Texto da autoria de João Boaventura cujo envio se agradece.
O autor refere-se a este diploma
Como vem sendo norma consuetudinária, a cada novo governo constitucional cabe, dentro da respectiva cronologia, o desempenho do papel de jogador do Direito, ou o de reconstrutor e renovador das normas jurídicas do futuro Direito Desportivo, que ora nos interessa, e no pressuposto de que se trata de um sub-sistema integrado no sistema social global, contemplando as interacções jurídicas, ou os laços afectivos que devem ligar o actor legislador ao actor que joga dentro da sociedade civil desportiva, para que a razão jurídica transmita a racionalidade do mundo desportivo que objectivamente se propõe.
Isto para dizer que o modelo jurídico deve corresponder ao modelo sociológico, ou que ambos se devem justapor, para que a eficiência, a exclusividade e o dinamismo de ambos tenham reflexos no sistema desportivo. Da distinção entre o retrato jurídico e o retrato sociológico resulta uma luta de domínio entre ambos, porque à lógica jurídica contrapõe-se a lógica sociológica, e deste afrontamento resultam os efeitos que não se desejam, com prejuízo para o mundo do deporto. Daqui se depreende que a lógica jurídica do direito desportivo não deve sobrepor-se à lógica da sociologia desportiva, sob pena de as interacções comunicacionais entre o direito e os agentes desportivos saírem defraudadas.
Talvez se possa agora entender as razões do título do anterior post “O Direito Desportivo traído pela Sociologia”, cuja tradução simplista especifica que, pelo estudo da sociologia desportiva, se pode descortinar a desadaptação da estrutura normativa à realidade desportiva, por não corresponder às expectativas dos destinatários. È, de certa forma, um combate permanente que exige uma compreensão comum dos problemas que afectam o desporto, em todos os seus campos de actuação.
O duelo também se situa noutras áreas, como no trabalho de André-Jean Arnaut et Pierre-Yves Raccah, “Le droit trahi par la philosophie” (Bibliothèque du centre d’étude des systèmes politiques et juridiques de Rouen, 1977) que a editora espanhola LSJ (San Sebastian, 1990) traduziu para “El Derecho sin Máscara”, e os brasileiros, logicamente, como “O Direito traído pela filosofia” (S.A. Fabris, Porto-Alegre, 1991). Na mesma linha de pensamento André-Jean Arnaut publicaria mais tarde “Le droit trahi par la sociologie. Une pratique de l’histoire” (LGDJ, Paris, 1998), inspirado na asserção de Lawrence Friedman de que as duas disciplinas, a sociologia e a história, se podiam comparar a “dois barcos que se cruzam na noite”.
Da mesma forma o sistema educativo também foi traído pela sociologia quando Jean-Claude Passeron e Pierre Bourdieu publicaram “Les héritiers. Les étudiants et la culture”(1964), seguido da “La reproduction. Éléments pour une théorie du système d’enseignement” (1970), denunciando as universidades como centros de reprodução da desigualdade, e que levaram ao Maio de 68, em Paris. Também aqui há uma relação de poder já que a sociologia da educação pode revelar as fraquezas do sistema educativo, ou do sistema jurídico que lhe dá suporte.
De uma forma simplista poder-se-á retratar esta relação de forças pela comparação literária quando se considera que Corneille descreve os homens, não como eles são, mas como eles deveriam ser, enquanto Racine já os retratam tal como eles são. Se a comparação se permite, sem a forçar, dir-se-ia que o Corneille literário, seria o Corneille do direito desportivo que se permite impor a reestruturação do desporto, enquanto o Racine literário, o Racine da sociologia desportiva, porque corrige a reestruturação do desporto que não corresponda aos desejos do destinatário.
Estamos na presença de dois poderes, sociológico e jurídico, incomunicáveis, a que acresce o poder do Estado que, utilizando o jurídico, lhe confere um duplo poder. E é deste duplo poder que dependeu todo o desporto do passado, como irá depender o do presente e o do futuro.
Isto para dizer que o modelo jurídico deve corresponder ao modelo sociológico, ou que ambos se devem justapor, para que a eficiência, a exclusividade e o dinamismo de ambos tenham reflexos no sistema desportivo. Da distinção entre o retrato jurídico e o retrato sociológico resulta uma luta de domínio entre ambos, porque à lógica jurídica contrapõe-se a lógica sociológica, e deste afrontamento resultam os efeitos que não se desejam, com prejuízo para o mundo do deporto. Daqui se depreende que a lógica jurídica do direito desportivo não deve sobrepor-se à lógica da sociologia desportiva, sob pena de as interacções comunicacionais entre o direito e os agentes desportivos saírem defraudadas.
Talvez se possa agora entender as razões do título do anterior post “O Direito Desportivo traído pela Sociologia”, cuja tradução simplista especifica que, pelo estudo da sociologia desportiva, se pode descortinar a desadaptação da estrutura normativa à realidade desportiva, por não corresponder às expectativas dos destinatários. È, de certa forma, um combate permanente que exige uma compreensão comum dos problemas que afectam o desporto, em todos os seus campos de actuação.
O duelo também se situa noutras áreas, como no trabalho de André-Jean Arnaut et Pierre-Yves Raccah, “Le droit trahi par la philosophie” (Bibliothèque du centre d’étude des systèmes politiques et juridiques de Rouen, 1977) que a editora espanhola LSJ (San Sebastian, 1990) traduziu para “El Derecho sin Máscara”, e os brasileiros, logicamente, como “O Direito traído pela filosofia” (S.A. Fabris, Porto-Alegre, 1991). Na mesma linha de pensamento André-Jean Arnaut publicaria mais tarde “Le droit trahi par la sociologie. Une pratique de l’histoire” (LGDJ, Paris, 1998), inspirado na asserção de Lawrence Friedman de que as duas disciplinas, a sociologia e a história, se podiam comparar a “dois barcos que se cruzam na noite”.
Da mesma forma o sistema educativo também foi traído pela sociologia quando Jean-Claude Passeron e Pierre Bourdieu publicaram “Les héritiers. Les étudiants et la culture”(1964), seguido da “La reproduction. Éléments pour une théorie du système d’enseignement” (1970), denunciando as universidades como centros de reprodução da desigualdade, e que levaram ao Maio de 68, em Paris. Também aqui há uma relação de poder já que a sociologia da educação pode revelar as fraquezas do sistema educativo, ou do sistema jurídico que lhe dá suporte.
De uma forma simplista poder-se-á retratar esta relação de forças pela comparação literária quando se considera que Corneille descreve os homens, não como eles são, mas como eles deveriam ser, enquanto Racine já os retratam tal como eles são. Se a comparação se permite, sem a forçar, dir-se-ia que o Corneille literário, seria o Corneille do direito desportivo que se permite impor a reestruturação do desporto, enquanto o Racine literário, o Racine da sociologia desportiva, porque corrige a reestruturação do desporto que não corresponda aos desejos do destinatário.
Estamos na presença de dois poderes, sociológico e jurídico, incomunicáveis, a que acresce o poder do Estado que, utilizando o jurídico, lhe confere um duplo poder. E é deste duplo poder que dependeu todo o desporto do passado, como irá depender o do presente e o do futuro.
7 comentários:
O que é Desporto?
O que é Juventude?
Deve um mesmo instituto público ter como objecto da sua existência duas áreas diferentes e com objectivos diversos?
Até agora, que me lembre e após pesquisa breve, todos os institutos públicos tinham por objecto apenas um tema, assunto ou actividade.
Agora, passamos a ter os desportistas desportistas, os desportistas jovens, os jovens jovens, os jovens não desportistas e os desportistas não jovens todos metidos no mesmo saco, na mesma organização (?).
Incluem-se ou não os desportistas não jovens e os jovens não desportistas?
O que é Desporto?
O que é Juventude?
Em que medida se sobrepõem ou não?
Mais uma vez o mesmo erro. E sempre o mesmo erro. O problema talvez sejam os autores e as referências utilizadas, que já não representam qualquer contributo relevante para os assuntos que se colocam à discussão. Quando apareceu a questão do Direito e da Sociologia não comentei por causa dessa desactualização. Mas agora JMConstantino vem corroborar JBoaventura.
O que hoje se discute é se a noção de «Sociedade» não é um conceito abstracto sem relevância operatória, e uma falácia para o próprio estudo das formas colectivas construídas pelos indivíduos humanos. São inúmeros os trabalhos académicos que, nas universidades mais prestigiadas do mundo (isto é, aquelas que estão nos 20 primeiros lugares do ranking mundial), adoptam essa crítica. Mas cá no burgo lusitano ainda se discute o antanho.
Ora a questão é a seguinte: os dois termos (direito e sociedade) são de ordens conceptuais distintas. Estão por isso impedidos de uma relação directa como a que expressa este texto de JMConstantino (e antes de JBoaventura). A Sociedade é um ente abstracto que ninguém sabe onde está, nem onde começa e acaba para cada indivíduo que diz viver nela. O Direito tem consequências muito mais comezinhas e próximas, e é exercido pelo arbítrio de indivíduos concretos, com nome, que urinam e choram, e moram nalgum lado objectivo.
A sociedade não se explica pela sociedade (pela sociologia). A vida não se explica pela vida (biologia). Este erro da auto-referência e da indecibilidade foi formulado em 1931.
Quando não se dominam certas áreas, e não se possui os conhecimentos básicos, é o que acontece a opiniões como as de JMConstantino e JBoaventura.
Funcionário do Estado
Será que o homem a esta hora já não sabe distinguir entre quem edita e quem escreve?
São inúmeros os trabalhos académicos que, nas universidades mais prestigiadas do mundo (isto é, aquelas que estão nos 20 primeiros lugares do ranking mundial), adoptam essa crítica e para isso basta uma folha A4.
O sósia do Funcionário do Estado
O que é curioso é o facto de, a pretexto da poupança de recursos financeiros do Estado, este governo, no caso do Desporto, dar mais um passo no caminho politicamente correcto dos governos PS, de ainda misturar mais o Desporto com outras coisas que nada têm a ver com Desporto.
Antes era a "actividade física e desporto", numa perspectiva política eleitoralista de identidade ou até igualdade, sem o mínimo sentido prático.
Agora, é uma amálgama de "desporto e juventude" numa perspectiva aparentemente análoga.
Num país esgotado, sem soluções à vista, à beira de um colapso económico e social de dimensão inimaginável, convenhamos que todos estes disparates não adiantam nem atrasam nada.
Estes são assuntos secundários, já que em breve a maioria da população o que vai ter que pensar é como fazer para sobreviver.
Continuo sem perceber a agregação do desporto e da juventude, antes numa Secretaria de Estado e agora também num Instituto Público.
Por que razão é a juventude privilegiada em relação a outros escalões etários, criando maus hábitos de direitos exclusivos que não poderão manter, criando uma ilusão de facilitismo em paralelo com o facilitismo escolar inútil?
Onde começa e acaba a juventude? E os ex-jovens e os velhos?
Resta-lhes uma Segurança Social de filas intermináveis e com a falência à vista e as iniciativas autárquicas eleitoralistas e popularuchas num país falido?
Acabem com as filosofias. Está na hora de trabalharmos mais. Apelo para que ofereçam gratuitamente ao Estado e/ou aos patrões, de livre vontade e gratuitamente, mais uma hora de árduo e produtivo trabalho por cada dia. E igualmente o Sábado das 9h às 12h.
Portugal merece.
Ou não?
Funcionário do Estado
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