terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Governabilidade,sustentabilidade e estabilidade


Quando se cria uma norma pública e se determina a sanção pelo seu incumprimento, tem de se avaliar se o efeito decorrente da sanção prevista tem efeitos mais nefastos que o vício que se pretende ver sanado. Não é quando chega o momento da aplicação da sanção, por incumprimento da norma, que se começa a pensar no assunto. E se constata que em vez de um morteiro temos uma bomba atómica. Pior: o que para uns é uma bomba atómica, que se quer evitar utilizar pelos efeitos devastadores que teria, para outros, é uma carga de napalm, cujos efeitos à escala dos atingidos são similares, mas que se não evita aplicar
Quando se altera, baixando, o regime do IVA sobre bens e serviços tem de se admitir que estamos perante um sistema de economia aberta e que a repercussão desse factor na fixação dos preços é livre. Pelo que invocar argumentos de autoridade para impor a respectiva correcção é um absurdo. Pior: retira inclusive valor à bondade e mérito da medida. Porque se faz incidir a atenção pública em que fez ouvidos moucos às alterações ocorridas e se desvaloriza quem levou em consideração essa alteração.
Estes dois factos revelam que o mérito de uma medida não está no seu enunciado, mas nos resultados da sua aplicação. O rendimento mínimo garantido era uma medida que visava reduzir situações de carência social dos desempregados mas a sua aplicação obrigou a sucessivas alterações do regime inicial por desvirtuamento do seu propósito inicial. Quando assim é só há que aprender com a realidade, reconhecer o erro e mudar o que tem de ser mudado.
A afectação de fundos comunitários a infra-estruturas para o alto rendimento foi uma medida positiva. Mas como vão ser mantidas? Estudaram-se os custos? Avaliou-se o impacto nas finanças públicas? Aprendeu-se com erros anteriores de instalações sub-aproveitadas e despesas de manutenção elevadas? Se a resposta for positiva só há que saudar as decisões políticas que estiveram na origem dessas opções. Mas se tudo foi feito sem acautelar o futuro há que reconhecer o erro.
Hoje é fácil criar empresas. Porque se simplificou o modo de o fazer. Mas continua a ser difícil montar negócios. Pela instabilidade legislativa, sobretudo em matéria fiscal, o que impede qualquer previsão de investimento a longo prazo. Pelas mudanças constantes nas taxas de juro. Pela censura ao lucro e ao privado. Coisas quem têm responsabilidades distintas mas que no seu conjunto concorrem para anularem o efeito de uma medida de simplificação legislativa.
Quem governa, quem legisla, quem tem por obrigação fazer cumprir as normas é muitas vezes confrontado com problemas que não imaginou ou que não previu. Ninguém está fora dessa ocorrência. Por vezes por culpa própria. Mas outras porque a própria realidade e os seus actores têm comportamentos imprevisíveis. Quando assim ocorre há que emendar a mão. E reconhecer o engano. Pior é esconder o erro. E colocar o ónus nos outros. Ou imaginar uma pérfida e obscura campanha para desacreditar quem governa.
No desporto e na competição é sempre possível começar a jogar bem e acabar perdendo. Ou a não atingir o resultado que se esperava.Com quem governa passa-se exactamente o mesmo. Muitas vezes, pensa - se muito na governabilidade e pouco na sustentabilidade .E só esta dá estabilidade. Começa-se cheio de gás e acaba-se aos trambolhões e com um indisfarçável nervosismo. Esperando, no íntimo, que o jogo acabe depressa.

sábado, 22 de janeiro de 2011

O despacho superiormente ilegal de Laurentino

No passado dia 20, Laurentino Dias publicitou, no Diário da República, um texto que escreveu. O essencial da sua mensagem é o seguinte: agravar as medidas “sancionatórias”, determinadas noutra peça digna de leitura obrigatória para os alunos de Direito, resultantes da suspensão do estatuto de utilidade pública desportiva à Federação Portuguesa de Futebol, aplicada em 12 de Abril de 2010, por um prazo de um ano.
O despacho de dia 20 é manifestamente ilegal. Expressámos essa opinião, a pergunta da imprensa e, na sua última crónica, no Record, Ricardo Costa, acompanha-nos.
Porquê? Vejamos, de forma sumária.

Dispõe o artigo 21º, nº 4, do seu tão amado regime jurídico das federações desportivas, que ele jura ser o seu parâmetro de legalidade, mas que não cumpre, que o prazo e o âmbito da suspensão são fixados até ao limite de um ano, eventualmente renovável por idêntico período, podendo aquela ser levantada a requerimento da federação desportiva interessada com base no desaparecimento das circunstâncias que constituíram fundamento da suspensão.
Isto é, em 12 de Abril de 2010, mal ou bem, Laurentino Dias, podia fazer várias coisas, mas fez uma: suspendeu, por um ano, com determinadas medidas sancionatórias, o estatuto de utilidade pública desportiva à FPF.
Significa este estado de coisas, com toda a clareza, que o despacho de 12 de Abril só pode ser alterado antes dessa data, por via de requerimento da FPF. No resto, Laurentino Dias encontra-se limitado, autolimitou-se.

Este segundo despacho, por outro lado, nem fixa prazo para a vigência das novas sanções. É a esse respeito indeterminado. Subsistirão até ser “resposta a legalidade da FPF”. Lindo, um despacho manifestamente ilegal, para pôr cobro a ilegalidades.
Eis as suas legais palavras: “O meu despacho é no sentido de, em 2011, enquanto não for reposta a legalidade da FPF no quadro da utilidade pública desportiva, o IDP (Instituto de Desporto de Portugal) não fazer qualquer contrato com a FPF”.
Gilberto Madaíl lamenta “profundamente” a decisão do seu presidente (pelo menos, no Conselho Nacional do Desporto). E por ser assim, e estar em causa, quase 3 milhões de euros, em face da ilegalidade do despacho, vai, desde já recorrer aos Tribunais (esta é a brincar).
e

Alexandre Mestre é um advogado que, a pergunta do Público, não lendo a lei, mas tão só o primeiro despacho, afirmou que este agravar de sanções era legal. Curiosamente, é este advogado que, também no Público, por duas vezes, uma delas em opinião, sustentou a ilegalidade da situação vigente na FPF e do previsto acto eleitoral. Curiosamente, foi este advogado que foi nomeado presidente do Tribunal Arbitral da FPF, que tem precisamente por objecto impedir esse acto eleitoral. Curiosamente, ainda, é um Tribunal Arbitral, em que o presidente reúne, aparentemente, menos qualificações académicas que uns dos vogais, o que não é, todos o sabem, natural. Curiosamente, é este advogado que se encontra inserido em sociedade de advogados que representa – para além de outras situações – o Gil Vicente (Caso Mateus), contra a FPF e a LPFP.
O mundo é feito de curiosidades.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Sporting C. P., um caso que merece ser estudado

Independentemente da preferência do clube, o Sporting C.P. merece ser estudado e analisado ao pormenor, tentando perceber (se possível) o que se passou, passa e passará, até porque pode ser considerado um exemplo de gestão (expectativas? financeira? desportiva?) que pode servir de aprendizagem para que outros não repitam alguns dos seus erros.

O clube é mais do que simplesmente Futebol, mas à imagem do País, não lhe valem as vitórias noutras modalidades como o Futsal, Andebol na Europa, Atletismo e outras modalidades. Os problemas do Futebol são sempre prioritários e nem o bom trabalho desenvolvido na formação acalma os adeptos, pese embora a alteração estratégica de quase despachar muitos dos atletas que eram produtos da Academia esta época desportiva.

JEB foi quase sempre contestado. E atenção porque ganhou as eleições com 90% dos votos e passado alguns dias já era alvo de acusações. Costinha, que em Dezembro de 2009 tinha sido vetado pelo ex-futuro treinador dos verdes que acabou por ir para o Porto, assumiu a pasta do Futebol e, sendo verdade que sem dinheiro é mais difícil, acabou por falhar na gestão das contratações e saídas de jogadores.

Passaram demasiados Directores Desportivos ou do Futebol nos últimos anos. Pedro Barbosa, Sá Pinto, Costinha, etc...Muitos para tão poucos resultados. Diria mesmo que o melhor elemento, quer se goste quer não se goste, que passou nos últimos anos pelo Futebol Profissional do clube foi o agora seleccionador nacional. Ganhou pouco, mas ganhou algo. O clube assumiu uma fixação pelo desequilíbrio e desnorte que de x em x tempo volta ao local do crime e mesmo após as vitórias, há sempre uma temática que faz desalinhar o clube como organização total.


O clube no Futebol terá de assumir as suas forças e fraquezas, e uma delas - sempre na comparação com o Benfica e Porto - é que a capacidade financeira é menor e com isto, exige uma ponderação melhor na política de contratações. E acima de tudo, o que parece que poucos querem admitir publicamente mas o vão fazendo indirectamente, a gestão de expectativas. Das suas próprias expectativas e que são transmitidas para os seus adeptos.

Convém não esquecer que o clube e a sua estrutura do Futebol foi pioneira em Portugal, um exemplo de sucesso na área da formação de jovens, SAD, Academia, exemplos de gestão, exemplos que faziam que os estudantes de Gestão de Desporto gostassem de os estudar, falar e visitar os locais. Com o tempo, foi perdendo capacidade de agregar a sua massa adepta e começa a ser difícil explicar a tão pouca fraca adesão dos adeptos nos jogos em casa (pois fora, se exceptuarmos as claques, poucos acompanham a equipa).

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Um bem perecível

Um comentário anónimo ao texto sobre o aumento do IVA, sem qualquer apreciação ao conteúdo do texto, mimoseava-me com alguns qualificativos. Desde o de fomentar um registo “intelectualmente desonesto”, de criticar por criticar o “homem do leme” e de ter servido a administração pública e não ter obra para apresentar. E de caminho aproveitava para julgar algumas das pessoas que aqui escrevem ou comentam. Sobre mim não há problema. Sobre os outros em texto da minha responsabilidade não. E foi esse facto, e apenas esse, que levou a que o comentário não fosse colocado. Lamento. E aproveito a embalagem.
Um dos modos de matar uma discussão é não falar sobre as ideias mas sobre as pessoas que defendem esta ou aquela ideia. Procurando desqualificar as pessoas para deste modo fragilizar as ideias que defendem. A história está repleta de exemplos. E sobretudo nas ditaduras. Mas num contexto como o que estamos a viver, de penoso fim de ciclo, de degenerescência democrática, de instabilidade e insegurança relativa à continuidade no poder o debate é propício a não estar centrado nas ideias para se transformar numa oposição entre pessoas. A campanha presidencial em curso é, de resto, um fiel e infeliz exemplo.
Nunca aqui se escreveu o que os actores sociais e políticos fazem com as suas vidas. Nem o que das suas vidas é feito á custa do emprego público. Nem o que das suas vidas privadas é conflito de interesses com o serviço público. Apresentam-se ideias, comentam-se decisões, defendem-se teses. Umas vezes bem, outras assim – assim e outras porventura erradas. E depois assina-se. Tudo aqui tem um nome. Porventura apreciamos mais a concordância que a discordância. Mas não é possível estarmos todos de acordo. Resta-nos ser capaz de viver e crescer com opiniões divergentes. E de apreciar as razões dos outros para, se for caso disso, corrigirmos ou mudarmos as nossas.
O estado desportivo em que estamos também se explica, em parte, por aquilo que somos, e pela incapacidade em sermos melhores. No interior de cada democrata habita muitas vezes o espírito despótico. E é sempre possível destruir uma tese, descobrindo no autor, alguém que em tempos andou a roubar figos, não respeitou uma fila, agrediu um animal ou copiou nos bancos da escola. Os exemplos são intencionalmente banais. A artilharia pesada é a mais comum.
A ingenuidade paga-se com juros altos. Afinal a história da humanidade demonstra que o debate de ideias é também um debate entre pessoas. E que esse debate não é apenas sobre o valor das ideias. Mas o que elas podem representar em termos de poder, estatuto, visibilidade, segurança ou até emprego. E por isso, volta e meia, vive-se uma espécie de retrocesso histórico. Parece que andamos para trás. Que certos tipos de conquistas civilizacionais assentam em bases tão frágeis que não são conquistas mas apenas estados situacionais que ao menor abalo podem ser reversíveis. A própria democracia. Que é um bem perecível. Costuma dizer-se que as plantas, tanto podem morrer por agua a mais, como por agua a menos. A liberdade e o sentido de responsabilidade são o oxigénio da democracia. Na dose certa. Ou então corrermos o risco de sossobrar. De forma lenta. Mas passando cada dia que passa com menos vitalidade. Até ficar a forma. Mas desabitada de qualquer conteúdo. É um risco e pode ser evitado. Se, não abdicando das ideias, respeitarmos as pessoas. E sempre assumindo a responsabilidade do que dizemos ou escrevemos. É simples e fácil de o dizer. Bem diferente de o cumprir.

domingo, 16 de janeiro de 2011

Desporto Escolar em Risco!

Em Portugal estão-se a preparar e a tomar decisões que terão um efeito muito perigoso e muito negativo para a saúde e qualidade de vida da nossa população. Desta vez a má notícia vem do Ministério da Educação, com a criação de um Projecto de Despacho sobre a organização do próximo ano lectivo (2011/2012) e que poderá eliminar anos de trabalho no âmbito do Desporto Escolar. Se isto acontecer, ficaremos todos mais pobres e o País longe das boas práticas de desenvolvimento social, económico, educativo e desportivo.

Este Projecto de Despacho tem como objectivo passar as horas de Desporto Escolar da componente lectiva para não lectiva. Como facilmente se compreende, esta decisão vai acabar com a existência de um sem número de equipas, modalidades desportivas e implicará certamente um excedente de Professores de Educação Física e Desporto Escolar no sistema. O que acontecerá a estes Docentes? Só se percebe esta medida, como mais uma de âmbito económico-financeiro, avulsa e como sempre de corte a direito sem pensar nas eventuais consequências!


O Desporto Escolar é a única forma de prática desportiva organizada e de oferta variada que chega a todos os cantos de Portugal. Em muitos locais do interior do País e regiões desfavorecidas é a única oferta possível para além do tradicional Futebol. Mesmo em meios urbanos, os projectos de Desporto Escolar têm sido o formato impulsionador e de aparecimento de equipas de desporto federado em muitas modalidades! Vivo em Braga e contacto com uma série projectos fantásticos que começaram no Desporto Escolar e passaram para o Desporto Federado, a título de exemplo, posso referir o caso de sucesso do Voleibol feminino da Escola de Lamaçães e a relação com o Sporting Clube de Braga. Mas existem centenas e centenas de bons exemplos pelo País fora, onde mais de 150.000 jovens dedicam o seu tempo ao treino e competição desportiva em ambiente escolar! Também as Federações Desportivas deverão ficar preocupadas com esta situação, poderá significar o desaparecimento de milhares de potenciais praticantes para a sua modalidade desportiva.


A UNESCO, organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura, da qual Portugal faz parte e subscreve os seus acordos e princípios, tem insistido no reforço do investimento e atenção a dar à Educação Física e Desporto Escolar enquanto factor fundamental da integração social dos jovens e prevenção contra algumas pragas que afectam a saúde individual e a sociedade em geral. Estamos a falar dos assustadores índices de obesidade na população juvenil e doenças irremediavelmente associadas, assim como, dos problemas associados ao consumo de drogas e actos de violência. Já não basta a ditadura imposta pela sociedade (e de certa forma pela família), aplicando cada vez mais uma vida sedentária às nossas crianças e jovens, agora é o Ministério das Escolas que ajuda à Festa! A nossa juventude vai ficar certamente ainda mais gorda, lenta e preguiçosa!


Por força da actividade profissional que desenvolvo no âmbito do Desporto no Ensino Superior, tenho constatado uma evolução absolutamente fantástica no âmbito da prática desportiva da “massa” dos estudantes que chegam todos os anos à Universidade. São cada vez mais os estudantes que entram na Universidade e que transportam consigo uma experiência e um saber desportivo adquirido na Escola, no Desporto Escolar. Ficarei muito decepcionado com os responsáveis educativos do País se este Projecto de Despacho for aprovado.


O Desporto é sem dúvida um contributo incontornável para a saúde e qualidade de vida das populações. Deveria ser encarado por todos como um verdadeiro direito das crianças e jovens em idade escolar, um espaço (até) decisivo para o aumento dos índices de desenvolvimento humano, mas infelizmente, e aqui em Portugal, está em risco… em risco de acabar!

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Alternativas crediveis

Um dia, para memória do futebol português, alguém se dedicará a escrever sobre o intrincado processo de relacionamento entre o Estado, a máquina fiscal, os jogos sociais e os clubes na regularização das suas dívidas. Até lá vão-se recolhendo contributos em algumas obras que, en passant, abordam o tema, ou em peças jornalísticas.
A ultima das quais, assinada por Paulo Curado e João Ramos de Almeida ontem no Público, faz uma interessante síntese deste tema. O balanço actual no que respeita ao pagamento das dívidas é, segundo a notícia, claramente prejudicial para o Estado:

O Governo aceitou prescindir, desde 2006, de receitas dos jogos da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) para reduzir as dívidas fiscais de clubes de futebol. Essa decisão mata, sem se dar conhecimento público, o acordo fechado em 1999 entre o Estado e os clubes de futebol para usar as receitas do Totobola para pagar as suas dívidas fiscais, conhecido por "totonegócio". Só de 2006 a 2010, os clubes terão recebido 27 milhões de euros, contra 6 milhões caso se aplicasse o acordo

Tal como noutros domínios da vida deste país - alguns bem na ordem do dia -, foram as receitas públicas, neste caso provenientes dos jogos da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, que financiaram o pagamento das dívidas.

Poder-se-à sustentar que as receitas do jogo provinham do justo retorno de um jogo que só existia devido aos nomes dos clubes, o Totobola, apesar de haver jurisprudência da época que não corrobora aqueles que seguem este entendimento. No entanto, o cenário alterou-se em 2006, e desde essa data “as dívidas fiscais do futebol estão a ser pagas através de uma parcela de 0,48 por cento da totalidade dos jogos, transferida para o Instituto do Desporto de Portugal, destinadas - segundo o diploma - para a promoção e desenvolvimento do futebol

Quer isto dizer, a fazer fé nas fontes oficiais que a noticia cita, que dos 0,6% de receita que o diploma consigna (art.º 3.º, n.º4, al. c)) para a “promoção e desenvolvimento do futebol” apenas 0,12% se destina realmente àquele objectivo, algo que, por força da suspensão da UPD à FPF, ficou reduzido a zero.

A vida tem destas coisas e o mesmo Estado que há décadas legisla para impedir que os clubes desportivos participantes em competições de natureza profissional possam beneficiar de comparticipações públicas, encontra-se, desde 2006, a pagar as suas dívidas fiscais com receitas destinadas à promoção e desenvolvimento do futebol através do Instituto do Desporto de Portugal.

Em cima da mesa estão, neste momento, alternativas credíveis de aporte fiscal para o Estado salvar a face neste processo sem comprometer outros interesses legítimos. Oxalá nelas bem reflicta.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Partilhar boas práticas

Ao procurarmos o significado do verbo/acto de partilhar, encontramos exemplos como repartir, dividir algo com alguém, compartilhar, etc.

Foco-me na atitude e comportamento de partilhar algo com alguém. Alguém esse que não conheço e partilho boas práticas, algo que teoricamente me coloca em vantagem em alguns contextos. Mas partilhar o quê? Boas práticas!

Boas práticas? Mas o quê? Responderei: Sim, boas práticas, conteúdos de acções, ferramentas, sabedoria, conhecimentos, soluções. Apostaria que alguns dos pensamentos serão “Mas se são coisas boas e tuas, ao dares…os outros podem copiar!”.

Acredito que algumas culturas, bem próximas de ‘nós’, a partilha faz parte do comportamento diário e de uma definição de bom senso. A partilha de boas práticas. De bons comportamentos. A partilha de acções que potenciem e façam aumentar comportamentos como a empatia, empreendorismo, tolerância, escuta activa, dedicação! Ao partilhar apresentações passa-se mensagens, ideias, acrescenta-se valor. Claro que existe sempre a hipótese (e o receio?) de serem aproveitadas por outros, fazendo-se passar por ideias deles. Claro que sim. É um risco que tem de ser medido e calculado. Quando, o quê e como?

Mas a partilha deve basear-se na ideia que não é (só) o conteúdo do conhecimento que faz a diferença, mas a aplicação do mesmo. Muito mais no processo que apenas o resultado de uma palavra ou acção. A visualização de uma acção feita por quem sabe e por quem acha que sabe tem de ser diferente e precisamos também de um público que saiba diferenciar e queira essa diferença.

Sei que pode ser uma ideia visionária, mas temos de começar por algum lado.
Também sei que podem existir inúmeras razões para o não fazer: experiências passadas, a nossa cultura, colegas que nos rodeiam, etc. Mas acredito que apenas a razão de a partilha de boas práticas fazer parte de uma sociedade melhor é mais do que suficiente para superar qualquer desconfiança. Com o risco calculado do quando, o que se partilha, como, onde, para quem, etc.

Na pergunta se estamos preparados para partilharmos e não sermos prejudicados, responderia com um “Talvez”. Como em tudo, muitos aproveitarão para crescer com ideias dos outros, criticar quem o faz ou copiar.


Em Portugal, na sociedade em geral, do desporto em específico, em alguns dos sectores no desporto, precisa-se urgentemente de crescer em termos qualitativos e nos projectos apresentados e dinamizados. A partilha de ideias com o intuito de melhorar e dinamizar algo...é quase uma obrigação, enquanto não for um comportamento naturalmente...natural.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Em nome da memória

Vitor Alves foi um destacado militar, capitão de Abril, cujos méritos e qualidades cívicas e políticas foram objecto de destaque no momento da sua morte. Mas foi alguém que os profissionais de educação física e desporto devem recordar como o ministro que assinou o diploma (decreto-lei nº675/75) que criou os ISEF’s de Lisboa e Porto e que culminou décadas de luta profissional pelo reconhecimento da formação superior.
A educação física e o desporto nacionais muito devem ao seu determinismo e clarividência num contexto difícil e muitas vezes adverso e onde é de elementar justiça reconhecer o esforço de pessoas como o Eng. Luís Elias Casanovas e de profissionais de educação física como o Alfredo Melo de Carvalho, o José Maria Noronha Feio, o António Paula Brito e o Jorge Crespo, os quais ajudaram a ultrapassar as últimas resistências, e foram bastantes, na altura criadas. Esta é uma parte da história da educação física e do desporto que não está escrita, que vive na memória dos protagonistas ainda vivos. E que importa recordar para que a memória dos tempos não faleça com as pessoas que os viveram
.

domingo, 9 de janeiro de 2011

Governabilidade e eficiência - I

"I know of no safe depository of the ultimate powers of the society but the people themselves; and if we think them not enlightened enough to exercise their control with wholesome discretion, the remedy is not to take it from them, but to inform their discretion by education. This is the true corrective of abuses of constitutional power."
Thomas Jefferson


Governabilidade e eficiência são dois termos na ordem do dia. Parece que no discurso oficial são fundamentos para resposta aos problemas pátrios. Neste respaldo se argumentou a necessidade de reformar o regime jurídico das federações desportivas e outros diplomas basilares do sistema desportivo. Governabilidade e eficiência são a ultima ratio para alterar o sistema eleitoral local numa versão “the winner takes it all”. Não se pense, porém, que se tratam de argumentos exclusivos da esfera pública. A proporcionalidade de votos em função do número de anos de associado ainda hoje vigora nas assembleias de vários dos clubes mais representativos do país.

Não se pretende neste espaço - outros já o fizeram - discutir os méritos e deméritos destas medidas, mas tão-somente, se o leitor tiver a paciência de me acompanhar neste primeiro momento onde o desporto ficará um pouco à margem, ponderar o lugar destes dois fundamentos no valor da governação, para os quais, não há muito tempo, uma dirigente política chegou até a considerar conveniente suspender a democracia por seis meses.

Vive-se um período onde o tempo aniquilou o espaço, o imediato o mediato. Exigem-se decisões céleres e urgentes para a crise que se instalou, mas também para a sobrevivência de qualquer carreira política, num cenário de fin de siècle digno de Lampedusa... Contenção, redução de custos, contracção das despesas, “mais com menos”, redução da burocracia e das rotinas parecem ser o alfa e o ómega das decisões políticas. No entanto, sem a participação e envolvimento cívico o conteúdo das decisões é pobre, perde legitimidade, não tem impacto e qualquer instrumento de cariz estratégico vale zero.

Assim, a transição do governo para a governança joga-se no aparente paradoxo do equilíbrio da eficiência e flexibilidade, com a visão estratégica e integrada, e destas, com o pluralismo, equidade, justiça social e afirmação participativa.

Se a herança centralista e desconfiança mútua entre o Estado e os cidadãos dificulta o envolvimento destes nos processos políticos, acomodando-se à condição de meros beneficiários das políticas. Por outro lado, as políticas sem concepção transversal, a departamentalização institucional e a polarização de interesses particulares e clientelares são, entre outros, obstáculos consideráveis para se justificar um bypass, diluir-se a democracia participativa pela “legitimidade do voto” e optar por outra via de governação - mais célere, mais fácil, mais cómoda - que distorce, amiúde sobre o manto da governabilidade e da eficiência, os fundamentos da administração dos bens públicos.

Uma deriva que se propaga desde logo na forma como se analisa o contexto, estabelecem-se objectivos e se criam mecanismos de cooperação no desenho dos programas públicos, obedecendo a uma lógica eminentemente político-partidária e, apenas em segundo plano, a uma orientação técnica, a qual apenas fundamenta decisões já tomadas, o que, num contexto de fraca participação e pejado de interesses circunscritos, compromete a percepção aprofundada das reais necessidades das pessoas pelo decisor político e o remetem - caso não esteja já sugestionado por outras vias - para projectos individuais, imediatistas, circunstanciais, casuísticos e “chave na mão”, onde o “caminho a desbravar” é mais seguro, confortável e perceptível, na mesma medida em que se acentua o pendor populista, a discricionariedade e a informalidade no exercício do poder, sem preocupações estratégicas ou de sustentabilidade.

Isso impele funcionários e dirigentes públicos a servirem as necessidades de políticos democraticamente eleitos e não as dos cidadãos, que, em última análise, são soberanos. Vêem-se como agentes públicos que se movem em nome de outros, e não como agentes que propiciam as condições através dos quais os outros podem agir. Aí cai por terra a mais bem intencionada das retóricas em torno dos valores da prossecução das virtudes da coisa publica.

O que aqui está em causa não é “apenas” a falta de ponderador de longo prazo, a disfuncionalidade da Administração em relação ao interesse público, a fragilidade de opções políticas mal transmitidas aos seus destinatários - vistos como parte do problema e não da solução - que não estão dispostos a se empenharem e envidarem esforços para com elas se comprometerem e se co-responsabilizarem na construção do seu futuro, ou a falta percepção do impacto e das consequências das escolhas dos decisores que administram as suas tributações. Está em causa, por ironia do destino, a própria eficiência das políticas e do serviço público. Não é a governabilidade, nem a eficiência que estão no centro da governação, mas sim a democracia. Aqueles são meios para esta se desenvolver, sem a qual não fazem sentido. É bom que não haja equívocos. Caso contrário o Estado fica cada vez mais isolado e exangue, a projectar ilusões publicadas em Diário da República.

O que interessa o Estado ser eficiente no fornecimento de serviços, se os serviços não servem as necessidades dos cidadãos, ou não são por eles considerados importantes e prioritários? Qual a eficiência disto? Caricaturando, para fazer “a boa acção diária” e ajudar o “ceguinho” a atravessar a rua e ir ao banco levantar dinheiro, não se pode obrigá-lo se ele não o deseja, e, muito menos, se o banco fica num outro sentido.

Não é preciso grande esforço para na política desportiva de ontem, de hoje e de amanhã se encontrarem gritantes exemplos reais desta caricatura, a nível central, regional ou local. Não é preciso também relembrar, para aqueles que acreditam no primado da racionalidade técnica e da prospectiva, o destino do PROIID ou das Opções Estratégicas para o Desenvolvimento Desportivo Nacional (2003-2013).

Antes de gastar bem é essencial saber onde gastar bem. Antes de saber quanto custa o Estado é essencial saber quanto vale o Estado e informar os cidadãos do valor que recebem face ao que pagam de impostos.

As consequências das opções tomadas neste momento têm efeitos multiplicadores muito mais amplos que tiveram no passado para, sob o argumento da falta de tempo ou da suposta eficiência e governabilidade, teimar-se em retirar a democracia participativa da equação e privilegiar a competitividade à sustentabilidade.

Aliás, olhando para o passado, as respostas aos momentos de crise - chamem-se elas New Deal, Great Society, Relatório Beveridge ou National Performance Review - não foram impostas às pessoas, foram feitas com as pessoas. Não foram património da esquerda ou da direita. Não foram planos mecânicos, mas planos processuais. Muito menos foram respostas imediatas de ajustamento à crise, mas compromissos de longo prazo para criar valor na sociedade.
Ah! E todas elas concebidas ou impulsionadas por um líder e não por um político.

Continua…

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

A falácia dos números

Um texto de Armando Inocentes que a Colectividade agradece.


Em extensa entrevista ao jornal «A Bola» do passado dia 2, ocupando quatro páginas, o Exm.º Sr. Secretário de Estado, Dr. Laurentino Dias, nas páginas 2 e 3 (pre) ocupa-se com o futebol – pois afirma, recorrendo aos títulos, que “era meia dúzia a mandar no futebol de Portugal” e que houve um “comportamento indevido de Queiroz” (será «indevido» sinónimo de «perturbador»?) – para nas páginas 4 e 5 dissertar, entrevistado por Vítor Serpa e João Esteves, sobre o trabalho desenvolvido e sobre o lançamento das bases para o futuro do Desporto.
Nesta segunda parte afirma que há “a a necessidade de trabalhar para que haja mais pessoas a fazer desporto” sem especificar que tipo de desporto: profissional? amador? escolar? de lazer ou de ocupação de tempos livres?... E trabalhar quem? Como? Com quê (ou com que verbas e com que material humano e recursos/material/espaços físicos)?
E mais adiante informa que “há números que resultam de dois trabalhos comparados e idênticos do Eurobarómetro, um de 2004, antes de tomarmos posse, e outro de Dezembro de 2009, que mostram, por exemplo, que Portugal se aproximou claramente da média da União Europeia. O Eurobarómetro diz que em 2004 existiam 34 por cento de portugueses que referiam fazer exercício físico ou praticar desporto; em 2009, esse número aumentou para 45 por cento. É um enorme salto que nos coloca mais próximos da União Europeia”.
Primeiro constatamos que «referir fazer exercício físico ou desporto» não é o mesmo que «realizar exercício físico ou desporto» na realidade. Enunciar o que se faz não significa de facto que se faça... E em relação ao exercício físico não conhecemos a realidade concreta da amostra (sabemos que foram entrevistados 1.031 indivíduos com idade igual ou superior a 15 anos, num universo de 8.080.915 habitantes – como mero exercício, calcule-se a percentagem!) até porque o agricultor que trabalha de sol a sol com a enxada nas mãos também realiza exercício físico...
Mas o que especifica o Eurobarómetro em relação a Portugal são 9% a praticar exercício físico ou desporto regularmente, com alguma regularidade 24% e raramente 11%. Mas repare-se que estas percentagens se referem aos entrevistados e não do total da população do nosso país.
O curioso é que se adicionarmos estas três percentagens obtemos 44% (e não os tais 45%, embora para esta análise 1% nem sequer seja importante, a não ser que 45% seja o complemento dos 55% que declararam nunca praticar – logo, deverá existir aqui 1% de «não respostas»), mas o mais curioso é adicionarmos os 11% daqueles que dizem raramente praticar... para se mostrar o tal enorme salto... a não ser que «raramente» seja um indicador relevante para mostrar esse salto (por acaso eu pratico desporto e raramente salto!).
Considere-se também que a grande maioria dos jovens com 15, 16 e 17 anos devem provavelmente praticar actividade física ou desporto nas suas escolas, mas não sabemos quantos destes foram inquiridos em Portugal – sabemos que o escalão etário é dividido entre os 15 e os 24 anos e que no total da UE 4% pratica na escola ou na universidade.
Mais afirma o Sr. Secretário de Estado que se fez um “enorme investimento na área da actividade física nas escolas, o que terá reflexos a médio prazo” e que “a introdução do desporto no ensino básico representa um esforço do Governo de muitos milhares de euros para que capacitasse milhares de crianças a um primeiro contacto com a actividade física e o desporto. Estimulámos o trabalho que as federações têm feito com o desporto escolar. Há um reforço muito grande de concertação (o autor medita se não será de consertação?) de algumas modalidades com o desporto escolar”.
Se o enorme investimento que se fez se refere às Actividades Extra Curriculares no 1º Ciclo do Ensino Básico, tem razão o Sr. Secretário de Estado, pois as crianças do 1º CEB (embora ainda não em todas as escolas) realizam duas vezes por semana, em tempos de 45 minutos, actividade física e desportiva – à excepção daquelas cujos pais ou encarregados de educação não aderiram às AEC’s. E se contabilizarmos o tempo de organização no início e no fim de cada actividade teremos o tempo útil de «realização do exercício físico ou de desporto» em concreto... a não ser que se considere este um indicador sem relevância. Resta saber até quando será possível pagar os vencimentos destes professores (reflexos a médio prazo?)... Mas que não se ignore que do 1º ao 4º ano de escolaridade sempre constou no programa a «expressão físico-motora» (seria conveniente também um “Portugalbarómetro” para saber com que regularidade nos últimos seis anos os professores do 1º CEB realizaram com os seus alunos esta actividade curricular e não se preocuparam só com a trilogia do ler-escrever-e-contar – mas depois lá aparecem as provas de aferição de Língua Portuguesa e de Matemática e os relatórios do GAVE!).
Em relação ao trabalho que as federações têm feito com o desporto escolar pena é não sabermos que federações e em que modalidades – pois se esse trabalho passa só pela assinatura de um protocolo entre uma federação e o Gabinete Coordenador do Desporto Escolar sem ser implementado no terreno então...
E se “ao longo de 2010 os eventos e organizações atingiram mais de 20 mil pessoas” por que motivo não se especifica que tipo de eventos foram esses e quantos foram – só para fazermos uma simples conta e ficarmos a saber quantas pessoas em média participaram nos mesmos?
Como parece resultar do exposto, não basta apresentar números, é necessário saber a que se referem concretamente e como os apresentar...

P. S. – Uma proposta para se mostrar quantos indivíduos praticam exercício físico e/ou desporto em Portugal será contabilizarmos também a partir dos 7 anos os alunos que participam nas AEC’s no 1º CEB e os que participam nas aulas de Educação Física nos ciclos seguintes, podendo-se adicionar a estes os que simultaneamente participam no desporto escolar. E, já agora, podemos somar aos primeiros aqueles de cujos professores realizam semanalmente a «expressão físico-motora». Aí é que mostraremos ter dado um grande salto!...

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Novo ano,novo IVA

Em 2008 o Governo aprovou a redução do IVA para 5% na aquisição de serviços de tipo desportivo nas instalações desportivas, academias e ginásios.Com ou sem enquadramento técnico. Porque sem enquadramento técnico esse já era o valor praticado. E o homem do leme do nosso desporto explicava o objectivo da medida: facilitar o acesso dos cidadãos às actividades físicas e desportivas. A coisa não era bem assim como aqui demonstramos. Um diploma tecnicamente mal feito permitiu aos serviços do IVA subirem o IVA que era praticado quando as entidades requisitantes (clubes e colectividades) não fossem os directos utilizadores dos serviços ou das instalações. Mas adiante. O comportamento do mercado foi o habitual neste tipo de situações. Houve operadores privados e públicos que baixaram os respectivos tarifários. E outros que aos costumes disseram nada. Integraram a redução do IVA na sua estrutura de receitas. E os utentes em nada beneficiaram. Continuaram a pagar o mesmo. Houve protestos. A DECO fez o seu habitual papel. E o homem do leme do nosso desporto não baixou os braços. Era um abuso e isso não podia acontecer. Prometeu que a coisa não ia ficar assim. Ameaçou, protestou, musculou o discurso. Disse que ia fazer queixa às autoridades de regulação económica. O resultado era antecipadamente conhecido por óbvias razões do direito da livre fixação dos preços. E tudo ficou em águas de bacalhau.
Em 201O governo mudou de ideias. E no OE para 2011 aumentou o IVA. E retirou da base de incidência mínima o que antes lá colocara para facilitar o acesso às actividades físicas e desportivas. Passou para 23%. Um aumento de 17% porque aos 5% iniciais já havia sido adicionado um ponto percentual a meio do ano. A justificação do homem do leme do nosso desporto para esta alteração de procedimento é a de que no passado os operadores não fizeram repercutir nos preços a redução do IVA (entrevista Jornal a Bola, 2.1.11). O que é verdade para alguns, mas não o é para todos. O que para alguns é um aumento de 2%, para outros é de 17%.Convinha ter tratado o assunto com o rigor que se exige a um governante. E respeitar quem baixou os respectivos tarifários e agora vai ter de os aumentar de forma abrupta.
Mas os problemas não ficam por aqui. O que fazer com as actividades sem enquadramento técnico? É IVA reduzido ou à taxa máxima? Até 2008 era à taxa reduzida. E agora? O que pensa a Direcção Geral dos Impostos e a direcção de serviços do IVA? E o que pensa a Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais? O ano começou e os operadores públicos e privados aguardam o que devem fazer. E esperam que quem tem de explicar estes procedimentos o faça. Mas a questão não termina por aqui.
Uma das maiores distorções à concorrência deste sector é a não aplicação de IVA por parte de Estado e demais pessoas colectivas de direito público para o mesmo tipo de serviços. E as autoridades fiscais assobiam para o lado. E o homem do leme do nosso desporto não tem tempo para se dedicar ao problema. Estado e demais pessoas colectivas de direito público só podem ser sujeitos passivos do imposto quando realizem operações no exercício dos seus poderes de autoridade mas desde que a sua não sujeição não origine distorções de concorrência. Ora o que se passa é que serviços dependentes de entidades e institutos públicos estão em concorrência directa com entidades que estão obrigadas a cobrar IVA. Quer no sector privado, quer no sector empresarial local. E ao não tributarem o IVA estão num regime de desleal concorrência a dificultar a vida a empresas e a outro tipo de operadores. Usando a lei através do seu incumprimento.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

O Marketing e as regras do Jogo

(texto enviado por Horácio Lopes)

Uma das especificidades mais interessante do desporto é a imprevisibilidade do resultado, baseada numa competitividade e rivalidade necessárias, entre atletas em igualdade de circunstâncias e que em conjunto fornecem ao espectador um espectáculo desportivo atractivo.
Quando esta competitividade é colocada em causa, permitindo que um dos oponentes tenha alguma espécie de vantagem à partida, o desporto perde qualidade, a idoneidade dos intervenientes é questionada e a verdade desportiva violada. Este factor torna-se mais importante em desportos em que o existe mais “capital humano” envolvido (como o Basketball por exemplo) e menos equipamentos em oposição a outros em que a prova se disputa com recurso a máquinas (desportos motorizados) com uma importância e intervenção consideráveis.

Para precaver este tipo de situações têm-se desenvolvido ao longo dos anos as chamadas “regras do jogo”, vulgo regulamentos, que enquadram toda a actividade desportiva e competitiva dos desportos, destacando a importância das regras anti-doping, contra a violência e a favor do fairplay.

As marcas desportivas generalistas da actualidade e ainda as aquelas mais específicas de cada desporto, lançam cada vez mais campanhas agressivas, reivindicando uma melhor qualidade dos seus produtos alegando que com o seu uso os atletas conseguem melhores performances.

Não obstante serem campanhas de marketing muito facilmente enquadráveis em acções estudadas de acordo com o comportamento do consumidor moderno, a verdade é que ao nível das melhores marcas, a diferenciação e benefício, se verificam ao nível da imagem que o utilizador tem da marca em causa e que lhe é sugerida através de campanhas bem planeadas com esse intuito. Isto porque as técnicas de fabrico modernas permitem a qualquer marca oferecer produtos de elevada qualidade.

A controvérsia lançada em torno dos novos ténis da APL (Athletic Propulsion Labs - www.athleticpropulsionlabs.com) obriga-nos a pensar os limites da intervenção do Marketing no jogo e nas suas regras, bem como o papel dos reguladores das competições desportivas.



O modelo Concept 1 da Athletics Propulsion Labs Alguns números do Modelo Concept 1 esgotaram e não serão mais produzidos Imagens retiradas do site www.athleticpropulsionlabs.com

Ryan e Adam Goldston, irmãos gémeos e ex-jogadores de basketball, alegam ter efectuado estudos independentes que comprovam que os jogadores de Basketball saltam mais alto e jogam melhor quando usam os ténis Concept 1 da APL, por si desenvolvidos com base na nova tecnologia Load’N LaunchTM(www.athleticpropulsionlabs.com/load-n-launch-technology.html).

Percebendo esta vantagem, muito jogadores da NBA e cerca de 30% dos novos jogadores da NBA (de acordo com os Goldston), manifestaram imediatamente interesse em usar estes ténis na nova temporada, o que mereceu o desagrado da NBA que baniu prontamente este modelo de ténis.
Os jogadores não permitiram revelar os seus nomes pelo facto de já terem firmado contratos com outras marcas.
Ao tomar esta atitude a NBA alegou obviamente que pretendia manter as condições de jogo iguais para todos os atletas, não permitindo vantagens competitivas baseadas no uso de equipamentos, mas, parece-me existir claramente uma protecção por parte da NBA às marcas que a patrocinam e que são vendidas na sua loja, ADIDAS, NIKE, JORDAN, TEAM (http://store.nba.com/).

Ao olhar com distanciamento esta situação, e numa perspectiva de análise de marketing pura, diria que a promessa que a marca fez não foi acautelada verificando se a utilização do produto em causa ultrapassava os limites das regras do jogo, mas foi uma estratégia de marketing bem pensada.

Para vender, as marcas fazem promessas aos seus consumidores que convém serem verdadeiras e facilmente verificadas pelos utilizadores. Caso não sejam o resultado será um claro recuo nas vendas. No entanto, a meu ver estamos perante uma estratégia de Marketing que procurou provocar a reacção da NBA para a utilizar como argumento de venda.

Tudo me leva a crer que Ryan e Adam Goldston sabiam claramente que os seus ténis, ao criar uma vantagem competitiva, não seriam aceites pela NBA. Apesar desta proibição a APL esgotou alguns números da sua produção e planeia expandir a linha a novos modelos, revelando-se um sucesso comercial, porque as suas vendas não eram direccionadas à NBA mas sim ao público em geral.
Quantos jogadores actuam na NBA e quantos amadores jogam basketball na rua, entre amigos, aos fins-de-semana? Destes, quantos gostariam de saltar mais alto e jogar melhor? … todos!

E foi exactamente este o argumento de vendas que procuraram. A aceitação por parte de 30% dos novos jogadores (e portanto não tão bons como as estrelas mas pretendendo chegar lá, que representam o público-alvo do produto), e a proibição por parte da NBA (ao proibir confirmaram que os ténis de facto ajudam a saltar mais alto e a jogar melhor), foram o seu melhor argumento de marketing para fazer um boom nas vendas.

O resultado foi óbvio e a APL só tem a agradecer à NBA a oportunidade de marketing que foi criada. Actualmente a marca exibe no seu site uma promoção de oferta de uma t-shirt com a compra de um par de ténis, com a inscrição “ Banned by the NBA”.

domingo, 2 de janeiro de 2011

“Coragem e carinho” para 2011! (Texto I)

No primeiro dia do ano, vinda de um almoço familiar reconfortante, apenas ouvi a parte final do discurso da tomada de posse da primeira mulher Presidenta do Brasil. Não pude deixar de me emocionar e empolgar com a força das palavras de Dilma Rousseff, como outrora também já me tinha acontecido com os discursos e as intervenções de Marina Silva. Com ajuda amiga, recuperei na íntegra o seu discurso proferido no Congresso, escutei-o, ainda não com a atenção devida, e logo pensei na vida de tantas e tantas raparigas e mulheres do nosso planeta e, naturalmente, do nosso País.
Surgiu-me de imediato a memória da afegã Bibi Aisha, o intolerável arbítrio e as repugnáveis discriminações e violências a que as mulheres estão sujeitas naquele país, mas que, infelizmente, são extensíveis a tantos outros do nosso planeta.

A mobilização das ideias na minha mente provocadas pela intervenção de Dilma foi tal que, de seguida, em vez de continuar no recatado convívio familiar, fui à procura de escritos lidos recentemente relacionados com as relações de género. Teresa Pizarro Beleza, autora que acompanho há muitos anos, expressa com clarividência na sua última obra (Direito das Mulheres e da Igualdade Social. A Construção Jurídica das Relações de Género, 2010) que não podemos observar as relações de género como empreendimento neutro e distanciado, mas de o fazer com a consciência prévia do desfavorecimento de um dos lados, de um dos grupos, por acaso o maioritário em termos populacionais, e com a mesma clareza afirma que “ a distinção entre homens e mulheres (e “brancos” e não “não brancos”, “homossexuais” e “heterossexuais”) que o Direito ora fomenta, ora ignora, ora limita, ora mesmo proíbe, é uma distinção carregada de sentido discriminatório. Implica uma concepção de diferenciação vertical, não uma simetria horizontal. Mais do que desigualdade, estamos perante situações de domínio, de subjugação, de hierarquia” (p.37).
E para que não pensem que estas reflexões e constatações sociais são apenas assuntos de mulheres ou de feministas frustradas, encontramos o mesmo pensamento em homens de diversos quadrantes de estudo e intervenção. O exemplo de Vasco Prazeres (in “O voo desordeiro de Eros. Uma ode à singularidade do amor e do erotismo”, 2008) é apenas um entre milhares. «Em todas as facetas da vida, tendemos a afirmar que os homens “são” assim, e as mulheres “são” assado…é neste maniqueísmo contundente que nos movemos na trama social, não deixando de interiorizar que a diferença não é neutra, que existe uma hierarquia de poderes e que homem e mulher adquirem carga simbólica de valor diferente. Dir-se-á que o novo protagonismo social das mulheres deixou para trás tais dissemelhanças. Nada mais enganador; em primeiro lugar, porque tal conquista não se reflecte de forma equitativa no universo feminino, continuando a verificar-se uma acentuada estratificação no que a ela diz respeito; em segundo lugar, a aparente igualdade estabelecida entre sexos, em determinados contextos, não costuma resistir a uma análise que vá além de reprodução acrítica de novos lugares comuns, mais adaptados aos tempos que correm.» (pp. 41-42).

Por tudo isto e muito mais, ser mulher Presidenta no Brasil vai requerer muita competência, autoridade, honestidade, dureza, vai exigir muita coragem, parafraseando Dilma Rousseff, “É com essa coragem que vou governar o Brasil, mas não só com coragem, com carinho também (…).” E, por isso, Expedito Soares, reconhecedor da sociedade machista brasileira, afirmou com alegria “Dilma sai do Congresso no meio de uma multidão masculina. Muito bom! Esses homens vão ter de engolir uma mulher, de aceitar ela.”

E por isso, porque ser mulher é diferente de ser homem para o bem das mulheres e dos homens e, consequentemente, para o bem da humanidade, Dilma Rousseff, em momento inédito no Brasil fez a revista às tropas de saias e saltos e com firmeza em vez de fazer a continência ou a vénia, beijou a sua bandeira.

Pensarão as leitoras ou os leitores neste momento, mas que tem a ver este texto com o mundo da colectividade desportiva. Porquê estas enfatizações, estas referências e estes problemas a serem chamados ao sector desportivo?
Não precisarei de explicar muito no texto que por estes dias escreverei a este propósito. É por demais evidente o alheamento político, em diversas instâncias, relativo à participação feminina na educação física e na actividade física e desportiva. É um grande desaproveitamento e desperdício de recursos o menosprezo ou a pouco solicitação de muitas mulheres competentes na área desportiva. São enormes e anacrónicos os tratamentos absurdos e discriminatórios que, entre nós, e de forma acentuada, se praticam e que nos fazem, ou deviam fazer, envergonhar, pois nos conduzem para cenários muito desfavoráveis no quadro europeu. Basta termos em consideração os paupérrimos níveis da participação das raparigas e das mulheres ao nível da prática, da decisão, da gestão, do treino ou da arbitragem desportiva, independentemente de possuirmos algumas verdadeiras pérolas e heroínas femininas, sobretudo na prática desportiva federada e de alto rendimento e que nos vão alegrando a alma.

Bom ano de 2011, com apelo à coragem e ao carinho!!



sábado, 1 de janeiro de 2011

O FMI e a FIFA

Ao primeiro olhar o (tão famigerado) FMI e a FIFA nada não têm de comum. Mesmo num país como o nosso, onde o Futebol concentra quase todas as atenções possíveis, os últimos tempos têm atribuído a um organismo como o FMI um tempo de antena nada normal para Portugal, sem querer enveredar pela sua necessidade de intervenção ou não.

Observando o problema económico-financeiro que o país atravessa, muitos são os que defendem a entrada daquele organismo em Portugal como a única forma de clarificar a situação bem como uniformizar os procedimentos para Portugal poder ir a algum lado.

Se analisarmos o momento que Portugal atravessa actualmente (ou que se arrasta há demasiado tempo...) ao nível do Futebol e da sua Federação, quase nos sentimos tentados a igualar o papel que a FIFA poderia ter no 'nosso' Futebol com o do FMI nas 'nossas' finanças. A problemática do Futebol em Portugal revela-se quase exclusivamente ao nível dos dirigentes que nele habitam. Tomara que o nível do dirigismo em Portugal e no Futebol tivesse ao nível dos atletas e treinadores que se produzem e brilham por esse mundo fora.

O constante adiamento da aprovação de uns novos estatutos da FPF. A perda do estatuto de utilidade pública da FPF que a impede a diversos actos, excepto ter a presença constante dos dirigentes máximos do desporto e do Governo de Portugal quando os momentos são demasiados expostos promocionalmente. As ameaças dos 'ses' e das figuras quase zangadas nos programas televisivos que nos tentam convencer que de facto poderão existir sanções para a FPF e os seus associados se rapidamente não resolverem as suas problemáticas, leva-nos a questionar se apenas a intervenção da tão poderosa FIFA em Portugal pode de facto abanar as maiores instâncias nacionais ao nível dessa modalidade.

Não se coloca qualquer tipo de ajuizamento positivo à FIFA, até porque alguns dos seus últimos apontamentos têm sido retrógrados e tudo menos conciliadores para o futuro. Mas sabemos que uma intervenção menos simpática em Portugal daquela entidade iria impedir que num intervalo de tempo a FPF ficasse sem grandes hipóteses de produzir receitas pelas não participações nas provas internacionais ou provavelmente, a perda dos seus patrocinadores mais emblemáticos e poderosos.

Dado que apenas uma consequência a este nível pode mexer com os poderes instituídos, parece que se 'exige' à FIFA que venha a Portugal dar uns 'pontapés na bola', porque de outra forma, através do bom senso ou da formação, os dirigentes nunca irão abrir mão dos direitos adquiridos e permitidos ao longo das últimas décadas.