domingo, 26 de maio de 2013

Já não há federações no céu.

Texto publicado no Público em 26 de Maio de 2013.


1. No passado dia 20 o Diário da República publicitou os despachos do novel Secretário de Estado do Desporto e Juventude que indeferiu os requerimentos visando a renovação do estatuto de utilidade pública desportivas, apresentados pela Federação Portuguesa de Aeronáutica, pela Federação Portuguesa de Aeromodelismo, pela Federação Portuguesa de Paraquedismo e pela Federação Portuguesa de Voo Livre. O fundamento invocado para tais decisões é o de que as federações não fizeram prova de se encontrarem filiadas em organização desportiva internacional reguladora da modalidade.
Coloquemos de parte, por ora, o fundamento invocado. Não conhecemos o processo e vamos aguardar para outros fundamentos que irão surgir quando o Estado não renovar o estatuto a outras federações desportivas. Dir-se-ia até, para efeitos deste texto, que o acerto do fundamento é algo bem secundário.
Não há nada de escandaloso nesta afirmação proferida por um jurista de formação e deformação. Vejamos porquê.
2. As quatro federações desportivas titulavam o estatuto de utilidade pública desportiva desde 1996!
Durante 17 anos os sucessivos Governos, IDP’s, IDPJ’s e afins, nada se preocuparam com esta eventual ausência de filiação em federação internacional. Não vale o argumento de que é algo que o novo regime jurídico das federações veio a introduzir. Mesmo que assim fosse, a omissão dos poderes públicos – não confundir com podres públicos, erro sintomático do word – perdura há 4 anos.
Anos e anos de contratos-programa celebrados com essas federações, anos e anos de reconhecimento público da actividade desportiva organizada e regulada por essas federações desportivas.
Porquê agora?
3. A meu ver há uma razão fundamental: poupar no financiamento às federações desportivas o que equivale, no quadro em análise, em ferir gravemente essas práticas desportivas.
Por outro lado, este eventual apego à legalidade, por parte do Estado é de um cinismo extremo.
O Estado tem o poder-dever de fiscalizar, nos termos da lei, as federações desportivas. Essa fiscalização deve ser – assim manda o princípio da legalidade - contínua e não algo, como é prática há anos, impulsionado, de quando em vez, por razões que pouco se prendem com o serviço público. O Estado vive na omissão, no laxismo. O Estado actua, perdoem-me as modalidades em voo livre, salta de paraquedas, prosseguindo finalidades por vezes bem pouco confessáveis.
4. Sempre foi assim e sempre será assim. Com Laurentino, Mestre e seguidores. Perante esta certeza, as federações desportivas só têm, como há anos afirmo (mas não sou ouvido), uma postura possível: cumprir a lei e ter o Direito como aliado. Só assim se combate o arbítrio estatal.

6 comentários:

Anónimo disse...

Bem avisou, o Talvez. Avisou antes, e com a devida antecedência.

Este Direito que se tem feito em Portugal na área do Desporto está completamente desfasado da Realidade desportiva portuguesa. Não truque nem malabarismo que lhe valha.

O Talvez apresentou a Folha A4 como método e caminho para a solução. Não criticou só para dizer mal, nem se furtou a não dizer como se deve fazer. A Reforma Organizacional que a Folha A4 propõe é, cada vez mais, uma solução pertinente e adequada à Realidade do desporto português.
Na altura riram e gozaram. Agora é o Talvez que, em vez de rir e de gozar, confirma a incompetência e a falta de preparação desses.

Esses, ao lerem as mensagens anteriores, e a solução proposta na Folha A4, talvez consigam aprender aquilo que lhes falta. Talvez consigam agora refletir com calma e serenidade. É para isso que servem os «anónimos», para não deixarem que se distraiam a «pessoalizar» os problemas e as soluções; para não terem possibilidade de confundir a «perseguição pessoal» com a «competência e o mérito daquilo que se propõe». Perceberão agora o favor que os «anónimos» lhes fazem? Porque para bravatas, não há melhor sabedoria que dito dos anciãos da Beira: «quanto maior é o alvo, melhor se lhe acerta».

O Direito Desportivo que se faz em Portugal (com uma ou duas honrosas exceções) está desfasado da Realidade. Há muito que o está. São resmas de decretos e portarias em catadupa. As soluções são sempre em cumprir ou não cumprir aquilo que se está a mudar constantemente. Ora, isso é, sequer, ter juízo ou senso?

Infelizmente ocuparam as cadeiras do Poder durante tempo demais nas últimas décadas. Com os resultados que estão agora à vista de todos. E que não há forma de disfarçar nem de desculpar. Os nomes e a formação em Direito dos que estiveram no Poder não pode ser disfarçada por nenhum truque jurídico. Há muito que essa profusão e predominância do Direito é um dos principais problemas do desporto português.

O Talvez repete outra vez: «andaram demasiado tempo a entreterem-se com as Infraestruturas & Decretos, em vez de apostarem na «competência a desenvolver a competitividade do desporto português». É tempo de mudar esse tipo de liderança nas organizações que gerem o desporto português.

Os que fazem o Direito do Desporto em Portugal não tem preparação para diagnosticar a Realidade Desportiva que é o Contexto do Desporto Português. O resultado está à vista.

Até quando teremos que prolongar esta incapacidade e esta incompetência?

Se não adotarem a Reforma que a Folha A4 propõe, e continuarem a produzir «decretos, portarias e contratos-programas», cuja profusão é irracional e excessiva, a Realidade continuará a fazer vítimas como as que a este Post testemunha, e que o Talvez antecipou.

Talvez

Luís Leite disse...

Caro JM Meirim:
Independentemente das questões de natureza jurídica, é fundamental que as modalidades desportivas, para o serem em território nacional, sejam tuteladas por uma Federação Internacional, com regulamentação universal.
Senão não passam de meras associações de direito privado, podendo existir várias para objectivos semelhantes.

Blog Spin disse...

Simplifiquemos...
Perante o cenário atual, atividade dessas federações tem relevância suficiente para receber apoios públicos? ... é que se não tem (e a meu ver não tem), o argumento apresentado é aceitável, ainda que deixe em aberto a possibilidade de as mesmas se adaptarem às normas internacionais e depois o SE ter de reverter a situação!

Estas Federações podem e devem manter a sua atividade, mas que o façam numa lógica de prestação de serviços sem fins lucrativos... pois os benefícios fiscais que lhes são concedidos são mais que suficientes como apoio público.

Concordo com a suspensão de modo a não existir financiamento público...acho um acto corajoso, pouco populista e como tal responsável... além de que, em caso algum os erros do passado possam servir para justificar a sua manutenção no presente.

Fernando Tenreiro disse...

Sem querer ofender ninguém há 'vozes' que chegam ao céu e se sentam e decidem o que é 'legal', porque é legal. Isto é muito velho. Estamos parados sobre uma lei errada, que, porque é lei, tem de ser aplicada e é o melhor para todos aplicar a má lei!????

No Portugal actual as vozes invisíveis por correctas que sejam são invisíveis, na definição e na materialidade.

Mal o comprei, li de uma penada o último livro de Herberto Helder e cheguei ao fim com uma sensação complexa e de certa plenitude que não quero aqui desenvolver para não estragar a viagem a quem nela se aventurar.

Leonardo disse...

E as modalidades com varias federações internacionais? O que deveria ser considerado é se a Federação desportiva FAZ DESPORTO ... e tem resultados nos objectivos traçados e contratualizados com o Estado.

Luís Leite disse...

Não há modalidades com várias federações internacionais.
Só uma pode ser membro do Comité Olímpico Internacional.
As que não são membros do COI são autoridades únicas aceites internacionalmente, na qual se encontram filiadas as federações nacionais.