domingo, 3 de outubro de 2010

O dirigismo desportivo em Portugal

Um novo texto de Luís Leite.


Um dos principais problemas do dirigismo desportivo é a fraca qualidade de muitos dos seus dirigentes. Isto é tão válido para os dirigentes da Administração Pública, eleitos ou designados, como para os diversos patamares e órgãos do designado “movimento associativo”, normalmente eleitos.
Sendo esta afirmação resultado de uma experiência pessoal e sendo a “formação” actual unicamente resultado da experiência adquirida, não pretendendo generalizar, julgo existirem dois perfis diferentes de dirigente no movimento associativo desportivo:

1) O “profissional”, em que a maior ou menor experiência em cargos de direcção é um factor a considerar; a vantagem está na acumulação de experiência e conhecimento, diverso mas útil; a desvantagem está na tendência para a eternização no poder e para a manipulação da estrutura que se lidera;

2) O “amador” é normalmente pessoa com algum tempo livre e gosto pela modalidade, clube ou vida associativa; a vantagem é o facto de sem ele não ser possível a existência dos diversos patamares do movimento associativo; a desvantagem reside na falta de formação, de disponibilidade de tempo e, muitas vezes, de conhecimento geral e específico suficiente sobre a função que desempenha.

Os dois perfis caracterizados integram, em simultâneo, quase todas as organizações desportivas.

A partir de um determinado nível de responsabilidade, existe uma grande falta de pessoas com interesse, disponibilidade e capacidade adequados para o exercício das respectivas funções e disso se ressentem todas as organizações desportivas. Isto deve-se, fundamentalmente, à dificuldade em abandonar ou interromper temporariamente uma carreira ou vida profissional, com todas as desvantagens que tal opção acarreta, designadamente de impossibilidade de progressão em carreiras e de vencimentos compatíveis com a responsabilidade. A oferta inclui quase exclusivamente funcionários públicos e reformados e, no caso da Administração Pública, de políticos de carreira, o que é manifestamente insuficiente.

É vulgar os dirigentes responsáveis pelas Direcções Executivas das organizações estarem demasiado ausentes e pouco ou nada saberem do que se passa no dia-a-dia da actividade. Em muitas organizações do movimento associativo, os dirigentes ou membros dos corpos sociais eleitos primam, pura e simplesmente, pela ausência sistemática, permanecendo alheados da realidade.
Perante esta constatação, verifica-se frequentemente que o quadro intermédio, técnico profissional requisitado ou contratado, não dirigente, sabe mais ou muito mais da organização que aquele que tem as responsabilidades executivas, gerando-se assim uma situação paradoxal, extremamente nociva, de desequilíbrio organizacional e gestão deficiente, embora perfeitamente legítima.

Como ultrapassar esta situação?

Julgo que a solução estará na progressiva profissionalização do dirigismo, através da criação de uma carreira de dirigente diplomado, em que uma determinada formação inicial fosse obrigatória para o desempenho de determinados lugares de maior responsabilidade, tal como se fez para os Directores de Escolas Públicas. Quando eleitos, não seriam penalizados (como eu fui) na carreira profissional da respectiva proveniência. Transitoriamente, dirigentes com 4 anos de experiência teriam equivalência à formação inicial. Para evitar eternizações no poder executivo, seria importante manter por um lado a eleição periódica dos corpos sociais por 4 anos e por outro limitar a duração de todos os mandatos executivos a 8 anos, para haver uma rotatividade/ renovação que só pode trazer vantagens.
Não sendo pessoalmente adepto de legislação ou regulamentação excessiva (intromissão) do Estado no movimento associativo (embora ela exista actualmente na Lei), deixaria esta sugestão para todos quantos a achassem conveniente em cada organismo desportivo.

Gostaria de ver esta ideia debatida neste espaço, apenas como ponto de partida para outras ideias ou soluções e/ou aperfeiçoamento desta.

A qualidade do dirigismo é um dos grandes problemas do Desporto nacional.

11 comentários:

Anónimo disse...

Esta sugestão é fantásticCertamente que será entusiásticamente adoptada pelos mais diversos organismos desportivos!!

A ideia é tão boa que se vai impôr por si própria! É deste tipo de ideias práticas que precisamos, não da maléfica intervenção do Estado (que horror!....).

Anónimo disse...

E qual poderia ser essa formação inicial? O ensino básico? O secundário? Um curso específico? Dado por quem? Com que conteúdos? Seria cada federação desportiva a estabelecer essa formação mínima inicial? Ou a federação de natação, por exemplo, estabeleceria qual seria a formação para a federação de atletismo? Como é que isto poderia ser feito sem intromissão do Estado (a evitar a todo o custo)?!

Acho que esta ideia tem muitas pernas para andar. Fundamental aquela sugestão de um regime transitório que dispensasse à partida a necessidade de formação para quem já exerceu cargos dirigentes pelo mínimo de 4 anos...

Anónimo disse...

Não percebo a queixa do Luís Leite.
Se as federações trabalham, o que trabalham, e recebem os financiamentos que esperam, para que serve a formação? O anónimo não gostou porque assim não pode ser ele a propor o mesmo e a promover-se junto do secretário do estádio.

Anónimo disse...

Que anónimo é que não gostou?! Que herege foi esse?!

Por mim - e só falo por mim - adorei!

Tanto mais que a ideia é fabulosa. Só não percebi se continuariam a haver eleições ou se a "coisa" se passava a resolver por concursos.

Em todo o caso, a ideia da criação de uma carreira de dirigente diplomado é muito interessante. Até já estou a ver as categorias: dirigente desportivo estagiário; dirigente desportivo de 2ª; dirigente desportivo de 1ª; dirigente desportivo assessor. E, para o ingresso, nada de "licenciaturas de aviário", que alguns designam por "licenciaturas de Bolonha". Antes da defesa da "tese", teria que haver uma prova nacional de ditado, redacção e aritmética. Meu Deus: que razia não seria. A não ser que a progressão se fizesse por "tempo de serviço" - o que "oferece" muito mais garantias....

Penso que há um sistema muito semelhante a este no Butão. E com óptimos resultados.

Notável!!!!!

Anónimo disse...

Como diz o Povo:

"Se queres ver o Vilão mete-lhe o pau na mão".E o vilão é o Estado...sempre o foi!!!

Anónimo disse...

O Estado não é um vilão. É um vilãozão. Por isso, deviam ser as federações a "legislar". E o Estado tinha que cumprir, que para isso é que nós lhe pagamos.

Anónimo disse...

O diálogo entre a inocência e as máscaras do provocador.
Votem Sócrates.

Anónimo disse...

Ó meus Caros Colegas Anónimos, sinceramente não havia nexexidade de malhar no LL...
Então o homem esforçou-se tanto para tirar uma tese para a resolução do "dirigismo", onde ele já esteve, devia de ter queimado as pestanas com leituras avançadas de gestão e recursos humanos, quiçá correspondeu-se com o Drucker e o Mourinho e vocês, simples anónimos, aqui a gozarem a tese ???? Para mim a crise portuguesa seria apenas resolvida com o LL em 1.º Ministro !!
Penso eu de que.......

Luís Leite disse...

Lamento o nível rasteiro da (in)capacidade argumentativa, protegida, como sempre, pelo anonimato servilista.

Anónimo disse...

Um crítico avalia-se pela capacidade de propor soluções alternativas. Quem apenas critica, e nada propõe, não merece crédito algum; quem é apenas partidário da acção, e não tem capacidade crítica, age por agir, sem reflexão.

Luís Leite alia uma grande finura da análise à capacidade de formular propostas concretas para as grandes reformas de que carece o Desporto nacional.

De alguma forma se pode dizer que as propostas que faz são o contraponto exacto das críticas que formula: ambas, de altíssima qualidade.

Chamo a atenção para a sua capacidade de diagnóstico: a frase lapidar de que "a qualidade do dirigismo é um dos grandes problemas do Desporto nacional", é bem demonstrativa do estudo, da reflexão, do carinho que dedica à "coisa desportiva". E da sua grande experiência, nacional e internacional, também.

Por isso, quero participar neste debate, com o objectivo de não deixar cair em saco roto as proposta capazes de salvar o País.

Daí, a minha sugestão: porque não alargar esta ideia "aos políticos", antes de começarem a sua "carreira"? Não deveriam, eles também, fazer um curso? Não deveria esta "carreira" ser privilégio de diplomados com um curso formativo inicial (que, por exemplo, compreendesse obrigatoriamente o Código Penal)?!

Espero contributos igualmente valiosos.

Future15 disse...

O grande problema do país reside no facto de os nossos políticos e decisores, ocuparem muito do seu tempo em jogos de poderes, deixando para segundo plano os interesses nacionais.

Querem melhor que o caso Queirós para justificar esta minha opinião.

Será que algum dia vamos enfrentar os problemas graves do país e consequentemente do desporto nacional?

O Contexto economico-financeiro actual está a matar o associativismo desportivo, base do desporto em Portugal, algum político ou decisor fala nisto?

Concordo com o debate sobre a ideia do professor Meirim, mas se já não houver associativismo desportivo, para quê formar dirigentes associativos?