quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Conselho Nacional do Desporto = ??

Um texto de José Pinto Correia que se agradece.
Quando foi criado o Conselho Nacional do Desporto e definidas as suas funções e composição escrevi de imediato que tinha as mais sérias dúvidas sobre a sua capacidade de pensar o desporto português em profundidade e de forma sistémica e que tivesse mesmo alguma possibilidade ou interesse em vir a introduzir com profundidade e documentalmente no nosso sistema desportivo e na governação do mesmo quaisquer contributos valiosos.

Escrevi isto por mais de uma vez à medida que os meses passavam e nada de muito significativo emergia como actividade do CND. Lamentei também que no sítio da Secretaria de Estado do Desporto, na área reservada ao dito Conselho, nada mais constasse do que as agendas das reuniões plenárias e a decomposição em comissões especializadas dos ditos membros do órgão.

Percebi muito cedo que o CND seria apenas uma entidade praticamente decorativa da Secretaria de Estado e que não teria capacidades e vontade de iniciativa própria para pensar os caminhos de desenvolvimento do desporto português.

Se hoje agora formos verificar o que mudou naquele panorama prospectivo que eu então traçava podemos facilmente constatar, compulsando o site da Secretaria de Estado, que o CND não produziu até agora um único documento sobre o desporto por sua iniciativa e que nada mais consta das actividades do CND na respectiva área do referido sítio governamental que não sejam as agendas das reuniões e as tais partições constitutivas das comissões especializadas.

Nem do pomposo anúncio feito há dias na televisão pelo Secretário de Estado sobre um novo modelo de financiamento das federações para vigorar para futuro se vê qualquer indício para que, extravasando as paredes dos corredores do poder ou das salas onde se reúnem os conselheiros, outros possam discutir e reflectir sobre o tal novíssimo modelo de financiamento que pretensamente resolverá muita coisa que o passado dos últimos seis nos foi incapaz de solucionar.

Dirão alguns que sempre existem as actas dos conclaves plenários do CND para validar a sua missão, funções e afazeres pelo nosso desporto nestes anos.

Direi eu que: para um país europeu, republicano laico, democrático, de cidadania activa, exigente, eficaz e eficiente, responsável e transparente, que tem necessidade de melhorar discutindo propostas e projectos, a presença do CND no nosso sistema desportivo e na governação tutelar é praticamente igual a zero!

Portanto, em conclusão, decorrendo do título desta opinião, o CND é igual a zero para o nosso desporto, desde logo para o Governo que o instituiu e acolhe no respectivo sítio electrónico com “reporte minoritário” e também para os agentes mais relevantes do movimento associativo desportivo que dele quase nada têm dito, exigem ou esperam.


segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

No dia seguinte

O mini conselho nacional de desporto que a SiC Notícias transmitiu em directo (20 Dez.) permitiu ao homem do leme do nosso desporto atirar-se às associações distritais de futebol. E mostrar que o resultado, das providências cautelares intentadas contra a suspensão de parte da UPD da FPF,para já, é-lhe favorável por 6 a O. Embora no intervalo-as acções principais vão ainda ser apreciadas - o grito já é de vitória. Fraca consolação. Uma tão grande cabazada ao intervalo não é suficiente para obrigar a FPF, que ficou queda e muda, a fazer o que diploma prevê: alterar os estatutos e conforma-los ao novo regime. E, neste caso, nem o princípio, de que quem paga manda, parece ter surtido o efeito desejado. O homem do leme mandou cortar os financiamentos às associações e o resultado foi o mesmo que antes. Segundo a imprensa alguns dos conselheiros do homem do leme reunidos em conclave no dia seguinte ao dia seguinte sugeriram-lhe medidas mais duras. O que cria um problema de difícil solução. Mais dureza das medidas podem atingir a parte da FPF aliada do nosso homem do leme . Pagará o justo pelo pecador.
O regime, que as associações distritais teimam em não cumprir, foi feito para o futebol. E para retirar o poder aqueles que o não querem ceder. Coisa de que ninguém gosta. Mas se não querem, paciência. Nenhuma lei do país os pode obrigar. Porque o país tem outras leis que os habilitam a funcionar como até data. Pelo que se não trata de desconformidade legal em absoluto. Mas apenas a um diploma em concreto. Resta a quem governa retirar à respectiva federação algum do reconhecimento que ainda tem em sede de utilidade pública desportiva. O país não acaba. E o futebol não desaparece. E pode sobreviver sem qualquer apoio financeiro do Estado. De resto, os resultados financeiros que a FPF apresenta e as disponibilidades financeiras de que dispõe, quase que tornam pornográfica a necessidade de continuar a receber apoios financeiros do Estado. Este bem podia poupar umas boas massas. E respirar para outras latitudes.
O governo, se estivesse para aí virado, também poderia aproveitar para reflectir. Mas o homem do leme do nosso desporto é como o professor Cavaco: nunca se engana. Mas devia pensar que as medidas legislativas que criou para “organizar”e distribuir o poder no seio das federações desportivas, mas feitas a pensar no futebol, não residem na natureza “boa” ou “má” das mesmas. Mas na incapacidade do governo - este ou qualquer outro - para entender que não é ele quem desenvolve o desporto nacional, mas sim os clubes, as federações desportivas e a iniciativa privada. Este erro, de resto, muito persistente no arco governativo do PS/PSD não resiste à evidência do bom senso: se um governo pudesse desenvolver o desporto através de medidas legislativas, não estaríamos no estado em que estamos. Bastaria decretar como o desporto se deveria comportar. E fiscalizar esse comportamento. Mas é precisamente o contrário. Se um qualquer governo quiser ajudar, o que tem a fazer não é andar a mexer na organização associativa e privada do desporto. Deve é retirar todos os entraves para que elas possam livremente operar no sistema. E estimular e apoiar as respectivas actividades desportivas desonerando custos e procedimentos.
Bem sei que dizer as coisas assim é uma verdadeira blasfémia. Operar livremente no sistema? Isso iria permitir que cada um fizesse o que bem lhe apetecia. Não é essa a questão. Mas a de alterar o foco de atenção do Estado. Deixar de estar focado nas condições prévias á produção dos resultados das organizações desportivas e centrar-se numa avaliação de produto desses resultados. O modo como se organizam só é relevante face aos resultados que alcançam. E seguramente que federações desportivas distintas terão tendência a ter formas de organização também distintas.
Tudo isto pode ser lido como provocatório. Sobretudo para quem apresenta como legado governativo um tão vasto rol de medidas legislativas. Mas o caminho seguido não é o único. E está por demonstrar que seja o melhor. Os resultados desportivos alcançados o confirmarão ou não.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

A competitividade das competições

Saiu ontem no jornal 'A Bola' um artigo do Prof. Doutor Pedro Mil Homens sobre competitividade (parte I, informa-se). Interessante o artigo, debatendo ideias que mesmo os menos afortunados academicamente, já lançaram para o debate. Há muito tempo, reforçamos!

Coloca ideias e factos passados noutros países que contribuem para uma maior competitividade em diversas modalidades, embora com enfoque no Futebol, e nos escalões mais jovens. A história de que mesmo nos escalões jovens, deve-se exigir rigor e competição em todas as situações dos torneios, competições e até ao final do jogo, competição, treino, etc, como factor que desequilibra para que alguns países apresentem hoje modelos mais consistentes e que são sustentados pela maior preocupação que as respectivas Federações nas mais diferentes modalidades apresentam.

Ideias de competitividade que devem ser transversais para outros modelos da sociedade. Discussão essa que já vai longa e sem grandes resultados, pois continua a não existir qualquer consenso entre os treinadores dos escalões mais jovens e das Federações. Modelos esse que não promove a competição ou a participação de todos ou desmoralizam os menos fortes ou não criam suficiente motivação para os mais fortes ou que não preenchem todo o ano competitivo ou muitos etcs. E aqui se insere um dos principais obstáculos para chegar a um qualquer consenso.

Ideias que foram lançadas quer por catedráticos quer por treinadores que até possuem pouca formação. É demais evidente que os modelos não funcionam e vão proporcionando poucas sinergias entre os vários segmentos que colaboram para um resultado final. Resultado final que vai proporcionando alguns talentos mais por ‘calorice’ de alguns agentes desportivos que propriamente o sistema competitivo.

No Futebol têm existido mais talentos. Mais por adesão de uma grande percentagem de ‘miúdos’ do que propriamente de uma filtragem de qualidade. Noutras modalidades colectivas os modelos vão sofrendo ainda mais dificuldades. Para não falar dos escalões jovens no género feminino!

Esperam-se alterações (para quando? E com a iniciativa de quem? Com a intervenção do IDP? Estado?). Com eleições previstas para a FPF, que prioridade terá a formação, competição jovem nestas guerrinhas que temos assistido?

Aproveitar para desejar a todos um Bom Natal e um Excelente 2011!

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Desenvolvimento do desporto e financiamento das federações

Um texto de José Pinto Correia.
O Secretário de Estado do Desporto, Laurentino Dias, foi ao “Dia Seguinte” da SIC há poucos dias. Para falar de desporto o “homem do leme” vai a um programa de televisão dedicado ao futebol. E durante mais de uma hora falou longamente sobre o seu desporto de eleição e dedicação, o futebol. Falou e falou de que existem/subsistem os tais problemas de poder de muitos anos na dita Federação Portuguesa de Futebol do Dr. Madaíl, razão para a mesma estar fora da lei e incapaz de dar a volta estatutária que a confirme como entidade de utilidade pública e merecedora das boas graças da FIFA e do Governo.

Mas lá bem quase ao fim de tanta peroração sobre os magníficos meandros, encantos e recantos do nosso futebol, o nosso Secretário de Estado soltou um anúncio luminoso. Qual seja o de que vai agora, ao fim de seis anos de governação, pensar e remediar o desenvolvimento desportivo nacional por via de um novo quadro de financiamento das federações desportivas.

Portanto, para que se resuma o que ali ficou dito pelo nosso governante do desporto:

1. O desenvolvimento do desporto tem a ver sobremaneira com o financiamento das federações sob um quadro de orientação novo a emergir proximamente;
2. O financiamento das federações feito até à data presente foi feito sem esse enquadramento estratégico;
3. O desenvolvimento desportivo em Portugal é sinónimo e medido através dos apoios financeiros às federações;
4. O Conselho Nacional do Desporto, entidade indispensável e valiosa, vai debruçar-se agora sobre esse desenvolvimento desportivo que o Governo lhe enviará.

Para nós nada disto é novidade. Numa Secretaria de Estado que durante seis anos foi incapaz de produzir um documento estratégico sobre o desporto; que se dedicou a legislar e a gerir os meandros do poder do sistema dirigente das federações; que aproveitou o QREN para realizar obras e obras para ficarem como apanágio de uma governação; mas que sobretudo foi incapaz de pensar o desporto para além do seu subsistema competitivo e de lhe dar um envolvimento interdepartamental que reunisse a educação, as autarquias e os movimentos locais de promoção das praticas desportivas.

Uma Secretaria de Estado do Desporto que agora, mais uma vez com este anúncio opíparo, limita o desenvolvimento desportivo nacional ao movimento federado e ao fim de seis anos, sem que tenha produzido qualquer enquadramento e visão global do desporto para o país, vai tentar arquitectar um qualquer algoritmo financeiro para repartir os parcos recursos disponíveis pelas federações, pensando que desta forma simplista e limitada pode originar um qualquer nível indefinido de desenvolvimento desportivo em Portugal.

Quem pode continuar a acreditar nesta fraude, que limita o desporto e o seu desenvolvimento ao que se passa nas federações desportivas? Quando chega aqui o conhecimento e os modelos de desenvolvimento desportivo que estão em vigor nos países do Norte da Europa ou no Reino Unido? Se ainda hoje são desconhecidos na Secretaria de Estado, então que esta os estude com a necessária profundidade e empenho para que possamos ter modelos de desenvolvimento desportivo comparáveis com os desses países europeus!

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Vitooória!!!!!

Uma pobre ave está a caminho de se transformar na grande transferência da época de Inverno do futebol luso. Tudo porque o seu dono aprendeu depressa a arte do negócio futeboleiro. E quis acompanhar os tempos de globalização e não ficar preso ao solo pátrio. Apostou na internacionalização do voo do bicho. E para isso criou um conceito e uma marca. E franchizou-a.
O que deveria ser objecto de incentivo das instâncias nacionais apostadas no aumento das exportações – dado tratar-se de um caso de sucesso -corre o risco de ser, uma vez mais, uma oportunidade perdida. No próprio dia dos acontecimentos o director de comunicação do clube com aquela voz grave e ponderada que lhe vem dos tempos em que assessorava o Dr.Sampaio deu explicações ao país. A entidade patronal - empresa cotada na bolsa de Lisboa -emitiu já uma comunicado. Á data que escrevemos não se conhece ainda a reacção dos mercados. E qual a influência na cotação das acções e no comportamento do PSI20.Mas é de prever a resposta à situação de crise que apanhou todos desprevenidos. Entretanto o advogado do trabalhador e dono do bicho prepara uma resposta. No meio contam-se agressões embora as versões sejam desencontradas. Como na questão do ovo e da galinha há dúvidas sobre quem começou. E a síndrome do túnel não parece afastar-se daquelas paragens.
O que já não parece haver dúvidas é que o trabalhador e dono do bicho ganha um balúrdio. E que Teixeira dos Santos lhe não tinha previsto qualquer redução salarial. O que se compreende. Podia ser acusado de facciosismo. E,por outro lado, apesar de só actuar em público de quinze em quinze dias e em média três a cinco minutos tem de treinar, provavelmente treinos bidiários, e o bicho tem de se alimentar. E para fazer aqueles voos não é a comer alface e cenouras.
O problema é de tal gravidade que há mesmo quem pense em apresentar queixa às autoridades europeias. Parece que é intenção pedir uma audiência à deputada Ana Gomes atendendo à sua experiência na matéria de queixas por aquelas bandas. Embora a sua especialidade seja a de navegar debaixo de água e da ave seja a de voar nos céus, à partida não parece haver problemas. A presença de presidente do clube numa sessão de um dos candidatos à presidência da república faz supor que tenha aproveitado a circunstância para dar um palavrinha ao candidato sobre o assunto. E a forma alegre como foi descoberto pelas câmaras da televisão, presentes no local, leva a admitir que o seu propósito tenha tido acolhimento. Não espantaria, de resto, que ao assunto fosse tema da campanha presidencial.
A imprensa especula que o clube procura já no mercado uma alternativa. Ignora-se se com ou sem a ajuda do conhecido Jorge Mendes. O clube está no entanto em pressas e quer comprar pelo seguro.Experiências passadas assim o aconselham. Neste caso a concorrência habitual não parece constituir qualquer perigo. O facto de no passado um Falcão ter sido desviado para o Porto não parece repetir-se dado tratar-se de uma outra espécie avícola. O problema principal está sobretudo na valorização futura do activo: uma águia jovem mas como boa margem de progressão ou uma águia adulta. Algo que certamente a imprensa de fim-de-semana não deixará de equacionar avaliando os diferentes cenários.
O que parece estar fora das cogitações do bicho e respectivo dono é um pedido de audiência com carácter de urgência ao homem do leme do nosso desporto.Ele bem gosta de se meter em tudo.Mas o assunto é mais do âmbito zoológico e não parece caber nas matérias recorríveis para o Tribunal Arbitral de Desporto. Mas nunca se sabe. Somos um país de surpresas.E Natal e sempre que um homem quer!

sábado, 18 de dezembro de 2010

Questionar preconceitos

A história do desporto moderno encontra-se inevitavelmente marcada pela instrumentalização do seu potencial de mobilização social e activismo político. Ao serviço de ideologias totalitaristas ou nacionalismos extremados, no combate à discriminação racial ou na promoção da paz e do desenvolvimento, o desporto é um catalisador para a acção em torno desses objectivos políticos.

Nem sempre explorada com o rigor científico que lhe é devido a geopolítica desportiva é um tema na ordem do dia. No que respeita à integração do desporto nas políticas para o desenvolvimento e para a paz, procurou-se anteriormente neste espaço apresentar, em traços gerais, a estratégia e o labor das organizações internacionais neste domínio, em particular no seio do denominado sistema das Nações Unidas (NU), tendo em atenção que se tratam de acções humanitárias e cívicas implementadas através de inúmeros projectos apoiados e desenvolvidos pelas diversas organizações das NU nos locais mais remotos do planeta longe de dos holofotes mediáticos.

No entanto, a realização do Campeonato do Mundo de Futebol este ano, pela primeira vez num país em desenvolvimento, constituiu uma oportunidade única para a comunidade internacional explorar o acontecimento em favor do desenvolvimento do continente africano. O recente relatório do Secretário-geral reporta a estratégia das Nações Unidas implementada antes, durante e após o evento, clarificando, por um lado, o quadro institucional criado no seio das NU para uma abordagem concertada sobre o desporto ao serviço do desenvolvimento e da paz no reforço da cooperação e coordenação entre os organismos das NU, com os Estados Membros, as federações e organizações desportivas, bem como as organizações governamentais e não governamentais, mas também, por outro lado, na elaboração de políticas, mobilização de recursos e avaliação do seu impacto ao serviço do desenvolvimento e da paz, de acordo com o Plano de acção trienal estabelecido em 2006 aproveitando o ímpeto gerado no âmbito do Ano Internacional do Desporto e da Educação Física, e do seu relatório intercalar.

A leitura serena deste documento, que fecha o plano de acção sobre o desporto ao serviço do desenvolvimento e da paz, permite aquilatar, com maior acuidade, o trabalho implementado em vários continentes, o roteiro institucional no seio das NU e os programas nacionais desenvolvidos em torno do desporto para consolidar objectivos de saúde pública, educação, resolução de conflitos e manutenção da paz - o desporto é uma linguagem universal para mediar o acesso a comunidades em conflito -, mas também os obstáculos encontrados na sua prossecução e sustentabilidade no seio dos programas das Nações Unidas e suas orientações estratégicas e políticas.

Aliás, como em tudo na cena política internacional, o despertar de consciências nos últimos tempos para o reforço deste valor do desporto no âmbito das políticas de desenvolvimento, tem uma agenda política iniludível que se prende com os Objectivos do Milénio, cujas metas para 2015 parecem, neste momento, de difícil alcance. Com efeito, o relatório em apreço é submetido à Assembleia Geral nos termos da Resolução 63/135, a qual reconhecia “a necessidade de maximizar o potencial do desporto para contribuir para alcançar os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio das Nações Unidas”.

Assim, sem surpresas, o movimento olímpico - com um novo estatuto político de maior relevo reconhecido no seio das NU - e o Secretário-Geral das NU correm atrás do tempo perdido, e exortam ao dinamismo de projectos desportivos locais ao serviço da agenda do desenvolvimento e dos oito objectivos - políticos - do milénio, como se comprova da resolução saída da Assembleia Geral de Novembro cujo principal desígnio visa, no compromisso de acelerar o cumprimento daqueles objectivos, reforçar o peso político do desporto no seio do sistema das NU, através dos eixos estratégicos delineados no quadro de acção ao longo dos últimos três anos.

Contudo, apesar do potencial reconhecido ao desporto em integrar minorias étnicas, emigrantes e populações específicas esbatendo focos de discriminação estrutural, pode ser, paradoxalmente, um veículo privilegiado para a sua replicação e reprodução de manifestações de discriminação directa e indirecta.

As visões apriorísticas do desporto como indutor - por geração espontânea (?) - de resultados sociais positivos que por aí medram no discurso político-desportivo são meio caminho andado para se alcançarem efeitos em sentido oposto, bem graves em momentos de maior agitação social como se prevêem.

Que a análise dos resultados ao nível dos países desenvolvidos da UE possa servir de exemplo para, pelo menos, questionar preconceitos e reflectir sobre as interdependências entre políticas sociais, educativas e desportivas, não só em países em desenvolvimento.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

O Natal de 2010 e o Desporto

Publicamos e agradecemos mais um texto da autoria do Fernando Tenreiro


O milagre dos resultados desportivos é algo que os portugueses não devem esperar.

A investigação económica, que fiz recentemente para a Faculdade de Desporto do Porto, permitiu-me identificar três funções de produção que se interligam em cadeia para produzir desporto de acordo com os princípios de política da União Europeia. O modelo económico que construí, desenvolvendo os contributos de Stefan Kesenne, de Chris Gratton e Peter Taylor e de Paul Downward, pode ser quantificado com dados preliminares da União Europeia e com os dados nacionais.


O Eurobarómetro é o primeiro instrumento com resultados da prática desportiva das populações que comummente são a prática desportiva informal que está na base da pirâmide. A distância de Portugal à média europeia mede-se em 19 pontos percentuais correspondendo a 1,9 milhões de praticantes desportivos.

As duas funções de produção seguintes são a recreação e o alto rendimento que constituem a prática formal identificada com a actividade das federações desportivas. Quanto à recreação o défice de Portugal é de 12 pontos percentuais ou 1,2 milhões de praticantes segundo dados genéricos das federações. Se os valores do alto rendimento forem de 3% para a Europa e de 1% para Portugal, cerca de 5 mil praticantes, porque estes números ainda são incertos, o nosso défice de alto rendimento será de 2 pontos percentuais. O valor percentual de défice é o mais baixo e corresponde ao valor mais longínquo de se atingir. O valor corresponde a multiplicar por três os actuais níveis de intensidade do capital humano desportivo nacional e que é o mais sofisticado em todas as dimensões.

O desporto de Portugal não está preparado para a crise económica e orçamental, para resolver estes três défices desportivos porque lhe falta o conhecimento, a capacidade de debate, as estruturas de literacia científica e técnica avançada que os países europeus possuem quando se apresentam nas competições globais. As faltas organizativas, institucionais e de comportamento e debate científico e técnico das universidades aos campos de treino são as metas a definir e a trabalhar para que os défices que agora são visíveis sejam trabalhados e desapareçam.

No curto prazo resta-nos um milagre e, mesmo assim, seria aconselhável esperar sentados mesmo que trabalhando afincadamente em todos os níveis.



Bom Natal a Todos.
Fernando Tenreiro

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Um compromisso de todos?

Não sei se é ter receio de compromissos ou não, mas gostamos pouco de estar comprometidos com o quer que seja: pessoas, resultados, objectivos, etc. Por outro lado, devemos ter a noção que apenas comprometendo as pessoas com outras pessoas (mesmo abordando apenas a questão profissional) podemos alcançar resultados, objectivos, fins! Existe um equilibrio entre não querer estar e querer estar comprometido. Os perigos de não comprometermos as pessoas com os nossos objectivos, resultados, ambientes é bem superior ao comprometer.

Comprometendo, existe uma percentagem mais elevada dos meus passarem a ser meus e deles. Nossos! Quem não sabe o que se passa, a razão para que estão a trabalhar ou esforça faz com que não seja prioritário, crie desinteresse, não dê o extra-mile e coloque outros factores à frente dessas funções que atribuem. Para além…de não saber, especular.

Uma simples alteração na abordagem modifica quase exponencialmente a atitude e comportamento do outro. Para melhor. Sabermos para onde se dirige ou queremos que se dirija o barco é mais do que suficiente para: criar trocas de ideias e quem sabe criação de mais valor, mesmo que exista discórdia existe por algo em concreto e não do desconhecido, existe um mapa e bússola, existe um reconhecimento com algo. Algo mais do que suficiente para altera a abordagem de quem quer alcançar um objectivo e necessita de outros para os alcançar.

Afirma-se que a cultura está a mudar de uma economia Keynesiana, (top-down) em que o Estado "toma conta" de nós para uma economia Schumpeteriana, (bottom-up) assente na inovação produzida pela pessoa incluindo outras nos seus objectivos e projectos. Não sei onde encaixar a estratégia do sistema desportivo em Portugal, mas poucos sabem se existe e qual é a estratégia em prática para o desporto, bem como o que se pretende e onde queremos estar daqui a uns anos. Para quem anda em micro e macro sistemas desportivos, não consegue com a necessária certeza saber se o que faz se insere ou não num objectivo global. Ou consegue-se?

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

In memoriam,Albino Maria

A Escola Superior de Desporto de Rio Maior assinalou no passado dia 7 de Dezembro o 13º aniversário. E aproveitou a cerimónia evocativa para atribuir o prémio de investigação sobre gestão desportiva designado Prémio Albino Maria. Uma iniciativa a que se juntaram as Câmaras Municipais de Santarém e Rio Maior e a família. O júri distinguiu o trabalho apresentado por Carlos Januário que estuda as linhas orientadoras das políticas desportivas dos municípios da área metropolitana do Porto.
Homenageou-se alguém que a vida prematuramente levou e que marcou de modo indelével aqueles que com ele tiveram oportunidade de privar ao longo de uma vida profissional dedicada ao desporto e à causa pública.
O Albino Maria foi um exemplo pouco vulgar nos tempos que correm. Um homem simples mas de elevada probidade intelectual, de honestidade profissional e de integridade moral. Apesar de nascidos na mesma terra e termos idênticos percursos académicos a diferença de idades fez com que só o conhecesse por motivos profissionais. E apesar de nos tratarmos por tu, ele fazia questão de se me dirigir de um modo excessivamente formal sempre que estávamos fora do circulo de amigos. Julgo que o fazia por um questão de formação e de respeito. Acompanhei à distância a sua vida como atleta, como dirigente desportivo e como autarca. Soube da importância que teve para Silvino Sequeira no trabalho de infra-estruturação desportiva de Rio Maior e na Associação Nacional de Municípios. Mas foi quando tive oportunidade de com ele trabalhar directamente que avaliei a sua dimensão humana e o sentido de missão de serviço pública que praticava. A forma, por vezes febril, como se envolvia nos projectos e como procurava ultrapassar as dificuldades fazia dele um resistente. E um trabalhador incansável. Discreto, mas eficaz. O modo como se entregou à gestão e direcção do Complexo Desportivo do Jamor, o legado que recebeu, as condições em que teve de trabalhar e a insuficiência de recursos que com que foi confrontado nunca o esmoreceram. Testemunhei-o em muitos momentos e lamentei, mais tarde, as condições em que o levaram a renunciar ao seu labor e a regressar à actividade em Rio Maior. A cidade ficou a ganhar. Receio bem que administração pública desportiva não possa dizer o mesmo. Gente como o Albino Maria que servia sem se servir; que dava sem nada esperar para além do reconhecimento do trabalho realizado; que vivia com enorme intensidade, profissionalismo e dedicação as suas obrigações públicas não são muitos comuns. E o que é um bem escasso deve ser aproveitado. Infelizmente as curvas da vida nem sempre permitem reconhecer e valorizar em vida o mérito de quem dele é merecedor.
Mesmo perante a doença galopante não deitou a toalha ao chão. Ia sabendo notícias através do Alfredo Silva. Imaginava-o débil. Mas foi um Albino Maria confiante que reencontrei num almoço em Santarém e que juntou vários amigos dos tempos do IDP. Soube tempos depois que a doença lhe não dava tranquilidade. E que fazia constantes deslocações à Alemanha. E sempre temi um reencontro. Sobretudo a partir do momento em que os nossos percursos já não eram só profissionais. Avaliava o drama dele através da minha própria situação de vida. Mas reencontrei-o. Em Tavira apoiado na sua companheira e mãe dos seus filhos.Com o mesmo entusiasmo de sempre. Embora o corpo, ele que sempre foi um homem bonito e elegante, já desse sinal de fraqueza. Mas não desistia. Mais tarde em Ansião, onde então o corpo da doença já não era apenas a doença escondida algures numa parte do corpo, lá estava ele, de canadianas, com um braço quebrado, amparado, pelo Manuel Mendes, única forma de se poder deslocar. E aí chorámos os dois. Mas a esperança ainda o não tinha abandonado. Tinha medo. Mas uma vez mais resistia. E contava-me que se iria deslocar novamente à Alemanha para fazer análises. Ele fez a sua comunicação. Eu não consegui assistir. Meti-me no carro e regressei a casa. Nesse dia a imagem que dele retive nunca mais me abandonou. E as suas palavras não mais as vou esquecer.
Um grande profissional mas acima de tudo um bom homem. De quem tenho imensa saudade. Da sua fraternidade. Da sua amizade. Do seu companheirismo. Da sua simplicidade. E de quem sou devedor de inúmeras manifestações de estima. E de apoio. Se amigos são aqueles que ficam quando todos os outros se vão embora o Albino Maria foi um dos que sempre ficou.
Um morto amado nunca acaba por morrer, escreveu um dia Mia Couto. E é bem certo. Sobretudo enquanto houver alguém vivo que se lembre. A sua memória e o seu exemplo continuarão entre nós. Até um dia, Albino!

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

A dimensão do desporto profissional americano

Um texto de Luís Leite.

Em Portugal criou-se há muito a ideia de que o futebol é a modalidade com mais interesse a nível mundial e que movimenta mais dinheiro.
Uma pesquisa na Internet levou-me à descoberta dos jogadores mais bem pagos do mundo nas modalidades colectivas em 2010.
Trata-se aqui apenas de vencimentos, não estando incluídos prémios ou contratos publicitários.
Cristiano Ronaldo, o futebolista mais bem pago do mundo, é apenas o 33º da lista, que diz respeito, unicamente, a modalidades colectivas.

(valores em USD)
1 Alex Rodriguez 33.000.000 Baseball
2 Philip Rivers 25.556.630 American Football
3 Kobe Bryant 24.806.250 Basketball
4 CC Sabathia 24.300.000 Baseball
5 Derek Jeter 22.600.000 Baseball
6 Jay Cutler 22.044.090 American Football
7 Mark Teixeira 20.600.000 Baseball
8 Rashard Lewis 20.514.000 Basketball
9 Eli Manning 20.500.000 American Football
10 Johan Santana 20.144.708 Baseball
11 Miguel Cabrera 20.000.000 Baseball
12 Carlos Beltran 19.401.571 Baseball
13 Kurt Warner 19.004.680 American Football
14 Alfonso Soriano 19.000.000 Baseball
15 Carlos Lee 19.000.000 Baseball
16 Ryan Howard 19.000.000 Baseball
17 Carlos Zambrano 18.875.000 Baseball
18 Ichiro Suzuki 18.000.000 Baseball
19 Kevin Garnett 18.800.000 Basketball
20 Tim Duncan 18.700.000 Basketball
21 John Lackey 18.700.000 Baseball
22 Manny Ramirez 18.695.007 Baseball
23 Barry Zito 18.500.000 Baseball
24 Torii Hunter 18.500.000 Baseball
25 Michael Redd 18.300.000 Basketball
26 Magglio Ordonez 17.825.976 Baseball
27 Pau Gasol 17.822.187 Basketball
28 Andrei Kirilenko 17.822.187 Basketball
29 Todd Helton 17.775.000 Baseball
30 Gilbert Arenas 17.730.694 Basketball
31 Yao Ming 17.686.100 Basketball
32 Kelvin Hayden 17.480.000 American Football
33 Cristiano Ronaldo 17.420.000 Futebol

O clube que paga mais em ordenados de jogadores é, a grande distância, os New York Yankees (Baseball) com 206.333.339 USD (153.718.337,56 Euros).
A MLB (Liga profissional americana de Baseball), com 30 clubes, paga este ano 2.730.601.585 USD (2.047.951.188,75 Euros) só em ordenados de jogadores.
A NBA (Liga profissional americana de Basquetebol), com 30 clubes, paga este ano 2.010.189.550 USD (1.497.591.214,75 Euros) também só em ordenados de jogadores, mas não passa da 3ª Liga que mais gasta em vencimentos, atrás da NFL (Futebol Americano), com 32 clubes, cujo valor exacto não foi possível apurar, por várias razões, mas anda à volta dos 2.500.000.000 USD.
Nos Estados Unidos estes valores são mesmo reais e não há hipótese de fuga aos impostos.
Quanto ao futebol, os dados não estão disponíveis na Internet, por razões óbvias.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

A melhor e sem custos

O milagre podia ter acontecido na passada quinta feira. Bastaria que a candidatura ibérica, a melhor de todas segundo o homem do leme do nosso desporto, tivesse logrado a organização do mundial de futebol. Mas Putin não deixou. E parece que jogou forte. Como escreveu José Lello: quem paga, ganha. O homem do leme do nosso desporto já tinha garantido que o país não ia gastar um euro. Ou seja não pagava. Supõe – se, de resto, que as viagens, deslocações e estadias que entretanto realizou para apresentação da candidatura tenham sido suportadas por outro bolso que não os cofres públicos E embora para o final já admitisse que tinha de pagar os custos de segurança, ainda não estimados, a coisa era dinheiro em caixa. E mais emprego. E camas ocupadas. E mais turismo. E transportes. E os inevitáveis reflexos para a boa imagem do país.
De repente o país político transfigurava-se. A crise tinha abalado. Havia uns patuscos que achavam que a nossa parcela (leia-se número de jogos em solo pátrio) era pequena comparada com Espanha. Quanto ao resto tudo bem. E no mar de dificuldades em que vivemos o centrão político deu um ar da sua graça. O governo cumpriu os mínimos. Sem grandes euforias. A surpresa veio do lado dos PSD´s do futebol e afins. A defender algo inédito: o investimento está feito e o retorno é imediato. Sem risco. Cavaquistas desembainharam os argumentos e esqueceram por momentos as palavras do dito a propósito do evento. Todos a defenderem a causa .E a demonstrarem que o tempo em que o PCP tinha o monopólio das cassettes já passou. A imprensa desportiva fez o óbvio: render o peixe que a ajuda a sobreviver. E para que a coisa tivesse ainda maior rigor científico houve até um estudo académico a demonstrar “a+b” que era dinheiro em caixa. Parece que havia o compromisso do TGV, de que falou Zapatero, mas por cá a coisa passou não fosse transtornar as relações com o parceiro de orçamento. Nem se falou do assunto. O estudo dizia que era preciso gastar uns milhões. Mas se o mesmo estudo previa que o número de milhões a entrar era bem maior o assunto estava arrumado. E havia ainda o valor da marca “Portugal”. E o contributo para o PIB. Tudo, como sempre, boas causas.
E, por isso, foi um futebol politicamente unido que fez frente à poderosa FIFA. O homem do leme do nosso desporto, o patrão do futebol e o representante dos trabalhadores fardaram-me a rigor. Colocaram a mesma gravata. E demonstraram que, afinal, os estatutos da federação não são motivo impeditivo para todos estarem irmanados pelas grandes causas futebolísticas nacionais. Sentido de honra? Defesa de princípios? A parte ilegal da federação cedeu o seu lugar à realpolitik .O governo legitimou. O governo esqueceu a parte ilegal da federação. Esta agradeceu. Para quê complicar?
É dos livros. Sempre que Portugal se candidata a organizar qualquer coisa, a “coisa” paga-se a si mesma. E ainda dá lucro. Foi assim com a Expo. E com o Euro 2004.E com estudos para um candidatura aos jogos olímpicos. É o espírito scut. O problema é quando se enceram as contas. As previsões saem falhadas. O que talvez ajude a explicar que tão lucrativos projectos não consigam arrancar sem o chamado apoio político. Que trocado por miúdos quer dizer dinheiros públicos.
Com excepção de Barcelona, e respectivos Jogos Olímpicos, está para surgir o primeiro grande evento desportivo internacional, tipo europeu/mundial de futebol ou jogos olímpicos, que não seja um descalabro financeiro para o pais ou a cidade que os acolhe. E o oposto: um lucrativo resultado para a entidade que os organiza (UEFA/FIFA ou COI).
A literatura é abundante a demonstrar que a organização de um mundial de futebol cria valor. Ganha-se muito dinheiro. Mas também se perde. O que é mais lucrativo - direitos televisivos e contratos de sponsorização - ficam na Suiça. Limpos e isentos de impostos. O resto se verá. O resultado final é conhecido. Bom para a FIFA (ou UEFA). Bom para a federação nacional e negócios que na sua orbita prosperam. Mau para as finanças públicas dos países que acolhem. Se estamos enganados que surjam os bons exemplos.
É preciso rever muita coisa na organização do futebol, dizia consternado Gilberto Madail. Compreendo-o. Quem o convenceu que uma candidatura que não constrói uma dezena de novos estádios tem vantagens comparativas face uma outra que se propõe fazê-lo?
Quando - agora na FIFA, no passado no COI- os senhores do mundo se plantam frente a uns vetustos decisores desportivos a pedirem uma decisão favorável aos seus projectos, o que tem de ser repensado não é a organização do futebol(ou do desporto). É a relação da política com os negócios do futebol (e do desporto).

domingo, 5 de dezembro de 2010

Um despacho para além do transitório?

Dê-se conhecimento, para quem da matéria esteja inteirado – o que não é seguramente o meu caso –, do alcance de recente despacho do Presidente do IDP sobre os profissionais responsáveis pela orientação e condução do exercício de actividades físicas e desportivas.

Como é sabido o Decreto-Lei n.º 271/2009, de 1 de Outubro, veio definir o regime jurídico da responsabilidade técnica pela direcção das actividades físicas e desportivas desenvolvidas nas instalações desportivas que prestam serviços desportivos na área da manutenção da condição física (fitness), designadamente aos ginásios, academias ou clubes de saúde (healthclubs), independentemente da designação adoptada e forma de exploração, bem como determinadas regras sobre o seu funcionamento (artigo 1º).

Dois aspectos importantes do diploma respeitam à qualificação dos directores técnicos e dos profissionais responsáveis pela orientação e condução do exercício de actividades físicas e desportivas.
Para o director técnico, entre outros requisitos, exige-se o grau de licenciado na área do Desporto ou da Educação Física (artigo 7º, nº 1).

O mesmo grau é exigido para os restantes profissionais (artigo 13º, nº 1).


Contudo, o artigo 27º do diploma vem estabelecer um regime transitório.
Para o que agora interessa reter, os nºs 3 e 4 deste preceito, dispõe do seguinte modo:

1. Os profissionais responsáveis pela orientação e condução do exercício de actividades físicas e desportivas que não fossem licenciados, nas áreas indicadas, dispunham de 90 dias, após a entrada em vigor, para requerer junto do IDP, I. P. o reconhecimento das suas competências actuais obtidas através de:
a) Qualificação, na área do desporto, no âmbito do sistema nacional de qualificações;
b) Experiência profissional na orientação e condução do exercício de actividades físicas e desportivas;
c) Reconhecimento de títulos adquiridos noutros países.

2. Para os profissionais que venham a ser titulares de qualificação, na área do desporto, no âmbito do sistema nacional de qualificações podem, igualmente, no prazo de dois anos contados da data de publicação do presente decreto-lei, requerer junto do IDP, I. P., o reconhecimento das competências entretanto adquiridas.


Como é bom de ver, dois regimes transitórios: um dirigido ao passado e outro visando acautelar situações futuras, como dá bem conta, aliás, o texto preambular do decreto-lei.

Vejamos, agora, o que afirma o Despacho nº 16766/2010, de 25 de Outubro e publicado no passado dia 5 de Novembro:

“1 — Considerando que:
a) O Decreto-Lei n.º 271/2009, de 1 de Outubro, define o regime jurídico da responsabilidade técnica pela direcção das actividades físicas e desportivas desenvolvidas nas instalações desportivas que prestam serviços desportivos na área da manutenção da condição física (fitness), designadamente aos ginásios, academias ou clubes de saúde (healthclubs);
b) Um dos objectivos do regime transitório estabelecido por este diploma, conforme atesta o próprio preâmbulo, é possibilitar a todos os profissionais que não preencham os requisitos nele previstos, durante o período transitório, o reconhecimento das suas competências;
c) Ao longo das últimas décadas foram aceites pelo mercado, de forma a dar sustentabilidade ao mesmo, um conjunto de cursos de formação profissional, realizados por entidades de reconhecida credibilidade no sector e reconhecidas pela Direcção -Geral do Emprego e das Relações de Trabalho (DGERT);
d) Por outro lado, a partir da data de entrada em vigor deste diploma, o exercício de funções dos profissionais nesta área é certificado através de cédula, estabelecendo o n.º 5 do artigo 27.º que a obtenção da cédula é conferida através de despacho do presidente do IDP, I. P., ouvidas as associações socioprofissionais do sector.
2 — Nestes termos, determina -se
a) Para efeitos do disposto no artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 271/2009, de 1 de Outubro, as qualificações conferidas pelas entidades que, à data de entrada em vigor do referido diploma, estivessem certificadas pela DGERT e que preencham os requisitos do número seguinte, são consideradas como suficientes para obtenção da referida cédula;
b) Para efeitos do disposto no número anterior, são considerados os cursos de formação inicial ministrados por aquelas entidades, desde que os mesmos tenham uma carga horária igual ou superior a 100 horas;
c) Para efeitos do presente despacho, as entidades que queiram ver os seus cursos reconhecidos, deverão enviar ao IDP, I. P., comprovativo da carga horária, as datas de início e de fim, e a listagem nominal dos formandos que obtiveram aproveitamento nos mesmos;
d) A medida referida na alínea anterior produz efeitos a partir da data de publicação do Decreto-Lei n.º 271/2009, de 1 de Outubro”.

Estar-se-á mesmo a cumprir o determinado na lei?

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Londres 2012: Uma competição sem importância

Um texto de Luís Leite.


Este país está cada vez mais futebolizado.
A cultura desportiva, em vez de crescer e melhorar, é cada vez mais frágil.
O interesse da população em geral no que respeita ao desporto, ao que parece, limita-se à vida de José Mourinho, Cristiano Ronaldo, e ao momento dos 3 grandes (FCP, SLB e SCP), a que se juntaram agora os vários clubes estrangeiros em que militam jogadores portugueses.
O resto, praticamente não tem qualquer relevância.
O Comité Olímpico de Portugal limita-se a distribuir bolsas de preparação olímpica aos atletas que vão sendo integrados.
Entretanto, o recém-nomeado Chefe de Missão Olímpica, declarou, um mês depois da sua nomeação, que já tem definido o perfil do seu adjunto. Bravo!
A pouco mais de ano e meio dos Jogos de Londres, a preparação da Missão Olímpica está no ponto de partida.
É o desinteresse total.
Dos Jogos só se falará, nos Órgãos de Comunicação Social, nas vésperas da partida para Londres.
Para onde enviarão, outra vez, jornalistas completamente ignorantes sobre aquelas estranhas modalidades.
Vicente Moura agora já não arrisca previsões.
O Governo não revela a menor preocupação. O que tinha interessado mesmo era a organização do Mundial de Futebol.
Eu arrisco uma previsão:
Dado o estado actual do Desporto Português, em plano inclinado, arriscamo-nos a sair de Londres sem qualquer medalha.
O que nos colocará, definitivamente, no grupo dos mais atrasados da Europa, com a companhia exclusiva dos micro-estados.
Com a população que temos, deveríamos apontar para 5 a 7 medalhas, o que significaria ter 15 a 21 medalháveis.
Mas ninguém se importa.
Pois se podemos ter dezenas de medalhas nos Paralímpicos…
O que interessa, para já, são os eventuais reforços futebolísticos de Inverno.
Em Agosto de 2012, após os Jogos, alguém irá culpar a crise financeira pelos maus resultados olímpicos.
De que se falará durante uma semana, no máximo, em simultâneo com os eventuais “reforços” dos 3 grandes para 2012/2013, que continuarão a encher as capas dos jornais desportivos, diariamente, com nomes de jogadores sul-americanos desconhecidos.
E o Benfica e o Porto deixarão de jogar com 9/10 estrangeiros. Passarão a jogar com 11.
É a paixão pelo Futebol…

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

O individual e o colectivo

Algumas modalidades desportivas, pelas suas características e 'catalogação' de modalidade individual, vivem o treino com o desafio de - isoladamente, quando os há - inserir objectivos de equipa na modalidade em que a prática é quase sempre individual na competição.

Atletas que são treinados e 'formatados' a valores individuais e de um momento para o outro, a obtenção do objectivo passa a incluir uma equipa, um conjunto de colegas durante a competição propriamente dita. A tal questão de correr unicamente só ou estar numa competição onde se inserem também valores e comportamentos relacionados com uma equipa que apenas existe durante a competição e depois volta à 'normalidade'.

Poderíamos saltar quantas vezes as necessárias para a analogia entre o exemplo anterior e o mundo das organizações, onde damos preferência a valores organizacionais e profissionais relacionados com os aspectos individuais e depois, como fosse simples, mudar-se o chip para algo colectivo e em grupo.

Os treinadores trabalham atletas de forma a que os mesmos sejam fortes mental, física e tecnicamente e a conquistarem os seus objectivos de forma quase 'só' quando estão em competição. Em outras situações a confrontarem-se com um problema de alinhamento quando tentam explicar aos mesmos atletas que nesta competição, para a vencerem terão de trabalhar em equipa, puxar uns pelos outros.

Não se trata de nenhuma crítica ao nível competitivo das modalidades, antes, uma reflexão sobre a dificuldade do próprio treinador alterar o seu discurso e alinhar as formas metodológicas e processuais para conseguir aumentar o rendimento dos atletas, quer quando competem de forma individual, quer quando a sua modalidade 'oferece' a via colectiva.

Ao nível das organizações, mesmo as desportivas, essa necessidade de alinhamento é tudo menos empática. Não existe qualquer sentimento e preocupação relacionada com o ajustar do discurso e das mensagens a um melhor resultado final colectivo.

As dinâmicas geralmente são sempre as mesmas, apenas condicionadas se são comunicadas para uma pessoa só ou a um conjunto. No desporto, apesar de existir a dificuldade, a empatia e necessidade criam nos treinadores uma tentativa e esforço de mesmo em pouco tempo fazer com que os seus atletas entendam que o seu resultado individual depende sempre de um colectivo.

O desporto, que tem muita a ensinar às organizações, independentemente das suas dimensões, podia começar a catalogar os ensinamentos às organizações. Este era um deles.

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Mito e tabu

Não é difícil encontrar consensos a propósito da necessidade de elevar o grau de eficiência do Estado. Consensos, porventura menores, relativamente ao facto desse ganho de eficiência passar por o Estado se dedicar a menos coisas. A questão complica-se quando se passa à fase de concretizar: que menos “coisas” são essas? E atinge o seu paroxismo se alguém defende que algumas dessas “coisas” são precisamente aquelas que desde sempre foram feitas. Que moldaram um modo de funcionamento. Que, em parte, são a razão de ser de um organismo. Que, por isso,habitualmente nem se discutem. É o caso, nas políticas públicas do Estado, dos apoios financeiros às federações desportivas.
O financiamento público do Estado às federações dotadas do estatuto de utilidade pública desportiva é a matéria mais sensível, mais delicada e também a que maior tempo ocupa das tarefas da administração pública desportiva. E é por causa dela que se apanham as maiores dores de cabeça. A maior parte do tempo “gasto” a governar o desporto tem origem em matérias ligadas ao financiamento das federações desportivas. O que se replica nas estruturas administrativas de suporte. Na legislação. Nas auditorias. Nas reuniões. No contactos. Nos telefonemas. Nas movimentações.No lobbying. E numa infindável teia de procedimentos burocráticos. Que todos os anos, em vez de diminuir, aumentam. Porquê? É um mito: sempre foi assim. E um tabu: não se discute. Para o Estado e para as federações desportivas. O que explica que tradicionalmente se procure aumentar o grau de burocratização dos procedimentos sempre em nome da celestial música do “bom uso dos recursos públicos”.
Convém começar por esclarecer que estamos a falar não de recursos que têm origem nos impostos que os cidadãos pagam, mas numa percentagem das receitas que são absorvidas através das práticas dos chamados jogos sociais. É uma receita que está no orçamento do Estado consignado a um objectivo claro: o desenvolvimento desportivo. E nem passava (presumo que actualmente ocorre a mesma situação..) pelas estruturas de gestão das finanças públicas: sai directamente da santa casa da misericórdia de Lisboa para o IDP. Aí é repartido por várias fatias. Ninguém, a não ser os apostadores, “determina” qual o valor do bolo. E o modo de o repartir é um misto de “histórico” do último ano e dos recursos que estão disponíveis no presente. E o “histórico” do último ano obedeceu ao mesmo exercício. É uma espécie de razão da razão anterior. Porque o “histórico” que num ano é ponto de partida foi de chegada no anterior. E assim sucessivamente. Com mais toque aqui e ali o resultado não é, no essencial, diferente. E digo isto com à vontade de quem não tem sequer um critério diferente para apresentar. Apenas uma solução de método distinta. Tirar esse exercício das funções do Estado.
Por que razão deve ser a administração pública a definir os montantes da parcela que cada entidade (federação desportiva) anualmente recebe para as suas diferentes actividades? Ou para o programa de preparação olímpica? Porque se não limita o Estado a definir o montante global sob a forma de percentagem do valor das verbas para o efeito consignadas? E a deixar a gestão desse recurso, a sua administração e divisão, que, repete-se, não são impostos dos portugueses, ao critério dos organismos representativos das entidades apoiadas? Por que se não limita, estabelecendo regras, a sindicar, no plano financeiro e fiscal, o modo da sua aplicação?
Podemos ensaiar várias respostas. Umas técnicas e outras políticas. Mas há uma constatação simples: a esquerda, o centro e a direita nunca colocaram em causa o método actual. Nem o vão fazer. Qual a razão? Porque no dia em que isso acontecesse esvanecia-se o poder que a governação do desporto comporta. E a ultima coisa que quem governa (ou pretende vir a fazê-lo) está disposto a abandonar é a razão de ser de governar. Bem sei que as razões aduzidas possam ser outras: a de quem está profundamente convicto que essa e a melhor forma de o fazer.Com mais equilíbrio, mais justiça, maior isenção. Mesmo que não tenha como o demonstrar. É uma mera convicção.Pode defender-se que tendo as federações desportivas competências delegadas ,cabe ao delegante definir as prioridades.Mas quem conheça a realiade sabe que isso é conversa fiada. Pode também dizer-se que a natureza das entidades representativas não assegura as competências necessárias à equidade no tratamento dos representados. Nem nunca assegurará se sobre elas se não aumentar o grau de exigência e responsabilidade públicas. E embora se saiba que essa é uma forma de não responsabilizar as entidades apoiadas que encontram sempre no critério de apoio do “Estado” um álibi desculpabilizante.
Uma coisa temos como certa: no dia em que quem governa retirar o ónus do financiamento às federações desportivas das rotinas da administração pública ganha tempo para estudar, pensar, avaliar e construir uma política pública de apoio ao desporto. Coisa que manifestamente não consegue enquanto se não libertar da ideia de que pensar e desenvolver o desporto é gastar a parte mais importante do tempo a financiar e a resolver os problemas das federações desportivas. É que mesmo que o não pense, o que, em tese, se concede, não tem como fugir.

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

O desporto na revisão constitucional

Já demos conta, neste espaço, das propostas do PSD em sede do presente processo de revisão constitucional.
Mirados, agora, todos os projectos apresentados, é possível determinar o ponto de partida do desporto neste processo.
Assim, só o PSD adianta expressas alterações.
No artigo 79º elimina-se a menção à cultura física:

"Artigo 79º
(Desporto)
1. Todos têm direito ao desporto.
2. Incumbe ao Estado, em colaboração com as escolas e as associações e colectividades desportivas, promover, estimular, orientar e apoiar a prática e a difusão do desporto, bem como prevenir a violência no desporto".

Por seu turno, no artigo 64º, sobre o direito fundamental à saúde, o seu nº 4, quanto aos meios da sua realização, também se assiste à supressão da referência – hoje vigente – à cultura física.
Dispõe a proposta alínea b) desse nº 4:

"Pela criação de condições económicas, sociais, culturais e ambientais que garantam, designadamente, a protecção da infância, da juventude e da velhice, e pela melhoria sistemática das condições de vida e de trabalho, bem como pela promoção da cultura desportiva, escolar e popular, e ainda pelo desenvolvimento de práticas de vida saudável.
Para além deste registo, o CDS-PP, no texto preambular do seu projecto, a respeito da organização judiciária, refere a necessidade de “limitação severa da possibilidade de magistrados judiciais ou do Ministério Público serem nomeados para comissões de serviço fora das funções estatutárias – v.g., para funções políticas ou desportivas.”
Contudo, mesmo aqui, o texto proposto para os artigos 216º, nº 4 e 219º, nº6, não é de todo evidente, não obstante marcar o carácter excepcional de todas as comissões de serviço, sendo certo, que a presença de magistrados em órgãos sociais de federações desportivas, não tem lugar ao abrigo de qualquer comissão de serviço.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Ver o que está à frente do nariz


Ver o que está à frente do nariz requer uma luta constante.
George Orwell


A “mística” do socialismo (na sua versão social-democrata ou comunista) reside no ideal de igualdade. Sacrificando a democracia e a liberdade na versão comunista. Na versão social-democrata sacrificando a igualdade em nome da democracia e da liberdade. Com a implosão do comunismo soviético tudo se baralhou. O capitalismo passou a ser a única forma de vida económica compatível com qualquer regime: ditadura de direita, ditadura de esquerda, monarquia constitucional e república democrática (Tony Judt). À esquerda, à direita ou ao centro. E o ideal de igualdade ficou nos textos e na retórica discursiva. O exemplo mais claro dessa implosão é a China comunista (!!!) cujo grau de desenvolvimento económico é feito à custa de baixos salários e de baixos direitos que não penalizam apenas os trabalhadores chineses mas as economias (e os trabalhadores) dos países com quem competem no mercado global.
Nas democracias ocidentais o modelo socialista/social-democrata procurou demonstrar a sua superioridade ao modelo comunista através de um Estado que garantindo a liberdade e a democracia mais do que regulador era sobretudo distributivo e se encarregava de garantir direitos. Que foram crescendo ao longo dos tempos.
Durante muito tempo criou-se a ideia de que o Estado era a boa solução para qualquer problema. Estamos a viver um momento em que, por força da falência do modelo económico em que se sustenta o Estado-providência precisamos de não cair no oposto: a de que o Estado é sempre a pior opção. Porque a única coisa pior que Estado a mais, é Estado a menos(Tony Judt).
Como não podemos viver sem Estado a melhor solução é melhorá-lo. Para esse efeito a discussão não deve ser entre mais/menos Estado. Mas entre um Estado eficiente/ineficiente.
Para ter melhor Estado, é preciso menos governo. Quanto mais governo houver pior será o Estado. Nos Estados fracos a tendência natural é para a sua governamentalização. E para que os trabalhadores e chefias do Estado se transformem em trabalhadores e chefias do governo. Os Estados fracos tendem a servir os governos e as suas clientelas. Contrariamente nos Estados fortes os governos avaliam-se por bem cumprirem as obrigações do Estado. E os programas partidários são modos alternativos de melhor cumprirem essas obrigações.
Os Estados só são fortes quando a sua missão e funções decorrem de uma contratualização politica e social que torna as suas obrigações perenes às mudanças e oscilações governativas. Quando os Estados são fracos uma qualquer mudança governativa abre o caminho á sobreprodução legislativa, às chamadas reformas estruturais, num processo imparável e que se vai alimentando por si próprio. E a constantes mudanças de rumo. Ora na vida dos Estados como das instituições a estabilidade é um valor. Que, se assente em bases socialmente contratualizadas, dá segurança às comunidades.
A crise do Estado - que não é um problema exclusivamente português –não é apenas de natureza financeira. É a crise do próprio modelo e de uma cultura política que tende a reduzir o interesse público à presença do Estado. O assunto acompanha toda a história do pensamento e da doutrina política.
Pensar nos tempos actuais o desenvolvimento desportivo a partir das políticas públicas é pensar num Estado diferente. Um Estado seguro, que se centre no estratégico e que deixe o circunstancial. Que tenha como aliado o conhecimento. Que não passa a vida a desconfiar. E que acredite que a sua força reside na capacidade de tornar mais fortes os seus parceiros. O que requer uma ordem distinta de governo. Um governo que não perde tempo a gerir piscinas, pavilhões desportivas, centros de estágio, refeitórios e ginásios. E ousa enfrentar um dos seus mitos mais arreigados: o chamado financiamento público. É dele que falaremos no próximo texto.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Omeletes sem ovos

“A UE deve fazer um uso mais activo dos seus poderes no Tratado de Lisboa para promover os benefícios sociais e educativos do desporto de massas”.

Esta foi a tónica comum dos deputados europeus e peritos presentes na recente audição pública no Parlamento Europeu sobre “Uma futura política europeia de desporto”.

Num período onde a Comissão ultima uma comunicação sobre o impacto do Tratado de Lisboa sobre o desporto e define as suas prioridades de acção para o primeiro programa da UE para o sector, a lançar em 2012 - em versão limitada, prévia ao novo quadro de apoio em 2014 -, o falhanço das negociações entre os Estados Membros e o PE sobre o orçamento da UE para 2011 , onde se previa um envelope financeiro específico de € 7,5 milhões, veio gorar as expectativas em relação à implementação das competências conferidas à UE no art.º 165.º do Tratado.

Aliás, a comissária Vassiliou havia alertado recentemente que, dado o actual contexto económico, até ao próximo período programático não haveria nenhum novo programa dedicado ao desporto. Isto significa, desde já, que só em 2014 se poderá pensar num programa de financiamento comunitário, não sendo sequer claro se haverá verba para continuar a financiar as acções preparatórias no próximo ano, as quais vinham, desde 2009, a conduzir o labor da UE para consolidar uma nova competência ao apoiar vários projectos transnacionais em domínios estratégicos do desporto, coordenados em parceria por autoridades desportivas, organizações não governamentais e organismos públicos nacionais.

Sem os recursos necessários para implementar uma nova competência política, o foco da Comissão sobre as áreas onde a UE pode acrescentar valor à acção dos Estados Membros, em particular o contributo do desporto para a estratégia UE 2020, terá necessariamente de ser cada vez mais preciso na posição formal que vai tomar até ao final deste ano. Por outro lado, em relação à outra dimensão da iniciativa europeia - a regulação dos desafios transfronteiriços do desporto e seu enquadramento com os princípios do mercado interno - os objectivos que possa propor, seja nas medidas de protecção e controlo de direitos de propriedade intelectual de organizadores de competições desportivas, seja na regulação do mercado de apostas desportivas, no combate ao doping ou a manifestações racistas no desporto, na livre circulação de desportistas, ou no fomento do voluntariado não podem deixar de ficar comprometidos sem uma base orçamental consistente.

A 16 e 17 de Dezembro na cimeira de chefes de estado e de governo em Bruxelas, na qual será apresentado um novo esboço de orçamento, ficaremos a saber se a politica desportiva da UE terá apenas uma base jurídica ou não, bem como as reais intenções da Comissão para passar ao exercício efectivo das suas competências e operar no terreno as medidas concretas para a prossecução dos objectivos de acção diagnosticados em diversos estudos recentes, definindo, desde logo, a sua posição em relação a várias propostas pertinentes lançadas pelos peritos na audição parlamentar. Caso contrário tudo permanecerá no plano discursivo, conceptual e na interpretação jurídica dos mecanismos do Tratado.

Gorado o processo de co-decisão - tão incensado com o Tratado de Lisboa - e as limitações de recursos deste novo contexto orçamental em vários programas de educação e cultura até ao novo pacote programático, tudo está agora nas mãos dos governos nacionais e seus decisores políticos. Contudo, no que ao desporto concerne, os ecos provenientes do Conselho são de algum optimismo e vontade política.

Na mesma data em que no Parlamento o representante da Comissão repetia não haver dinheiro específico para o desporto no orçamento da UE até ao final do presente programa plurianual, os responsáveis governamentais do desporto dos Estados Membros, reunidos no Conselho da União Europeia, davam corpo a um assinalável esforço político da presidência belga, e adoptavam uma resolução sobre a consolidação do processo de diálogo estruturado e duas conclusões, sobre o papel da UE no combate internacional ao doping e sobre o papel do desporto como fonte de inclusão social activa, onde, no caso desta última, convidam a Comissão a considerar a inclusão social no e através do desporto como uma prioridade, não só nos programas da UE para o desporto, mas também no âmbito de vários fundos estruturais existentes.

Uma das principais conquistas com a actual competência expressa no Tratado foi, conforme já aqui sublinhámos, o fim das restrições ao financiamento directo da UE ao desporto. Curiosamente, depois de uma longa batalha política, não deixa de ser irónico que tal financiamento possa ser mantido apenas através do FEDER, do Fundo Social Europeu, ou de programas como a Juventude em Acção ou o Programa de Aprendizagem ao Longo da Vida e permanecer incorporado em outras áreas durante mais três anos.

sábado, 20 de novembro de 2010

A candidatura

Um texto de Luís Leite.

O que pode trazer de bom para Portugal uma eventual atribuição da organização pela FIFA do Mundial de Futebol de 2018 ou 2022?
Portugal é, actualmente, o país mais fraco da Europa em Desporto, com excepção dos micro-estados, seja qual for a perspectiva racional em que o tema seja abordado. É fácil prová-lo.
Em termos de cultura desportiva, para a quase totalidade da população, desporto é futebol, clubite, e Cristiano Ronaldo.
Os pivots da RTP, nos Telejornais, quando falam em Selecção já nem dizem a que modalidade se estão a referir. É só futebol.
A haver grandes investimentos governamentais em Desporto, tendo em atenção o verdadeiro interesse nacional e a mudança de mentalidades, deviam ser dirigidos para a criação de condições para uma progressiva afirmação nas modalidades olímpicas, com uma estratégia clara de desenvolvimento, pensando sobretudo nos Jogos Olímpicos, essa sim, a grande montra mundial do desenvolvimento desportivo.
Mas não.
Para além do mexa-se e caminhadas, a aposta vai para a organização, a meias com a Espanha, já que o nosso passado desportivo é, comparativamente com os outros países europeus uma desgraça, de um evento que só vai trazer para Portugal:

1) A possibilidade de recuperar e actualizar tecnologicamente alguns dos Estádios do Euro 2004, então já com 14 ou 18 anos;
2) Dar visibilidade a personagens que são autênticas nulidades e que são responsáveis pelo atraso do desporto português;
3) Em época de crise, com um endividamento externo incomportável, encomendar prejuízos de centenas de milhões de euros, que o povo terá também um dia de pagar.

Sejamos contra este inacreditável desígnio nacional, mais uma machadada asfixiante no desporto olímpico português em favor da futebolite.
Revoltemo-nos e sejamos capazes de fazer ouvir a nossa revolta!

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

O mapa e o território

"O mapa não é o território".

Escutei esta frase no âmbito de uma formação que abordava a gestão de conflitos, expectativas, aspectos relacionados com a liderança, gestão de pessoas, etc. Para além de um problema de visão e missão da grande maioria das entidades públicas e também privadas no nosso País, que acaba por alinhar o próprio País numa caminhada sem objectivos ou indicadores, observamos que a busca de uma posição de liderança ou coordenação altera quase sempre as bases identitárias das pessoas, que de alguma forma, buscam um mapa ou título que as torne 'mais importantes'.

Na verdade, sabemos que o mapa que é entregue às pessoas, independentemente do cargo ou posição hierárquica que possuem, quase nunca bate 100% com o real território em que essas pessoas lidam. A não percepção de da distinção do mapa e território continua a ser deturpada por questões de formação de base e bom senso.

Observamos o sistema desportivo com um conjunto de princípios bastante válidos ao nível da competição propriamente dita, formação, treino, interacção ao nível dos atletas, treinadores, etc., e tudo se esfuma quase por magia a partir do momento em que essas mesmas pessoas enveredam pela parte de gestão, administração, coordenação mais administrativa/avaliação das Federações, Institutos, Associações, etc.

Tal fenómeno contribuiu para uma decalage ao nível dos resultados, principalmente se os soubermos diferenciar e segmentar o mérito: o que pertence por trabalho 'apenas' da parte técnica do treino, competição, formação, etc.; e aquela que advém 'apenas' do trabalho desenvolvido pelos dirigentes dessas mesmas entidades.

Questionar porque um treinador apela à justiça, alinhamento dos seus atletas, repetição no treino, procura dos 'experts' para as suas tarefas, comunicação frontal, desenvolvimento das competências dos seus atletas e, transferido para uma posição mais fora do terreno, assume comportamentos que contrariam os que antes aplicava para a obtenção...dos melhores resultados.

A não obtenção dos melhores resultados por falta ou recusa de procedimentos que fomentam a concretização dos objectivos, propiciam o estado a que o desporto (e não só) português chegou. A recusa de existir uma estratégia comum, nem que fosse ao nível das associações de uma federação! De uma visão alinhada pelo Estado, descentralizada pelas autarquias, federações, associações, etc.


A necessidade da existência de muitos pequenos mapas para incluírem todos os favores, que na realidades se reflectem em territórios sobrepostos, mal definidos, funções repetidas por duas, três ou mais entidades, visões que são incoerentes com as suas práticas, fazem com que hoje (fenómeno que sempre foi existindo, mas hoje agrava-se) não se deva apenas falar de poucas verbas, mas de verbas mal atribuídas e para os mesmos acontecimentos e, pior do que tudo, potencia que entidades se repitam na sua natureza e sejam adversárias e estejam explicitamente numa competição.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Reflectindo

Na altura escrevi. Hoje repito: este é (mais) um notável texto do João Paulo de Almeida. E, com o devido respeito a todos, de leitura obrigatória. Porque desafia a quietude intelectual em torno do que é o desporto e dos valores que lhe estão associados. Porque revela uma sensibilidade pouco comum para o que se está a passar em torno das práticas do desporto e, por arrastamento, das políticas públicas E ainda porque coloca questões para as quais não há respostas fáceis.
Curiosamente, na mesma semana, António Guerreiro na Actual (suplemento cultural do Expresso) abordava a questão da arte contemporânea a partir da polémica Pacheco Pereira/Pinto Ribeiro. O que existe de comum entre dois âmbitos aparentemente tão distantes?
A arte contemporânea desenvolveu-se a partir da destruição do paradigma valorativo estética/razão. A partir do momento em que tudo é arte a mensagem nela contida carece de um exercício reflexivo. A obra não consegue explicar-se por si própria.E fica por saber se é ou não arte.
O desporto quando abandonou a competição e baixou à simples actividade física destruiu o paradigma em que se construiu. E fê-lo qual tsunami. Não percebendo o que se estava a passar nas sociedades contemporâneas - medicalização da vida, sedentarismo, comercialização da prevenção para a doença - defendeu-se da pior maneira .Não separando o que lhe era próprio - a passagem do modelo formal de desporto para modelos plurais - com o que lhe era estranho: a higienização dos comportamentos por via das práticas desportivas. E agora tudo o que mexe é desporto. Ou pelo menos não lhe é estranho. E crescentemente se dá mais atenção à agitação física - que é simples e supostamente ao alcance de cada um - do que à promoção do desporto, que é complexa e exige ensino, organização, persistência, treino e competição. E não tem resultados imediatos.
O predomínio do carácter utilitário e individualista da actividade física que se abrigou á sombra do desporto é um dos factores, não o único, que está a contribuir para o declínio do carácter lúdico e gregário das práticas desportivas com reflexos na dinâmica das práticas federativas. A solução encontrada tem sido a de alargar o próprio conceito de desporto e a de incorporar novas praticas e novos modos de organização e deste modo acompanhar a onda. E sobretudo contrariar a tendência decrescente das filiações federativas através da “abertura” a outro tipo de praticantes. A prazo ou esta tendência é limitada por uma reflexão, que reconheço não ser fácil, sobre os limites do desporto ou assistir-se-á a uma desvitalização progressiva do desporto que herdámos do século passado.
Aquilo que está a ocorrer desenhou-se a partir das escolas de formação superior. Quando em Portugal assistimos, por parte da mais antiga escola de formação de quadros superiores em desporto da mudança nome para “faculdade de motricidade humana”não tínhamos perante nós uma simples actualização de uma designação. Mas uma verdadeira alteração de paradigma. Replicando o que se estava a passar em outras paragens. E subalternizando o desporto a outras área capazes de dar maior certificação científica. Umas afins e outras completamente alheias.
As organizações desportivas, com as federações desportivas internacionais à cabeça, hibernaram e não tiveram tempo, nem paciência, para reflectir sobre o que se estava(e está) a passar no universo das práticas que dirigem. E deviam ser as primeiras a fazê-lo. Transformaram-se em agências de viagens. A obsessão pela internacionalização e pelo aumento dos quadros competitivos internacionais trouxe mais problemas ao desporto que a globalização. E introduziram crescentes factores de desregulação e desequilíbrio - financeiro e organizacional - nos sistemas desportivos.
As autoridades europeias vagueiam, perdidas em cimeiras rotineiras e em declarações de princípio onde abundam os lugares comuns. Ignoram e parecem não perceber o que se está a ocorrer. Restam as franjas de alguma produção académica e de alguma reflexão solitária. Pouco para tamanha empresa.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

A falta de Economia no Desporto em Portugal

Um texto de José Pinto Correia, que se agradece.
Por aquilo que modestamente desde há vários anos vou acompanhando do desporto e do sistema desportivo em Portugal devo dizer, em primeiro lugar, que nesse mesmo desporto e sistema não existe praticamente economia e economistas, antes pelo contrário. Devo assim dizer que a pobreza portuguesa em matéria de economia do desporto é confrangedora.

Penso mais ainda, que se podem contar por menos do que os dedos de uma mão as pessoas com formação económica que entre nós produzem conhecimento no domínio do desporto. E que por isso mesmo os trabalhos académicos em economia do desporto são com uma ou outra excepção inexistentes, e a investigação no IDP, na Secretaria de Estado, nas Autarquias, ou no próprio Sistema Educativo, em matéria de economia do desporto é desconhecida, impublicada e sem qualquer relevo para influenciar ou racionalizar a governação desportiva portuguesa.

Por outro lado, as disciplinas académicas de economia do desporto são desconhecidas no nosso sistema de ensino superior e universitário. Não é reconhecível qualquer profundidade de estudo e produção científica desta área da economia neste mesmo grau de ensino português.

Claro que pode e deve perguntar-se como foi e é possível “conduzir estrategicamente o desporto” (o denominado “steering” dos anglo-saxónicos) sem que uma das ciências sociais mais relevantes da actualidade de sistematização da racionalidade dos decisores políticos e restantes agentes esteja visivelmente presente nesse desporto. O que faz pensar sobre o modo como tem sido possível à administração pública desportiva, ao Governo, ou aos diferentes componentes dirigentes das estrutura federativas e do Comité Olímpico passarem sem o contributo de tal ciência para a definição das suas opções, estratégia e planos de desenvolvimento do nosso desporto nacional.

Não se estranha, por isso, que mantendo-se essa desvalorização da economia no desporto tenham estado no passado e continuem a estar hoje e futuramente ausentes da “direcção e organização do desporto nacional” as questões relativas a análise de investimentos e do bem estar económico e social, da racionalidade e eficiência da afectação de recursos escassos (escassíssimos segundo sabemos), as dinâmicas de procura versus as da oferta, as análises de desenvolvimento nacional e regional e local do desporto, a eficiência e o valor da utilização dos recursos financeiros, materiais e humanos, bem como a basilar determinação rigorosa e modelar do valor económico do desporto para a sociedade portuguesa.

E não nos escandalizemos, portanto, quando os máximos dirigentes do sistema desportivo, desde o Comité Olímpico ao Presidente da Federação de Futebol, propõem a cada volta realizar eventos de muitos e muitos milhões de euros e contos, sem que para tal promovam previamente os indispensáveis estudos e análises fundamentadas da valia económica, dos custos e dos correspondentes benefícios de tais eventos.

Ninguém entre nós aos mais altos níveis de responsabilidade faz as contas devidas, ninguém exige estudos de viabilidade e análises de custos benefícios, ninguém quer saber da rentabilidade económica e social desses projectos. E mesmo quando por contrafeita obrigação se fazem estudos, como no caso do EURO 2004, as metodologias de análise escolhidas dão a ilusão de que esses projectos têm impactos económicos que as análises de custos benefícios e os factos pós-evento categoricamente desmentem (ainda que tenham tido mão de economistas ocasionais que fizeram uma mãozinha bem paga no desporto para tal “empreitada”). E é o que agora de novo se prepara com a candidatura de realização conjunta do Campeonato do Mundo de Futebol em 2018, com desconhecimento categórico dos custos e benefícios de tal aventura.

Há então uma absoluta necessidade de chamar a economia e os economistas para o desporto. Deixemos vir, por conseguinte, mais economia e mais e novos economistas para o desporto. Desta ciência só pode resultar um óbvio e indispensável benefício para a racionalidade das decisões e para uma melhor afectação de recursos e organização do sistema desportivo – desde a base não competitiva até ao topo competitivo. Exijamos ao IDP e à Secretaria de Estado, e ao Comité Olímpico de Portugal, apoios e patrocínio para que mais economia e economistas surjam no desporto em Portugal.

Veja-se a esse respeito, ou melhor estude-se por análise de políticas desportivas comparadas, o caso exemplar do Reino Unido onde as autoridades públicas que governam o desporto estabelecem parcerias com as Universidades para o estudo efectivo e consequente da economia do e no desporto e chegam mesmo a financiar “Centros de Investigação em Economia do Desporto” que produzem estudos e análises que relevam para a condução desportiva nacional (seria fastidioso enumerar aqui e agora os estudos e benefícios que daí têm provindo para a “coordenação global do desporto” pública e para-pública naquele país).

Faz muita falta em Portugal introduzir modelos de análise e de racionalidade económica no desporto. Desde logo, tais contribuições da ciência económica poderiam facultar os instrumentos e as bases em que se fundamentassem as prioridades e as escolhas de utilização eficaz e eficiente dos poucos recursos financeiros, materiais e humanos disponíveis no e para o desporto. O que aliado a melhores práticas e métodos de gestão das organizações desportivas poderia fazer ultrapassar as limitações de desenvolvimento e afirmação nacional e internacional do nosso desporto.

Como dizia Peter Drucker (o pai da gestão moderna como hoje a conhecemos): “não há países desenvolvidos e subdesenvolvidos, há países administrados e sub-administrados”. E assim sendo, deve afirmar-se que para uma melhor administração do desporto português faz muita falta que a economia do desporto possa ter um impulso grande que lhe permita passar a fazer parte dos modelos de pensamento, organização e governação do desporto de Portugal.

domingo, 14 de novembro de 2010

Quem manda numa SAD?

Permitam-me os associados e visitantes desta nossa colectividade que hoje dedique algumas palavras ao futebol na sua expressão mais imediatista, o que não é meu hábito.
O jornal desportivo “A Bola”, logo na primeira página e com amplo espaço em página interior, olha – diria em termos muito peculiares – o ocorrido no último treino da equipa do Benfica (ontem de manhã no Seixal).

Na primeira página titula-se: “Foi Jesus quem autorizou a entrada dos adeptos no Seixal”. Segue o jornal afirmando que o treino da manhã foi “marcado pelo diálogo entre o técnico encarnado e uma centena de jovens que o questionaram sobre a goleada sofrida no Dragão”.
Terá sido mesmo assim?
Claro que não e o jornalista, no interior, não consegue corroborar as chamadas de primeira página.

O grupo de adeptos – uma boa parte dos quais (pelo menos) pertencentes aos No Name Boys) – “juntou-se em frente à entrada principal do complexo encarnado e ameaçou entrar a bem ou mal”.
Depois de entrarem – pelos vistos com o beneplácito do treinador, pois, caso contrário, entravam a mal –, deslocaram-se “directamente para o relvado”, o que conduziu à interrupção do treino.
Lá foi o treinador ouvir as «queixas» da claque.

“O momento foi de elevada tensão, mas não houve qualquer tipo de violência física, apenas verbal, nomeadamente insultos. Jorge Jesus foi o principal alvo, mas também vários jogadores foram interpelados”.
“O plantel foi completamente apanhado de surpresa e o incidente impressionou negativamente alguns jogadores, em particular os que chegaram esta época ao clube.”
“Mas mesmo para os mais antigos da casa, uma confrontação como esta, em pleno treino, foi algo de inédito.”
“ Jorge Jesus ainda pensou, depois, retomar o treino, mas entendeu que não estavam reunidas condições para o fazer.”

O que se passou ontem no Seixal junta-se a outros episódios que no passado – e no futuro será também assim – tiveram lugar em treinos do Sporting e do FC do Porto, só para citar os «grandes» (?) e dá perfeita conta do peso das claques nos destinos de uma equipa de futebol.

Mas como diriam todos os administradores das SAD’S, membros dos corpos policiais, sociólogos «politicamente correctos», o Conselho Nacional do Desporto e membros do Governo, elas, legalizadas (?) ou nã0, fazem parte da «grande festa que é o futebol.
Assim seja, se assim o querem.
Mas, depois, não vertam, como sempre, lágrimas de crocodilo.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Preparação olímpica?

Um texto de Luís Leite.


Os próximos Jogos Olímpicos vão realizar-se em Londres no Verão de 2012.
Em finais de Setembro de 2010, ou seja, pouco mais de um ano e meio antes do início dos Jogos, o Comité Olímpico de Portugal escolheu o Chefe de Missão Olímpica.
O Chefe de Missão Olímpica é o responsável máximo pela representação nacional e coordenador de todas as actividades relacionadas com a preparação e com a presença em Londres.
Será também o autor do relatório final, após os Jogos.
Como se explica que um país do mundo dito civilizado e membro da União Europeia só decida escolher o Chefe de Missão quando já passou mais de metade da Olimpíada, ou se preferirem do ciclo olímpico?
Nada tenho contra a pessoa escolhida.
Mas não será estranho que, no acto de posse, tenha afirmado que a equipa que irá escolher (será ainda este ano?) terá que ser uma equipa profissional, composta por pessoas capazes e experientes?
O que é que isto significa?
Será que quando os outros países já estão a entrar na fase decisiva da preparação para os Jogos, Portugal só agora é que vai começar a pensar nisso a sério?
Olhando para o panorama actual do Desporto português e tendo em consideração que o máximo que conseguimos foram 3 medalhas em Los Angeles e Atenas e a média geral das participações portuguesas é de 1 medalha, as expectativas para Londres são, digo eu, muito más.
Dificilmente ultrapassaremos o intervalo habitual (0 a 3 medalhas), que nos atirará ainda mais, no medalheiro geral, para a cauda dos países europeus, à frente apenas apenas dos micro-estados.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Decoro

Todos conhecemos pessoas que perante uma situação de doença grave procuram os melhores médicos. Aqueles cuja desempenho está ligado ao sucesso em resolver situações difíceis.Quem tem processos complexos em tribunal, e dispõe de suficientes meios financeiros para pagar a um bom advogado, não vai entregar a causa a um jovem em início de carreira. Procura causídicos com nome na praça.Com experiência profissional.Com muitas causas ganhas. Isto significa que apenas esses estão à altura de ter êxito? Não necessariamente. Significa tão só que o grau de confiança é mais elevado num profissional que já teve sucesso em situações difíceis e particularmente adversas. Que conseguiu o que, aparentemente, poucos seriam capazes. Que apresenta resultados. Qual é garantia que dá quem fala de assuntos que nunca tratou? Pouca. A percepção que se tem das capacidades profissionais tem muito a ver com a experiência.Com o currículo e o desempenho profissionais. A confiança assenta numa base objectiva de resultados alcançados.
O que se passa com as nossas vidas pessoais passa-se com as organizações. E com a maior de todas elas que é o Estado. Dele se espera que as tarefas mais delicadas e mais complexas sejam entregues aos melhores. Aos mais competentes. Aos que dão melhores garantias de fazer bem as coisas difíceis. Aos que protegem bem o dinheiro que lhes entregamos. Que o não usam para fins pessoais. Que têm sentido de missão no serviço público.
A falta de confiança é um custo na vida das organizações. É um obstáculo a boa governação. Num contexto de dificuldades a confiança depende em larga medida da credibilidade e do prestígio dos actores sociais intervenientes. E não basta ser competente. É preciso que a essa capacidade se junte um comportamento cívico exemplar para a comunidade. Se é preciso fazer sacrifícios ninguém está disposto a seguir quem não dá, como exemplo, o seu próprio. Se é preciso poupar ninguém levará a sério quem gasta o que podia evitar. Se é preciso gerir com sentido de responsabilidade, quem dirige tem de ser o primeiro a mostrá-lo.
Entre os que aspiram a um dia governar este país seguramente que existe gente séria e competente. E em todos os partidos. E admiro-os. Pela disponibilidade em assumir funções públicas. Porque o estado a que o país chegou desaconselharia a fazê-lo. A ingovernabilidade é bem maior que a possibilidade de o governar. E o que sabemos deve ser apenas uma pequena parte do que se passa. Os últimos anos acentuaram uma tendência em que a informação que os governos dispõem não é facultada ao país, mas ao partido que governa. E por isso, contrariamente ao que nos querem fazer crer, não sabemos, ao certo, quanto gastamos, nem onde gastamos. Sabemos apenas que aqueles a quem devemos, e que durante anos nos andaram a emprestar dinheiro, desconfiam da nossa capacidade em honrar compromissos. Em sermos pessoas de bem.
O Público (5.11.2010) revela que o deputado Marques Júnior confessou que 95 por cento das vezes não sabe bem o que vota e que é debatido no Parlamento. Não encontrei qualquer desmentido. Não deve ser caso único. Talvez única, apenas, a sinceridade com que o assume. Retrata o estado da democracia parlamentar. E o último debate sobre o orçamento do Estado um fiel retrato. Em que a “velha” e a “catastrofista”, como depreciativamente era tratada, acaba elogiada pelo primeiro-ministro. Ele mesmo. Revendo o filme para trás a surpresa é evidente. Surpresa ou outro qualificativo menos elegante?
O “cadastro” do governo em termos de objectivos está aí. Dirá, enquanto pode, que é culpa alheia. Faz o seu papel. Mas toda a representação tem limites. Ouvir falar em rigor, em transparência, em disciplina e em responsabilidade é insuportável. Que faça o seu trabalho o melhor que pode e sabe. Mas que haja decoro.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Felicitações


Com pedido de publicação texto de Fernando Tenreiro,que se agradece.


Ontem domingo, 7 de Novembro de 2010, o Prof. Dr. José Manuel Meirim tornou-se o primeiro professor de Direito do Desporto a compreender e a expressar no jornal Público que o âmago da Lei de Bases como é interpretado habitualmente pelos juristas do desporto em Portugal está errado:
Ao contrário do que se assume as federações, apesar de prerrogativas públicas, são instituições privadas.
A afirmação segundo as quais as federações são entes sem finalidade lucrativa beneficiando de contratos públicos é um feito inédito por parte de um jurista e dos 100 % dos líderes e técnicos que debitam artigos das leis do desporto em Portugal.
Esta afirmação para além de outras que tenho dito no blogue Colectividade Desportiva, no sentido da reforma das leis no desporto, dita por um dos mais distintos oficiais, abre a porta para que a próxima legislatura tenha novos horizontes legislativos e com isso o desporto possa, por fim, singrar para novos horizontes europeus.
O que a postura tradicional impede materialmente.
Faço a afirmação daquilo que tenho dito não para me promover mas para combater os erros que se constituíram durante muitos anos sem as competentes investigação científica, debate e avaliação dos resultados das políticas. A universidade não pode ser calada senão com a sua conivência ou distracção.
Há mais limitações na Lei de Bases da Actividade Física e do Desporto e existem soluções para produzir mais e melhor desporto em Portugal e actos como o do Prof. Dr. José Manuel Meirim rompem com erros estabelecidos e por serem actos raros devem ser enaltecidos.
Renovo as maiores felicitações aos autores do blogue pelo resultado que a nova concepção do desporto português alcança e para o qual o CD tem tido um papel fundamental.

Fernando Tenreiro

domingo, 7 de novembro de 2010

O país das meias-maratonas

Um novo texto de Luís Leite.

A meia-maratona é uma disciplina do Atletismo não olímpica (21.098m em estrada), relativamente recente, que não integra as grandes competições internacionais, com excepção de um pseudo-Campeonato do Mundo que está em vias de extinção, já que não tem relevância e conta com a presença de poucos países.
A meia-maratona “não é peixe nem é carne”, ou seja, é demasiado curta para servir como preparação para a Maratona e demasiado longa para beneficiar os corredores das distâncias olímpicas em pista.

Em meados dos anos 70, com a democratização da corrida que se seguiu ao 25 de Abril, descobriu-se em Portugal uma disciplina do Atletismo sem qualquer relevância internacional: a meia-maratona.
A primeira meia-maratona realizada em Portugal e portanto a mais antiga, é a da Nazaré, que se iniciou em 1975, ainda com a presença de muito poucos atletas. O número foi aumentando progressivamente.

Com o andar dos tempos, os municípios (primeiro) e alguns empresários e os sucessivos Governos (depois), começaram a descobrir a grande virtude desta disciplina: realizando-se na via pública dentro das localidades e podendo juntar milhares de “atletas”, tem uma visibilidade local impossível de conseguir em qualquer outra iniciativa desportiva extra-futebol, com a vantagem de se poder desenrolar em ambiente de festa.
É a manifestação ideal e “politicamente correcta” do “desporto de massas”, promovida e apoiada pelos eleitos, sempre presentes na entrega de prémios.

Não é de estranhar que, nas últimas décadas, as meias-maratonas tenham proliferado um pouco por todo o país, concorrendo entre si pelas melhores datas e distribuindo prémios suficientemente atractivos para os melhores, em função da sua importância.
Actualmente quase não há município que não tenha a sua meia-maratona, até porque seria uma vergonha não a ter. São muitíssimas dezenas por ano, nem se sabe bem quantas.

A meia-maratona não é bem Atletismo. É “meio-atletismo”.
É o local de encontro privilegiado daqueles que correm devagar mas correm todos os dias. E nesse aspecto tem um interesse relativo, mas inegável. Como qualquer outra prática desportiva.
Mas a meia-maratona está a dar cabo do meio-fundo/fundo nacional.
Para poderem acautelar o seu futuro, os melhores fundistas nacionais correm todo o ano atrás de prémios monetários que não encontram em mais lado nenhum.
Assim, exageram na quantidade de provas de estrada que vão correndo e não têm tempo para treinar o ritmo para as provas de pista, que se adquire na pista, nem para treinar a “endurance” com o ritmo adequado para as provas de Maratona.
Com isto, os rankings nacionais de 5000m, 10000m e Maratona têm vindo a piorar ano após ano e Portugal, que era um dos mais fortes países europeus do meio-fundo nas décadas de 80 e 90, hoje só consegue manter alguns (poucos) atletas de topo europeu por via das bolsas olímpicas que, de algum modo, compensam a perda de prémios em meias-maratonas.

Outro aspecto extremamente negativo é a relativização do sucesso desportivo pela qualidade do esforço, quando se atribuem medalhas (e T-shirts) a todos os participantes e pagantes, mesmo àqueles que foram a andar devagarinho e não chegaram ao fim.
É o nivelamento por baixo e a banalização do mérito desportivo.
Ultimamente, adicionaram-se aos programas de festas as “mini-maratonas” e as “caminhadas”, manifestações populistas de encontro social pontual, sem qualquer vantagem real para cidadãos que, maioritariamente, não praticam desporto e fariam a “festa” de outra forma qualquer.
É o desporto a fingir mas muito visível, que tanto agrada aos políticos.

Nalguns casos mais conhecidos e que metem pontes lisboetas, estas “meias, minis e caminhadas” são fortemente patrocinadas (às centenas de milhar de euros) pelas empresas públicas que não gastam um cêntimo com o verdadeiro Atletismo.
Mas gastam-no com dezenas de quenianos e etíopes que vêm cá fazer a corrida deles, sozinhos, sem qualquer vantagem competitiva para os atletas nacionais.
Para dar na TV pública em directo.

Porque sabem que assim agradam mais ao Poder que, através do chefe, também finge que corre.
É porreiro, pá!
Eu não concordo e sou contra as meias-maratonas. E sou a favor do atletismo a sério.
Para que conste.