terça-feira, 29 de setembro de 2009

A liderança do desporto português está equivocada

Este texto da autoria de Fernando Tenreiro foi publicado no Jornal Público de 26 de Setembro.


O desporto vive sem uma liderança com um rumo reconhecido pela sociedade. As PT do mercado desportivo restringem a concorrência sem uma autoridade independente e sem a percepção do prejuízo do mercado. As principais instituições desportivas privadas e públicas "limitaram a produção, a distribuição, o desenvolvimento técnico e o investimento relativos aos serviços em causa, em prejuízo da concorrência e dos consumidores", usando as palavras da Autoridade da Concorrência. Sem uma "banda larga" na prática desportiva, recriando o modelo europeu, os resultados são decepcionantes.
O associativismo desportivo tem uma liderança pluricéfala e produz resultados menores do que a expectativa e o potencial nacional no contexto europeu. O nosso futuro e o das novas gerações são prejudicados pelo modelo de produção desportiva vigente há trinta anos. Em termos relativos somos os mais pequenos na Europa do desporto e constituímos a população nacional que menos desporto consome e cujo impacto no produto nacional é menor. A manter os índices actuais de crescimento de produção e consumo desportivos levaremos décadas a alcançar a actual média europeia, o que sugere que com o modelo português actual, uma cópia truncada do europeu, não a atingiremos. Produzimos pouco desporto e fazemo-lo com demasiado envolvimento público para o produto obtido sem que o Estado e a sociedade reinventem a sua parceria no sector abrindo-a ao "saber fazer" europeu.
Existem duas instituições privadas, o Comité Olímpico de Portugal e a Confederação do Desporto de Portugal, e uma instituição pública, o Conselho Nacional do Desporto, reunindo uma, duas e três vezes os mesmos líderes desportivos, personalidades do PS, PSD, PCP e PP e professores do ensino superior. Esta liderança faz política desportiva como se Portugal pudesse ser competitivo na Europa sem referência aos indicadores do sucesso global do desporto europeu.
A política desportiva portuguesa não tem sucesso porque falha nas características da produção e do consumo desportivos. Tanto falhou ao longo do século XX como agora. No século XX os países iguais a Portugal no PIB e na população acumularam centenas de medalhas olímpicas e nós apenas 15. No século XXI, somando as de Sydney 2000, Atenas 2004 e Pequim 2008, conquistámos 7 medalhas e temos um total de 22. Nos restantes indicadores desportivos praticantes, clubes, técnicos, financiamento os valores absolutos e relativos não dão a substância e a massa crítica do sucesso europeu. Numa palavra, assim, no desporto nunca chegaremos à média europeia e o impacto no país é um peso morto para os restantes sectores da actividade.
O consenso dos líderes políticos e dos desportivos sobre o modelo de produção baseia-se em resultados desportivos casuísticos e sem uma relação de interesses com a sociedade. É um consenso fechado que se abre com as vitórias sofridas e esparsas que celebram o sucesso das políticas de feição liberal incapazes de colocar o desporto como um dos centros do combate à diferenciação da população segundo a idade, a riqueza, a literacia, o sexo e a idade que a sociedade portuguesa genericamente tem prosseguido.
O desporto necessita de uma revolução desportiva, cultural, científica, política, económica, social e ética que os líderes actuais ou não reconhecem ou não querem protagonizar.
O monopólio que os líderes políticos e desportivos gerem tem receitas privadas baixas por insuficiência de resposta às necessidades desportivas do país em relação ao potencial europeu que deveria promover. No longo prazo os líderes asseguram o preço acima do custo marginal sem competir no mercado através da respectiva produção desportiva. A racionalidade económica da produção desportiva não é uma variável relevante da regulação vigente. O modelo de produção desportivo, sendo viciado na subsídio-dependência, atingiu os limites do envolvimento público e da sociedade civil aos projectos desportivos. Dito de outra forma: o modelo de produção vigente gera menos produto e menor lucro para os produtores do que faria o modelo europeu. Ao contrário do que afirmam os seus líderes, a via que o desporto português prossegue não leva a uma média europeia contemporânea.
Os acontecimentos de Pequim 2008 sugeriam que ou o desporto português tinha um sobressalto e emendava a mão de três décadas de políticas tradicionais, ou a moeda tradicional substituiria o modo de fazer desporto europeu. Passado um ano é claro que a última hipótese foi a preferida pelos líderes desportivos e políticos nacionais e a próxima legislatura começará no desporto sem novos princípios de ética, bom governo, objectivos europeus, empenhamento e equidade social, estatísticas e estudos, transparência e prestação de contas.
Aos atletas e aos treinadores exige-se-lhes que cumpram a sua obrigação. Pena que os líderes desportivos e políticos se escusem de igual compromisso ético e cívico e não se comprometam e envolvam nos índices desportivos que os líderes europeus produzem. O acontecido em Pequim 2008 é o alerta de uma situação que contamina o futuro de gerações de portugueses.
Refira-se de novo que se o problema é a segurança do dinheiro sem risco recebido do Estado, então a liderança do desporto português está profundamente equivocada, porque ganharia muito mais com o modelo europeu do que com os "negócios do costume" que actualmente prossegue.

Economista, ftenreiro@clix.pt

domingo, 27 de setembro de 2009

Contas com leis II

Para mim hoje é um dia como outro qualquer.
Todavia, em homenagem àqueles (a esmagadora maioria) que o sentem como um momento determinante para as suas vidas e para existência colectiva deste infeliz país, deixo aqui o meu pequeno contributo para o cumprimento de um dever cívico.
Em
anterior texto demos conta da “quantidade das leis” e do nível de produção alcançado, em particular pelos XIII e XVII Governos constitucionais.
Adicionamos, agora, algumas observações qualitativas, percorrendo dois trilhos.

Em primeiro lugar, mas naturalmente não só no desporto, vivemos sob o jugo de uma cultura política que vê na lei o instrumento fundamental – quiçá, para alguns, único – para a resolução dos problemas com que se depara este infeliz país.
O poder político “ultrapassa” os bloqueios da vida social com o anúncio de novos diplomas e, num momento posterior – por vezes, bem longe –, com a sua aprovação e entrada em vigor.

Porém, se alguém se der ao trabalho de serenamente olhar a legislação desportiva, constatará uma significativa mancha de copy e paste, que vai perdurando de ano para ano, de Governo para Governo, de partido para partido.
Vigora, neste domínio, a lógica da «pegada legislativa».
É vital para os governos que se contabilize o número de diplomas que aprovou, independentemente de se manterem muitas soluções, já há muito adquiridas, acompanhadas de retoques.

Mas o que é verdadeiramente significativo para este infeliz país é que uma vez aprovados os remakes, ninguém os cumpre. A forma vence sempre a matéria.
E todos os operadores vivem bem com esta situação, minando desta forma os «alicerces sociais» de um Estado referenciado como de Direito e democrático.
A lei não é, neste infeliz país, ao contrário do que um dia afirmou um Presidente da República em exercício – Jorge Sampaio –, um mero conselho.
É, na verdade, um mero texto de entretenimento.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Transparência


A Transparency International (TI) é a maior organização da sociedade civil dedicada ao combate à corrupção. Os sociólogos que estudam este fenómeno têm ciente a importância política das iniciativas desta entidade.

Não sendo a primeira vez que aborda a problemática da corrupção no desporto, o documento de trabalho agora apresentado sublinha a preocupação na falta de integridade da industria desportiva, a qual pode pôr em causa os seus valores nucleares: fair play, ética desportiva, respeito mútuo e confiança nas regras do jogo. Traz para a comunidade académica e política que discute a corrupção, de uma forma simples, os principais problemas deste fenómeno no contexto desportivo. Alguns dirão: Nada de novo!

A questão não é tanto essa, mas o momento político escolhido para lançar um documento deste género, após os recentes episódios no mundo do atletismo e da Fórmula 1, e a preparação de um domínio de acção comunitário em matéria de desporto, o qual, ainda que constituindo-se como uma competência complementar à acção dos governos nacionais, terá um papel importante a desempenhar nos problemas supra nacionais que hoje se colocam no desporto mundial. Quem acompanha a vivência das instituições comunitárias está ciente que a institucionalização de uma agenda permanente em 2004 criou na UE uma metodologia de trabalho e consulta para a criação de um programa político para o desporto, completamente diferente do percurso errático onde navegava até então, disso é prova o labor dos diversos grupos de trabalho constituídos desde então no apoio ao Conselho e as diversas iniciativas lançadas para implementar o programa de acção previsto no Livro Branco, a mais recente no domínio do voluntariado, a qual convido os leitores a participarem.

O documento de trabalho da TI elege sete áreas particularmente vulneráveis à corrupção devido à falta de transparência ou integridade: Viciação de resultados, crime organizado, governança, construção, patrocínios e media. Avança com propostas de prevenção das ameaças à corrupção, frisando a necessidade de implementar padrões de transparência e prestação de contas na governação desportiva.

Sobre a aplicação destes princípios são conhecidas as limitações dos países do sul da Europa. São também conhecidas, no nosso país, as diferentes opções tomadas em relação às propostas de João Cravinho nesta matéria. O leitor que quiser seguir em maior profundidade o “estado da arte” sobre o combate à corrupção em Portugal poderá avaliar por si próprio os dados recolhidos por Luis Sousa para o estudo desta realidade e, assim, extrair as suas conclusões.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Escolher o óbvio

A actual governação “desportiva” teve tudo: tempo, dinheiro e poder. E boa imprensa. Por mérito próprio, reconheça-se. Politicamente fez o que quis. Contou com uma oposição ausente. E com organismos de topo da hierarquia desportiva obedientes e servis. Se acaso não fez tudo quanto desejaria não foi por iniciativa alheia.
Em princípio estão reunidas as condições para que inicio da próxima governação não apresente a cultura de queixa que caracterizou o início da legislatura que está a terminar. O que é um avanço. O PS continuará e aprofundará a opção estratégica que caracterizou o actual mandato. Se outro for o governo resta manter o que se iniciou porque não se conheceu, nestes últimos quatro anos, qualquer alternativa. E o pior que poderia suceder era começar tudo outra vez. Ou inventar só para ser diferente.
Dito isto importa reconhecer que o modo como alguns defendem a actual governação acaba por prejudicar aquilo que fez bem. Desde logo porque não há governação que só viva de resultados positivos. E por outro, na hora do balanço, a credibilidade conquista-se precisamente quando se avalia o que se fez bem e aquilo em que se errou. Os balanços que só encerram encómios não são exercícios sérios. São manifestações de propaganda.
O erro da avaliação da actual governação é fazê-lo em nome da comparação com o que fez, quando foi governo, o PSD. Nessa comparação o PS ganha sempre. E esse é o problema.
É que a situação desportiva nacional e respectivos indicadores dificilmente podem ser assacados à responsabilidade de quem, o que fez foi pouco e nem sempre bem. A responsabilidade politica vai direitinha para quem fez muito. O que ajuda a explicar que recentemente tenham surgido alguns comentários que pretendem estabelecer uma ruptura ente a actual governação e a de anteriores períodos socialistas. De acordo com esse entendimento o PS de 2005 nada tem a ver com os outros momentos da governação socialista. Mesmo quando num dos outros era ministro do desporto o actual primeiro-ministro. Não creio que o assunto mereça muitas linhas. A mudança de paradigma é um absurdo. Vive de pessoas e de protagonismos mais que de estratégias ou alternativas.
É compreensível que em tempo de balanço se enumerem as medidas adoptadas. E se procure ganhos de competência politica em função do número e diversidade dessas medidas. E se procure sustentar que nunca no passado se fez tanto. Mas o balanço será sempre fraco se o efeito das medidas sobre a realidade desportiva for escasso. Ou se as próprias medidas pecarem por défices na sua aplicação.
Sucede que muitas das medidas carecem de tempo para se poder exercer uma avaliação sustentada dos resultados. E não podem ficar prisioneiras da sua simples enunciação. Porque o mérito dos resultados pode não coincidir com a bondade dos propósitos. A narrativa mediática daquilo que “fizemos desde que chegámos” oferece muita distracção e motivos de interesse mas não responde ao essencial: como avançar para obter melhores resultados.
Nos defensores da actual governação desportiva existe um indisfarçável nervosismo e inquietação. Creio que muito ligados à indefinição do próximo quadro governativo. Mas não creio haver razões para preocupação sobre o futuro. Os temas da agenda politico - desportiva estão lançados. São os mesmos há cerca de três décadas. Goste-se ou não a actual maioria vai à frente. E nunca foi desafiada politicamente para qualquer outra alternativa.
Deixemos o desporto entregue aos seus habituais protagonistas. Mesmo quando rodam. Dizê-mo-lo sem ironia ou cinismo. Os nossos problemas são outros. E bem mais graves. E a alternativa que se coloca ao país é escolher entre uma economia produtiva e competitiva e a pobreza. Nem sempre o óbvio foi tão óbvio. E poucas vezes escolher o óbvio foi tão difícil.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

10 razões para uma demissão


Publicita-se, com o devido agradecimento, o texto de Luís Leite na "Revista Atletismo", nº 334/335, Setembro/Outubro de 2009, pág. 7.


…Ou uma terrível sensação de frustração e saturação de alguém que não está nem esteve “agarrado” a funções federativas nem quer voltar a tê-las, mas se envolveu demais, por paixão à modalidade.
Portugal continua um país periférico e inculto, uma partidocracia em que a justiça faliu, tal como a moral e a ética e onde as elites, em regra, tendem para formas mais ou menos subtis de corrupção e facilitismo; rareiam as excepções.
Desportivamente, é o país da bola, rodeado de futebol, de espertalhões e de negociatas por todos os lados.
Nada há a fazer; é escusado continuar a lutar, sobretudo quando a nossa saúde e a carreira profissional estão em risco e se tem a consciência tranquila de que se deu tudo, mesmo tudo, durante sete anos de trabalho intenso e fiel à instituição; quando não se faltou ao serviço ou a reuniões de Direcção uma única vez, mas em que a paciência, finalmente, se esgotou.
Felizmente, há mais vida para além da FPA, embora nas outras áreas da vida profissional as coisas também não estejam fáceis.
Felizmente, ainda há liberdade para dizer o que se pensa e quando se sai de funções, o silêncio sigiloso deixa de ser obrigatório…
Apesar das mais de 200 medalhas conquistadas, sucesso relativo difícil de avaliar comparativamente com outros países de dimensão similar no atletismo, mas evidente na comparação interna com as outras modalidades individuais, fruto do trabalho persistente e quase incógnito de muita gente, analisemos os porquês desta demissão:

RAZÕES CONJUNTURAIS E ESTRUTURAIS EXTERNAS

1) Incompetência continuada da administração pública desportiva nacional, regional e local, claramente populista e demagógica nas opções políticas, nas promessas e nos procedimentos, com particular gravidade no que respeita à aprovação, financiamento e licenciamento das instalações desportivas com particulares responsabilidades para o legislador, para o IDP e para o QCA/CREN; as pistas com condições satisfatórias para treino e competição são poucas e quase todas muito ventosas; muitas têm relva sintética e/ou não possuem apetrechamento; a maioria das pistas encontra-se muito degradada e sem renovação à vista; vários distritos não têm uma única pista em estado aceitável e apetrechada; a situação agravar-se-á significativamente nos próximos anos;

2) Incompetência crescente do Comité Olímpico de Portugal, claramente, envelhecido e desactualizado, onde os protagonismos pessoais e as manobras de bastidores prevalecem sobre a lógica do conhecimento e o interesse nacional; o Presidente acumula (pasme-se) com a presidência da Assembleia Plenária (!); em Julho/Agosto de 2009 ainda não havia novos critérios de integração nem financiamento à preparação olímpica (!);

3) Incompetência e inexistência prática da Confederação do Desporto de Portugal, submetida aos interesses governamentais, sem carácter representativo ou reivindicativo das Federações; uma nulidade;

4) Importância excessiva e desmesurada da modalidade Futebol na atenção da população em geral, com fortes responsabilidades para os sucessivos governos, os quais, através da comunicação social pública, contribuem, em crescendo, para a intoxicação da população com o mundo do futebol e para o aumento da iliteracia e da clubite alarve; assim se inviabiliza a divulgação das outras modalidades, dificultando intencionalmente a difusão do seu conhecimento;

RAZÕES ESTRUTURAIS INTERNAS

5) Excessiva centralização de poder na figura do Presidente da Federação Portuguesa de Atletismo (FPA), há demasiado tempo (26 anos) “dono exclusivo” da modalidade, personalidade que se descontrola facilmente e que se considera insubstituível, incapaz de descentralizar, interferindo e desautorizando os raros directores com funções executivas, sendo, na prática, o “único” centro de poder; órgãos sociais eleitos sucessivamente sem necessidade de apresentar programa eleitoral (!), à revelia dos Estatutos; consequente inexistência de estratégia para cada ciclo de quatro anos; incumprimento, desde 1994 (!) da entrega dos galardões FPA, previstos nos estatutos;

6) Inépcia quase total da Direcção da FPA enquanto órgão, a qual, contrariamente ao disposto implicitamente nos estatutos, não tem carácter deliberativo, limitando-se a reunir para ouvir longos monólogos presidenciais justificativos de decisões entretanto tomadas e relatos circunstanciais de acontecimentos passados; consequente impossibilidade de discussão aberta, objectiva e organizada dos assuntos estratégicos mais relevantes, por elementos supostamente conhecedores (?) da modalidade;

7) Excesso de amadorismo e absentismo na Direcção da FPA, não compatível com a realidade actual; necessidade de um novo modelo profissionalizado, com um número necessariamente reduzido de membros (4 ou 5), mas com distribuição de pelouros e conhecimento específico da modalidade na respectiva área de intervenção;

8) Situação financeira sempre dramática da FPA por falta de liquidez, sobretudo no primeiro semestre de cada ano, sem estratégias de solução à vista, dependente a 90% do financiamento público; incapacidade de atrair um forte patrocinador privado; enorme discrepância de valores entre os orçamentos e as contas de exercício aprovados em Assembleia-Geral;

9) Deficiente gestão, organização e coordenação dos departamentos e recursos humanos intermédios da FPA por falta de directores executivos a tempo inteiro; nítido contraste com a qualidade de vários dos quadros intermédios;

10) Retrocesso ou estagnação no desenvolvimento da maioria das Associações Regionais, as quais apresentam um atletismo de reduzida expressão nacional; basta consultar os resultados dos campeonatos distritais de pista; há mais filiados (benjamins, infantis, veteranos), mas os rankings, em profundidade, estagnam ou pioram ano após ano… A macrocefalia mantém-se.

Por fim, não estão em causa as pessoas em si, com quem, em geral, sempre tive bom relacionamento e estima pessoal, mas sim o sistema, com todas as suas falhas aqui evidenciadas, próprias de um país que, em termos de desenvolvimento, continua na cauda da Europa, sem estratégias ou soluções à vista.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Contas com leis

Anónimo a cavalo de um texto sobre as claques – sobre o qual nada diz, embora aí se afirmasse algo sobre uma novel solução legislativa –, ofereceu-nos um entusiástico balanço da iniciativa legislativa do XVII Governo Constitucional. E o fervor é tanto que é legítimo suspeitar que o anónimo se trata, a final, do próprio membro do Governo ou de algum dos seus porta-vozes.

O anonimato começa por nos dar conta da «parte desportiva» do Conselho de Ministros do passado dia 5 de Agosto.
Nessa reunião, o Conselho de Ministros aprovou os seguintes diplomas:

a) Decreto-Lei que estabelece as medidas específicas de apoio ao desenvolvimento do desporto de alto rendimento;
b) Decreto-Lei que estabelece a responsabilidade técnica pelas actividades físicas e desportivas desenvolvidas nas instalações desportivas;
c) Decreto-Lei que estabelece o regime jurídico dos contratos-programa de desenvolvimento desportivo.

Depois da notícia, assim fala (?) o anonimato:

Assim, quase seja ao fim, em 4 anos apenas, a maior e mais profunda reforma legislativa no sector do Desporto na história da democracia portuguesa.
De um lado, a propaganda e o ataque pessoal. Do outro lado, os resultados e a obra efectivamente feita.
À vista de todos sem embustes mediáticos, nem montagens televisivas, ou bloguistas.
Digam lá, ò doutos de vocês da Colectividade, no fundo da vossa consciência, se o truque político das «oposições» não foi tentar esconder do Povo estes resultados, e esta capacidade de realizar, com os insultos e os ataques pessoais?
A sério?”

Colocando de parte o que só interessa ao anonimato, centremo-nos, serenamente, no destaque que efectuámos, para a seu propósito tecermos algumas considerações.
Olhando, por ora, somente a quantidade, quanto errado está o anónimo.
Caso me esqueça de alguma medida legislativa, estou certo que o anonimato me corrigirá.
Assim temos:

1. Lei nº 5/2007, de 16 de Janeiro (Lei de Bases da Actividade Física e do Desporto), a qual determinava, no seu artigo 51º, que a sua regulamentação, nas matérias que não sejam reserva da Assembleia da República, deve ser objecto de regulamentação, por decreto-lei, no prazo de 180 dias;
2. Decreto n.º 4-A/2007, de 20 de Março, que aprova a Convenção Internacional contra a Dopagem no Desporto;
3. Decreto-Lei nº 169/2007, de 3 de Maio, que cria o Instituo do Desporto de Portugal, acompanhado de duas declarações de rectificação do seu texto – uma publicada em 15 de Junho e outra a 2 de Julho –, existindo, assim, por via delas, no espaço de dois meses, três regimes de exercício de funções para os dirigentes do IDP;
4. A Portaria nº 662/2007, de 31 de Maio, procedeu à aprovação dos Estatutos do IDP, todavia, um ano depois, a Portaria nº 573/2008, alterou tais estatutos dado que a “experiência entretanto colhida demonstrou que a estrutura interna dos serviços centrais carece, ainda, de pequenos ajustamentos que visam garantir uma melhor adequação desta estrutura à prossecução da missão e atribuições do IDP, I. P.”;
5. Decreto-Lei n.º 315/2007, de 18 de Setembro, que veio estabelecer as competências, composição e funcionamento do Conselho Nacional do Desporto; o seu texto viu-se rectificado em 26 de Outubro e já em 2009 foi objecto de alteração por via do Decreto-Lei n.º 1/2009, de 5 de Janeiro;
6. A Lei n.º 50/2007, de 31 de Agosto, veio estabelecer um novo regime de responsabilidade penal por comportamentos susceptíveis de afectar a verdade, a lealdade e a correcção da competição e do seu resultado na actividade desportiva;
7. O Decreto-Lei n.º 248-A/2008, de 31 de Dezembro, ocupa-se da Actividade de treinador de desporto;
8. O Decreto-Lei n.º 248-B/2008, de 31 de Dezembro, estabelece o regime jurídico das federações desportivas e as condições de atribuição do estatuto de utilidade pública desportiva;
9. O Decreto-Lei n.º 10/2009, de 12 de Janeiro, estabelece o regime jurídico do seguro desportivo obrigatório;
10. O Decreto-Lei n.º 141/2009, de 16 de Junho, estabelece o regime jurídico das instalações desportivas de uso público;
11. A Lei n.º 27/2009, de 19 de Junho, estabelece o regime jurídico da luta contra a dopagem no desporto, diploma já rectificado a 4 de Agosto;
12. A Lei n.º 39/2009, de 30 de Julho, estabelece o regime jurídico do combate à violência, ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espectáculos desportivos, de forma a possibilitar a realização dos mesmos com segurança.

De boa vontade aditamos os três que anunciou.
Ora, a “marca alcançada” parece-nos ficar bem atrás da obtida pelo XIII Governo Constitucional, liderado por António Guterres, não havendo legitimidade, assim se crê, para homologar o record pretendido.
Eis alguns dados da “maior e mais profunda reforma legislativa no sector do Desporto na história da democracia portuguesa”:

1996 – Reforma da Lei de Bases do Sistema Desportivo, criação do Gabinete Coordenador do Desporto de Escolar, alteração do diploma sobre o apoio à alta competição;

1997 – Diploma sobre a prevenção e combate à dopagem, regime de segurança social especial para o basquetebol (algo agora nunca alcançado para o andebol, em manifesta violação do princípio da igualdade), portaria sobre o regime de alta competição, diploma sobre os clubes de praticantes, diploma sobre as associações promotoras do desporto, regime jurídico das sociedades anónimas desportivas, regime fiscal das sociedades anónimas desportivas, alteração do regime jurídico das federações desportivas, diploma sobre a instalação e funcionamento das instalações desportivas de uso público, criação de três institutos públicos na área do desporto (IND, CAAD e CEFD), criação do Conselho Superior do Desporto;

1998 – Lei sobre a violência no desporto, lei do contrato de trabalho desportivo e do contrato de formação desportiva, portaria sobre a livre entrada nos recintos desportivos, três portarias relacionadas com o regime da alta competição e plano oficial de contabilidade para as federações desportivas, associações e agrupamentos de clubes;

1999 – Diploma sobre o enquadramento da formação desportiva, decreto-lei sobre medicina desportiva, estatuto do mecenato, decreto-lei sobre o regime de responsabilidade técnica nas instalações desportivas, qualificação das competições desportivas profissionais e regime disciplinar das federações desportivas.

E, na actualidade, o vento soprou a favor, pois não havia, na altura, maioria absoluta.
Mais. O resultado agora obtido não foi em 4 anos apenas.
A primeira reunião do Conselho de Ministros do XVII Governo Constitucional teve lugar a 17 de Março de 2005 e, como é público e notório, esta legislatura viu-se alongada no tempo para além dos quatro anos.
Ao invés, o XIII Governo Constitucional (1995-1999) tomou posse a 28 de Outubro de 1995 e a 25 de Outubro de 1999 tomava posse o XIV.
Aqui sim, apenas quatro anos.
Eis o exercício quantitativo. Pela extensão, as desculpas. Mas sempre fica um registo.
Voltaremos para outros.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

De cócoras

No plano da opinião pública um assunto de mera rotina académica é irrelevante. O caso muda de figura quando se transforma num facto político.
Segundo A Bola (9.9.2009) o Reitor da Universidade do Porto deslocou-se a Lisboa para reunir com o Presidente do SLBenfica. A reunião teve como objectivo encontrar uma solução para o facto de um docente universitário, que livremente optou pelo regime de trabalho a tempo integral na Faculdade de Desporto no Porto, pretender acumular, em termos de direitos de carreira e remuneratórios, com um contrato de trabalho em Lisboa como treinador.
Este tipo de situação não é novo. Muitos outros docentes - universitário e de outros graus -, que eram simultaneamente treinadores desportivos, passaram situações equivalentes. E tiveram, em determinado momento das suas carreiras que optar. Dedicarem-se à carreira de treinador ou entregarem-se inteiramente às tarefas académicas. Ou então escolher, nos casos em que foi possível, um regime parcial de docência com a acumulação legalmente possível.
A apreciação e decisão sobre a possibilidade de conciliar a situação de docente com a de contratado por uma entidade privada para o exercício de uma outra profissão é do foro interno das autoridades académicas.
Não é habitual ser a entidade patronal a interferir na relação institucional docente/universidade. Mas nada impede que o faça. E nesse contexto, interessado que estava em envolver-se na resolução da situação de um seu trabalhador, é natural que o clube em causa se dirigisse ao reitor da universidade e procurasse encontrar uma solução. Sem que pelo caminho fosse necessário enxovalhar publicamente o presidente da Faculdade do Desporto, perante, diga-se, o incompreensível silêncio do reitor.
Neste quadro, a deslocação do reitor a Lisboa é uma manifestação de subserviência. Mas também de fragilização de uma das suas faculdades que lhe cabia saber respeitar e defender. É difícil de acreditar que se fosse outra a entidade interessada o reitor tivesse tão elevada amabilidade. Ao fazê-lo o assunto deixou de estar na órbita de uma simples tramitação administrativo-legal para passar para um outro patamar: o da política.
A atitude do reitor só pode ser explicada à luz do resultado das pressões e das influências que o SLBenfica previamente anunciou que iria fazer junto do poder político,designadamente do ministro do ensino superior. Se o reitor veio a Lisboa foi porque alguém o chamou. E se chamou não é pela natureza do assunto e pelo interesse público que revestia. É porque do outro lado está um clube desportivo a quem o poder politico verga e receia enfrentar. Mesmo quando isso significa falta de respeito para com as autoridades académicas.E as diligências posteriores do reitor revelam quem pretende servir.
Ao politizar esta questão e ao transforma-la num assunto do Estado- independentemente da solução que vier a ser encontrada para o problema ,que seguramente aliará as disposições e legais com o interesse público - esta forma de tratar um problema da universidade, revela o valor e a importância que tem a reclamada autonomia.Com exemplos deste o reitor mas também o governo, correm o evidente risco de se poder concluir que são permeáveis ao tráfico de influências e de interesses. Mesmo quando esses interesses chocam com as mais elementares disposições legais que cabe ao ministro,ao reitor e à faculdade fazerem respeitar.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Programas,partidos,representação e governabilidade

Um texto anterior sobre os programas partidários às eleições legislativas suscitou um número inusitado de comentários. A maior parte não para comentar o texto. Mas para “ajustar contas” com esta ou aquela pessoa de que se não gosta. Á socapa. Atirando a pedra e escondendo a mão. Lamento não opinar relativamente a algumas das poucas opiniões expressas sobre questões substantivas. Mas em ditadura não me escondi para dizer o que pensava. Não é agora, em democracia, que aceito como regra do debate comentários sem rosto e sem assinatura. Respeito quem assim não pensa - as próprias regras do blogue o permitem – e a quem a isso está “obrigado” pelas funções que exerça. Mas não entro nesse campeonato.
As propostas políticas para o desporto contidas nos programas eleitorais não configuram alternativas. Uma linha de afirmação e continuidade para quem governa. Uma ausência de prospectiva para quem pretende governar ou condicionar quem governe. Uma interpretação a este “estado de coisas” pode incidir na crítica aos “partidos” e aos “políticos”. E a falta de qualidade dos programas partidários vistas como uma extensão da falta de qualidade dos que os sustentam. Esta opção pode explicar alguma coisa. Duvido que seja a única explicação.
Os partidos políticos são organizações da “nossa”sociedade. E reflectem o que somos. É nula a pressão para que apurem as suas qualidades. Tudo os empurra para que se movimentem basicamente para a conquista do poder. Ou para a resistência a quem o conquista. O que se lhes exige é pouco. E quando se exige pouco não se pode esperar muito. Por outro lado, no desporto como em outras áreas sociais, não cabe aos partidos, e a quem governa, ter resposta para tudo. Os partidos reflectem a fragilidade da própria sociedade. Um efeito que conduz a que se espere deles o que é a sua obrigação e ainda o que é da nossa obrigação cívica. E nestas coisas é sempre mais fácil criticar as autoridades porque não limpam adequadamente as ruas do que chamar a atenção do vizinho que teima em deitar lixo onde não deve.
Nas organizações e nos movimentos da sociedade civil que debate existe e que propostas surgem para outras politicas no desporto? Que capacidade existe para avaliar as actuais? A opinião sobre politica desportiva que ainda é feita não vai para além de pequenos círculos sem repercussão na sociedade e nos movimentos e organizações ligadas ao desporto.
A universidade, com vocação para o estudo e o debate sobre a dimensão politica do desporto, está num processo de crescente dependência financeira, remetendo-a para uma agenda de “investigação” onde não entram os temas incómodos. Prefere-se legitimar conhecimento na área da ciências da saúde ou da educação do que nas do desporto. E investe-se mais dinheiro público a estudar a ”prega adiposa” que o abandono desportivo precoce.
Neste blogue, como é fácil de constatar, não existe debate. Mas muita energia gasta em ressentimento, muito queixume e muitas contas por acertar. Só um país cansado e uma democracia exangue podem explicar que a diferença de opinião seja submetida à banalidade de quem vê a realidade a duas cores: nós e eles.
O problema é que a qualidade das pessoas e das ideias não tem como linha demarcadora quem está e quem esteve. Quem é deste ou daquele partido. Quem opta por ser capaz de pensar e viver sem esse “seguro de vida” ou por quem escolhe uma igreja ou uma loja como protecção para a vida. Manter esta lógica só empobrece o empobrecido ambiente de análise e de debate.
Há uma elevada incerteza para próximas eleições legislativas. Excepto a improbabilidade de uma maioria absoluta. O que pode não alterar a situação em termos de representatividade. Mas seguramente que vai ter mudanças em matéria de governabilidade. O governo está num labirinto. Que em parte ajudou a construir. O exercício musculado, arrogante e pouco dialogante da actual maioria, o seu progressismo em matéria de costumes, mas a sua inflexão ao centro em matéria económica, à direita no plano laboral e a crise internacional penaliza quem governa.
Qualquer governo, este ou outro, só tem a ganhar se souber aproveitar o debate público. Mas para que ele exista, é preciso um ambiente de distensão e de respeito. Sem exclusão de ninguém. Sem clubismos. Partidários ou outros. E com elevação, transparência e sentido de responsabilidade. Esse será o melhor contributo que se pode dar ao desporto. Mas também às organizações políticas e partidárias que têm a responsabilidade de “pensar a governação “ do “pais desportivo”.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

O valor do risco

Sobre as peripécias em torno da organização do Circuito da Boavista já me pronunciei anteriormente. As dúvidas que ali levantei e os lapsos entre contrato programa e contrato programa de desenvolvimento desportivo mantêm-se no articulado do contrato para a edição deste ano, salvo o despacho de interesse público do evento entretanto exarado.

Mas não é a justificação do interesse público numa comparticipação de 450.000 € por parte do Estado para um evento cujo contrato programa é assinado após a sua realização e onde a única obrigação do IDP é “verificar o exacto desenvolvimento do evento desportivo que justificou a celebração do presente contrato...”, nem tão pouco o mecanismo jurídico que regula o financiamento público que aqui se questiona. Outros o farão, por certo, com o rigor técnico-jurídico que amiúde trazem a este espaço.

Assim, optou-se pelo regime de contratos programa sectoriais definido pelo Decreto-Lei n.º 384/87, de 24 de Setembro. Tomando esta como a opção escolhida, o Despacho n.º 20101/2009, de 19 de Agosto justifica a celebração de contrato programa entre o IDP e a Porto Lazer E.M. em conformidade com o artigo 15.º do referido diploma legal.
De acordo com o n.º1 do art. 7.º do Decreto-Lei n.º 384/87, de 24 de Setembro :

Os contratos-programa são celebrados entre as entidades referidas no artigo 1º deste
diploma depois de os investimentos serem aprovados e dotados pelo Orçamento do Estado e incluídos no plano de actividades e orçamento dos municípios
.”

No que respeita à dotação no OE2009 deste investimento desconheço em absoluto e penitencio-me desde já pela minha eventual ignorância. Mas quem acompanha minimamente a vida política da cidade do Porto sabe que este evento não está contemplado no plano de actividades e orçamento do Município do Porto, onde se insere a empresa municipal Porto Lazer.

E sabe-o não apenas através das divergências político-partidárias que tornaram este evento um cavalo de batalha no seio da autarquia, mas principalmente pela consulta aos seus instrumentos de gestão financeira, onde não existe qualquer dotação para este evento conforme estipula a lei, mas também pelas palavras do seu vereador da cultura:

"A organização do circuito sofrerá algumas alterações. Qualquer previsão que fizéssemos aqui correríamos o risco de falhar. Também em 2005 e 2007 foi feito exactamente desta maneira"

Como também sabe pelas declarações do presidente da autarquia ,o qual, por diversas vezes, salientou a oportunidade de um novo modelo de gestão e financiamento através de uma parceria com agentes privados na qual o esforço e o risco da autarquia fosse menor e se rentabilizassem as contrapartidas económicas de uma prova com esta projecção, protegendo os legitimos interesses da autarquia portuense.

São também do domínio público os problemas auditados à Porto Lazer em aferir as suas fontes de financiamento

Infelizmente o dever de reserva me impede de alinhar outros elementos que, a acrescentar a estes, reforçam algo que, apenas pelo que aqui se veículou, se torna desde já evidente. O facto de o Estado ter perfeito conhecimento que não estavam reunidos princípios elementares para a celebração do referido contrato, estando o mesmo comprometido à partida, bem como os 450.000€ de financiamento.

O Municipio do Porto, ainda assim, estou certo, agradece este apoio providencial na sua estratégia para diminuir o risco financeiro da organização da competição.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Estória curta e conturbada

Corria o ano de 2002 e os clubes de andebol que integravam a competição de seniores da 1.ª divisão masculina deram como que o grito do Ipiranga rumo à sua autonomia organizativa e representativa instituindo a Liga Portuguesa de Andebol (LPA: onze fundadores).
Com tal acto pretendiam constituir uma competição desportiva de natureza profissional, conforme as disposições legais vigentes, as quais reclamavam, para além do reconhecimento oficial dessa competição como tal, um organismo específico para a organização, direcção e disciplina da mesma.

Seguiu-se, como é do conhecimento público, uma verdadeira história do desassossego entre a Federação de Andebol de Portugal (FAP) e a Liga Portuguesa de Andebol que se estendeu por 4 longos anos, com atropelos, afastamentos e aproximações à ordem jurídica em vigor. Os conflitos entre estas duas entidades desportivas foram elevados a assunto parlamentar; fizeram com que o Conselho Superior do Desporto tivesse desencadeado oficiosamente o processo para o reconhecimento da competição profissional; forçaram o estabelecimento de um protocolo transitório a bem do campeonato do mundo que se realizava entre nós e da participação da selecção nacional; e estiveram na base da sanção administrativa aplicada à FAP (suspensão do Estatuto de Utilidade Pública Desportiva).

Na época desportiva de 2005/2006 os tumultos pareciam ter desaparecido e formalmente era restabelecida a ordem nesta modalidade, contudo os seus diversos agentes desportivos referiam que o clima reinante mais se assemelhava a uma paz podre do que a uma paz derivada da cura das feridas, não alvitrando longa sobrevivência à liga de clubes. Previsto e efectivado.
Assim, não é de estranhar que na próxima semana comecemos a assistir àquela competição então reconhecida como profissional e da responsabilidade da LPA, a ser organizada apenas sob a tutela da FAP.

Retratam estes 7 anos que a liga de clubes nasceu e viveu da discórdia entre a federação e os clubes desportivos e não da natural e necessária adaptação orgânica da entidade federativa para integrar uma competição profissional.

Moral da estória, mais uma vez parece ser certo que o que nasce torto dificilmente se endireita. Consequências sociais, económicas e desportivas para a modalidade desportiva em questão? Quem vier atrás, por favor, feche a porta e apague a luz!

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Programas

A desvalorização dos programas eleitorais é a desvalorização da política. É o empobrecimento da democracia. É a cedência ao espectáculo mediático. É a submissão à parafernália de meios de encenação e de dramaturgia comunicacional. É a subordinação das escolhas politicas a opções sobre pessoas, carismas e idiossincrasias pessoais.
É-me indiferente se as pessoas lêem ou não os programas eleitorais. Menos ainda se as suas opções eleitorais decorrem do que cada força politica apresenta como programa. Mas um programa eleitoral é uma obrigação e um compromisso. Sela um contrato entre quem propõe e quem apoia. E se quem apoia o faz por outras razões que não as programáticas está no seu direito. Mas assina um cheque em branco.
Quem se dispõe a governar um país não pode deixar de apresentar as suas ideias e projectos para os diferentes sectores da governação. Se o não faz é porque não sabe ou porque desvaloriza essa realidade. Não é um ritual que se cumpre porque seria escandaloso não o fazer. Ou que se faz por fazer porque se percebe que não é por aí que o poder se conquista. Um programa eleitoral é um marcador de seriedade política.
Todo este arrazoado para entrar no essencial: as politicas propostas às próximas eleições legislativas no que respeita ao desporto. E não tanto para avaliar do mérito ou demérito das propostas, mas para perceber como é politicamente “pensado” o “país desportivo”.
O que encontramos é diverso. Nuns casos pura e simplesmente não é “pensado”. Assim se passa com o CDS/PP e com o BE. À extrema da direita e da esquerda o desporto não conta. Pelo menos não encontrámos qualquer referência programática ao desporto.
O PCP, um partido com experiência e responsabilidades no sector e que dispõe de quadros qualificados, opta por uma versão minimalista com breves linhas de referência e um conjunto de lugares comuns. Surpreende que tudo quanto consiga dizer em relação ao futuro seja tão pouco.
O PS e o PSD têm desenvolvimentos mais significativos designadamente o PS cujo enunciação exaustiva se aproxima de um programa de governo.
O programa do PS acentua e desenvolve a matriz que nos seus traços essenciais desenvolveu em onze dos últimos catorze anos. Com singularidades distintas, é certo, mas mais devidas aos titulares da governação que à substância das propostas. O modelo é o mesmo, reservando ao Estado um papel regulador e interventor e tocando a generalidade dos tópicos que têm constituído a sua agenda politica.
A proposta do PSD é um conjunto de princípios gerais cuja tradução politica se ignora o que seja, se é que existe algum conhecimento político que saiba traduzir os princípios enunciados, designadamente quanto ao papel do Estado.
A conclusão é relativamente simples: o PS diz o que quer e expõe-o de forma clara. O PSD limita-se a trabalhos mínimos não se percebendo se tem, se quer ou se sabe ser alternativa. O PCP reconhece-se em vulgaridades. E os outros têm mais que fazer.
As propostas reflectem a legislatura: hegemonia do governo (PS); ausência de oposição.
Pobre desporto que tão pouco engenho requer.

E.T. No Programa do PS lá está, uma vez mais, o “desporto para todos” que, por aqui, tinha sido, surpreendentemente, dado como extinto. Afinal a informação era falsa ou a fonte não era fidedigna. Vai dar ao mesmo.