domingo, 31 de janeiro de 2010

Uma Equipa, uma Nação

Humanismo, Política e Desporto – a trilogia perfeita para os comentários dos que forem ver o filme, para as emoções daqueles que conseguem arrepiar-se com o poder e a magia do desporto, para as estratégias de quem consegue ver o desporto mais além, ou para além, do simples entretenimento ou da actividade física.

Invictus
Do fundo da noite que me envolve
Escura como o inferno de ponta a ponta
Agradeço a qualquer Deus que seja
Pela minha alma inconquistável

Nas garras do destino
Eu não vacilei nem chorei
Sob as pancadas do acaso
Minha cabeça está sangrenta, mas erecta

Além deste lugar tenebroso
Só se percebe o horror das trevas
E ainda assim, o tempo,
Encontra, e há-de encontrar-me, destemido

Não importa quão estreito o portão
Nem quão pesado os ensinamentos
Eu sou o mestre do meu destino
Eu sou o comandante da minha alma

(William Ernest Henley - 1849-1903)

sábado, 30 de janeiro de 2010

A novela e o novelo

Os contornos do caso EPUL poderão surpreender quem desconheça os meandros das relações do futebol profissional com os municípios, em particular os mecanismos de financiamento público à construção e requalificação de infra-estruturas desportivas. Foi - e tudo indica que continue a ser - uma novela com episódios por demais mediatizados tais os montantes e instituições em causa, as circunstâncias políticas à época e o clamoroso desrespeito pelo ordenamento jurídico vigente sobre esta matéria. Outras novelas não o são tanto.

Importa tomar esta novela como exemplo para divergir do enfoque sobre a promiscuidade entre a política e o futebol e enquadrá-la na óptica dos processos de accountability na governação do desporto autárquico.

Desde 1991 que existe um quadro regulador - recentemente alterado - sobre financiamento público desportivo, o qual procura sustentar boas práticas na gestão de dinheiros públicos. Ainda hoje são inúmeros os municípios que operam à margem deste, e de outros, instrumentos normativos. Para o confirmar basta uma visita na internet aos regulamentos de apoio ao desporto de inúmeros municípios deste país, despender alguns minutos a ler em boletim municipal, ou no jornal oficial da república, o conteúdo de deliberações autárquicas neste domínio. Caso não se queira investir desde logo no tratamento de choque com que o Tribunal de Contas e a IGF nos brindam.

Aqui chegados poder-se-á pensar que esta tendência representa apenas um sintoma de impunidade generalizado e por aqui ficamos. Porém desenrole-se o novelo... Sugiro ao leitor que imagine um clube de dimensão local e regional, o qual possa até disputar competições de natureza profissional, legalmente reconhecidas como tal. Tendo presente essa referência, quantos são aqueles que dispõem de uma estrutura técnica que permita responder com eficiência aos requisitos definidos naquele quadro regulador? Quantos são aqueles com uma situação financeira, patrimonial e fiscal, que, em bom rigor, estão em condições de assumir com probidade as obrigações ali definidas?

Admita-se, num cenário optimista - ou ilusório - que até são alguns. E assim se estabelece uma relação contratual com a autarquia, tendo por objecto a consolidação de um programa de desenvolvimento desportivo. Esta, no âmbito das suas atribuições inspectivas, fiscaliza e monitoriza o cumprimento do contrato, se essa for a sua vontade e empenho. Caso ocorram derrapagens e incumprimentos pela entidade beneficiária durante a vigência do contrato alguém acredita que o programa de desenvolvimento não se concretize? Seja ele um evento de interesse público, um programa de formação desportiva ou um novo espaço desportivo, nomeadamente quando estão em causa interesses comerciais ou desígnios nacionais sob o rótulo de interesse público? Alguém acredita que a autarquia dispõe de meios que lhe permitam apurar se as comparticipações municipais não derivam para o desporto profissional ou outros fins? E ainda que os serviços detectem anomalias e irregularidades, que político - na oposição ou no poder municipal - assume o ónus de propor e decidir a resolução do contrato com o clube bandeira da região ou do concelho, sem esgotar outros expedientes que comprometem não só a saúde financeira da autarquia como o futuro do clube?

Infelizmente sabemos que está longe de ser a produção legislativa, mesmo que bem intencionada, que vem mudar hábitos ou acrescentar rigor e responsabilidade na gestão de financiamentos públicos, como os fenómenos EPUL, que saltam para as parangonas, estão aí para o relembrar.

A prestação de contas começa no momento em que o ente público avalia ex ante a capacidade do eventual beneficiário em assumir riscos e valoriza a boa gestão e a evolução de resultados alcançados ao longo do tempo, com base em indicadores objectivos, com os quais estabelece um compromisso durável no tempo, susceptível de ser publicamente escrutinado e auditado. Trata-se de desenvolver e implementar processos de diagnóstico que suportem quem gera valor, ao invés de cumprir meras rotinas procedimentais, à semelhança de um balcão bancário.

Não se gerando incentivos à competitividade e empreendedorismo de quem beneficia de apoios públicos e avaliando tudo por igual, sem critérios precisos e mensuráveis, replicam-se as ineficiências de subsidiodependência e assumem-se contratos que não passam de simples formalismos. Mais cedo ou mais tarde, todos sabem, à partida, que o Estado acabará por assumir encargos e responsabilidades que não são suas. Depois, enredado neste novelo, tudo depende do engenho com que o faça, mais ou menos à margem da lei.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Espelho meu, quem é mais belo do que eu?

A Colectividade Desportiva publica e agradece um novo texto de Fernando Tenreiro.

Houve quem se perguntasse no fim da legislatura passada acerca do seu trabalho no desporto. Através de anónimos, atirava os foguetes, corria a apanhar as canas, apontando virtudes porque não havia elementos contestáveis alternativos. Portugal sabe que a ausência de contestação é sinal de certa força, que não de razão.
A evidência que a legislação do desporto dos anos noventa falhara aconselhava um perfil de actuação modesto e baseado em pressupostos de governance e éticos semelhantes aos que produzem os melhores resultados europeus. Infelizmente a certa altivez teve como consequência o falhanço de Pequim que confesso, eu próprio, esperava não acontecesse.
Irei escrever o prometido terceiro e último artigo, este sobre o lançamento do livro ‘Desporto e Estado: Ideologia e Prática’.
O novo livro que Jorge Bento e José Constantino coordenaram foi a reafirmação de um modelo de sucesso do desporto português. Uma vez mais o acto editorial comportou o risco de trazer novos nomes para testar o acumular de capital de conhecimentos do desporto português num mercado pouco motivado para a escrita e o debate dos seus temas candentes.
Manuel Villaverde Cabral o orador convidado fez uma incisiva valoração científica do que apelidou uma nova área, referindo-se ao conhecimento do desporto, notando que existem condições para um desenvolvimento futuro seguro e equivalente ao já sucedido noutras áreas.
Estas palavras esperançosas ilustram que os desafios que se apresentam ao desporto exigem o aprofundamento das medidas e dos incentivos numa perspectiva de longo prazo e sem expectativa de resultados positivos instantâneos e de benefícios sem um custo acessório.
Este imediatismo feito de espuma que apela ao sucesso pelo sucesso, observa-se nos actos oficiais, inaugurações, recepções a atletas, participação em corridas populares, comemorações e festas desportivas. O comportamento contamina e prejudica o desporto nacional porque a acumulação de conhecimento e de capacidade de governance equivalente ao nível europeu exige um investimento público conhecedor, prolongado direccionado para os desafios do mercado privado e menos para os problemas dos agentes conhecidos.
Armando França demonstrou no Congresso do Desporto que existem políticos com um conhecimento apurado sobre as necessidades reais do mercado do desporto, assim como, existem líderes desportivos como Hermínio Loureiro e Joaquim Evangelista que actuam em ambientes adversos, para citar um par de nomes.
Há um oceano de projectos para fazer, todo o tempo do mundo é pouco para o muito que a população portuguesa necessita em termos desportivos, todos somos escassos e ignorantes dos passos exactos que gerarão o maior valor acrescentado e colocarão as futuras gerações de portugueses com um consumo desportivo de nível europeu.
Os parceiros desportivos públicos e privados do desporto devem caminhar neste sentido mesmo que erros sejam cometidos ou lapsos surjam. A definição do ‘core’, do objecto fundamental do sector, é o elemento decisivo da determinação de fazer como a Europa faz.
Pequim primeiro e depois os dados europeus do nível desportivo nacional demonstraram que Portugal está longe do nível Europeu médio e que a criação de condições de produção desportiva é incipiente materialmente.
O futebol, retirando o trabalho incompreendido da Liga de Clubes e a resignação contrariada do Sindicato de Jogadores, mantém uma atitude majestática que a sua dimensão suporta servindo de exemplo às restantes modalidades que o copiam e porque o copiam remetem-se à sua menoridade e invisibilidade social e económica.
Como Jorge Bento referia na apresentação do livro a falta de debate é imensa e trilha-se uma via de silenciamento. O exemplo dado por José Constantino da falta debate, publicações, teses, não se justifica pela existência dos três jornais diários de desporto que mais nenhum país tem no mundo desenvolvido.
O blogue e os livros de Jorge Bento e José Constantino são oásis civis no desporto português actual. Não são o bastante, nem são o essencial para o que um mercado dinâmico, como o do desporto moderno, exige dos parceiros desportivos portugueses.
A definição do ‘core’ para o desporto nacional numa perspectiva europeia permitirá equacionar os projectos relevantes, a sua quantidade e qualidade, e os tempos de realização dos activos que faltam para a média dos países com quem Portugal compete globalmente.
A definição do ‘core’ através do debate científico e democrático traria outra beleza às mãos de fada que no seu castelo à beira Tejo lidam com o mercado desconhecendo o saber fazer europeu de todos os países que desde há décadas e mais recentemente nos ultrapassam habitualmente em todos os indicadores de performance desportiva.

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Os planos são rascunhos?

Um dos arcaísmos em matéria de gestão urbana e de planeamento de espaços para a prática desportiva é o conceito de que se deve garantir cerca de 4m2 como área útil desportiva por habitante. Trata-se de um valor arbitrário. Não tem qualquer fundamentação técnica ou científica. Fez escola em algumas instâncias europeias. Mas como indicador de planeamento é um erro. Basta pensar que trata por igual o que é diferente. Homogeneíza quantitativos populacionais que, supostamente, teriam iguais necessidades de procura/prática desportiva. Independentemente de perfis etários, sociais e económicos.
Associado àquele arcaísmo estão as chamadas “cartas desportivas”. Um depositário de boas intenções. Mas que não ultrapassa, em grande número de casos, a possibilidade de análise da situação ou o diagnostico. Passar desta fase para a da previsão de necessidades pede outros instrumentos de planeamento. Onde estão eles? Com que critérios? Como se estruturam? Em que se fundamentam?
Muitos dos actuais modelos de planeamento estratégico assentam em visões e valores que o desporto já não partilha. Partem do modelo tradicional do funcionamento de uma organização desportiva: um sistema aberto, em que se podem observar as relações directas e previsíveis entre causas e efeitos, entre oferta e procura, entre disciplinas desportivas e práticas. É um modelo que corresponde a um desporto unipolar: o desporto de competição. Mas que tem dificuldades em se adaptar a um modelo plural onde convivam várias formas e expressões desportivas. E onde o sector publico se tem de articular com o associativo e o privado.
O planeamento urbano evoluiu, nos últimos anos, de uma perspectiva fixista para um perspectiva estratégica, mais aberta, mais móvel e muito ligada às lógicas de qualificação e competitividade das cidades e das regiões. E esta mudança obrigou a convocar outros saberes disciplinares e outros actores sociais para além dos associados ao planeamento tradicional. É uma aproximação que se afasta dos modelos clássicos, previsíveis e arrumados que raramente passam do papel e que se tornaram exercícios inúteis.
Na realidade, o processo de planeamento tornou-se, com frequência, um elemento conservador, apesar do seu propósito de pretender "facilitar as mudanças". Os planos são, por vezes, construções tão detalhadas e rígidas que se tornam frágeis, caindo por terra ao mínimo ajustamento. O controlo a intervalos de tempo determinados e essencialmente quantitativo, permite verificar e corrigir desvios face ao que tinha sido planeado. Mas, muitas vezes, é apenas um controlo da evolução da execução. Não retroage às escolhas.
Pensar o planeamento dos espaços de desporto é antes de mais pensar a “cidade” e o modo ela se organiza. O que deve oferecer aos que nela vivem, habitam ou trabalham. As cidades dependem crescentemente de factores económicos. Da capacidade de fixar e qualificar pessoas. De atrair investimento. De garantir boas politicas de sustentabilidade ambiental. É neste quadro que as politicas de equipamentos desportivos se têm de integrar. Pensá-lo de outro modo é o caminho mais curto para uma política de “pedras mortas”.Anunciar novos projectos sem ligação a uma lógica sustentada de”projecto de cidade” é, a prazo, a possibilidade de ter equipamentos desportivos sem qualquer relação com a realidade social envolvente. Pensar as necessidades de pratica desportiva local pelas necessidades da prática desportiva federada é desastre à vista.
A lógica do Estado central normativizar o planeamento não é distinta da lógica que normativiza os contratos públicos. Em nome do interesse público, da transparência e da boa governação criam-se modelos que são um pesadelo e um bico-de-obra para quem tem de os executar. E que, em muitos casos, o cumprimento da norma é um fim e o serviço público um seu efeito colateral.
A superação da situação nacional não se ultrapassa com métodos de crivo administrativo. Em que uma entidade central governamental “dá parecer” sobre a viabilidade/pertinência deste ou daquele projecto. Que habitualmente se limita às condicionantes técnicas. O problema é mais vasto. É do âmbito do saber e do conhecimento. Que não está mais presente na administração central do que na local. Tudo seria mais fácil se assim fosse. Mas não é. O essencial reside sobre o processo de formação e construção do conhecimento que conduz ao planeamento e à estratégia. E não sobre o resultado desse processo. Sob pena de se definir um destino, mas não ter mapa para lá chegar. Há sempre o risco de se perder.

domingo, 24 de janeiro de 2010

Imaginem...

Imaginem que existia um jornal desportivo que apresentava nas suas capas apenas os resultados das competições - e não apenas de futebol -, as afirmações construtivas das entrevistas realizadas a todo o tipo de agentes desportivos, planos desportivos das Associações, Federações, Clubes, SAD's, etc., um misto de vários jornais, com opiniões de pessoas do desporto e não de agentes da sociedade que ao falarem de futebol e não de desporto, perdem totalmente a sua compostura sempre que falam do seu clube.

Nem precisava de ser um jornal diário, talvez duas ou três vezes por semana. Recuperando as três vezes por semana do jornal 'A Bola', que era à 2.ª feira, 5.ª feira e Sábado, ou do 'Record', 3.ª feira, 6.ª feira e Domingo.

Não fazia da sua prioridade imagens de túneis, viagens oferecidas, erros de arbitragem. Dos maus e pseudo 'mindgames' realizados pelos treinadores e dirigentes desportivos. Da listagem enorme de jogadores falados mas que não chegam a assinar nem a viajar.

Imaginem...será que tinha alguma procura? Se sim, quem os lia? Quem os comprava? Que tiragem atingiriam?

Isto porque me parece que, com maior ou menor perspicácia e congruência, outros jornais diários que não 'desportivos', têm conseguido ultimamente atingir um patamar bastante equilibrado do que 'importa' informar ou não. Que remetem para a importância que a notícia deve possuir de boatos e frustrações, independentemente da sua cor.

Também aqui precisamos de uma alteração do conteúdo das informações que deveriam fazer capa e do processo. Infelizmente, e para quem tem como hábito ler alguns dos diários desportivos, a qualidade neste campo abordado no post, tem vindo a decrescer e a uma velocidade quase vertiginosa.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010



As Edições Afrontamento têm o prazer de convidar V. Exa. para a apresentação do livro coordenado por
Jorge Bento e José Manuel Constantino

O Desporto e o Estado
Ideologias e Práticas

A sessão terá lugar no dia 26 de Janeiro, pelas 18.30 horas, na FNAC do Chiado,
em Lisboa
.

A obra será apresentada pelo
Professor Manuel Villaverde Cabral.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

De bata e estetoscópio

Pessoa amiga contava-me, entre o incrédulo e o irónico, a experiência que viveu recentemente. Tratava-se de uma visita/reunião a um centro de controlo do treino desportivo. Durante a reunião surgiu o responsável pelo centro. Vestia bata branca e tinha um estetoscópio pendurado ao pescoço. Prestou as informações relativas ao trabalho no local. Á saída, a pessoa amiga, ignorando de quem se tratava, para além de ter sido indicado como responsável técnico do centro, perguntou a quem a acompanhava: quem era aquele médico? Ao que o interlocutor lhe respondeu:”não é médico nenhum, é um professor de educação física”.
Podemos entender o ocorrido como um “fait-divers” próprio da manifestação tardia de uma certa adolescência profissional. Também houve um geração de “gestores de desporto”que se encantavam com o “marketing mix”. E um vaga de treinadores e técnicos de exercício que são “personnal trainers”.E jovens que distribuem propaganda nas caixas de correio e que como profissão indicam “trabalho em publicidade”.Não vem grande mal ao mundo por isso.O problema é outro.
Como pertenço a uma geração que transitou de uma fase de afirmação profissional dos professores de educação física para uma outra que passou a viver mal, e em crise, com essa identidade profissional tenho imensas reservas a quem procura legitimidade profissional imitando /copiando lógicas de exercício profissional de outros grupos. Mas tenho ainda maior reserva aos que buscando inicialmente um formação vocacional na área do desporto terminam em especialistas em tudo e mais alguma coisa. E com os muitos anos que levo de vida profissional receio sempre encontrar alguém que sendo do desporto, do desporto sabe pouco, mas sabe muito de gestão, de arquitectura, de engenharia, de direito, de marketing, de finanças, de medicina etc. Ora estas são áreas de conhecimento que têm os seus especialistas. Que têm as pessoas que estudaram para dominar essas áreas. Aos profissionais das áreas do desporto o que se lhes pede é que saibam comunicar com esses especialistas. Não se pode é ter a atitude, que seria arrogante, de pensar que o conhecimento especializado nas áreas referidas é dominado por quem passa uns anos numa faculdade com um currículo onde existe uma cadeira de direito, de economia ou da saúde. Será já muito bom se, no plano profissional, aprender a falar com outras áreas de especialiadade dominando as suas linguagens e códigos essenciais. Porque infelizmente , por vezes, nem isso ocorre.
Diz-me também a experiência que especialistas de outras áreas (médicos, juristas, advogados, arquitectos, engenheiros) que têm experiência do desporto como praticantes ou dirigentes, por exemplo, têm um valor acrescentado nas suas áreas de especialidade profissional em relação ao desporto. A que muitas vezes juntam especializações acdémicas e profissionais das suas áreas em desporto.
Esta delimitação de áreas de especialização profissional é bem urgente perante e emergência de formações na área do desporto, onde o desporto parece ser o filho menor. E onde a legitimação profissional parece querer ser obtida através da captura de saberes e de lógicas de outros grupos profissionais e de outras especialidades. Até para que não suceda o inverso. Como no caso de uma universidade pública que promove mestrados, imaginem, em gestão e manutenção de campos de golfe(!) e em que nas habilitações de acesso não surge qualquer formação na área do desporto.
O caso inicialmente referido é sintomático. Não coloquem ordem na casa e “cada macaco no seu galho” a ainda hão-de ver um professor de educação física a dirigir um centro de medicina. Nem que para tanto baste um qualquer doutoramento, numa qualquer especialidade das ciências da saúde.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

A Petição por Álvaro Parente


A sociedade civil portuguesa acordou para as Petições!
Praticamente todas as semanas surgem pelo correio electrónico pedidos muito diferenciados a solicitar signatários para causas relacionadas com regras de acesso ao subsídio de desemprego, com questões de gestão de água, com a responsabilização dos pais pela educação dos filhos, com a “verdade desportiva”, enfim um rol enorme de preocupações sociais que suscitam maior consciencialização e intervenção dos cidadãos. Obviamente, nada a opor, bem pelo contrário!

Vem este assunto a propósito de uma outra Petição, que me chegou por mais do que uma via, reivindicando o apoio público ao atleta português, piloto de testes da Virgin Racing, Álvaro Parente.
O pedido em causa logo me remeteu a memória para os 2 milhões de euros atribuídos pela Secretaria de Estado da Juventude e do Desporto em 2008 a um outro piloto português e que mereceu a nossa reflexão neste espaço.
Após este controverso apoio financeiro a revogação do regime jurídico do contrato programa legitima o patrocínio público a agentes desportivos que projectem o nome de Portugal no estrangeiro. Tal medida, como bem relevou Alfredo Silva, parece ter sido implementada à imagem e à medida de novos “Tiago Monteiro”.

Contudo, Álvaro Parente vê as negociações para a sua carreira em 2010 paradas devido ao 'chumbo' que o Estado decidiu aplicar ao apoio que o Turismo de Portugal pretendia dar ao piloto.

Que motivações terão estado na base de tal decisão política?
A crise económica, mãe de todos os males e restrições que norteiam o quotidiano?
O menor poder negocial do lobby afecto a este piloto?
Ou simplesmente o parecer do Tribunal de Contas que indiciou a ilegalidade do apoio público concedido a Tiago Monteiro?

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

O país que também queria organizar Jogos Olímpicos

Publica-se texto que nos foi enviado por Luís Leite e que a colectividade desportiva agradece.
Aproveita-se a oportunidade para, uma vez mais, disponibilizar este espaço a contributos dos seus visitantes.


A importância que este “país da bola” dá aos Jogos Olímpicos em geral, e à participação portuguesa em particular, apenas em Jogos de Verão, está bem patente na posição que ocupa num ranking europeu (all-time) de medalhas obtidas por país, tendo em consideração o número de participações e a população:

Portugal conquistou, até 2008, 22 medalhas, sendo 4 de ouro (todas do Atletismo), 7 de prata e 11 de bronze, para uma população de 10,6 milhões de habitantes em 22 participações.

Vejamos o palmarés dos países que têm uma população semelhante ou inferior à nossa e que estão à nossa frente no número de medalhas:

Suécia: 475 medalhas, 9,2 milhões de habitantes, 25 participações;
Hungria: 459 med, 10,1 mh, 24 p;
Finlândia: 299 med, 5,3 mh, 23 p;
Bulgária: 212 med, 7,5 mh, 18 p;
Suíça: 181 med, 7,8 mh, 26 p;
Dinamarca: 170 med, 5,5 mh, 25 p;
Noruega: 144 med, 4,8 mh, 23 p;
Bélgica: 139 med, 10,4 mh, 24 p;
Grécia: 108 med, 11,2 mh, 26 p;
Áustria: 86 med, 8,3 mh, 25 p;
Bielorrússia: 64 med, 9,7 mh, 4 p;
Rep. Checa: 33 med, 10,3 mh, 4 p;
Estónia: 31 med, 1,3 mh, 10 p;
Irlanda: 23 med, 4,3 mh, 19 p.

Atrás de nós, mas prontos para nos passar já nos próximos Jogos (atente-se na população e no número de participações):

Eslováquia: 20 med, 5,4 mh, 4 p;
Geórgia: 18 med, 4,4 mh, 4 p;
Croácia: 17 med, 4,4 mh, 5 p;
Letónia: 17 med, 2,2 mh, 9 p;
Azerbeijão: 16 med, 8,9 mh, 4 p;
Lituânia: 16 med, 3,4 mh, 7 p;
Eslovénia: 15 med, 2 mh, 5 p.

Depois só restam praticamente os micro-estados.

Não contente com este panorama, o Presidente do Comité Olímpico de Portugal, que não revelou conhecer em Pequim a maioria dos membros da comitiva e teve o comportamento que se conhece durante os Jogos (e mesmo assim foi reeleito), pretendia que Portugal se candidatasse à organização de uns Jogos Olímpicos (!) …

Tudo isto teria até alguma piada se não estivessem em causa dinheiros públicos, gastos e a gastar num Projecto Londres 2012, cujo contrato-programa com o Governo já foi assinado, mas que pelos vistos, se consultarmos o “site” oficial do COP, não está publicado.
Quando estamos a chegar quase ao meio da Olimpíada (faltam dois anos e meio), a informação a que temos acesso naquele “site” permanece desactualizada no menu principal “Londres 2012”. Com a excepção de um pequeno destaque muito recente com uma lista de integrados, noutro local, à direita. No entanto, quanto a critérios de integração que sustentam aquela lista de atletas e modalidades, nada.

Quanto ao Plano de actividades do COP para 2010, entretanto aprovado e publicado, pouco parece preocupar-se com os aspectos organizativos da próxima Delegação Olímpica, tantos são os eventos secundários laterais e passeatas previstas.


Pode-se consultar: www.comiteolimpicoportugal.pt

domingo, 17 de janeiro de 2010

Verdade ou proselitismo?

A linguagem torna-nos públicos e baldios – desta forma o disse Miguel Torga, tal como o poderia dizer qualquer um de nós, se tivesse o olhar acurado do grande e luminoso pensador transmontano. Com efeito aquilo que dizemos ou escrevemos põe ao léu, desnuda e torna patente o que somos, temos e nos habita por dentro: os princípios e valores, os ideais e utopias, as noções, conceitos e preconceitos, as normas, direitos e deveres, as inclinações e tendências, as convicções e orientações, os conhecimentos, gostos e preferências etc. Ou seja, através da linguagem expomos à consideração, avaliação e apreço dos outros a nossa interioridade e identidade. E não seria exagero acrescentar que ela é reveladora e constituinte da nossa alma, tanto mais que, na ausência de melhor ou perfeita definição desta, podemos deitar mão à formulação de José Saramago, expressa mais ou menos assim: Eu não sei o que é o espírito ou alma, mas deve ser aquilo que está cá dentro, ocupa e preenche os espaços da nossa arquitectura interior, aquilo que nos examina, intima e agita, desencadeia, controla, atiça ou inibe os nossos comportamentos e actos.
Enfim, a linguagem, seja escrita ou oral, constitui a forma dos nossos pensamentos e sentimentos, das nossas ideias e perspectivas, das nossas causas e motivações. Há uma relação de causa e efeito entre os dois lados. A elevação ou a baixeza da linguagem condiz, pois, com o estado e o nível da nossa dimensão anímica e volitiva, espiritual e cognitiva, idealista e pensante. Julgo que isto é tão compreensível e manifesto que não carece de prolongarmos o arrazoado.
Mas – perguntará o leitor – qual o propósito que suscita estas deambulações? É pura e simplesmente a questão, já tratada neste espaço, da arrebatadora cruzada convocada em prol da putativa ‘verdade desportiva’. Há dias surgiu no jornal Record um texto assinado pelo arauto mais ínclito e proeminente do dito movimento. Trata-se de um naco de prosa aveludada, fina e macia, cuja leitura se recomenda vivamente, pela inflamação e esplendor do verbo, pela densidade e fulgor da erudição exibida, pelo estilo bem cerzido, apurado e, sobretudo, aprumado, cívico, culto e educado da escrita. É um deleite para os olhos e um regalo para os mais exigentes apreciadores do sabor ético e estético da linguagem. O casto, devoto e intocável autor, qual intrépido e indomável guerreiro, não se cansa de brandir um reluzente espadachim com o gume afiado pelo esmeril dos insultos, ameaças, imprecações e epítetos rasteiros com que mimoseia os críticos da ópera bufa levada à cena na Assembleia da República.
Ao ler um texto tão encantador, cativante e edificante, vieram-me instantaneamente à lembrança as palavras ‘proselitismo’ e ‘prosélito’. Ocorreu-me logo que estes termos não se coadunam ou casam com a ‘verdade’. Todavia, para evitar juízos apressados e infundados, para desfazer dúvidas e ficar melhor esclarecido, a cautela e a prudência aconselharam-me a consulta de um dicionário da língua portuguesa. E lá encontrei o que suspeitava: ‘prosélito’ é aquele que abraça uma nova religião, seita, doutrina ou partido, com tudo o que isso comporta de paixão, cegueira e desmedida, de visão messiânica e missão salvífica, de fanatismo, obscurantismo, sectarismo e piromania, de demência, irracionalidade e insanidade, de obsessão, insensatez e alienação, de ódio e raiva, de excesso, fervor e zelo persecutórios. Carregados de certezas e dogmas infalíveis os ‘prosélitos’ fixam as linhas de fronteira entre o bem e o mal, sendo eles obviamente uma elite de arcanjos e cavaleiros incumbidos de zelar pela prevalência e observância do primeiro e de denunciar, perseguir e exterminar as desprezíveis, encardidas e malditas criaturas possuídas pelo segundo.
Ora aí está a grande e decisiva diferença! A ‘verdade’ está casada em comunhão de bens com a compreensão, a serenidade, a tranquilidade, a tolerância, a temperança e as demais virtudes humanas. O ‘proselitismo’ tem outra matriz, é de outro jaez e tem vocação incendiária: para as dissensões e desvios dos mandamentos, dos padrões, preceitos, fins e interesses por ele estabelecidos advoga soluções de limpeza final, como as que arrasaram Sodoma e Gomorra. Os ‘prosélitos’ são filhos de Deus, depositários da fé, mensageiros da boa-nova, obra e expressão da pureza e inspiração divinas; os outros são heréticos ou ímpios, estão mancomunados com o diabo, a falsidade e a sujidade, devendo por isso ser sujeitos ao fogo purificador.
Deus nos livre e guarde de novos inquisidores-mores! Torquemada há só um, não precisamos de mais nenhum.

sábado, 16 de janeiro de 2010

Como sustentar políticas desportivas municipais em cenários políticos débeis?

A captura por interesses privados, o conluio da porta giratória, a gestão de uma agenda eleitoral que condiciona o vínculo com políticas duráveis e sustentáveis, são apenas alguns dos contributos que, em diferentes ópticas, as ciências económicas, sociológicas, jurídicas e de gestão avançaram para criticar a visão clássica da regulação e da produção de políticas públicas como um processo benévolo na prossecução do interesse geral. Ganhou corpo a ideia de que os actores de um sistema sociopolítico seriam maximizadores instantâneos de escolhas racionais num jogo de soma nula, fossem elas escolhas económicas ou políticas.

Se a isto juntarmos o padrão de valores que compõe a cultura cívica e política dos países do Sul da Europa, estão reunidos os condimentos que na grande maioria das vezes se avocam para criticar as falhas da governação e as disfuncionalidades que lhe aprisionam. As políticas desportivas, ou melhor, a sua ausência e fragilidade, são também elas analisadas neste prisma, por aqueles, poucos, que despendem o seu tempo a emergirem para lá da superficialidade com que o desporto é habitualmente abordado.

Importa, no entanto, ter presente que a produção política segue um trajecto mais complexo, não linear, dependente de contingências históricas e institucionais que a afastam da mera gestão de um mercado de oportunidades, ou de um guião sequencial de etapas que vão desde o diagnóstico à avaliação do impacto das políticas, passando pela sua negociação, produção e implementação. Isto é tanto mais notório quanto mais antigo é o Estado e o seu modelo de organização social.

Partilho – já aqui e noutros locais o escrevi – da ideia da inestimável importância das autarquias locais para o desenvolvimento desportivo do país, mas procuro também não criar ilusões sobre o seu quadro de acção. As edilidades, as autarquias locais, os municípios, têm a sua génese anterior à formação do próprio Estado em Portugal. Ao longo de séculos foram corpos administrativos cuja tarefa essencial se focava em resolver os problemas quotidianos das suas comunidades, administrar, taxar, recolher receitas na gestão do seu território e fazer cumprir as determinações de outros níveis do Reino e do Estado. Foram sempre entidades administrativas e não entidades políticas.

De acordo com um trabalho seminal sobre o sistema político local, uma elevadíssima percentagem dos recursos de uma autarquia estão focalizados na resolução de problemas imediatos (uma estrada que abate, uma canalização que rebenta, etc.) e em pequenas rotinas administrativas essenciais à sua actividade.

Ainda que constate o enorme desenvolvimento do poder local em Portugal com as mudanças após o 25 de Abril é pernicioso apagar todo um percurso histórico a montante - as suas virtualidades e debilidades - no que é hoje a acção de uma autarquia ao nível do desporto.

Assim, não é surpresa constatar que as tarefas de planeamento ainda assumam um papel irrelevante na política municipal, ou que os documentos estratégicos, quando existem, estejam à nascença, condicionados por opções políticas e apenas servem para encontrar suporte técnico que as ratifique e possam constituir-se como argumentos "sérios" e "credíveis" para negociar financiamentos públicos. É também sem surpresas que se assiste a opções políticas discricionárias - à margem de instrumentos de planeamento ou de qualquer critério de racionalidade - para aproveitar a oportunidade de um evento mediático, de uma permuta de um terreno, de um programa comunitário, ou apoiar um clube em suposta crise, sem que isso acrescente qualquer valor desportivo – antes pelo contrário -, ao município.

O "presidencialismo municipal" é uma herança forte de antanho que condiciona a arquitectura do poder, onde cada pelouro é visto como um feudo. A oposição é marginal à gestão quotidiana, limitando-se a algum ruído na esperança de que as coisas mudem daqui a quatro anos, debilitada pela debandada da renuncia dos mandatos dos primeiros elementos das suas listas, ou de compromissos constrangedores em torno de um pelouro com competências menores, de um cargo numa empresa municipal, ou do apoio municipal oportuno a um projecto da suas cores.

As fragilidades ao nível da cultura política passam também para o espectro da sociedade local, onde são raros os clubes, associações, escolas e agentes desportivos com uma visão que não se circunscreva ao seu estrito domínio de acção, fazendo ouvir a sua voz até ao limite onde os problemas do seu burgo serem pontualmente solucionados pela autarquia, quando a esta nem lhe competia intervir em inúmeras ocasiões. Este paroquialismo dificulta o sucesso de soluções como o conselho desportivo municipal, ensaiadas em várias autarquias, partindo do modelo francês.

Faz sentido falar nas autarquias, concretamente nos municípios, como entidades promotoras de políticas desportivas? Ou estamos apenas a falar de entidades administrativas com autonomia para gerirem um quadro delimitado de competências para o desporto no seu território?

É neste contexto que o técnico de desporto tem de intervir, é neste domínio que deve operar , saber posicionar-se e ser um actor promotor de mudança. Compreender como e onde a sua acção poderá ser um aporte de mais-valia para criar políticas desportivas municipais estáveis, num sistema marcadamente administrativo, com um legado enorme de caciquismo, e a dar os primeiros passos na aprendizagem da construção de políticas públicas sem as melhores referências, no que ao desporto concerne, de outros níveis da Administração.

Mas o caminho é longo não apenas para as autarquias. Também o é para muitos técnicos que chegam, e foi para muitos que acompanhei. As escolas de desporto, e não só, têm currículos que ignoram as noções básicas de gestão pública nos ciclos mais avançados de estudos superiores. Submetem os alunos ao catecismo do management, que tem décadas, mas não lhes fornece um código de leitura que permita valorizar a boa aplicação das inequívocas potencialidades dos instrumentos de gestão nesta realidade que tem séculos. Parece que olvidam que a Administração tem princípios, regras, valores seculares ao serviço de cidadãos, e não de simples clientes, os quais, em última instância se resumem numa palavra cuja concepção weberiana foi diabolizada – a burocracia. Parece que se esquecem de apontar o fracasso de soluções de "copy/paste", como as da Nova Gestão Pública, objecto de análise pelas mais diversas instituições que estudam o fenómeno administrativo. Parece que se esquecem que o sector empresarial público tem processos distintos de uma empresa privada… Neste cenário a obrigatoriedade do FORGEP surge como uma bênção para muita gente.

É tão fácil focalizar a atenção no poder político pelo estado das coisas, como é ignorar as responsabilidades de outros intervenientes quando se pretende evitar aprofundar respostas sobre qual a real responsabilidade de cada interveniente na produção de políticas públicas sustentáveis em contextos complexos.

Num país estruturalmente atrasado, vejo outros sectores mais empenhados nessa missão do que o desporto. E no desporto, não é, por certo, às autarquias, apesar dos problemas aqui sublinhados, que se deve apontar falta de empenho.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Impacto Comunicacional

Com menor ou maior impacto, com menos ou mais experiência, sabemos que existem naturais dificuldades comunicacionais entre as pessoas, nas associações, nos grupos, nas equipas, nas organizações, etc.

Possivelmente, nem todos nós temos a consciência da quantidade de informação contida numa mensagem que se ‘perde’ ou ganha outros significados desde do primeiro momento de um acto comunicacional até ao seu término, considerando que passa pela mensagem ser processada por um emissor.

Dividindo o acto comunicacional em seis pequenos passos:
- O que se quer dizer;
- O que se diz;
- O que o outro quer ouvir;
- O que o outro escuta;
- O que o outro compreende;
- O que o outro retém.

os exemplos que tivemos esta semana com a intervenção do Presidente do Comissão de Arbitragem
Vítor Pereira, são notórios, talvez num primeiro nível, da clara má intenção que o ser humano pode atingir, em segundo lugar, do baixo nível que o dirigismo português nesta modalidade possui nos mais diversos cargos e hierarquias.

A partir do momento que um árbitro ou juiz erra, considerando que o faz involuntariamente (dispensa-se qualquer outro tipo de cenários), está claramente a ser imparcial, pois na sua análise condicionou injustamente um atleta ou uma equipa por outrem na tentativa de obtenção de um melhor resultado. O que se tem de fazer para combater esta ‘imparcialidade’ será outra ‘discussão’, como a formação, melhor treino, profissionalismo, maior capacidade de escolha, etc.

Devido à parca qualidade dos dirigentes e outros agentes desportivos, especialmente ao nível das competências softs, que se movimentam melhor na desorganização e num estilo de liderança que tenta dividir para reinar, aproveitaram-se de declarações com pouco ruído para o dimensionar. É caso para afirmar “Precisa-se de empatia. Urgente!”

Por muito que se invista em cimento, em formação ao metro para dirigentes, em receitas copiadas de um sítio para o outro, enquanto não existir o bom senso e a capacidade do dirigente em tentar no mínimo escutar as outras partes, seremos um país cheio de pessoas que preferem ser consideradas interessantes do que interessadas em criar valor.

Prefere-se uma soma negativa ou nula em qualquer abordagem sobre uma opinião ou fundamentação, do que uma perspectiva de construir. Arrisca-se a perder o pouco que se constrói e que se avança, porque o atrito é enorme. Infelizmente, é mais um exemplo de como a evolução é um passo complexo.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Uns pagam,outros usam

Na última semana surgiram novas notícias sobre o efeito nas finanças municipais da construção dos estádios de futebol do Euro 2004.Não vou regressar ao assunto. Mas pegar no tema dos custos de manutenção para um outro que lhe está próximo: o do pagamento do custo de utilização dos equipamentos desportivos públicos. Se no caso dos estádios de futebol a dimensão do desequilíbrio entre custos de manutenção /proveitos atinge valores elevados no caso de outras tipologias a dimensão da diferença é menor. Mas o problema de fundo persiste: quem deve suportar/pagar os custos de manutenção do equipamento desportivo público? É resposta a esta questão que, em parte, deve determinar o que se constroi,com que características e finalidades.
Estes tipos de equipamentos são construídos com dinheiros públicos. Dinheiros que resultam das receitas do Estado (central e/ou local). Receitas que têm uma origem fiscal. Exceptuando os que fogem à tributação todos concorrem para a arrecadação da receita. Mas nem todos vão utilizar aquilo para o qual, os recursos que entregaram ao Estado, vão ser aplicados. A maioria dos que o fazem jamais irão utilizar o equipamento. Mas o seu contributo fundamenta-se numa lógica de construção e funcionamento do Estado social e de benefício para comunidade.
Construído o equipamento deve continuar a ser o contributo de todos a pagar o que só alguns beneficiam ou seja a efectiva utilização do equipamento? A nosso ver não. O custo de utilização deve ser suportado pelo utilizador, tanto mais que nesse custo se não incorporam os custos de investimento. Tratando-se de um equipamento público a “recuperação” do investimento é a sua optimização desportiva e social.
A generalidade dos equipamentos desportivos públicos têm, e bem, um tarifário. E esse tarifário deve ser o que permita estabelecer um equilíbrio entre custos e proveitos. E na óptica do interesse geral não repugna que haja um subsidiação ao preço praticado sempre que os custos operacionais elevem o tarifário para níveis incomportáveis para a generalidade dos utilizadores. E também aceitável que no âmbito das politicas sociais de apoio a grupos carenciados possam existir regimes de excepção que incluam a gratuitidade.
O que é inaceitável é que o que devia ser excepção se transforme em regra. E que os custos operacionais do equipamento tenham de ser suportados por quem o não utiliza. É o que se passa em muitos equipamentos públicos, designadamente, municipais.
E não me refiro apenas no plano do associativismo local, onde essas apoios podem ser entendidos numa lógica de apoio ao tecido associativo, mas a muitos dos eventos de federações desportivas de cariz claramente profissional, independentemente da configuração jurídica das mesmas e das respectivas competições, onde tudo é remunerado –atletas, dirigentes, treinadores, juízes e árbitros –mas onde o uso que fazem dos equipamentos tem de ser suportado por quem deles não retira qualquer benefício.
De resto, interrogo-me como é possível garantir o equilíbrio financeiro da gestão desses equipamentos quando as despesas superam largamente os proveitos. A menos que exista uma folga financeira desconhecida, que mantenha eternamente este sistema.
A generalidade dos municípios mantém este assunto em banho-maria. Pergunto: por quanto tempo?

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

A compra de uns estatutos?

A novela jurídico- desportiva que tem por objecto a revisão estatutária das federações desportivas não deixa de nos continuar a surpreender.
Já aqui fomos dando conta de algumas das melhores cenas (todas seleccionadas).
Na passada quinta-feira o Diário da República publicitou uma outra que merece a atenção.
Antes, porém, é imperioso registar, em abono da verdade, três observações.
A primeira, é a de que o (novo) regime jurídico das federações desportivas, que determina aquela revisão estatutária, se revela – penso ser indiscutível – um instrumento de intervenção pública na organização e funcionamento dessas organizações desportivas sem paralelo no Portugal democrático.
Em segundo lugar, dir-se-á que o Governo (o anterior e o actual), ou se se quiser a Administração Pública Desportiva, é certo que gerindo politicamente prazos e outras condicionantes, acabou por efectivar algum esforço de fiscalização quanto ao conteúdo dos estatutos federativos reformulados. Bem ou mal, de forma exaustiva ou parcial, com maior ou menor rigor jurídico, o certo é que – aparte a propaganda política sempre presente – “as coisas mexeram-se”. Nada disso ocorreu entre 1993 e 2008, na vigência do anterior regime jurídico, vivendo as federações desportivas, ou a grande maioria delas, em desconformidade com o diploma legal então vigente.
Por último, sempre defendi – inclusive ao nível profissional – que a Federação Portuguesa de Futebol, uma das federações desportivas que ainda não concretizou tal revisão estatutária, não se encontra a viver num registo de ilegalidade. Tal, a meu ver, só ocorrerá com o início da próxima época desportiva.

Não é esse, contudo, o entendimento do Governo e da Administração Pública Desportiva, como é público e notório há já alguns meses. Ainda no passado dia 17 de Dezembro, no balanço dos procedimentos de fiscalização das reformas estatutárias das federações desportivas, foi amplamente destacada a situação de ilegalidade em que vive – na perspectiva do Governo – a Federação Portuguesa de Futebol.
Condescente, amigo, compreensivo, o Governo estabeleceu uma nova data limite para a aprovação dos estatutos no futebol: o fim de Fevereiro de 2010.
Vá lá saber-se com base em que critérios. Terá sido valorizado o Carnaval como momento de aprovação?

Sucede que, numa lógica política muito própria, a 30 de Dezembro, veio a ser assinado um contrato-programa de desenvolvimento desportivo entre o IDP e a Federação Portuguesa de Futebol, relativo aos encargos com deslocação, por via aérea, ente o território continental e as Regiões Autónomas, relativas à época 2009/2010, até ao montante de 2 milhões e 100.000 euros, podendo até ser aumentado.
Será um gesto de fé na futura aprovação dos «novos estatutos» no futebol? Uma aliciante compensação financeira, com vista a conquistar os votos das associações distritais e regionais de futebol?
Ao certo não sabemos qual a motivação deste contrato. Sabemos, isso sim, que não foi determinado por questões de princípio e de respeito da legalidade, tal como lida pelo Governo.


domingo, 10 de janeiro de 2010

Verdade desportiva – exibicionismo, farsa e pantomina

Há dias subiu ao palco da Assembleia da República uma peça, encenada pelo oportunismo serôdio. Não foi a primeira vez - nem será a última - que aquela acrópole da nobreza e decência cívicas se viu usada para uma tragicomédia. Só que desta vez a desfaçatez atingiu as raias do absurdo, sendo de pasmar como é que pessoas idóneas e ilustres, de boa-fé e impoluto carácter, se deixaram instrumentalizar para finalidades que podem situar-se nos antípodas das proclamadas.
Mas então a verdade desportiva não é um objectivo que todos devemos acalentar? Não é uma causa que a todos deve inquietar e mobilizar?
Certamente. Todavia a verdade não se passeia nos andores de festas e foguetórios. Mais, não decorre fundamental e automaticamente - qual fruto de geração espontânea! - do emprego de meios tecnológicos. Nem é com o recurso a estes que ela se almeja. A montante disto está a conduta quotidiana dos diversos agentes desportivos. Que compromisso com a verdade têm eles no seu dia-a-dia? Como é o relacionamento com a ética nos seus desempenhos e comportamentos, nas distintas tarefas e actividades que assumem no sector plural do desporto?
Chega de atirar poeira para os olhos dos incautos, ingénuos e bem-intencionados! Acaso um grande número dos jornalistas e comentadores desportivos, que enxameiam o espaço gráfico e áudio-visual, tem formação no desporto? Acaso tem conhecimentos suficientes que legitimem a sua intrusão neste domínio? Ocupar um lugar e abocanhar uma função, sem pressupostos para tal, não é usurpar e faltar à verdade? É mentira que alguns dos protagonistas desta ‘cruzada’ pífia pautam as suas intervenções, comentários e escritos, por fundamentalismo, facciosismo e fanatismo, por grosseiras mistificações, por atropelos ostensivos, por uma manifesta fuga da ética, da verdade e da moral? Os comoventes apelos, as belas palavras e as enganosas encenações produzidas para a sua promoção nos ecrãs não têm correspondência nos seus actos; pelo contrário, são o prolongamento e a expressão da desfaçatez e do modo como fazem jus ao estatuto de actores espertos e ladinos, peritos em ardis e malabarismos de insana índole, em ludibriar e vender gato por lebre.
Constituem a ética e a estética, a verdade e a beleza os fios do prumo do porte de muitos dos propagandistas da dita ‘verdade desportiva’? Têm estes princípios, ideais e valores alguma consideração e espaço na formação, conduta e avaliação dos agentes desportivos, tanto dos que intervêm directamente no terreno como dos que usufruem de acesso fácil ou de lugar cativo no panorama mediático?
Sem ética e estética o desporto não presta para nada de positivo, renuncia ao seu sentido e fim, à sua essência e substância, isto é, deixa de o ser. Mas… encontra esta preposição reconhecimento ou até algum eco na actuação e nas preocupações dos principais agentes desportivos?
Não há ‘jornalistas’ (melhor dizendo, paus mandados) sevandijas, capazes de toda a veniaga, traficância e infâmia, desde a mentira à falsificação, que, sem qualquer escrúpulo e rebuço, atropelam constantemente a deontologia profissional e agem a mando de outrem? Não há dirigentes que saem sempre em defesa de atletas (?) apanhados nas malhas do doping? Não há túneis minados e armadilhados, onde a arruaça e a provocação são propositadamente instaladas e estão particularmente em casa? Não é isto um atentado à verdade? Quão curta é a memória! É por esta não ir além da missa de sétimo dia que tais sujeitos cuidam que os outros também são desmemoriados.
E que dizer dos árbitros que tripudiam a letra e o espírito das regras, permitindo que o jogo decorra a roçar a violência?! Não é isso um flagrante desvio da verdade, da ética e da estética?! Cumpram primeiro a sua parte e então, sim, venham pedir ou reivindicar o apoio de meios tecnológicos.
Estão disponíveis a FPF e a Liga para testar paulatinamente o emprego de tais meios nos jogos organizados sob a sua alçada e, a partir dos resultados atingidos, tentar sensibilizar os organismos internacionais que superintendem na matéria? Se não é esse o caso, o que é que leva os Presidentes daquelas entidades a alinhar no ridículo de montar na Assembleia da República uma mesa destinada a apregoar, impingir e vender tão baixa bufarinha? Será o receio de serem criticados por não aderirem ao politicamente correcto e ao faz-de-conta em que se transformou a vida pública?
Enfim, a verdade é um valor a perseguir afincadamente não só no desporto, mas em toda a nossa vida. Infelizmente, a cruzada aqui em causa tresanda a demagogia, manipulação, populismo e hipocrisia, ao serviço de fins inconfessos. Há sobeja gente, envolvida e inscrita neste circo, que está muito longe de irradiar verdade e parece ter pacto com o seu contrário. Sejamos assertivos e claros: a verdade, no desporto como noutras áreas, não se alcança com espectáculos, engalanados e espampanantes, de grande impacto mediático, mas sim com a firme determinação de a respeitar e cultivar nas pequenas e silenciosas coisas, sem visibilidade e alarde publicitários. Ora sobejam motivos para duvidar das ‘razões’ que presidem a tanta pompa e circunstância. Faça cada um primeiro a sua parte, aquilo que é possível e depende da sua vontade. Concentremos nisso o nosso esforço, mobilizemo-nos para essa pequena grande missão, antes de nos voltarmos para a tecnologia.
Obviamente a busca da verdade é um empreendimento tão relevante que não se deve descartar o auxílio da tecnologia para o concretizar. Mas antes há que assumir, avivar e afirmar convicções básicas, adquirir atitudes, hábitos e rotinas, dar passos e percorrer etapas que casem a alma, a razão e o coração com a verdade. Sem isso nada feito. A inversão dos papéis indicia uma tentativa de abafar uma consciência acusativa da falta de apego à verdade; é legítimo vê-la como uma máscara ou uma prótese cosmética, para encobrir um persistente e impenitente defeito.
Afinal tanta propaganda, tanto estardalhaço e tamanha teatralização podem ser tão-somente a bandeira de uma manobra de ocultação de intenções absurdas e pouco sérias, ausentes do senso e do equilíbrio das proporções e consequências.

Um parceiro credível

A reforma institucional consagrada no Tratado de Lisboa (TL) vem redimensionar o funcionamento da União Europeia. Importa equacionar, nesta nova ordem, ainda que precocemente, o seu impacto na produção de políticas desportivas europeias.

O Tratado põe fim ao sistema de pilares, criado pelo Tratado de Maastricht em 1992, cuja complexidade de gestão política marcava uma Europa a dois tempos: Mais atrasada e politizada nos pilares intergovernamentais em torno da soberania dos Estados membros (Politica Externa e de Segurança Comum e Justiça e Assuntos Internos) e com maior integração, mais regulação e política técnico-burocrática no pilar comunitário - integrado num sistema institucional único com personalidade jurídica, a Comunidade Europeia, - marcado pela política incremental de pequenos passos.

O TL vem aclarar (arts 2.º a 6.º) os domínios de competência exclusiva da União Europeia (UE), de competência partilhada, e fundamentalmente, as políticas onde a União opera em complemento, coordenação e apoio à acção dos Estados – como é o caso das politicas desportivas – as quais são competências próprias destes, não susceptíveis de harmonização.

O reconhecimento da personalidade jurídica da UE, a generalização do procedimento de co-decisão e do direito de iniciativa da Comissão, e a extensão das matérias decididas por maioria qualificada são características do TL que contribuem claramente para a consolidação de uma estratégia politica europeia para o desporto definida no Livro Branco.

Com a institucionalização de uma agenda permanente, acordada pelos ministros europeus responsáveis pelo desporto em Janeiro de 2004 em Dublin, o ciclo das políticas europeias para o sector ganhou uma nova lógica com a definição de prioridades transversais ao longo de várias presidências e concertação da acção dos Estados-Membros, assumindo a Comissão uma posição de destaque ao longo de todo o processo. No fundo, desde 2004, comunitarizou-se a politica desportiva da União.

A difusão de vários grupos de trabalho, o reforço dos mecanismos de consulta e participação dos actores desportivos e a divulgação de estudos e diagnósticos sobre várias dimensões do desporto europeu traduzem a lógica de acção comunitária, marcadamente consociativa, através de uma lógica de produção política passo a passo, que rentabiliza a acção empreendedora e negociadora da Comissão para consolidar os seus objectivos, gerindo os efeitos de spillover e as janelas de oportunidade política que vão surgindo. Disso é exemplo, bem recente, a divulgação do estudo sobre os agentes desportivos na UE e o processo de consulta pública em curso sobre o financiamento das bases do desporto europeu.

Este trajecto, sustentado de baixo para cima em articulação com o mundo desportivo, foi autonomizando o ciclo político-desportivo da UE do diktat dos chefes de Estado que instrumentalizou a Comissão durante anos, profícuo após o caso Bosman com as declarações anexas aos tratados de Amesterdão e Nice e o Relatório de Helsínquia.

O reforço da co-decisão e a consagração do desporto como competência da União criam novas estruturas junto das instâncias decisórias, como é o caso do novo grupo de trabalho sobre o desporto, a funcionar junto do Comité de Representantes Permanentes do Conselho.

A lógica consociativa que tem imperado visa distender os interesses em presença, torná-los mais visíveis e menos dissimulados. A política europeia é tanto mais eficaz quanto mais claros forem os interesses em confronto. O mérito da Comissão tem sido precisamente esse: Expor claramente os vários interesses e negociar as posições numa agenda transparente onde os actores principais são os organismos desportivos e as administrações nacionais, constituindo-se como um parceiro credível para intervir e apoiar a sua acção quando necessário.

Nestes primeiros tempos de alguma incerteza institucional no funcionamento da União é bom ter esta noção bem presente, caso queira manter-se como um parceiro credível. A UE tem no desporto uma competência complementar e de apoio, onde a iniciativa política pertence à Comissão, num quadro estratégico e num plano de acção claramente definidos em torno de um modelo de governação no qual o seu papel é secundário. As memórias de outros tempos em que assim não o foi deixaram marcas num rasto de desregulação e conflito entre as instituições europeias, e entre estas e o mundo do desporto, com profundas consequências.

sábado, 9 de janeiro de 2010

A tomada de decisão

'(...) Perante um público de dirigentes, chefias, coordenadores de equipas e projectos, coloca-se a seguinte questão:

- Imaginem que chegam a casa e os vossos dois filhos discutem porque apenas existe uma laranja em casa e ambos a desejam. Que fariam? Eles perguntam que vocês os ajudem a tomar a decisão de quem fica com a dita laranja. Que fazem?

Ainda não terminei a questão e chovem sugestões!
"- Corta ao meio!
- Ninguém a come!
- Fico eu com ela!
- Quem achou primeiro!
- Quem comeu a anterior não come esta!
(mais um conjunto delas)"

Questiona-se se há mais...e sai a pergunta: "O que ainda não fizeram para tomar essas decisões?". Algum silêncio...e alguém se lembra de dizer "Não perguntámos a razão, porque queriam a laranja". Podemos perguntar a um dos filhos e ele responde-nos "Preciso da casca para fazer um bolo". E o outro "Do conteúdo para um sumo". Muito mais se pode seguir e geralmente, a chegada a esta conclusão demora alguns segundos, ou minutos.'

Não passa de um conto utilizado para estimular esta competência, mas pretende-se fazer o transfer para a realidade que é:
- decide-se rapidamente sem termos as informações básicas para a tomada de decisão;
- as pessoas não querem saber da escuta activa;
- o cargo de chefia e a quem decide exige-se saber recolher informação;
- a partilha entre razões, interesses, vontades e fins, é uma das melhores formas de gestão e concretização de objectivos.

A verdade é que somos estimulados para decidir rápido. Na nossa vida, no nosso trabalho premeia-se quem aparece com a decisão mais rápida e no desporto, os atletas, treinadores, juízes e dirigentes têm de decidir rapidamente, face aos múltiplos acontecimentos que acontecem constantemente.

A decisão deve ser rápida, sim! Mas dentro do timing que possuímos para decidir. Se um árbitro pode decidir em 01'' não precisa de se precipitar em milésimos. Se um atleta verifica que tem 5'' para decidir o que faz, pode recolher mais informação do que se tivesse de decidir em 2''.

Mais uma vez, no dirigismo, não partilhamos informação, sabendo por vezes que a razão e o interesse é o mesmo, mas preferindo ter mais adversários do que parceiros. Duplicam-se esforços, recursos financeiros e outros, baixam-se os impactos das acções e projectos, para finalmente, mostrar-se algo inferior.

Precisa-se de uma visão e missão bem definida para o desporto. 'Apenas' uma certa desorganização de quem faz o quê, e o ainda excesso (ou seja, a existência) de recursos financeiros possibilita sustentar pequenas vontades e permite que os dirigentes desportivos não trabalhem também eles em equipa e em rede.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Sentido das coisas

A importância que o poder local tem tido nos processos de desenvolvimento do desporto é relativamente consensual. O país está mais desenvolvido e essa modificação teve como elemento motor ou charneira, as autarquias locais. Um processo que não foi isento de dificuldades, de contradições e que está longe de estar terminado. Um desenvolvimento que, convém ter presente, não foi suficiente para superar o histórico atraso estrutural.
A situação actual é, contudo, preocupante. Existe um crise de modelos de intervenção, de modelos de financiamento, de modelos de relacionamento com o tecido associativo, das relações com as federações desportivas, com o sector educativo, na concepção e gestão dos equipamentos públicos, nas relações com o sector privado, nas relações com alto rendimento e o espectáculo desportivo. Os problemas são muitos e as experiências conhecidas, em alguns casos, inconstantes e inconsequentes.
Existem autarquias que se organizaram como entidades prestadores de serviços em concorrência aberta com o sector associativo e privado. Outras que se transformaram em serviços de organizações de eventos, sem se perceber o papel que fica para as organizações desportivas e privadas. Outras que são um pouco de tudo: serviço público, clube, escola, federação. Outras que “empresarializaram” as suas competências. Outras que andam à procura de um “modelo”.
Os próprios instrumentos de planeamento e gestão são disso reflexo com a perenidade de fórmulas completamente desactualizadas, seja no apoio ao tecido associativo, seja no planeamento, programação e gestão do espaço. A deriva higienista também fez os seus estragos com um crescente aumento de programas de activismo físico em detrimento do desporto.
A obsessão normativa, tão presente em algumas áreas da organização do sistema desportivo, curiosamente, não tem dada a atenção devida a uma melhor identificação das competências das autarquias em matéria de desporto. O que permite que cada uma faça o que bem entende.
O modo como muitas autarquias esbanjam os recursos públicos no financiamento à dimensão profissional do desporto e no apoio ao espectáculo desportivo continua a constituir um dos traços mais preocupantes do serviço público.
Os investimentos em matéria de infra-estruturas desportivas estão longe de poder ser considerados, em muitos casos, como isentos de uma avaliação negativa. Equipamentos sobredimensionados. Ausência de estudos de sustentabilidade económico-financeira prévios à decisão política. Subutilização desportiva e social.
O trabalho de uma autarquia, sobretudo nos meios urbanos, continua muito condicionado pelo que é mediaticamente relevante. A construção de equipamento desportivo, mesmo que desproporcionado para a realidade local ou escassamente utilizado, é bem mais importante do que, semanalmente, proporcionar a centenas de crianças a aprendizagem de uma modalidade desportiva. Uma rotunda ou uma estátua valem politicamente muito mais, que centenas de jovens em prática regular de actividade desportiva.
A política local continua a construir-se muito à custa do que é visível e o betão ganha à educação e à cultura mesmo quando, no discurso político, a ordem de prioridades procura ser diferente. Mas a realidade não muda por se mudar o discurso.
A comunidade desportiva, os decisores políticos locais, o movimento associativo, os técnicos, bem teriam a ganhar se conseguissem avaliar e reflectir sobre o caminho percorrido e redesenhar os melhores modelos de intervenção para o futuro. Partindo de uma questão base: o que têm as autarquias para oferecer aos seus cidadãos em matéria de prática desportiva e como se devem organizar para esse efeito.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Ganhar mais de 600.000 euros? Nem pensar…


Na vizinha Espanha a famosa e denominada, para muitos, “Lei Beckham”, implementada em 2004, consignava um regime fiscal beneficiador para os trabalhadores estrangeiros com residência fiscal no país, isto é, sobre os seus rendimentos incidiria uma taxa de apenas 24% enquanto para os demais trabalhadores seria de 43% durante um período de 6 anos.
Considerado um regime injusto para com a restante população, o governo espanhol, graças a fortes pressões políticas, decidiu ao fim de cinco anos revogar tal regime, porém, o arrojo foi fraco face à ameaça de greve por parte da Liga de Futebol Profissional Espanhola que alegava a incapacidade financeira dos clubes para cobrir a redução que os seus jogadores iriam ter nos seus salários.

E a intenção de revogação rapidamente passou a uma pequena alteração do regime. Assim, a partir de 1 de Janeiro de 2010, apenas os jogadores que aufiram mais de 600.000 Euros mensais (7,2 milhões Euros anuais) passarão a estar sujeitos à taxa de 43%, mantendo-se para os restantes jogadores estrangeiros a de 24%.

Poder-se-á contar com os dedos de uma mão os jogadores que auferem mais do que aquele montante astronómico (provavelmente C.Ronaldo, Messi, Ibrahimovic, Kaká e Henry) e claro está que a Liga Espanhola continuará a ser uma das ligas europeias com vantagem negocial no mercado de jogadores estrangeiros e a dar-se muito bem com esta política, já que a importação de tantos jogadores estrangeiros nem sequer impediu o progresso da selecção espanhola, campeã europeia em 2008.

Veremos se tal matéria será regulada, e em que moldes, na Lei do Desporto Profissional, cuja preparação há muito se ventila em Espanha. Contudo, os mais de cem milhões de euros evocados pelo Presidente da Liga espanhola como a factura que os clubes teriam de pagar caso vingasse a aplicação da taxa de 43% para todos os jogadores, não representará um apoio, ainda que indirecto, e bem significativo por parte do Estado ao desporto profissional? Por onde pairam as preocupações e interdições da União Europeia a este respeito?

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Todos vendem a alma ao diabo

Este é o segundo de uma série de três artigos de Fernando Tenreiro que a nossa colectividade agradece.

A leitura sobre a carência das ciências
sociais e a ilusão que outras áreas possuem da economia, que é do desporto português, pode ser aprofundada.
Anteriormente referi o peso da ineficácia do legislativo e do político sobre o mercado.
A arquitectura e a engenharia do desporto são áreas cujo impacto no modelo nacional é igualmente nefasto pelo economicismo do seu pensamento de que basta cumprir as equações da engenharia e a arquitectura ser assinada por um arquitecto, para a infra-estrutura não ser um mono e um estorvo para o bem-estar da população. O Euro2004 e o Estádio de Aveiro demonstram o contrário.
Portugal investe centenas de milhões de euros em infra-estruturas desportivas e não produz estatísticas sobre o investimento feito e a sua utilidade social. Não prestam contas do que fazem. Usam o dinheiro e desculpam-se com a lei, as políticas, as acções dos políticos quando questionados. Se se sugere que mostrem as estatísticas da utilização e da adequação às necessidades das populações dizem que não são eles que têm de produzir estatísticas sociais.
Mas há mais.
A engenharia e a arquitectura sabem que as infra-estruturas desportivas são aproveitadas pelas federações, as maiores, que podem criar a relação pecuniária entre determinado tipo de infra-estruturas e o patrocínio das empresas de materiais e equipamentos que acobertam outros fins os quais controlam o local, dimensão, qualidade e oportunidade do investimento, cujos parâmetros desportivos são minimizados. Este processo confunde a utilidade da infra-estrutura para o desenvolvimento desportivo e social e o interesse lucrativo no investimento em betão para os seus beneficiários empresariais. Dada a ausência de políticas dimensionadas em milhões de euros que incentivem as federações a promover o desporto para todos, as federações são entaladas no nicho do alto rendimento e em incentivos lucrativos perversos como no esmagamento dos activos desportivos materiais e imateriais.
Outro exemplo é o dos professores de educação física que confundem a performance desportiva com a missão da educação física. Chumbam os alunos porque estes não realizam bem o gesto desportivo, o que é devido aos campeões, e não avaliam os jovens de acordo com o saber de um estilo de vida activo e o gosto de desporto em todas as suas formas, para toda a vida. Avaliam o estudante como se estivessem numa SAD e não como o cadinho de saberes que perdurarão incluindo a lembrança imorredoura de quem lhes abriu aquele conhecimento sagrado.
Ainda outro, os gestores de desporto sonham tornar-se empresários de ginásios, nos clubes com SAD’s, nas grandes empresas de desporto e esquecem-se de exigir o investimento nos clubes de base e as condições de competitividade e de solvabilidade no mercado do desporto português.
Face a estes três exemplos, que é possível estender ainda mais, a opinião pública no desporto tende a lamuriar-se não sabendo chamar o nome que cada coisa deve ter.
Todos, vendem a alma ao diabo.
É uma arte portuguesa a do desconhecimento, propositado ou não, de como se faz desporto moderno.
O desporto moderno é o desporto que se fez na Europa durante o século XX, que Portugal nunca acompanhou materialmente e que actualmente não faz porque chega a ser negligente e mentiroso.
Se se negligencia, mente e se recebe o pagamento, para quê fazer o desporto que nunca se fez?
O pensamento do desporto português deixa-se corromper pela mentira do ‘orgulhosamente sós’ das tricas políticas.
Há bons profissionais mas do que estou a falar são das condições de trabalho que destroem a eficiência económica do mercado desportivo.
Se e quando fizer desporto moderno Portugal criará projectos que deixem de vender desporto a retalho, para conceber o desporto por inteiro, segundo o saber-fazer europeu.

sábado, 2 de janeiro de 2010

Inteligência Colectiva das Organizações

A inteligência colectiva nas organizações/equipas é um termo que abrange um misto do conjunto das competências dos elementos que compõem o todo e dos processos/dinâmicas criados para potenciar as mais valias dos recursos humanos na concretização dos objectivos propostos. Algo semelhante ao team cognition.

Ao observar as equipas com excelentes performances e com os seus processos equilibrados, quer as desportivas quer em termos organizacionais, deparamo-nos cada vez mais com um conjunto de processos transversais baseados em competências (que deveriam ser) ‘simples’ e, que constituem em muitos casos, a base das relações humanas, de equipa, laborais, etc.

Constatamos que as boas equipas de projecto/trabalho (apenas para as diferenciar das desportivas propriamente ditas) apresentam sintonia nos processos de grupo em competências como:
- Escuta activa/comunicação/assertividade;
- Empatia;
- Confiança;
- Alinhamento (visão, missão, valores, objectivos);
- Envolvimento (I always go the extra mile);
- Responsabilização/Reconhecimento;
- Superação;
- Etc.

Constata-se também que ‘bastará olhar para o lado’ para visualizarmos (e vivenciarmos) grupos de trabalho onde a comunicação não flui, não há a preocupação em saber se a nossa mensagem chegou ao destinatário e a sua compreensão foi de encontro ao nosso objectivo, onde não existe um complemento de objectivos, tarefas, sentimentos contraditórios e longe do ‘amor à camisola’, pouca proactividade ou o não reconhecimento.

Observamos as equipas desportivas que apresentam excelentes resultados desportivos e o que constatamos? Utilizamos o último caso de enorme sucesso, e constatamos que o Barcelona em futebol, vence, convence, supera os seus desafios, dificuldades e adversários, bate recordes e quando ouvimos os comentadores e treinadores a falar do seu sucesso, conclui-se que a magnífica equipa baseia os seus processos nas competências técnicas básicas do jogo de futebol para além da qualidade que os seus elementos individuais possuem:
- Passe, recepção, ‘desmarcação, entreajuda, alinhados num objectivo, dedicação ao clube e empenhados.

Para todos aqueles que foram ou são atletas ou treinadores, quer em desportos colectivos quer em desportos individuais, recordamo-nos de que são esses os princípios que ouvíamos ou tentamos instituir nos atletas. Step by step de forma a garantir os princípios para posteriormente se avançar para a complexidade de processos.

Estranhamente, as organizações desportivas, constituídas por técnicos e dirigentes com um passado desportivo, não conseguem transpor os valores porque se regiam enquanto praticantes desportivos para uma realidade organizacional, falando em Federações, Associações, Clubes, ONG’s, Autarquias, etc.

Certo que existem inúmeras explicações para o sucedido. Outras existirão para comprovar a incapacidade das organizações que trabalham no sistema desportivo em produzirem mais valia, diferenciarem-se e terem ‘jogo de cintura’ para os interesses não alinhados existentes, indo contra os tais valores ou competências softs que enquanto treinadores, vamos insistindo que as equipas e os elementos que as compõem, adquirem.

Somos tentados a concluir que as grandes equipas baseiam os seus princípios processuais e técnicos nos softskills. E que quer em jogo quer no nosso local de trabalho, complicamos em vez de facilitar. Destruímos em vez de construir. E que enquanto não comunicarmos de uma forma clara, concreta e concisa, tivermos a preocupação de compreender o outro, assumirmos a organização e a tarefa como nossa, trabalharmos em prol de um objectivo assumidamente global, muitos dos esforços são em vão, consumidos por obstáculos e adversários que nós próprios alimentamos.

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

Portugal 2010: um país moderno

Portugal é sinónimo de grandeza. De afirmação entre as nações. 2010 é, pois, necessariamente, mais um ano de recidiva de abertura ao Mundo, de modernidade, da comprovação que somos capazes, como os melhores, de empreendorismo desportivo. É bom viver desportivamente neste País.
Tendo terminado, tão inesperadamente como se iniciaram, os ecos da assombrosa afirmação de que porventura seria melhor implodir o estádio de Aveiro – uma pérola desse inesquecível momento de portugalidade que foi o EURO 2004 –, e já em plena campanha para a organização de um Mundial de futebol, eis que de Leiria brotam notícias (já sabidas mas poucas vezes referidas).
O presidente do município admitiu, em Assembleia Municipal – realizada segunda-feira passada – vender o estádio municipal. Para este autarca, o estádio é o grande responsável pela situação financeira da Câmara Municipal.
Existem, contudo, três hipóteses: manter a presente situação, sob a alçada da empresa municipal Leirisport, vender a um investidor privado ou passar a sua gestão para a União Desportiva de Leiria.
O serviço da dívida e as despesas de manutenção totalizam cerca de € 5.000 diários: “Um sorvedouro de dinheiro que devia ser aplicado noutras obras”.
Para Raul Castro, “a venda seria o ideal para a autarquia e para o próprio concelho”, pois assim poderá ter “acesso aos recursos que estão a penalizar gerações futuras”. Raul Castro adiantou ainda que as obras estavam previstas totalizarem 19,5 milhões de euros, mas o custo do estádio, incluindo a aquisição de terrenos, está neste momento “acima dos 90 milhões”.
Mas nada de derrotismo, nem de espírito negativo, ainda para mais num dia destes.
Segundo a LUSA “Futebol português é o mais gastador da Europa no mercado de Inverno”. Em novos jogadores já investimos 17 milhões de euros. Por ora, lideramos, o que é da nossa natureza. Com ou sem petróleo ou diamantes.
Não necessitamos disso. A nossa riqueza natural está no homem português e na sua inesgotável capacidade de ser um homem moderno, positivo. Em 2010, como sempre.