No início do século XIX, nos partidos operários sociais-democratas e nas organizações sindicais europeias, viveu-se um problema que suscitou violentas discussões. A acumulação de poder num pequeno número de indivíduos eleitos cujo grau de exclusividade levou a que fossem remunerados. E que se iam perpetuando no poder. Mas tinham dificuldades em assumir essa profissionalização Um problema que chegou até aos dias de hoje. Nos políticos profissionais e sindicais, pessoas que de há muito deixaram as profissões que exerceram para se dedicarem à vida politica e sindical de modo exclusivo, é habitual indicarem nas respectivas biografias a profissão que um dia tiveram. Não a que têm e de há muito exercem. Existe uma espécie de pudor.Com os dirigentes desportivos que optaram, em detrimento da sua profissão pelo dirigismo desportivo há algo de similar. Será raro quem, quando interrogado sobre a profissão, indique o que de facto faz. Normalmente indica o que fez. Mesmo quando o que fez é bem menor, em tempo de ocupação, do que aquilo que faz.
O facto de se não ser voluntário no exercício de funções dirigentes no movimento associativo desportivo nada tem de censurável. É normal. Um dirigente desportivo remunerado é tão digno como um outro que o não é. A sua actividade não desmerece pelo facto de ter uma relação profissional com a direcção de uma organização desportiva. É preferível que seja remunerado e só isso, do que apresentar-se como benévolo e usar o cargo para actividades conexas com a profissão que exerce ou para tráfico de influências. Mas, no plano dos princípios, entre um e outro dos casos, existem situações híbridas: o da remuneração encapotada. O estatuto de voluntariado é assumido para consumo externo mas na realidade do que se trata é de um verdadeiro emprego. Que explica, muitas vezes, as dificuldades de renovação do dirigismo, porque é normal que quem tem um emprego e uma remuneração só pretenda deixá-los se tiver outra alternativa.
Qual é a razão para um procedimento tão comedido e em que se não aceita a profissão que se exerce? A dificuldade pode estar ligada à tradição desportiva e ao lugar que o amadorismo -conceito equívoco - e o voluntariado ou benevolato assumiram na construção do sistema e das práticas desportivas. Até numa relação incómoda com o dinheiro. Mas a situação só ganha em ser enfrentada com transparência e sem qualquer reserva mental. Quem é voluntário e não é remunerado pelas tarefas desportivas a que se dedica e quem o não é.Com transparência e com a obrigação de cumprir os procedimentos previstos no ordenamento jurídico em matéria de relações laborais e de contrato. Um e outros são a consequência natural do grau de desenvolvimento das organizações desportivas.
O governo que agora termina funções introduziu alguma disciplina neste domínio. No que lhe era possível. E fez bem. Porque em muitas organizações desportivas de topo são recursos públicos que estão em causa. Mas não chega. Um funcionário público aposentado carece de um autorização especial do primeiro-ministro para poder acumular uma eventual actividade remunerada de uma entidade pública. Por que razão numa entidade privada, mas que cujo orçamento é composto basicamente por recursos públicos deve estar livre desse procedimento? Mas a principal obrigação de disciplina pertence às próprias organizações desportivas. Assumir com frontalidade e responsabilidade que optaram por um regime de profissionalização nos termos gerais do trabalho. E não em esquemas onde a remuneração, por que é disso que se trata, está eufemisticamente considerada como compensações por perdas ou outras designações equivalentes e, muitas vezes, fiscalmente censuráveis.Em Ano Europeu das Actividades Voluntárias que Promovam uma Cidadania Activa, o desporto, que tem a seu crédito um enorme historial a favor da comunidade bem podia, através das suas organizações representativas, valorizar o debate e as iniciativas nacionais sobre o voluntariado. Sem anátemas para quem o não pratica e valorizando quem o continua a praticar.
O facto de se não ser voluntário no exercício de funções dirigentes no movimento associativo desportivo nada tem de censurável. É normal. Um dirigente desportivo remunerado é tão digno como um outro que o não é. A sua actividade não desmerece pelo facto de ter uma relação profissional com a direcção de uma organização desportiva. É preferível que seja remunerado e só isso, do que apresentar-se como benévolo e usar o cargo para actividades conexas com a profissão que exerce ou para tráfico de influências. Mas, no plano dos princípios, entre um e outro dos casos, existem situações híbridas: o da remuneração encapotada. O estatuto de voluntariado é assumido para consumo externo mas na realidade do que se trata é de um verdadeiro emprego. Que explica, muitas vezes, as dificuldades de renovação do dirigismo, porque é normal que quem tem um emprego e uma remuneração só pretenda deixá-los se tiver outra alternativa.
Qual é a razão para um procedimento tão comedido e em que se não aceita a profissão que se exerce? A dificuldade pode estar ligada à tradição desportiva e ao lugar que o amadorismo -conceito equívoco - e o voluntariado ou benevolato assumiram na construção do sistema e das práticas desportivas. Até numa relação incómoda com o dinheiro. Mas a situação só ganha em ser enfrentada com transparência e sem qualquer reserva mental. Quem é voluntário e não é remunerado pelas tarefas desportivas a que se dedica e quem o não é.Com transparência e com a obrigação de cumprir os procedimentos previstos no ordenamento jurídico em matéria de relações laborais e de contrato. Um e outros são a consequência natural do grau de desenvolvimento das organizações desportivas.
O governo que agora termina funções introduziu alguma disciplina neste domínio. No que lhe era possível. E fez bem. Porque em muitas organizações desportivas de topo são recursos públicos que estão em causa. Mas não chega. Um funcionário público aposentado carece de um autorização especial do primeiro-ministro para poder acumular uma eventual actividade remunerada de uma entidade pública. Por que razão numa entidade privada, mas que cujo orçamento é composto basicamente por recursos públicos deve estar livre desse procedimento? Mas a principal obrigação de disciplina pertence às próprias organizações desportivas. Assumir com frontalidade e responsabilidade que optaram por um regime de profissionalização nos termos gerais do trabalho. E não em esquemas onde a remuneração, por que é disso que se trata, está eufemisticamente considerada como compensações por perdas ou outras designações equivalentes e, muitas vezes, fiscalmente censuráveis.Em Ano Europeu das Actividades Voluntárias que Promovam uma Cidadania Activa, o desporto, que tem a seu crédito um enorme historial a favor da comunidade bem podia, através das suas organizações representativas, valorizar o debate e as iniciativas nacionais sobre o voluntariado. Sem anátemas para quem o não pratica e valorizando quem o continua a praticar.
18 comentários:
Concordo com o essencial do texto.
Quanto à nova legislação é facilmente contornável e qualquer dinossáurio à frente de uma Federação há décadas pode facilmente manter-se no Poder, passando de Presidente a Presidente da Assembleia-Geral, mantendo-se no mesmo gabinete a fazer o mesmo e dando a assinar a correspondência e os documentos oficiais a uma pessoa da sua confiança, indicada por ele e vencedora em eleições sem concorrência.
Existe nas principais Federações uma forte tradição de perpetuação no poder ilimitada, em resultado de estratégias de manipulação que são fáceis de implementar.
Basta ser esperto e ter muita gente dependente e obediente.
Citando um dos maiores vultos do pensamento desportivo português (PDP), Fernando Tenreiro, "a ciência é a única saída possível para as crises do desporto e do país".
Não é apenas uma "saída para o desporto"; é, também e sobretudo, uma "saída para o país".
E onde se encontra " a ciência", pergunta-se Fernando Tenreiro, tal como outrora Eça se perguntara sobre "a Ideia"?!
Tenreiro não tem dúvidas: na universidade! A qual, históricamente, tem sido um alfobre de soluções práticas para os diversos e angustiosos problemas da grei (como todos sabemos).
Por isso, Tenreiro conclui: "Menos do que a ciência é mau".
Esperemos que o novo Governo atente na profundidade destas sugestões e pergunte à universidade como deve governar.
A citação não é do Tenreiro
A relevância da ciência li-a um destes dias
Mas não consegui encontrar a origem quando escrevi o poste
Contudo creio que está relacionada com o Manifesto da Ciência assinado por centenas de catedráticos e investigadores, mais de mil
Deve ser possível chegar lá pelo Google
Mas mantenho que o desporto português poderia ter ido mais longe com mais universidade e evitado a destruição da Vanessa Fernandes
A morte de Tiago Alves ...
Uma melhor distribuição dos dinheiros pelo desporto com maior rendibilidade do investimento em factores de produção desportivos
Mais e melhor investigação social para compreender quais as características da procura desportiva e dos seus produtores
Mais investigação e soluções inovadoras sobre a estrutura do associativismo desportivo
Melhores processos de gestão para diferir o aumento discriminado do IVA
Há instituições no desporto português que trabalham sem a universidade e sem os seus procedimentos rigorosos
Era bom que no futuro houvesse mais, muitos mais instrumentos e procedimentos aprovados por métodos científicos
Eu suponho que os escritos do anónimo contra a ciência se devam ao facto de não dar aulas em nenhuma faculdade nem fazer investigação sobre o desporto português.
Era bom que o desporto português não se comportasse como um ente orgulhosamente só.
Concordo consigo anónimo de que sou exagerado
Concordo que continua a faltar Universidade ao Desporto português.
Em diversas áreas.
Falta de conhecimento específico ou falta da sua aplicação.
Falta de estudos não manipulados de comparação com a Europa e que possam ser publicados.
O problema é que prevalecem vários tipos de interesses pessoais ou colectivos (lugares, tachos, clubite, etc.) sobre os interesses nacionais.
Existem pessoas com conhecimentos mais avançados e actualizados que são rejeitadas pelo sistema.
Portugal é uma insignificância desportiva dentro da Europa, porque há gente agarrada ao poder que está ultrapassada mas não o larga e porque há muitos interesses associados e negociatas.
E há o desgraçado factor "politicamente correcto", em que há chavões e iniciativas ditadas por gente que pouco percebe de desporto mas que precisa de agradar a clientelas e/ou ganhar votos fáceis.
E há a futebolite a asfixiar tudo, cada vez mais.
Somos o país em que o que é verdadeiramente relevante são os "reforços" futebolísticos estrangeiros.
Por todas estas razões, nos Jogos Olímpicos de Londres não passaremos das habituais zero a três medalhas.
Escreve Tenreiro
Concordo consigo anónimo de que sou exagerado
Tenreiro é dotado de uma enorme auto-indulgência.
Não usei qualquer qualificativo, nem o sugeri. Mas se o fizesse -acredite! - nunca me ficaria pelo melífluo "exagerado"...
Constato que o anónimo está num dos seus momentos de excelência, os quais eu não posso e não devo de forma alguma acompanhar.
Álvaro Santos Pereira - Ministro da Economia - in "Portugal na Hora da Verdade", pág. 323:
E se fôssemos um pouco mais longe e, para além destes cortes, extinguíssemos organismos como o Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres e o Instituto da Construção e do Imobiliário, cortássemos para metade as despesas do Instituto de Gestão Financeira e de Infra-Estruturas da Justiça e do Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, e em 20% as do Instituto do Desporto(...)
Ó anónimo...
O problema, em Portugal, não está na quantidade de dinheiro que há para gastar, mas sim na maneira como é gasto!
Temos que cortar em todas as áreas. E gastar melhor.
Pode-se fazer muito melhor com menos dinheiro!
O modo como se esbanjaram centenas de milhões de euros no QCA III e no QREN na área do Desporto é um excelente exemplo!
Gastou-se demais onde não se devia e gastou-se de menos onde se devia.
Se quiser umas listas eu faço-as nas calmas...
O livro de Álvaro Santos Pereira, Portugal na hora da verdade, custa apenas 13,05 euros.
Álvaro Santos Pereira não tem a arte de fazer como certas pessoas que cortam de 90 milhões para 60 milhões e dizem que até aumentaram com um esforço inaudito e conseguem que as federações acreditem.
Não batam mais no ceguinho.Se o Santos Pereira soubesse o que se passou nestes anos no IDP a proposta de redução seria ainda maior.
Diz o anónimo das 18h50
Álvaro Santos Pereira não tem a arte de fazer como certas pessoas que cortam de 90 milhões para 60 milhões e dizem que até aumentaram com um esforço inaudito e conseguem que as federações acreditem.
É verdade. As federações são compostas por gente muito estúpida e ignorante. Chego mesmo a pensar se isso não será até requisito para se poder lá trabalhar.
Enfim, não me quero meter em áreas que não domino. Quem percebe mesmo disto é o LL....
20% do Orçamento do IDP até nem é muito. São apenas uns parcos 15,2 milhões de euros - segundo Alvaro Santos Pereira - que não farão falta alguma às federações desportivas e, menos ainda, ao COP...
Talvez até, ainda se pudesse cortar mais. As federações ficarão, por certo, entusiasmadas. E os Centros de Alto Rendimento, o Jamor e outras bagatelas estatais melhorarão significativamente a sua produtividade....
O desemvolvimento desportivo, finalmente, parece começar a reunir condições para uma explosão de desnvolvimento. Com um pouco de sorte, talvez algumas federações venham a descobrir as virtualidades do "mexa~se" (que passará a "pira-te"....)...
Com a iliteracia desportiva que por cá grassa e a arrogância de quem sabe tudo vamos ver como vai ser este filme
Álvaro Santos Pereira,in "Portugal na Hora da Verdade", pág.323:
Isto para já nem falar no Instituto de Emprego e Formação Profissional, responsável por um orçamento de 1119,9 milhões de euros, nem de institutos mais pequenos, tais como o Instituto do Desporto (79,6 milhões de euros)(...)
Do mesmo Autor e obra, pág. 325, vem referido que as despesas do OE 2011 do Instituto do Desporto de Portugal são de 75,8 milhões de euros.
Ainda segundo Álvaro Santos Pereira este levantamento das áreas onde se poderia "cortar despesa" teria sido um trabalho realizado por si, Carlos Moedas e Alexandre Patrício Gouveia (obra citada, pág. 311/312).
Fixemo-nos, portanto, nesta conclusão: o orçamento do IDP situar-se-á algures num intervalo entre 75 a 80 milhões de euros.
E, assim, seremos rigorosos. Mais ou menos...
Porque é que o anónimo não diz de 2005 a 2011 qual foi a evolução do orçamento do IDP?
Entre 75 e 80 milhões de euros, sem contar com as verbas astronómicas que foram gastas sem critério nem consulta às Federações (salvo raras excepções) pelo QCA e QREN em instalações desportivas pouco ou nada adequadas, mal localizadas e em muitos casos pouco ou nada utilizadas.
O problema não está nas quantias orçamentadas e gastas, em que apenas uma percentagem diminuta vem do OGE, insignificantes face ao PIB.
O problema está na forma como as verbas foram gastas, salvo raras excepções.
O Desporto nunca foi politicamente relevante para os políticos da Administração Central ou Local, com excepção das ajudas directas ou indirectas ao Futebol profissional e com o politicamente correcto "mexa-se" e afins, que dão votos fáceis sobretudo nos escalões etários mais avançados.
O resto sempre foram migalhas.
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