Deixámos aqui algumas palavras sobre um segmento bem particular do «Caso Carlos Queiroz». Em breve, este caso colocou em cima da mesa a própria concepção administrativa de uma entidade pública com competências acrescidas no âmbito da luta antidopagem.
Na verdade, a vida – sempre bem agreste à formal realidade plasmada nas normas jurídicas –, veio a determinar uma situação de impedimento legal para o presidente da ADoP.
E, nesse exacto momento, colocou-se a questão da sua substituição.
A final do nosso texto questionávamos se Laurentino Dias iria homologar o parecer urgente que solicitou ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, sobre a legalidade da substituição daquele agente público pelo presidente do IDP.
O mesmo é dizer, em rectas contas, se a decisão punitiva da ADoP, da autoria daquele último era legal, por provir de agente público dotado de competência para tal.
No passado sábado o Expresso noticiava (Laurentino Dias esconde parecer da Procuradoria) que “o secretário de Estado do Desporto, Laurentino Dias, tem fechado a sete chaves, desde 30 de Setembro, um parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República (PGR) relevante para saber se a suspensão de seis meses a Carlos Queiroz, dada pela ADoP, foi legal. Em causa está a forma como se procedeu à substituição do presidente da ADoP”.
Por outro lado, “fonte do gabinete de Laurentino Dias disse ontem ao Expresso que “não há nenhum comentário a fazer” e que “o documento não é público”.
Sejamos claros.
Nenhum membro do Governo se encontra juridicamente vinculado a homologar um parecer que tenha solicitado ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República. Pode até, inclusive, tal parecer traduzir uma leitura errada das normas legais que suscitaram dúvidas ao governante.
Mas, se dúvidas existiam e por isso se solicitou o parecer, há pelo menos um comando ético-político que impõe a homologação das conclusões de qualquer parecer solicitado àquele que passa por ser o único órgão consultivo público (de vocação geral), restrito à matéria jurídica, do Governo.
Caso contrário, ou não se tem dúvidas – e não se pede o parecer – ou tendo encarrega-se um escriba de serviço para elaborar informação jurídica interna favorável ao que se pretende ou, numa terceira hipótese, «encomenda-se» um parecer externo.
9 comentários:
Caro JM Meirim:
A grande vocação deste Governo autoritário sem nexo (também) na Adimistração Pública Desportiva, atingiu todo o explendor, procurando traduzir a sua incontestável superioridade ética e moral, nas seguintes áreas temáticas (a ordem não está hierarquizada):
1) Legislativa;
2) Sancionatória;
3) Promoção e financiamento de mega-eventos (muitos) altamente deficitários;
4) Inauguracionista;
5) Inventora de Centros de Alto-Rendimento sem quaisquer critérios técnicos, de prioridade e localização e sem estarem concluídos e pagos;
5) Favorecimento da clubite e dos negócios futebolísticos, traduzida na própria composição do Conselho Nacional do Desporto;
6) Intromissão (permitida pela Lei) nas competências das Federações e dos seus Órgãos;
7) Desvalorização do trabalho das Federações, com excepção das subservientes;
8) Arrelvamento sintético do país para o Futebol e para o Rugby (um grande negócio sem sentido);
9) Utilização dos fundos comunitários sem critério nem clara orientação programática;
10) Favorecimento do desporto informal face ao desporto federado, vertido na Lei de Bases;
11) Desorientação e acção contraditória, conforme os interesses políticos, no Processo de Luta Anti-Doping.
Tudo isto com uma aparência sempre politicamente correcta.
No pior dos sentidos.
O que o Prof. José Manuel Meirim descreve é a imagem real do Direito do desporto feito em Portugal para além das suas vestes deslumbrantes.
Porém, acho que isso não é o que tem piores consequências.
O Direito e o seu uso na política desportiva tem consequências no usufruto do desporto para o bem-estar dos portugueses e estão numa rua sem saída, no fim da Europa.
A União Europeia a partir dos anos 70 começou a observar o afluxo inusitado de processos que extravasavam o direito nacional e quarenta anos depois observamos que recorreu às ciências sociais, sociologia e economia, para além do direito, concebeu o Modelo Europeu de Desporto e fez o Livro Branco do Desporto sobre o qual assenta um órgão e um orçamento para o desporto europeu previsto no Tratado de Lisboa.
Em 40 anos, para usar a mesma bitola temporal, Portugal teve uma série de experiências científicas e acaba enclausurado entre o direito e a política no fim da Europa do desporto.
O desafio que continuo a lançar aos professores de Direito no desporto é que cortem este cordão umblical com a política e concebam instrumentos pluridisciplinares para além daquilo que é uso o direito fazer de mau em toda a administração pública portuguesa.
Certamente que estas suas notas, que demonstram o que de mau de faz, são úteis mas tenho dúvidas do seu real impacto positivo e utilidade para saída do 'dead end'.
Vejamos, os líderes desportivos nem pestanejam com estes comportamentos juridico-politicos por vários motivos:
1 - não se sentem afectados.
2 - não sabem ou compreendem as alternativas.
3 - pensam que o seu tempo útil de liderança é inferior à possível transformação e benefício da correcção dos erros.
4 - esperam que uma mão lave a outra e pela compreensão dos problemas que reverencialmente colocam a Sua Excelência, quem quer que ela seja.
5 - não identificam a correcção dos usos e costumes como um direito de cidadania e um benefício com impactos estruturais significativos.
Estou a criticá-lo e isso é injusto para o que tem trazido mas é espantoso como na altura é que o país está numa crise histórica, ninguém no desporto levanta a voz a nível nacional para elucidar características e alternativas de futuro.
O seu caso é o de estar à hora errada no sítio errado.
Não se preocupe creio que sou eu que tenho estado nesta posição desde há muitos anos.
Agradeço os comentários do Luís Leite e do Fernando Tenreiro. Quanto a este último, muito haveria a dizer, mas é uma conversa que temos há anos. De todo o modo o Direito, a Economia e outras matrizes científicas não podem ser culpadas pela utilização que delas se fazem. E, estou certo, o Fernando Tenreiro sempre concordará comigo que teria que haver - como há - um qualquer desenho legal para enquadrar um serviço público como é o caso da ADoP. Por outro lado, nem se quer o que está em causa é algo que diga mais de perto àquilo que poderíamos designar por «legislação desportiva». Trata-se, no fundo, de aplicar normas do procedimento administrativo e da orgânica do IDP e da ADoP.
JMMeirim
José Manuel Meirim
Concordo com a sua redefinição da minha questão. Trata-se de um procedimento administrativo que para um leigo como eu passaria pelo mesmo que direito do desporto e não é.
Se tiver uma fórmula mágica para sensibilizar os líderes desportivos a debater a crise do desporto e as outras crises que lhes agravam a primeira, sou todo ouvidos.
O Congresso do Desporto, do início de 2006, não passou de uma gigantesca manobra política propagandista em que se fingiu (para inglês ver), pensar o Desporto português nas suas diversas dimensões.
Passados 5 anos, o que se sente é que o Governo só deu importância a meia dúzia de ideias que já eram as suas, desprezando todos os contributos mais críticos, que não afinavam pelo seu diapasão.
Foram apresentados muitos contributos especializados mas naturalmente dispersos e no fim saíu uma Lei de Bases que já estava feita.
O Congresso do Desporto foi a fingir porque não passou da fachada, agarrado ao politicamente correcto, sendo refractário a novas ideias reformistas e verdadeiramente estruturantes e transformadoras.
Como já aqui afirmei, os problemas não se resolvem com um qualquer enquadramento jurídico que não tome como ponto de partida uma realidade conhecida no terreno.
O que falta mesmo em Portugal são estudos de Desporto comparado com os vários modelos existentes nos países de referência. E pessoas que se interessem mesmo por Desporto e o acompanhem numa perspectiva internacional, descentrada da Futebolite e Clubite internas e de modelos teóricos universitários importados de outras culturas e níveis de desenvolvimento, sem aplicação directa em Portugal.
Para que depois se possa fazer um diagnóstico correcto da situação.
Tal como noutras áreas políticas, as comparações limitaram-se ao número de praticantes federados e não federados e de equipamentos desportivos, cujos critérios de contagem são muito variados e ilusórios, quando não simplesmente errados (posso demonstrá-lo). Há outros números e estatísticas importantes, em diversas áreas.
Enquanto não houver um diagnóstico honesto e realista, algo que obviamente não interessa conhecer porque "o Rei passará de vestido a nú", o Desporto português não passará daquilo que tenho demonstrado que é: a cauda da Europa, em quase todos os paraâmetros.
E não é, certamente, por falta de produção legislativa.
É mais por falta de diálogo e falta de personalidades globalmente conhecedoras de Desporto, que tenham acesso ao Poder e não sejam partidariamente dependentes.
Então, e as duas decisões dos tribunais administrativos a rejeitar as providências cautelares das associações de futebol de Bragança e do Porto?
O que é que o José Manuel Meirim tem a dizer a isto?!
Como são tribunais diferentes e juízes diferentes, como é que explica que as suas teses (dele, Meirim) não tenham tido acolhimento e tenham sido liminarmente rejeitadas?!
Será que é por serem juízes "controlados" pelo Governo?!
Lá vem este outra vez com o futebol e as associações.Porque não se preocupa com a decisão do tribunal em relação à vela?Ou só as do futebol porque lhe são favoráveis é que interessam?
Escreve Luís Leite
A grande vocação deste Governo autoritário sem nexo (também) na Adimistração Pública Desportiva, atingiu todo o explendor [...]
Esplendor, não "explendor", sff.
Agradeço ao anónimo a correcção do erro ortográfico e lamento também a gralha na palavra "administração".
Distracções (agora distrações) dificilmente desculpáveis.
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