O Governo, ao longo de mais de um ano que leva de exercício de funções, não apresentou ainda, como prevê o programa de governo, qualquer projeto de requalificação do Complexo Desportivo do Jamor. Este tempo não foi aproveitado para juntar as entidades residentes/utilizadoras do Complexo, designadamente várias federações desportivas, e definir um quadro de soluções possíveis face aos problemas existentes. Este tempo foi aproveitado para tentar resolver dois problemas: o do futebol e o de João Lagos. E com um princípio claro desde o inicio: o governo pretende passar parcelas daquele património público para outras mãos. Única solução, de resto, que,naquele local, pode animar o mercado da construção, face à crise da iniciativa pública.
Não me vou pronunciar sobre a solução que ontem foi anunciada. Ou outras que já estiveram previstas e foram colocadas de lado. E ao histórico deste processo. E a questões de direito no âmbito da propriedade pública do Estado. E ao que está em cima da mesa. Razões de natureza profissional, passadas e presentes, a isso me aconselham. Mas adianto que não tenho qualquer reserva à alienação no todo em parte, garantida que seja a sua função pública, do Complexo Desportivo do Jamor. E não tenho também qualquer resistência de princípio à valorização dos projetos imobiliários e afins que decorrem em áreas anexas ao perímetro do Complexo. Pretendo apenas chamar a atenção para um outro lado do problema: o modo como a realidade Jamor é vivida, é sentida e o seu espaço administrado. E o cuidado que se deve colocar em todas as iniciativas que, pretendendo valorizar o espaço, podem ser entendidas como de limitativas ao sentido público da sua missão.
O Jamor não é apenas o maior um equipamento desportivo público. Não é só um elemento destacado do património publico material. É um elemento identitário a que os portugueses se habituaram a ver e a sentir como uma referência afetiva. E que tem com as populações que o circundam uma relação especial. E pese embora as vicissitudes porque passou e, em determinados momentos, o elevado estado de degradação que atingiu, nunca essa dimensão de pertença se perdeu.
Quando no passado, os responsáveis de então, decidiram vedar algumas das zonas de acesso livre ao Complexo do Jamor, do modo a limitar a sua já acentuada degradação e impedir a prostituição que ocorria num dos topos, a decisão gerou enorme polémica. Quando se procurou impedir que o parque de estacionamento norte se mantivesse em regime de non-stop como local de engate e praticas gay a céu aberto, os portões, então colocados, foram várias vezes destruídos. Quando se procedeu ao abate de algumas espécies arbóreas, velhas e doentes, com o objetivo de substitui-las por outras a medida gerou reclamações e polémicas com a população. E a construção de campo de golfe de 9 buracos que é um fator de valorização patrimonial e paisagístico de todo o Complexo foi motivo de atrasos e disputas em tribunal com imenso dinheiro gasto que seria desejavelmente evitável.
O Jamor foi sempre um espaço de residência /utilização de muitas federações desportivas. São de há décadas inquilinos daquele espaço. É impensável uma qualquer solução futura que não passe pela necessidade de auscultação e concertação com os seus interesses e necessidades. E o que e se diz para este tipo de entidades se pode dizer para a mais antiga escola de formação de quadros superiores de Educação Física e Desporto (FMH).
O Jamor é o maior espaço público disponível para a prática informal do desporto. São milhares os seus utilizadores e qualquer solução futura não pode deixar de levar em linha de conta esta missão de serviço público. Mas o Jamor é também, e ainda, local de habitação para algumas famílias, em antigas casa de função do Estado, muitas delas sem condições de habitabilidade adequadas e que carecem de resolução. E finalmente o Jamor é uma via de atravessamento rodoviário com milhares de viaturas diárias incompatível com a natureza e missão daquele espaço.
Se digo tudo isto não é porque tenha uma solução pronta a servir. Apenas para chamar a atenção para a complexidade de tudo quanto envolve o Complexo Desportivo do Jamor.E para necessidade de não andar a correr atras do fogo-fatuo.E como, o que ontem foi anunciado, ainda vai fazer correr muita tinta, pode ser, que, pelo menos,que tenha o mérito de alertar consciências e chamar a atenção para o Jamor.
9 comentários:
Querem transformar o CDNJ num parque industrial desportivo de utilização restrita. Lamentável
A Folha A4, se aplicada à Governação do Desporto, teria obviamente um caminho para a «solução» concreta desse problema.
Em 2004 (salvo erro) o semanário “Expresso” publicou nas páginas centrais a maqueta do «projeto imobiliário» que se pretendia construir no local para onde ia o campo de golfe. Um desenho que incluía o prolongamento até ao mar com uma Marina. E lá estavam os projetos de «Lagos, Lda.», e outros. Um assunto que até deu polémica e acesos debates na Assembleia da República.
Mas voltemos à solução que a Folha A4 propõe. É uma solução para a qual é necessário coragem, sobretudo daqueles que se dizem aqui «humilhados e ofendidos», e falam muito.
A solução que proponho é a seguinte: Proponham ao Estado a classificação do Complexo Desportivo do Jamor como “Monumento de Interesse Público”, de acordo com a legislação em vigor.
Mas para além de dar a «solução», até dou uma outra ajuda, começando a redigir o texto da Proposta do seguinte modo:
Assunto: Projeto de Decisão n.º ?/2012 relativo à classificação como «Monumento de Interesse Público (MIP)» do Complexo Desportivo do Jamor.
1 — Nos termos do artigo 25.º do Decreto -Lei n.º 309/2009, de 23 de outubro, faço público que, com fundamento em Parecer da Secção do Património Arquitetónico e Arqueológico do Conselho Nacional de Cultura (SPAA — CNC) de ??/??/2012, é intenção da Direção-Geral do Património Cultural propor a S. Ex.ª o Secretário de Estado da Cultura a classificação como Monumento de Interesse Público do Complexo Desportivo do Jamor, constituído por etc., no concelho de Oeiras, distrito de Lisboa, e à fixação da respetiva zona especial de proteção (ZEP), conforme planta de delimitação anexa, a qual faz parte integrante do presente Anúncio.
2 — Nos termos dos artigos 27.º e 46.º do Decreto -Lei n.º 309/2009, de 23 de outubro, os elementos relevantes do processo estão disponíveis nas páginas eletrónicas dos seguintes organismos:
a) DGPC, www.patrimoniocultural.gov.pt;
b) Câmara Municipal de Oeiras, www.cm-oeiras.pt
3 — O processo administrativo original está disponível para consulta na DGPC — Direção de Serviços dos Bens Culturais, na morada seguinte….
4 — Nos termos do artigo 26.º e do n.º 3 do artigo 45.º do Decreto--Lei n.º 309/2009, de 23 de outubro, a consulta pública terá a duração de 30 dias úteis.
5 — Nos termos do artigo 28.º e do n.º 4 do artigo 45.º do mesmo decreto-lei, as observações dos interessados deverão ser apresentadas junto da DGPC que se pronunciará num prazo de 15 dias úteis.
6 — Caso não sejam apresentadas quaisquer observações, a classificação e a ZEP serão publicadas no Diário da República, nos termos do artigo 32.º do diploma legal acima referido, data a partir da qual se tornarão efetivas.
7 — Aquando da publicação referida no número anterior, os imóveis incluídos na ZEP ficarão abrangidos pelo disposto nos artigos 36.º, 37.º e 43.º da Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro, e no artigo 43.º do Decreto--Lei n.º 309/2009, de 23 de outubro.
Haverá coragem? Ou é só conversa?
Talvez
Em 2004 (salvo erro) o semanário “Expresso” publicou nas páginas centrais a maqueta do «projeto imobiliário» que se pretendia construir no local para onde ia o campo de golfe. Um desenho que incluía o prolongamento até ao mar com uma Marina. E lá estavam os projetos de «Lagos, Lda.», e outros. Um assunto que até deu polémica e acesos debates na Assembleia da República.
Alguns gostam que se lhes chame «empresários» (neste caso «do desporto»). Mas passaram a vida a tentar tirar ao Estado os terrenos públicos para lá construírem o lucro certo, sem correrem qualquer risco. Isto é, tentam que o Estado permita que lá construam um negócio que antecipadamente dá lucro garantido, por ser num sítio privilegiado. E assim obtêm, obviamente, empréstimo dos bancos para a construção, porque dão como garantia esse lucro garantido. Isto tudo sem gastarem nada do que é seu, e á conta de Governantes fracos e cúmplices, que ansiosamente esperam encontrar à esquina de cada nova legislatura. São esta «espécie de pseudo-empresários» que vivem da subsidio-dependência que se constituem geralmente como «pontas-de-lança» de um poder maior que os empurra para a frente. Todo este despudor à revelia do interesse público, e aos ombros de um Estado vilipendiado há tempo demais. Razão pela qual a corrupção e a delapidação da riqueza nacional tem sido a constante há mais de três décadas. Inclusive por aqueles que se dizem pertencer a «sociedades mais ou menos secretas» que existiriam para defender a Ética e a Moral da coletividade humana.
O Complexo Desportivo do Estádio Nacional é um daqueles casos em que nunca qualquer plano vingou na íntegra.
E quase tudo o que se decidiu e fez foi para dar resposta política a situações extremas, como a realização de grandes eventos ou a pressões de determinados grandes atletas que poderiam trazer problemas aos políticos.
Disso fui testemunha.
Todas as iniciativas de transformação no Complexo foram decisões isoladas e sem articulação planificada.
É de facto um caso de (não) ordenamento territorial extremamente complexo, em que vagas de pressões foram tendo (ou não) respostas politicamente convenientes, com muitos interesses pelo meio.
Nada mais.
A situação do Estádio de Honra, que está completamente obsoleto e em adiantado estado de degradação material e funcional, é, nos tempos que correm, impossível de resolver.
A única coisa que se sabe é que sai muitíssimo mais caro recuperar e atualizar aquele enorme anfiteatro construído há 70 anos que demoli-lo e fazer um novo de raíz.
Como não há nem haverá nas próximas décadas capacidade financeira para fazer seja o que for, julgo que a classificação do Estádio como património arqueológico de interesse nacional, incluindo um pequeno museu com fotografias da sua relevância histórica, seria a melhor solução.
Sobre a proposta anterior também poderíamos (sobretudo para aqueles que aqui tanto detestam o concreto, a ação, e a prática) dizer o mesmo por outras palavras:
“No estudo do Património encontraremos um fenómeno idêntico. Que confere, para a «Memória do que se transmite», um êxito adaptativo do mesmo tipo, e que só se pode explicar através da interferência da cognição. O Património não é explicado suficientemente pela “sacralidade”. Como fazem Maurice Godelier (2000[1996]), Annette Weiner (1992), ou Nathalie Heinich (2009) aliás na linha de Otto (1969) e de Pomian (1984). Mesmo tendo em consideração esse importantíssimo contributo de Godelier, ao relacionar numa dialética o «alienável» e o «inalienável»: “Guardar para (poder) dar, Dar para (poder) guardar” (Godelier, 2000, p.48); e ao distinguir os três princípios ligados ao «processo de Troca Económica» (vender, dar, e guardar), respetivamente os Bens “alienáveis-alienados”, os Bens “inalienáveis-alienados”, e os Bens “inalienáveis-inalienados” (Heinich, 2009). Ou o contributo de Annete Weiner, mostrando a necessidade de um ponto-de-restauro permanente para que «o que se dá ou vende» conserve o Valor (isto é, aquelas pessoas ou coisas que servem de referência ao Valor, tal como, por exemplo no domínio do valor económico, o ‘ouro’, a ‘cotação da moeda/divisa’, ou o ‘consenso do mercado através do rating’). Também é insuficiente o contributo de Lorenç Prats, ao reduzir a razão do Património ao «processo de simbolização de Geertz» e à «Identidade». Quando diz: “Los símbolos patrimoniales, como cualquier sistema simbólico, son deudores de una correlación entre ideas y valores que explico com gran claridade Clifford Geertz, 1987, en un modelo referido a la religión, pero que es perfectamente extrapolable a cualquier representación de la realidade com vocación normativa”; “Pero el factor determinante es su carácter simbólico, su capacidade para representar simbolicamente uma identidade.” (Prats, 1997, p.22;). Esta perspetiva de Prats não se verifica totalmente. Pois no «processo de patrimonização» a «Identidade» não é senão um entre os demais valores patrimoniais, não sendo sequer de onde nascem os outros oito valores que o património permite (como confirmam os inúmeros exemplos empíricos que se podem dar, por exemplo no Egipto Antigo com a coleção de Amenófis III, ou os gabinetes de curiosidades do século XVI/XVII, a coleção de Francisco I em 1532 em França, as coleções científicas dos naturalistas no século XVII/ XVIII, ou a profusa memorabilia contemporânea, e tantas outros casos que se sucederam ao longo da história humana). De facto, há objetos/coisas que são «Património» sem ser por causa das explicações dadas por estes autores. O Património não reside no triângulo imaginado por Prats (“un pool virtual de referentes simbólicos patrimoniales”, 1997, pp.27, 28, 30), mas deriva de uma codificação inserida e manipulada pela cognição (Squire & Kandel, 2002; Wynn & Coolidge, 2010). E é «construído socialmente» por um processo que escapa aos constrangimentos da “adaptação” preconizados pela teoria da «co-evolução gene-cultura» proposto pela Etnobiologia contemporânea (Ellen, 2006).” (TALVEZ, “Antropologia e Património”, UNL/FCSH, pp.6-7).
Não será esta mais uma razão para preservarmos o Jamor como Património? Ou não?
Talvez
Talvez o Primeiro-Ministro devesse ter assessores com formação desportiva… (estou a brincar).
Digo isto porque… Que belo debate daria agora o tema «Resultados, Competição, e Competitividade Desportiva». Depois das «medidas de austeridade» anunciadas por um Primeiro-Ministro de um País que necessita de «aumentar a Competitividade» e a riqueza. «Belo Debate» por causa do comentário crítico que fiz na altura ao «conceito de Competição e de Competitividade que distingue o Desporto das outras atividades humanas».
É nestes momentos privilegiados que, tal como referi, o Desporto serve para dar a sua Lição. Concretamente, de «metáfora das relações sociais de Competição e Competitividade». «Objetivos» e «Resultados» nunca como nestas ocasiões são melhor debatidos.
Talvez
Há erros sistemáticos do Alexandre Mestre que pretendendo uma posição diferente não consegue descolar do modelo que Marcelo Rebelo de Sousa diz ser a característica deste governo e para o qual MRS sugere a urgente remodelação. Partir o EN às fatias é um modelo em cima do joelho só isso. O dar aos amigos que gostam do governo e das coisas que o Governo dá é uma particularidade e uma característica bem nacional.
Talvez, algures entre Júpiter e Neptuno, complica o que é simples, necessitando de fazer exibição bibliográfica extensiva.
Também podia fazê-lo, mas acho ridículo e sobretudo revelador da existência de determinadas mentalidades que insistem em navegar fora deste planeta.
Hoje ficámos a saber que, passo a citar: “Em quatro Folhas A4, constam os ensinamentos dirigidos aos gabinetes ministeriais. O documento, que ensina os ministérios a justificarem medidas de austeridade, foi enviado na sexta-feira, dia do anúncio pelo Primeiro-Ministro, e dá instruções aos assessores de como lidar com a pergunta "é um novo aumento de impostos?".
Para a solução do Jamor, mais uma vez, não precisei mais do que isso. E mais uma vez não houve qualquer outra ideia ou solução. Apenas o insulto adolescente, tal como os miúdos fazem, por ainda não terem crescido o suficiente para debaterem ideias e argumentos.
A Folha A4… Evidentemente. Usada nas ocasiões difíceis, para resolver problemas complexos, e estabelecer a comunicação entre as «partes».
Talvez
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