quinta-feira, 31 de julho de 2008

Tudo bem no reino

1.O incómodo causado com o que a televisão publica gastou para ter o exclusivo das transmissões televisivas do futebol é bem menor que o ocorrido perante os contornos do negócio. Comprou não a quem detém os direitos do espectáculo, a Liga Profissional, mas ao intermediário, a Oliverdesportos, que previamente os comprou à Liga. Nada que incomode a autoridade reguladora da concorrência.

2.A Federação Portuguesa de Basquetebol anuncia, para quem quer ouvir, a obrigatoriedade de uma presença mínima de jogadores portugueses nas competições da Liga e da Proliga. Compreende-se o alcance da medida. Mas desconfia-se da sua conformidade legal. A ser aceite pelas autoridades portugueses esta “norma” instituirá una espécie de nova “jurisprudência desportiva por via federativa” em matéria de desigualdade de direitos aos não- nacionais abrangidos por legislação comunitária e afim

3.A entidade organizadora da Volta a Portugal a Bicicleta, que por sua vez também é patrocinadora de uma equipa que participa na competição que a própria organiza, rejeitou a inscrição na competição de uma equipa com problemas que envolvem dopagem. Mas prepara-se para aceitar uma outra que, com problemas idênticos, mudou de nome. Nada que pareça preocupar as autoridades desportivas ou políticas.

4.A equipa nacional búlgara de halterofilismo estava toda dopada. O respectivo Comité Olímpico decidiu que o país não estará representado nos Jogos Olímpicos. Novidade não é o estar dopada. Novidade é os resultados serem positivos. O que durante muito tempo não foi necessariamente coincidente.

5.Segundo a imprensa o COI terá aceite limitações impostas pelas autoridades chineses no livre acesso dos jornalistas a alguns sítios da internet, entre os quais o da Amnistia Internacional. Esta cedência sobre actos censórios não é nada que pareça incomodar os dirigentes olímpicos. É longa a tradição da adaptabilidade da carta olímpica à”realpolitik”.Mas ou muito me engano ou o tiro vai sair pela culatra. Estas coisas são como as massagens na praia, na versão vanguardista do homem da capitania do Algarve:sabemos como começam ,mas nunca sabemos como acabam.Voilá!


segunda-feira, 28 de julho de 2008

Sinais dos tempos

Não sendo a minha formação jurídica, considero que o estudo e o conhecimento da Administração Pública em Portugal, é, em diversas áreas do saber, fortemente amputado quando se ignora o labor do Prof. Freitas do Amaral em torno da ciência da Administração.

De matriz naturalmente jurídica, muitos dos seus trabalhos problematizam a estrutura e dinâmica da moderna Administração face a um conjunto de desafios políticos, gestionários, económicos, culturais e sociais, enquadrados numa rigorosa análise histórica, com uma abordagem clara e de fácil leitura mesmo para não juristas. Disso é exemplo a sua notável última lição recentemente publicada.

Considerado pelos seus pares como a maior referência viva do Direito Administrativo é conhecido o rigor de fundamentação, clareza e profundidade de análise que aplica nos seus trabalhos.

Deste modo, não se esperava diferente abordagem no parecer que a Federação Portuguesa de Futebol lhe solicitou a propósito da validade jurídica dos actos ocorridos na propalada reunião de 4 de Julho do Conselho de Justiça daquela entidade.

O parecer publicado no sítio da internet da FPF, e apresentado na data previamente estipulada, poderá, naturalmente, ser criticado e discutido das mais diversas formas e ângulos de análise. Como qualquer ser humano as posições de Freitas do Amaral não são inatacáveis e é bom que o não sejam, só assim se consolida o conhecimento.

Seria de todo positivo para o futebol, neste entendimento, uma ampla discussão e debate sobre as conclusões apresentadas no referido parecer. Tal, infelizmente, pouco aconteceu até agora.

Se nos vamos habituando à ligeireza de comentários de dirigentes desportivos sobre estas matérias, nomeadamente quando as posições expressas não lhe são convenientes, não se compreende a leviandade e displicência com que diversos “comentaristas”, com formação jurídica e um passado importante em entidades desportivas, se pronunciam sobre o parecer agora apresentado.

Ao invés de se sustentarem fundamentos sólidos que rebatam a tese defendida pelo maior administrativista do país - com décadas de trabalho académico e político sobre a Administração -, corta-se o mal pela raiz jogando mão dos estafados expedientes em torno de favores políticos, falta de independência, desconhecimento do “mundo do futebol”. Chegando ao caricato de serem até invocados por supostos “especialistas” na matéria.

Ora, esta imagem é um retrato impressivo daquilo que quotidianamente se assiste quando se procura introduzir na governação desportiva argumentos técnicos e científicos. A autofagia do status quo rapidamente os digere.

Deseja-se - ou melhor, desejava-se - que a FPF e os responsáveis políticos deste país afinem por outro diapasão e façam aquilo para o qual foram eleitos e os cidadãos deles esperam, ou deviam esperar. Garantir o estrito cumprimento da lei.

sábado, 26 de julho de 2008

A alta competição sem seguro


“O actual quadro jurídico do seguro do praticante desportivo de alta competição/ alto rendimento consta do artigo 34º do Decreto-Lei nº 125/95, de 31 de Maio, do Decreto-Lei nº 146/93, de 26 de Abril, dos nºs 1º e 3º a 7º da Portaria nº 757/93, de 26 de Agosto, e da Portaria nº 392/98, de 11 de Julho”.
“No quadro definido na conclusão 1ª, afigura-se não existir obstáculo legal à contratação, por parte da Administração Pública desportiva, do seguro desportivo especial do praticante desportivo não profissional de alta competição/alto rendimento, a que se referem o artigo 8º do Decreto-lei nº 146/93, o artigo 34º do Decreto-Lei nº 125/95 e as Portarias nºs 757/93 e 392/98”.

Transcrevemos a 1ª e a 5ª conclusões do parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, emitido no final de Maio, a solicitação do Secretário de Estado da Juventude e do Desporto.
Abreviando, significam que o Estado pode (podia) /deve (devia) celebrar um seguro “garantindo o pagamento de um capital em caso de ramo vida, decorridos que sejam 12 anos, e desde que o praticante se mantenha ligado à alta competição durante esse período, bem como a antecipação do pagamento do capital em caso de invalidez permanente total.”

Em Abril deste ano, Laurentino Dias afirmava à Lusa: "Até Maio, receberemos um parecer da PGR sobre um conjunto de assuntos que têm a ver com seguros desportivos e a legislação sobre a sua aplicação. Só a partir de então decidiremos cada caso". "A legislação sobre esta matéria é de interpretação difícil, pelo que para evitar deferir ou indeferir os vários processos em causa de uma forma menos ajustada, foi pedido este parecer".
Aditou: Laurentino Dias pediu um "tempo curto" para resolver o problema: "Aconselho calma, pois para tomarmos decisões e apreciarmos os dossiers não precisamos ser pressionados. Sabem que vamos tomar uma decisão. Fazemo-lo por razões de obrigação pública".

E agora, em finais de Julho, quase dois meses após a pronúncia do parecer, que decisão foi tomada?
Porque razão o parecer não se encontra homologado e publicado no Diário da República, para valer como interpretação obrigatória para o IDP?
Já não «obrigação pública» a cumprir?

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Política à portuguesa

A política à portuguesa dá muitas voltas. Mas num número significativo de casos acaba nos mesmos sítios,com os mesmos valores e com as mesmas práticas. Mesmo quando os protagonistas são de partidos diferentes.E há comportamentos que valem por mil doutrinas. Aparentemente, pouco significantes. Mas se os avaliarmos com atenção revelam-nos muito da atitude e dos valores perante o exercício e as missões de serviço público. E não há reformas ou mudanças de governo que os alterem. Como agora se diz, são “transversais”. Mais do que transversais tendem a perenizar-se. Sem qualquer sobressalto cívico. A embriaguês do poder cega. E o silêncio sobre eles ajuda. O pudor e receio em os abordar publicamente são um aliado para a sua continuidade. E no entanto, não sendo “ilegais”, minam a credibilidade do serviço público.
Um dos momentos “politicamente” mais delicados em matéria de “governação desportiva”é a final da Taça de Portugal em futebol. Que se agrava quando um dos finalistas é um “grande” da capital. Quando são os dois é um verdadeiro “tsunami” de contactos e de movimentações. Tinha sobre o assunto alguns “zunzuns”.Mas estava longe de imaginar a dimensão do problema. Conheci-o de perto. Refiro-me ao número de pedidos de bilhetes gratuitos para ir ao Jamor. Do gabinete do senhor ministro X, ao senhor deputado Y, ao assessor do senhor secretário de Estado Z, do chefe de gabinete ao adjunto,ao motorista, para o filho ou para a namorada do filho, toda a gente se acha com o direito de ir ao futebol e não pagar. Direito natural ou divino não sei. Sei, isso sim, que chegam a ser às centenas os pedidos de borlas. A extensão deste problema vai ao ponto de se pedir bilhetes para os familiares e fazer cenas caricatas como as de um ministro, devoto a Deus e aos princípios, que exigia bilhete para ele, para a filha e para o genro. Muito do país - da cunha ,da pedinchice,do favor, do arranjinho - está aqui e vale por mil teses sobre os portugueses. Não distingue títulos, posições ou graus académicos. Igual apreciação se pode fazer quanto às despesas públicas com viagens da “nomenclatura”da administração pública e afins para assistir aos jogos de futebol no estrangeiro. O mundial de 2006 em plena campanha de redução de gastos públicos ultrapassou tudo e sem qualquer laivo de escândalo: os bilhetes, as viagens, o alojamento e as ajudas de custo pagos com o dinheiro dos contribuintes. O mesmo ocorre com as delegações de funcionários públicos e equivalentes para “irem passear “aos Jogos Olímpicos”ou aos “jogos da Lusofonia” . Ou com as reservas de hotel para governantes e “acompanhantes”. Imagino as dificuldades que devem passar os dirigentes do COP a propósito dos pedidos para “ir aos Jogos” que se transformaram, como nos caso relatados, num verdadeiro festim de gastos públicos em turismo desportivo. Não estão em causa as representações institucionais e governamentais. Se forem exercidas. Não é caso virgem que delegações oficiais para competições desportivas pouco apareçam nas competições e dediquem o tempo ao passeio e ás compras. Mas estão sobretudo em causa quem nada lá vai fazer a não ser passear. Nada tem de errado que vão passear. Mas devem fazê-lo à sua própria custa e não à custa dos dinheiros públicos. Mais do que aquilo que se gasta - inaceitável a qualquer título - é o que revela de ausência de pudor e de reserva em usar funções ou cargos públicos para usufruir de benefícios e de regalias que estão para além das funções exercidas. Moralizar esta situação em nome do interesse público é qualquer coisa que, mais do que uma intervenção superior, deveria pertencer à escala da conduta individual. Como os exemplos superiores são o que são, todos se acham com o mesmo “direito”.Pelo menos a tentar. A dimensão que se atingiu criou uma espécie de “normalidade”em tudo isto. Neste despudor não deixa de ser curioso que alguns dos apóstolos da saga moralizadora sobre as práticas dos dirigentes desportivos - não vá terem bebido alguma cerveja ou gin e colocado nas despesas da federação – sejam eles próprios contumazes em práticas que condenam nos outros .Com estes servidores do Estado, não é de admirar o estado da nação. São “peanuts” comparando com o que por aí se passa em matéria de mau gasto de dinheiros públicos em uso e benefício pessoal.. Mas o que está em causa não é o valor, é o princípio! Bem sei que nada disto é novidade. Mas, de quando em quando, convém recordá-lo.

sábado, 19 de julho de 2008

Opções multi-usos

Quem se der ao trabalho de ler um programa de Governo ou quaisquer Grandes Opções do Plano, por certo não encontrará significativas alterações de tom e conteúdo. Aparte algum folclore narrativo, quem lê um, lê todos. Em singelo complemento informativo do texto de José Manuel Constantino, olhe-se as Grandes Opções do Plano para 2009, conforme afirmadas pelo Governo.

Sobre a palavra de ordem Desporto e Qualidade de Vida, numa vintena de linhas, afirma-se que, no seguimento da acção governativa desta legislatura, as realizações no âmbito do desporto incidirão em quatro vectores.
No que se refere à generalização da prática desportiva à população portuguesa, prosseguirá a implementação do Programa Nacional de Desporto para Todos (com o objectivo de aumentar os índices de prática desportiva, reduzindo progressivamente a taxa de sedentarismo da população portuguesa) e a execução do Programa Nacional de Infra-estruturas desportivas.
Por outro lado, no que respeita à modernização e melhoria do desporto português, tendo por finalidade o aumento da Qualidade de Vida e o contributo para a melhoria da Saúde Pública, serão melhorados os cuidados e serviços médico-desportivos, reforçar-se-á a luta contra a dopagem e aumentará a capacidade de respostas do laboratório de Análises e Bioquímica.
Um terceiro segmento da acção governativa, incidirá no domínio do reforço da dimensão internacional do desporto português, onde se continuará a apostar na organização de eventos de repercussão internacional.
Por outro lado, no âmbito do aperfeiçoamento do modelo de financiamento e das formas de apoio ao Movimento Associativo, o objectivo é consolidar a sustentabilidade do financiamento do sistema desportivo português e ao movimento associativo e garantir a assinatura dos Contratos-Programa de apoio ao desenvolvimento Desportivo para 2009.

Por fim, do conjunto de medidas a realizar em 2009, destacam-se a regulamentação da Lei de Bases da Actividade Física e do desporto (Lei nº 5/2007, de 16 de Janeiro) e as medidas de Saúde e Segurança nas Instalações Desportivas, O Primeiro Relvado, Modernização das Federações Desportivas, Mini campos Desportivos, Clubes Históricos, Centros de Alto Rendimento e Modernização e Requalificação do centro Nacional Desportivo do Jamor.

E está tudo dito.
Talvez não, se operarmos um pequeno confronto com o afirmado aquando das Grandes Opções do Plano para 2008.
Nesse documento, começava-se por destacar a obra de 2006-2007: publicação da Lei de Bases, consolidação da sustentabilidade do apoio e do financiamento ao sistema desportivo português (através, por exemplo, da modernização da «Rede Nacional de Infra-estruturas Desportivas»), a criação de infra-estruturas desportivas de proximidade em zonas urbanas com carências de oferta de equipamentos desportivos (concluído o concurso público que permitirá a instalação de 101 minicampos multiusos, destinados à prática informal de diversas modalidades), o início da requalificação e modernização do Complexo Desportivo do Jamor, a «Partida» do Rali Lisboa -Dakar 2007 (tendo sido garantida para Portugal a partida em 2008), o apoio ao «Campeonato Mundial de Classes Olímpicas de Vela 2007», a criação do «Observatório da Condição e da Aptidão Física da população portuguesa» (protocolado com as principais Faculdades da área da «Actividade Física e do Desporto» das Universidades públicas portuguesas, com o objectivo de criar um instrumento permanente de análise, diagnóstico e comparação dos vários indicadores nacionais e internacionais da actividade física e desportiva), a publicação das «Estatísticas do Desporto Federado em Portugal», a inclusão do Desporto Escolar no 1.º Ciclo do Ensino Básico como componente principal e obrigatória na área de enriquecimento curricular e a ratificação da «Convenção Internacional contra a Dopagem do Desporto da UNESCO».

E que tínhamos para 2008?
Em 2008, prosseguirá a implementação do «Programa Nacional de Desporto para Todos» e do «Programa Nacional de Infra-Estruturas Desportivas» e da «Carta dos Equipamentos e Infra-Estruturas Desportivas de Portugal», será implementado o «Observatório da Condição e da Aptidão Física da população portuguesa», apostar -se -á em iniciativas que coloquem o Desporto ao serviço da Saúde Pública (nomeadamente através da melhoria dos cuidados e serviços médico -desportivos e reforçando a capacidade de resposta do «Laboratório de Análises e Bioquímica» e a luta contra a dopagem) consolidar-se-á a sustentabilidade do apoio e do financiamento ao sistema desportivo português, garantindo a assinatura dos «Contratos – Programa de apoio ao Desenvolvimento Desportivo para 2008», com especial relevo para os Paralímpicos e para a participação portuguesa nos Jogos Olímpicos de Pequim 2008.

É muito difícil encontrar repetições de menções desde 2006-20o7 até 2009.

Mais. Independentemente do colorido do Governo, em 2010, continuará ser muito difícil, registar qualquer operação de copy e paste.

quinta-feira, 17 de julho de 2008

Nova corrida,nova viagem

O imaginário induz efeitos de realidade, afirmava Maquiavel. E o imaginário no discurso e a retórica politicas tendem a ser tomados pela própria realidade. O que cria uma espécie de sobre-realidade. Uma realidade discursiva e uma realidade vivida. Fernando Pessoa falava de uma vida pensada e uma vida vivida não necessariamente coincidentes. Tudo isto a propósito de não me recordar de ouvir um ministro ou um secretário de estado do desporto a dizer que o desporto em Portugal não vai no bom caminho. E que “a situação do desporto nacional é a melhor de sempre”no respectivo período de exercício governamental. Excluindo o período de nojo imediatamente a seguir ao início de funções, em que a situação é explicada pela “herança recebida”, rapidamente há uma transfiguração: o que antes se criticara passa a ser motivo de elogio; antigos adversários de “ideias e políticas “ passam a aliados; propostas e projectos anteriormente criticados, recuperados como “modelos”; funcionários de quem se não queria sequer ouvir falar, escolhidos como colaboradores; dirigentes desportivos que era preciso “controlar”, exemplos de dedicação à causa desportiva. Num ápice –que vai do deixar de ser oposição e passar a ser poder - tudo muda ,qual milagre das rosas .Se tudo isto, em parte, explica a relação conflituosa do povo com as suas elites políticas, confesso que não sei. Até porque o mal-estar entre o que se diz e o que se faz é antigo. O que é facto é que existe uma estranha alteração de avaliação, perante as mesmíssimas realidades, consoante se está no governo ou fora dele.
O actual Governo vai chegar a 2009 com os mesmos (ou piores) indicadores que recebeu em 2005.Excepção ao controlo das contas públicas, que é mérito do Governo, tudo o resto está pior: desemprego, crescimento económico, inflação, empobrecimento. Culpa própria em parte, culpa alheia em outra. E não só está pior como a entrada em período eleitoral o vai agravar. Não apenas como resultado dos factores externos. É atitude do próprio governo perante os problemas. A começar pelo modo como os avalia.
O desporto não foge a estes tempos. Não porque tenha resultados piores do que tinha há quatro anos atrás. Acredito até que hajam indicadores quantitativos que melhoraram a situação. A acção governativa não estrangulou nenhum dos factores críticos da ”situação desportiva”e o que prometeu e ainda não fez não aquece, nem arrefece. Nos casos onde não sabe o quer, ou se sabe o que quer, não sabe como o fazer (caso da administração pública desportiva) não conta. Se contasse não seria possível ter chegado ao ponto a que se chegou (administrativo, logístico e financeiro ). Também não introduziu qualquer factor de renovação susceptível de resultados diferentes no curto prazo. Não cumpre os prazos que publicamente anuncia (reforma legislativa, centros de alto rendimento) mas o país desportivo pode bem esperar. Escondidinho, o desporto, tem procurado escapar entre os pingos da crise. E tem-no conseguido relativamente bem. Aparece onde não se molha : nas cerimónias públicas. Das mais simples às mais institucionais.Com mérito. Bem na pose e bem no discurso. O problema é o resto.E os resto por enquanto não se fala. Quem “governa”- como dirigente desportivo ou político – engana-se se julga que vive momentos fáceis. Dificuldades que resultam da complexidade crescente do desporto e seus derivados; dificuldades que resultam dos instrumentos de “ governação desportiva” serem na generalidade dos casos oriundos de um tempo desportivo e político que já não existe; mas dificuldade maior porque assentam no facto de nas sociedades democráticas o desenvolvimento do desporto e a sua governação se fazer a partir de múltiplos centros o que torna inviável uma lógica de vértice ou comando único, como outrora o era a partir do Estado. Vale isto por dizer que não basta ao Estado “pensar e agir bem “ em matéria de política desportiva. Torna-se necessário que todos os restantes subsistemas ajam no mesmo sentido e direcção sob pena do efeito e o alcance das políticas ficar prejudicado. E o que é válido para o Estado é-o igualmente para os diferentes actores e protagonistas desportivos.
O discurso “de nunca o desporto português viveu um momento de tanta qualidade “ é recorrente a anteriores governações. Como o é por parte de outros agentes e protagonistas desportivos. Vale o que vale. Não atrasa, nem adianta. E por muito limitada que seja essa avaliação – ela refere-se tão só à prática desportiva de âmbito internacional - a sua simples enunciação, nos termos em que é feita, revela não o estado actual da arte, mas a qualidade dos nossos “artistas”.Confundem o efémero (as vitórias desportivas) com o permanente ( a vida desportiva da comunidade).Correm o risco, por este andar, de vir ainda a confundir a obra-prima do mestre com a prima do mestre-de-obras.
O situacionismo vigente é um filho dos tempos actuais. Aquece e conforta quem governa. E não incomoda, ao ponto de obrigar a ter uma opinião, quem um dia
aspira a ser governo. Será quebrado quando os períodos eleitorais reclamarem alguma coisa. A história é conhecida. Até lá continuará triste e cinzento. E o silêncio reinante não é porque se vai cantar o fado. É porque este é o nosso fado. Nunca a forma foi tão idêntica ao conteúdo. E quando assim é só nos resta aguardar por uma nova corrida e uma nova viagem. Como nos carrosséis. Sempre iguais. Apenas diferentes no tempo que duram. E no animador.

segunda-feira, 14 de julho de 2008

Os amigos franceses

O discurso do presidente Sarkozy no passado dia 10 na apresentação ao Parlamento Europeu das prioridades da presidência francesa da União Europeia é portador de uma clara mensagem no que respeita à regulação do desporto.

Nas suas palavras sobre o desporto (aprox. aos 30:00 do discurso): “Eu gostava que houvesse uma excepção desportiva europeia similar à excepção cultural” e acrescenta que “o desporto não ‘obedece’ simplesmente as regras da economia de mercado”.

A primeira das prioridades da presidência francesa em matéria de desporto prende-se com a procura de um acordo que procure ter em conta a especial natureza da formação de jovens atletas, de modo a proteger a formação de menores às regras de concorrência do mercado interno.

Neste sentido, na reunião informal dos ministros dos assuntos europeus realizada neste fim de semana à margem do Festival Internacional Marítimo de Brest, este foi um tema premente na discussão sobre o futuro da governação e regulação europeia do desporto, tendo contado com a presença de Michel Platini, portador de uma mensagem das principais federações desportivas europeias sobre o reconhecimento da autonomia, da independência e do papel central das federações desportivas na regulação das suas modalidades.

Esta mensagem que Platini tem vindo a “acenar” junto das diversas instituições europeias após a publicação do Livro Branco sobre o Desporto, à qual se veio juntar o memorando franco-holandês sobre o desporto (curiosamente os dois paises onde o referendo constitucional viria a conhecer a derrota), visa clarificar o estatuto jurídico do desporto na aplicação das normas comunitárias, em especial nas normas sobre concorrência, onde a competência da Comissão é ampla e se sobrepõe às normas internas dos Estados-Membros.

O caso Meca-Medina foi a primeira intervenção do Tribunal de Justiça das Comunidades em matéria de aplicação das normas de concorrência ao desporto e adopta uma abordagem “caso a caso”, marcando, na opinião de diversos autores, o fim da “excepção desportiva”. Esta abordagem veio a ser proposta e acolhida no Livro Branco sobre o Desporto.

Das três grandes funções do Estado - estabilização macroeconómica, redistribuição e regulação – a estrutura governativa da UE tem vindo a ser moldada para desempenhar uma papel preponderante nesta ultima, na qual a Comissão assume um lugar estratégico no equilíbrio dos mercados.

Ora, o mercado desportivo, como outros, assume características que o distinguem. A protecção dos jovens praticantes aos mecanismos tradicionais de mercado e a salvaguarda da formação nos clubes desportivos é certamente uma dessas características que importa acautelar.

Resta saber a metodologia a implementar para garantir a tão reclamada segurança jurídica pelo movimento desportivo. Uma excepção em bloco do desporto às normas de concorrência? Ou uma análise ‘caso a caso’? Curioso não haver muitas vozes a propor uma outra hipótese, talvez aquela que normalmente maiores garantias oferece em termos de segurança jurídica na UE. A atribuição ao desporto do estatuto de serviço de interesse geral. Como é bom de ver as exigências de avaliação, prestação de contas, escrutínio por autoridades independentes e diversidade de mecanismos de recurso aos tribunais, não é um caminho muito apelativo.

No memorando acima mencionado é referido que “uma abordagem ‘caso a caso’ é uma resposta inadequada à necessidade premente de oferecer uma segurança legal ex-ante às federações desportivas”. E exorta a Comissão a "promover a clarificação das federações desportivas, por exemplo pela criação de excepções por categoria, ou definindo regras genéricas e guias de referência. É neste sentido que a França e a Holanda convidam a Comissão a clarificar o estatuto do desporto no direito comunitário num certo número de pontos".

É também nesta linha que devem ser entendidas as palavras de Sarkozy e as expectativas de Platini sobre a presidência francesa à saída de Brest: “For the first time we feel as if we have not only been listened to but also, and in particular, that we have been understood."

sábado, 12 de julho de 2008

Ups! As infra-estruturas desportivas

Os estatutos do Instituto do Desporto de Portugal (IDP) foram aprovados pela Portaria n.º 662-L/2007, de 31 de Maio. Têm, pois, pouco mais de um ano de vida.

Nessa altura recebemos, a esse propósito, algumas mensagens críticas quanto ao seu conteúdo, uma das quais se intitulava “A grande mixórdia”. Entre outros aspectos, a indignação dirigia-se à diminuta dignidade conferida às competências do IDP no domínio – vastíssimo – das infra-estruturas desportivas. Acrescia que, tal domínio, há muito tempo se encontrava consolidado no desenho orgânico da principal referência da Administração Pública na área do desporto.

Tal matéria – uma das nucleares em qualquer política desportiva – surgiu, nos estatutos, como o “parente pobre” de um Departamento de Recursos Humanos, Financeiros e Patrimoniais – algures neste último segmento –, estrutura mais virada para o interior do IDP do que para a realidade desportiva nacional.

No passado dia 4 de Julho, o Diário da República publicou a Portaria nº 573/2008 que no seu artigo 1º vem alterar alguns preceitos do Estatuto, surgindo, agora, um Departamento de Gestão de Infra-estruturas Desportivas.

Justificação, nas palavras da sua nota preambular: “a experiência entretanto colhida demonstrou que a estrutura interna dos serviços centrais carece, ainda, de pequenos ajustamentos que visam garantir uma melhor adequação desta estrutura à prossecução da missão e atribuições do IDP, I.P.”

Destaques deste breve discurso: “experiência entretanto colhida”, “carências”, "ainda" e “pequenos ajustamentos”.

Não se fique por aqui, na leitura dos “serviços prestados pelo legislador” naquilo que diz respeito ao IDP.
Aproveite-se a oportunidade destes “pequenos ajustamentos”, para relembrar o que se passou com aquilo que poderíamos denominar por “Saga do estatuto dos dirigentes do IDP”.

O Decreto-Lei n.º 169/2007, de 3 de Maio (que veio reestruturar o Instituto do Desporto de Portugal), dispõe no seu artigo 9º sobre o estatuto do pessoal dirigente, estabelecendo que aos dirigentes do IDP, I. P., é aplicável o regime definido na lei quadro dos institutos públicos e, subsidiariamente, o fixado no Estatuto do Pessoal Dirigente da Administração Pública.

Contudo, não foi fácil, ao legislador, chegar a esta redacção.

Ela resulta da Declaração de Rectificação nº 61/2007, publicada no Diário da República, 1ª série, nº 125, de 2 de Julho, pois, segundo o seu texto, o Decreto-Lei nº 169/2007, “cujo original se encontra arquivado no Centro Jurídico [da Presidência do Conselho de Ministros], saiu com a seguinte inexactidão que assim se rectifica”.

A redacção primeiramente publicada no DRE referia-se ao estatuto dos membros do conselho directivo e estabelecia que lhes era aplicável o regime definido na lei quadro dos institutos públicos e, subsidiariamente, o fixado no Estatuto do Gestor Público.
De boa fé, até podemos admitir que, de facto, se trata aqui somente de erro formal. Alguém, mirando o DRE, veio depois a confrontar o artigo 9º com o referido original depositado no Centro Jurídico.

Todavia, sucede que entre estes dois momentos – o da redacção original no DRE e o da citada rectificação –, tivemos uma primeira rectificação (Declaração de Rectificação nº 55/2007, publicada no Diário da República, 1ª série, nº 114, de 15 de Junho).
Também aqui alguém levou a cabo o confronto anteriormente referido e concluiu que havia uma «inexactidão».
Na realidade, o que verdadeiramente constava do original, sendo embora relativo ao estatuto dos membros do conselho directivo, afirmava (?) que a esses titulares “é aplicável o regime definido na lei quadro dos institutos públicos e, subsidiariamente, o fixado no Estatuto do Pessoal Dirigente da Administração Pública”.

Perante este suceder de normas materialmente diferentes, como é que alguém pode falar em rectificações de erros meramente formais?
Como é difícil escrever algo, em forma de lei, sobre o IDP.

quinta-feira, 10 de julho de 2008

Nadar para fora e contra a corrente

Declaração prévia: o que se está passar com o futebol e respectivos órgãos dirigentes é suficientemente grave para merecer a censura e reprovação públicas. O governo tem a obrigação de avaliar a natureza das ocorrências e adoptar os procedimentos previstos no ordenamento jurídico de modo a salvaguardar os interesses e as competências públicas delegadas na FPF. Dito isto é preciso nadar para fora. Para fora do futebol e para fora do desporto.E contra a corrente. Para não cair no”meiinho”para onde a hierarquização mediático/social nos quer empurrar.
Nestes tempos conturbados do futebol luso ocorre-me com frequência o velho princípio de que o desporto é um reflexo da sociedade. Escrevi intencionalmente desporto porque o que se passa com o futebol só é diferente na escala, na dimensão e na visibilidade. Tudo o resto se pode passar em outras modalidades. Basta que deixem de ter pouco de desporto e façam o “up-grade”: muito de “produto”, ”negócio “,”espectáculo”,”indústria”e vocábulos equivalentes. E que passem a ter um escrutínio e interesse públicos como tem o futebol. Dito isto vale a pena acrescentar algo mais: o que se passa com o futebol em nada é substancialmente diferente, a não ser para os distraídos, do que por aí anda no resto do país. Se fosse possível fazer um ranking da “gravidade dos factos” o futebol perderia. E dou por mim não a defender o futebol, mas a criticar aqueles que não querem olhar para o país para além do futebol. É que os dirigentes do futebol não são nem mais sérios, nem mais incompetentes que os seus homólogos de outros sectores da sociedade. Respiguemos factos recentes. O que dizer do evidente desequilíbrio comunicacional no modo como são tratadas as vicissitudes do Apito Final e da Operação Furacão. As consequências gravosas para o interesse público são precisamente as inversas à atenção mediática concedida. O que se passa com uma e com outra relativamente ao lesar dos interesses do país não tem comparação possível. Outro exemplo: as pressões do Major merecem mais atenção que as escutas ilegais feitas por funcionários da PJ. Outro exemplo: as promiscuidades do futebol são tratadas como assuntos de Estado. Os negócios da banca como matéria reservada. Exceptuando a forma, pergunto: em que são diferentes? Outro exemplo: as comissões dos dirigentes nas transferências dos jogadores são práticas condenáveis; nas empresas, públicas e privadas, não são comissões, são “royalties” e é uma prática comum do negócio. Como no futebol: umas vezes às claras ; outras por baixo da mesa. Ou não é verdade? Assinaturas forjadas no futebol. E verdade! E em muitos dos projectos metidos na repartições públicas? As off-shores para o futebol são um modo de lavar dinheiro sujo. Mas as off-shores para a banca são um meio de rentabilizar capitais. Os dirigentes do futebol, uma peste que importa sanear em nome da indústria do espectáculo. Os dirigentes dos grandes grupos económicos e empresariais gente séria que puxa pelo país. Não têm dívidas fiscais? Não pagam serviços ilegítimos? Não manobram nos bastidores das influências? Não arranjam “fruta”para melhor fechar os negócios? Atente-se no modo como recentes investigações sobre aqueles últimos entraram e saíram rapidamente dos jornais de referência. Os exemplos podem multiplicar-se. Perante este descalabro ético que sector da sociedade portuguesa tem autoridade moral para dar lições ao futebol?
Não se trata de branquear ou aligeirar o que se passa no futebol. O que passa com o futebol e com o organismo de justiça é grave. Mas não é de todo diferente do que se passa com o país. De resto é cada vez mais nítido que o direito serve para muitas coisas mas nem sempre para a administração da justiça. No desporto e fora dele.
O que está doente não é futebol. Se fosse só o futebol o problema seria apesar de tudo bem mais fácil de resolver. O problema é outro. É o jogo da bola, é a política, são os interesses instalados -de que se não excluem os operadores de justiça - são as fortunas construídas em poucos anos, são os casinos, são as polícias, são as obras públicas, são as televisões, são as secretas,são os poderes não-eleitos, são as “golden share”, é a banca, é a bolsa, são as “off-shores”.É o país que está doente. E em vez de diagnosticar o que está a ocorrer limitamo-nos a seguir a onda do que mais se fala. A seleccionar sintomatologias em função do que é mediaticamente relevante. A solução vai invariavelmente para o reforço dos meios legais e similares. E para o desporto tudo agora se parece resumir a um novo edifico de magistratura: o Tribunal Arbitral. Será sério, honesto e imune a influências e poderes. Não será deste mas de outro mundo. Terá uma vocação e bênção divinas? Oxalá assim seja. Mas cá para mim há uma pequena coisa bem mais importante de discutir e mais difícil de debelar: o carácter. O carácter das pessoas. A sua formação e honorabilidade. Aquilo de que são ou não capazes de fazer. Os valores e os princípios que norteiam as suas condutas. Não do que apregoam. Nem do que rezam ou juram. Mas do que fazem. Em casa, no emprego, na sociedade. E deixem de pedir ao desporto o que ele por si só não tem capacidade de fazer: o de regenerar a sociedade!

segunda-feira, 7 de julho de 2008

Burlas, Mentiras e Retrocessos

Parece-me generalizado o sentimento e o julgamento de que não temos o desporto, a saúde, a justiça, a economia, entre muitos outros domínios sociais, que gostaríamos de ter. Temos estas realidades ajustadas ou conformadas ao País que somos, dizem uns. Outros indignam-se, revoltam-se e vão tentando remar contra o situacionismo e a infelicidade latente que reina no País.

Também é verdade que o PNUD, apesar dos maus índices apontados para Portugal na Europa, ainda não nos coloca nos países terceiro-mundistas. Contudo, como com os males dos outros posso, ou podemos, nós bem, não me conformo com algumas realidades desportivas miseráveis.

Poderia citar várias delas, com melhores ou piores retratos. Ir-me-ei reportar ao andebol, por razões óbvias. Primeiro, porque a vivi intensamente como uma das suas protagonistas (praticante e treinadora) até aos 30 anos e raramente me desliguei dela devido às relações institucionais e pessoais que tal vivência proporcionou e desenvolveu. Segundo, porque aceitei o convite de ter sido Vice-presidente da Associação de Andebol do Porto no mandato de 2000-2003 e continuei, noutra dimensão, a “vivenciar por dentro” esta modalidade, não tendo persistido nesta função no mandato seguinte porque, sendo eu a favor da limitação dos mandatos nos órgãos sociais, entendi que a direcção em causa já tinha “ultrapassado a sua validade”. Terceiro, porque sou mãe, tia e amiga de crianças e jovens andebolistas e como tal, por obrigação e solidariedade, vou acompanhando o desenrolar dos acontecimentos.

Não sou por conseguinte uma “paraquedista” no andebol, nem uma teórica do mesmo, sou apenas uma mulher que bem jovem se apaixonou por esta modalidade, a par da do voleibol (praticante federada dos 14-18 anos), e ainda acalenta essa paixão apesar das inúmeras contrariedades, injustiças e desatinos percorridos e vividos até à presente data.

Por isso, por mim, não posso deixar passar em claro e sem contestação muitas das situações inacreditáveis que nas últimas 3 décadas se têm passado no andebol luso. Já o fiz em textos anteriores a propósito da falta de estratégia e planeamento no andebol feminino ou do desporto que queremos para as nossas crianças e jovens, assim como na Revista Desporto & Direito, a propósito da "história do desassossego" entre a Liga Portuguesa de Andebol e a respetiva federação.

Volto novamente ao assunto para colocar algumas questões e fazer três considerações sumárias:

1.º Como é possível uma federação desportiva estabelecer contratos de desenvolvimento desportivo com o Estado, auferir deste modo avultadas verbas para fomentar e desenvolver a modalidade e, por exemplo, nos últimos Encontro Nacional de Minis e fase final do Camp. Nacional de Infantis (crianças de 8, 9, 10 11, 12), realizados em Aveiro, a organização destes eventos ter sido mais do que medíocre e com um mínimo investimento federativo e associativo? É inacreditável como se colocam 4 equipas (num total aproximado de 70 crianças e adultos responsáveis) numa mesma sala para algumas apenas adormecerem às 3 da madrugada e outras terem de acordar no dia seguinte às 7h para jogarem às 9h. Nem nos meus primórdios de jogadora e treinadora nem nos finais vivi coisa semelhante. Teria várias narrativas para descrever os dias terríveis destas competições, que deveriam ter sido de festa de fim de época, multidisciplinares, com actividades culturais e sociais e apenas se resumiram a uns quantos jogos da equipa A vs a equipa B para encontrar um campeão. Como está a ser mal conduzida a formação destas crianças, como estão ser enganadas, “burladas”, juntamente com os seus pais e familiares que esperançados na formação integral das suas crianças pagam (inscrições, seguros, estadias…) para verem (os que vêem) os seus filhos a passar mal e a chorarem.

2.º E o que dizer de acções ditas de formação dos agentes desportivos, igualmente alvo de financiamento público, para as quais se “arregimentam” a nível nacional cerca de 1500 dirigentes, treinadores e árbitros, declarando-as obrigatórias para o exercício da actividade em 2008/09, sem o mais pequeno interesse salvo o de propagandear os “feitos” da FAP, e nas quais formandos dormem a sono solto durante a manhã? Chutar a bola em frente e fazer de conta que o passado não nos diz respeito tem sido a política desta FAP. Agora chama-se “Objectivos 2012”, slogans repetidos e gastos, e sob este guarda-chuva metem-se mais de 500 dias de trabalho das várias selecções nacionais e acções de formação como esta, com o argumento de que fazem parte da cada vez maior exigência e profissionalismo que a FAP passará a exigir a todos os agentes da modalidade…

3.º Por fim, e recorrendo às palavras de Baptista-Bastos (vide revista do DN de 5 de Julho, pp.18-22) “ter saudade é ter lastro, história, percurso. Anda por aí muita amnésia e muita ignorância” quem, com passado e até saudade dos bons tempos andebolisticos, consegue sustentar e convencer que os últimos anos têm sido os melhores do andebol português? Só quem já esqueceu ou nunca conheceu feitos como os da selecção nacional masculina em 1976 (campeões mundiais, GrupoC) com uma final estonteante no pavilhão da Ajuda a rebentar pelas costuras e com treinadores portugueses de nome Adelino Moura e Ângelo Pintado. Quem tem memória deve recordar as repercussões de então e a juventude galvanizada com os seus ídolos que fizeram história durante os anos seguintes. No sector feminino quem despreza, as gerações sucessivas que tão dignamente representaram Portugal nos Campeonatos do Mundo (1986, Grupo C. Valência; 1988, Grupo C. Dreux, 1989, Grupo B. Dinamarca, 1990, Grupo C. Itália)? Só quem não tem memória, quem nunca quiz e não quer desenvolver o sector feminino ou então quem não tem orgulho de ser português/a!

Poderia estar mais tranquila com a eleição dos novos corpos sociais da Federação Portuguesa de Andebol, pensando que um ciclo de um quarto de século se encerraria e um nova era recheada de estratégias inovadoras, metodologias vanguardistas e sobretudo renovadas esperanças se avizinhariam para o futuro dos/as nossos/as andebolistas. Contudo, basta consultar a lista vencedora para o ciclo olímpico de 2008-2012 e as linhas orientadoras da Direcção desta instituição para este mandato para que não restem grandes dúvidas de que a máxima “mais do mesmo” se irá aplicar.

A frase de ordem do novo Presidente da FAP e o seu objectivo mor parecem poder ser traduzidos por “fazer do andebol um produto”. Há quantos anos ouço esta frase, vinda de outra personagem? Já perdi a conta, mas recupero a resposta de Baptista-Bastos na entrevista acima mencionada face à questão: que mais o indigna? - “A traição. O delator, seja ele da Direita ou de Esquerda; a indignidade; a ignorância; o pós-modernismo, que tenta destruir os conceitos do humanismo”.

sexta-feira, 4 de julho de 2008

O peso do diálogo

O desporto profissional, e em particular o futebol, é das actividades laborais com maior fluxo de trabalhadores no seio da União Europeia, pelo que não é de estranhar o crescimento de litígios resultantes de conflitos laborais no espaço comunitário.

As relações laborais no mundo do futebol profissional - não só pelas verbas envolvidas em contratos, bem como pelas particularidades inerentes a uma carreira profissional de curta duração – careciam há muito da implementação de um mecanismo de diálogo institucional entre os parceiros sociais a nível europeu.

A constituição do Comité Europeu para o Diálogo Social no sector do futebol profissional, no passado dia 1 em Paris, é uma importante conquista dos atletas, dos clubes e das ligas profissionais à tradicional centralização da discussão das relações laborais no seio das autoridades do futebol.

Mas é fundamentalmente o reconhecimento do futebol profissional como um sector laboral com dimensão política digna de concertação social, uma vez que os acordos resultantes do entendimento entre os parceiros sociais poderão vir a ser acolhidos pelas instituições comunitárias - nomeadamente a Comissão – para futuras iniciativas legislativas.

Ou seja, os jogadores e as ligas profissionais assumem uma autonomia negocial na esfera política comunitária que os coloca, nesta matéria, em pé de igualdade com a autoridade reguladora do futebol europeu, a UEFA, a qual apenas tem estatuto de observador no comité criado, o que abre uma janela de oportunidade para um novo modelo de regulação das relações laborais no futebol europeu, em particular nas relações de emprego e condições de trabalho dos desportistas, como previa a Comissão no Livro Branco sobre o Desporto.

É sabido que a UEFA tem vindo a criar diversos fóruns de diálogo no seu seio entre os representantes de clubes, sindicatos e ligas profissionais, e outras estratégias de sedução de modo a acautelar a sua esfera de influência, a fim de preservar e circunscrever a sua autoridade governativa em assuntos laborais.

Mas se atendermos, apenas e só, ao peso que os parceiros sociais tinham ainda há bem pouco tempo no interior da UEFA, são evidentes as mudanças no que respeita à sua representatividade nas decisões tomadas, com tudo o que isso implica na lógica de governação e organização do mundo do futebol nos Estados Membros. E a isso não é estranha a influência das instituições comunitárias.

quinta-feira, 3 de julho de 2008

Os novos marginais

Sedentário, obeso e fumador tendem a fazer parte da lista de "novos marginais" que assombram o bem-estar colectivo. A obsessão higio-sanitária tende a classificá-los como seres com o risco de morrerem cedo e doentes. O discurso político-sanitário mais "light" e menos sindicado na sua sanha moralizadora não deixa de acompanhar esta criação em busca de um homem novo, isento de “vicios”. Mapear essas "identidades clandestinas" e publicitar muitos estudos “científicos” tem sido a forma privilegiada de apontar caminhos para uma vida mais saudável, caminhos que se estreitam a cada comportamento desviante associado a cada um dos riscos. As tabelas são conhecidas. É uma especie de “nova ordem” de tipo compulsório que torna “não normal” quem se não confina aos padrões sociais e comportamentais préviamente definidos como saudáveis.Nessa topografia moral os sujeitos são posicionados sobre um fio de navalha, mostrados à sociedade como pecadores, mas permanecendo "livres" para fazer opções sobre o tipo de vida que querem levar. Em contrapartida, devem arcar com os custos de uma escolha catalogada cientificamente como de risco e financeiramente pesada para a sociedade.
Estes “desvios” sociais não são discutidos no âmbito das realidades sociais que os determinam e perpetuam. São considerados como equivalentes nas suas “etologias”.E são iguais para urbanos e rurais. Para jovens ou idosos. Para homens e mulheres. Tudo é colocado no âmbito das capacidades volitivas do indivíduo. É-se sedentário, gordo ou fumador porque se quer ou porque não se tem suficiente vontade em mudar. Esta crença instalou-se de tal modo no imaginário social contemporâneo que cada um destes “neo-marginais”tende a sentir-se mal no seu corpo e a assumir uma espécie de vergonha social perante os outros.Para onde quer que nos viremos, lá estão as mensagens a dizer “como devemos ser”. Magros ,activos e não-fumadores. Chovem em catadupa as possibilidades que nos podem programar como “seres limpos” adoptando “um estilo de vida saudável”.Alguns resumem-se a tarefas rotineiras, induzindo a mensagem de que subir sem elevador, regar o jardim ou caminhar de casa para o trabalho faz “bem à saúde” e nos pode retirar da indesejável posição de sedentário ou obeso.Outros apostam no mercado dos “healths clubs” e seus derivados.Outros nas várias “depuralinas” da industria farmacêutica e paramédica. Outros ainda vão mais longe e apostam na capacidade de mobilização, habilidade persuasiva e técnica comunicacional através de promoção de grandes eventos de massas a “mexerem-se”.Uma nova industria do “ser saudável” desenvolveu-se progressivamente e busca clientes.Nada disto é errado em si mesmo.Mas tudo isto pode não passar de uma grande ilusão se entretanto se não alterarem as condições sociais e culturais onde nascem,crescem e se desenvolvem os comportamentos e hábitos classificados como de risco.
O aumento da jornada de trabalho, a par de fenómenos como o desemprego,a pobreza e a concomitante exclusão social são condições geradoras de anomias sociais que com facilidade se “somatizam”.É a dialéctica entre a nossa constituição genética e o meio ambiente, condicionado pelo comportamento que gera a “doença”. Muitas das patologias orgânicas são um derivado de patologias sociais.Bem se pode vender a imagem da jovem urbana elegante e saudável,cheia de vida e saúde que visita o ginásio três vezes por semana e que se alimenta de forma saudável.E que quando é mãe tem tempo e dinheiro suficientes para que as sessões de ginástica post-parto limpem as marcas da procriação que se instalaram no corpo.Mas esta imagem pouco deixa a não ser uma sensação de bem inacessível, à mulher que em Corroios se levanta às seis da manhã para preparar refeições e levar os filhos à escola onde os deixa às oito,apanha os tranportes público para o emprego onde entra às nove,almoça no snack-bar uma sopa e um salgadinho, regressa a casa à seis da tarde,leva ,quando leva, o filho à natação ou à ginástica e vai ainda para a casa cozinhar para o marido e para os filhos e cuidar da lar.E que oito dias após receber o seu salário já está a fazer contas à vida. Estilo de vida activo é-o seguramente .Saudável ,dificilmente!
Os estilos de vida,nele incluindo o tempo de lazer, não estão para além das condições sociais, económicas e culturais.Fazem parte delas.Mudá-los significa também ter de alterar as condições que os sobredeterminam.Se é errado ceder a um mecanismo sociologista que tudo coloca do lado do “social” é também errado ignora-lo e tudo colocar sobre a responsabilidade individual.Este actualizar do tema tem oportunidade num tempo que “globaliza” comportamentos ,cataloga-os e distribui as respectivas honras ou penalizações sociais.Não para que os programas e propostas de activismo físico ou desportivo se não desenvolvam.Mas para que tenhamos a exacta noção das suas limitações.