Os níveis de coesão e solidariedade social, muito baixos e instáveis, apresentados em vários estudos sociológicos sobre o nosso país têm um impacto profundo na construção da cidadania.
Não se trata aqui de ver a cidadania apenas reduzida a um estatuto legal de direitos e deveres, mas – numa perspectiva mais abrangente – na capacidade de envolvimento numa comunidade política e social.
Isto é, a capacidade dos cidadãos e das organizações sociais em mobilizarem-se na definição e implementação de políticas publicas, não sendo apenas os destinatários dessas políticas.
Quando a cidadania democrática não se encontra consolidada, os actores sociais não dispõem de uma perspectiva mais ampla dos interesses em jogo no processo de governança. Não conseguem assim agir para além dos interesses próprios, limitando-se a reclamar, consumir e, se for caso disso, a avaliar as políticas públicas. Abdicam da sua dimensão de cidadania para se tornarem clientes das medidas que os governos implementam para responder às suas exigências. Aqui, tem maior sucesso quem tem mais meios para se fazer ouvir junto dos decisores políticos.
As origens latinas da palavra cliente, que apontam para a noção de dependência e de seguidor, estão bem longe do significado de cidadão. Na governação, os cidadãos não são apenas clientes, eles são “donos”. Os clientes decidem entre os produtos apresentados pelo mercado; os cidadãos decidem o que é importante que os governantes façam com os recursos públicos.
Este resumo de moderna teoria social - agora que é publicada a tomada de posição da SEDES com um retrato impressivo do país social – não deixa de ter no desporto um excelente exemplo, particularmente no desporto federado.
Era há muito conhecida a intenção política de reformar o Regime Jurídico das Federações Desportivas (RJFD). Até à recente proposta do governo, as federações optaram por escassas discussões avulsas - maioritariamente à porta fechada - sobre o eventual diploma. Isto, num domínio vital da sua autonomia.
Ao invés de liderarem a agenda política optaram pela confortável posição de esperar para ver.
No futebol, a emergência da Liga Portuguesa de Futebol Não Profissional (LPFNP) na negociação das viagens às regiões autónomas ia dando sinais da posição do governo face à impassividade das associações regionais e da federação. A Confederação do Desporto de Portugal, em processo eleitoral, mantinha-se num olímpico silêncio...
Quando foi apresentado o projecto de diploma a reacção do movimento associativo não se fez esperar e recorreu ao expediente comum em sociedades pavlovianas e paroquiais - pedir a “cabeça” do responsável político.
O governo apresentava a proposta que satisfazia os seus interesses próprios: Garantir uma intervenção forte do Estado na gestão federativa através do reforço do presidencialismo (medida típica de impor maior responsabilização sem garantir democraticidade e separação de poderes, o que reforça a possibilidade de intervenções arbitrárias dos poderes públicos). Reduzir o peso das associações, cuja inoperabilidade bloqueia a boa governação das federações, e consolidar a importância das ligas (a de futebol profissional e a inefável LPFNP) tendo em atenção o seu capital político. Tudo isto, claro está, num diploma que aponta, naturalmente, para a modalidade desportiva com maior peso e interesse político.
“Trancas à porta” o movimento associativo, importante laboratório de cidadania, vem agora - após organização de um fórum (do futebol, pois claro) onde procurou discutir aquilo que há muito devia ter feito – elaborar um conjunto de propostas sobre o projecto de diploma. Algumas, eventualmente, a serem hoje apresentadas na reunião do Conselho Nacional do Desporto.
Como se diz em linguagem desportiva, resta-lhe “ir atrás do prejuízo” uma vez que abdicou de conduzir a gestão do processo, optando antes por olhar pelos seus interesses clientelares.
O governo, neste paradigma de sociedade - não tendo uma lógica diferente - também optou por olhar pelos seus interesses e veio já reafirmar a “cosmética” disposição para auscultar as propostas ao seu projecto de diploma, sem abdicar, contudo, dos seus princípios estruturantes.
No desporto, como em outros domínios sociais, o caminho que separa o cliente reactivo do cidadão proactivo, a governação hierárquica da governança em rede, ainda está por percorrer.
No passado escreveu-se aqui sobre cidadania desportiva. Até hoje, na gestão da agenda em torno do RJFD, não deixa de ser manifesta a elementar cidadania desportiva de todos os actores envolvidos - públicos e privados.
Talvez um dia se volte a este tema, reflectindo sobre os instrumentos para garantir uma efectiva cidadania desportiva e ir ao encontro de níveis mais evoluídos onde o “pensar estratégico e agir democrático” não seja apenas um assunto de manuais… Até lá, no desporto “é preciso fazer algo para que tudo fique na mesma” e todos darmos uma vista de olhos na última página do documento da SEDES.
Não se trata aqui de ver a cidadania apenas reduzida a um estatuto legal de direitos e deveres, mas – numa perspectiva mais abrangente – na capacidade de envolvimento numa comunidade política e social.
Isto é, a capacidade dos cidadãos e das organizações sociais em mobilizarem-se na definição e implementação de políticas publicas, não sendo apenas os destinatários dessas políticas.
Quando a cidadania democrática não se encontra consolidada, os actores sociais não dispõem de uma perspectiva mais ampla dos interesses em jogo no processo de governança. Não conseguem assim agir para além dos interesses próprios, limitando-se a reclamar, consumir e, se for caso disso, a avaliar as políticas públicas. Abdicam da sua dimensão de cidadania para se tornarem clientes das medidas que os governos implementam para responder às suas exigências. Aqui, tem maior sucesso quem tem mais meios para se fazer ouvir junto dos decisores políticos.
As origens latinas da palavra cliente, que apontam para a noção de dependência e de seguidor, estão bem longe do significado de cidadão. Na governação, os cidadãos não são apenas clientes, eles são “donos”. Os clientes decidem entre os produtos apresentados pelo mercado; os cidadãos decidem o que é importante que os governantes façam com os recursos públicos.
Este resumo de moderna teoria social - agora que é publicada a tomada de posição da SEDES com um retrato impressivo do país social – não deixa de ter no desporto um excelente exemplo, particularmente no desporto federado.
Era há muito conhecida a intenção política de reformar o Regime Jurídico das Federações Desportivas (RJFD). Até à recente proposta do governo, as federações optaram por escassas discussões avulsas - maioritariamente à porta fechada - sobre o eventual diploma. Isto, num domínio vital da sua autonomia.
Ao invés de liderarem a agenda política optaram pela confortável posição de esperar para ver.
No futebol, a emergência da Liga Portuguesa de Futebol Não Profissional (LPFNP) na negociação das viagens às regiões autónomas ia dando sinais da posição do governo face à impassividade das associações regionais e da federação. A Confederação do Desporto de Portugal, em processo eleitoral, mantinha-se num olímpico silêncio...
Quando foi apresentado o projecto de diploma a reacção do movimento associativo não se fez esperar e recorreu ao expediente comum em sociedades pavlovianas e paroquiais - pedir a “cabeça” do responsável político.
O governo apresentava a proposta que satisfazia os seus interesses próprios: Garantir uma intervenção forte do Estado na gestão federativa através do reforço do presidencialismo (medida típica de impor maior responsabilização sem garantir democraticidade e separação de poderes, o que reforça a possibilidade de intervenções arbitrárias dos poderes públicos). Reduzir o peso das associações, cuja inoperabilidade bloqueia a boa governação das federações, e consolidar a importância das ligas (a de futebol profissional e a inefável LPFNP) tendo em atenção o seu capital político. Tudo isto, claro está, num diploma que aponta, naturalmente, para a modalidade desportiva com maior peso e interesse político.
“Trancas à porta” o movimento associativo, importante laboratório de cidadania, vem agora - após organização de um fórum (do futebol, pois claro) onde procurou discutir aquilo que há muito devia ter feito – elaborar um conjunto de propostas sobre o projecto de diploma. Algumas, eventualmente, a serem hoje apresentadas na reunião do Conselho Nacional do Desporto.
Como se diz em linguagem desportiva, resta-lhe “ir atrás do prejuízo” uma vez que abdicou de conduzir a gestão do processo, optando antes por olhar pelos seus interesses clientelares.
O governo, neste paradigma de sociedade - não tendo uma lógica diferente - também optou por olhar pelos seus interesses e veio já reafirmar a “cosmética” disposição para auscultar as propostas ao seu projecto de diploma, sem abdicar, contudo, dos seus princípios estruturantes.
No desporto, como em outros domínios sociais, o caminho que separa o cliente reactivo do cidadão proactivo, a governação hierárquica da governança em rede, ainda está por percorrer.
No passado escreveu-se aqui sobre cidadania desportiva. Até hoje, na gestão da agenda em torno do RJFD, não deixa de ser manifesta a elementar cidadania desportiva de todos os actores envolvidos - públicos e privados.
Talvez um dia se volte a este tema, reflectindo sobre os instrumentos para garantir uma efectiva cidadania desportiva e ir ao encontro de níveis mais evoluídos onde o “pensar estratégico e agir democrático” não seja apenas um assunto de manuais… Até lá, no desporto “é preciso fazer algo para que tudo fique na mesma” e todos darmos uma vista de olhos na última página do documento da SEDES.
2 comentários:
Bom dia,
A resolução do problema que expõe parece passar pela acção conjunta das federações face ao governo.
Mas isso não tem sido possível nem mesmo com a existência de organizações que existem mais ou menos para esse efeito (o COP ou a CDP).
De qualquer forma, seria melhor que o governo não interferisse na orgânica do associativismo e orientasse mais a sua atenção para aquilo que mais lhe parece interessar: gerir os interesses e os problemas políticos resultantes do futebol.
Mas ninguém parece estar muito preocupado em fazer algo que altere esta situação.
Daí que tudo isto parece ser um problema complicado de resolver.
andré
é de lamentar que o governo com este diploma pretenda diminuir a representatividade das associações desportivas. A vida desportiva das mais diversas modalidades passa pelas associações distritais e regionais e sobretudo passa por pessoas que de uma forma ou de outra contribuiem sem qualquer tipo de necessidade de promoção pessoal para que existam campeonatos regionais e desenvolvimento desportivo.
Actualmente com a a mania da eficiencia e da politica de retenção de custos assiste-se a chorrilho de decretos regulamentares que pelo contrário, são um apelo ao afastamento de todos os cidadãos da participação civica e desprotiva.
O que se pretende com o novo rjdfd é fomentar o profissionalismo das federações criar uma elite de dirigentes que tudo irão fazer para manter o poder e arrastar-se no poder em nada contribuindo para o desenvolvimento desportivo.
Veja-se o que está acontecendo em algumas federações, onde atletas de alta competição são obrigados a assinar contratos, aqui coloca-se em causa a validade juridica dos mesmos, pois caso contrário não lhes é permitido prosseguir na alta competição.E para cumulo se não cumprirem os objectivos propostos, para além de ficarem impedidos de prmanecer no percurso tem de devovlver as verbas auferidas até ao momento....só neste pais. Que estratégia de desenvolvimento será esta?
Federações que castigam árbitros só porque não estão alinhados com a direcção, caso recente é o que se passa com um árbitro internacional de pólo que recentemente foi retirado, sem qualquer explicação dos quadros internacionais, apenas porque´não está alinhado com a direcção. Que Pais é este onde pessoas que dirigem os destinos ds federações, apenas surgiram e se arvoraram em salvadores da nação quando foi aprovado o estatuto remuneratório da mesma. Onde é que andavam quando nada se recebia, porque não vieram em defesa da pátria.
Saudações desportivas
José
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