Em termos conceptuais o apoio público à prática desportiva justifica-se pelo facto de os benefícios daí decorrentes não se esgotarem no individuo/praticante e estenderem-se à comunidade em diversos domínios de cariz social, cultural, educativo e económico.
No que concerne ao desporto federado compete à sua hierarquia associativa organizar e desenvolver os quadros competitivos, dotando o Estado os recursos e os poderes necessários para tal actividade, a qual funciona num regime distante de um mercado convencional, atendendo a um conjunto de especificidades.
Partindo, por parcimónia de espaço e tempo para mais desenvolvimentos, destas duas premissas, um dos recursos que o Estado assegura no apoio ao normal desenvolvimento das competições tem sido, há longos anos, o policiamento dos espectáculos e manifestações desportivas, atendendo às competências que a lei fundamental lhe atribui em matéria de segurança pública e de prevenção da violência no desporto.
Para o efeito dispõe de uma percentagem das verbas provenientes das receitas dos jogos sociais, que a lei afecta anualmente à Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna (MAI), para posterior transferência para as forças de segurança. Ou seja, o dinheiro não provem do bolso dos contribuintes, via Orçamento de Estado - como por vezes, e já neste espaço, se refere -, mas dos apostadores nos jogos sociais.
Ora, o novo quadro regulador sobre esta matéria traz, em relação ao regime anterior, importantes alterações, as quais, é sabido, têm suscitado controvérsia pela eventual redução do âmbito da comparticipação do Estado nos encargos com o policiamento de espectáculos desportivos, a qual se prioriza nas selecções nacionais e “provas de campeonatos nacionais de escalões etários inferiores ao do escalão sénior e dos campeonatos distritais”, sendo que “nos espectáculos referentes a competições de escalões juvenis e inferiores, quando realizadas em recinto, em regra, não deve ter lugar o policiamento”.
Isto é, o Estado apenas comparticipa regularmente as competições no escalão entre juvenis e seniores, ficando ao critério do promotor do espectáculo (clube) requerer o policiamento nos restantes escalões, salvo nos casos legalmente obrigatórios, sendo este “inteiramente responsável pela ordem e segurança no interior do respetivo recinto…”.
Importa também ter em atenção que estas alterações surgem com a época desportiva a decorrer e têm um impacto assinalável nos orçamentos dos clubes:
Desde logo pelos novos valores, recentemente fixados, auferidos pelas forças de segurança pela participação efectiva na prestação de serviços remunerados, definidos nas tabelas anexas.
Depois, cumprindo as novas disposições, são obrigatoriamente destacados, no mínimo, três agentes, sendo normalmente um deles graduado.
A isto acresce o facto das autoridade policiais, a quem incumbe garantir o cumprimento da Lei (!?), considerarem competições desportivas de natureza profissional diversas competições organizadas por associações distritais e regionais - quiçá adiantando-se à regulamentação do art.º 59.º da lei deste país onde se tipificam os parâmetros para o reconhecimento da natureza profissional das competições desportivas e os consequentes pressupostos de participação nas mesmas - , cobrando aos clubes o policiamento de acordo com os valores, naturalmente mais elevados, definidos na tabela remuneratória para essas competições.
Por fim, as referidas tabelas cobram um período mínimo de policiamento de quatro horas, sendo raras as competições com essa duração, aqui incluindo o policiamento prévio e posterior à sua realização. Para atestá-lo o leitor poderá deslocar-se, por exemplo, a um pavilhão e verificar o tempo que as forças de segurança aí permanecem para um jogo de voleibol, andebol, futsal ou basquetebol…
Perante este cenário, num contexto de elevados condicionalismos financeiros, não se fez esperar a contestação, organizada ou pontual, de vários agentes desportivos, nomeadamente árbitros e dirigentes, ou de encarregados de educação. Tendo sido suspensas competições.
Nas competições de natureza profissional, clubes há que dispensaram o policiamento em estádios com lotação de dezenas de milhar de espectadores…
Confrontado com tudo isto, de acordo com informação disponível comunicada aos clubes, “por parte do gabinete de Sua Excelência o Ministro da Administração Interna, foram transmitidas instruções às forças de segurança no sentido de que (…) sejam aceites sem qualquer encargo para os promotores, em conformidade com o artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 216/2012, de 9 de Outubro, as requisições para o policiamento dos jogos referentes aos escalões de formação, devendo o pagamento dos serviços ser suportado pela Secretaria Geral do MAI…”. "Este regime transitório de adaptação (…) não tem lapso temporal definido (…)”.
Ou seja, assim, tão simples, em mais um feliz exemplo que alguém em tempos definiu como “law in Portugal”, volta-se à casa de partida, retomam-se as competições, e voltam a ter policiamento nos escalões onde o diploma considerava, que, em regra, não deviam ter lugar…
Aqui chegados não se questiona se o legislador mediu o impacto desta regulação e acautelou o normal funcionamento das competições, nomeadamente nos escalões de formação iniciais, e as responsabilidades, anteriormente mencionadas, que a Constituição confere ao Estado em matéria de segurança e prevenção da violência associada ao desporto. Disso se ocupará o Tribunal Constitucional, a fazer fé no ponto 4 da deliberação da Direcção da Associação de Futebol de Lisboa.
Não se questiona também se tal medição do impacto aferiu o aumento exponencial nos encargos de policiamento e o reflexo que isso tem, no contexto actual, não só na gestão de clubes de pequena e média dimensão mas, complementarmente, noutros poderes públicos aos quais estes inevitavelmente recorrem nestas circunstâncias, em particular os Municípios e as Freguesias.
A pergunta que aqui fica é apenas esta: Desconhecendo-se um aumento substancial nos quadros competitivos federados face à época desportiva anterior, e sendo os encargos de comparticipação do Estado provenientes da distribuição dos resultados líquidos dos jogos sociais explorados pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, o que justifica a decisão de limitar o policiamento, e por essa via a comparticipação pública, quando a verba destinada ao policiamento de espectáculos desportivos tem vindo a aumentar nos últimos anos, conforme atesta a tabela de distribuição de receitas dos jogos sociais a páginas 168 do Relatório e Contas de 2011 da Santa Casa e se mantém em 2013 a mesma repartição para este fim face a 2012 ?
Pelo que aqui se alinhou suspeita-se a resposta. Oxalá não fique sem confirmação oficial…
Por certo, sendo a parceria entre as entidades federativas e as estruturas das forças armadas e de segurança uma realidade bem vincada ao longo de décadas, não só pelo trabalho no terreno, mas também na representatividade em cargos dirigentes em várias federações e órgãos de topo do nosso sistema desportivo, estas questões estarão em cima da mesa no seminário “Desporto e Forças Armadas”, numa ocasião, feliz e oportuna, para se debater o tema e esclarecer os interessados.
3 comentários:
New economics is being made: "Ou seja, o dinheiro não provém do bolso dos contribuintes, via Orçamento de Estado - como por vezes, e já neste espaço, se refere -, mas dos apostadores nos jogos sociais." How wonderful when nature follows their most foolish ideas and scientifically, they intend to mean, tax payers are different from those who bet and State has fiscal benefits, one from common citizen and another one completely different citizen related to those who bet and don't pay taxes even if their prize is shortened in several tens of thousands! Only in English it is possible to express this new literature! Econo… what?
Não me agrada nada pagar dos meus impostos policiamento porque os sr. encarregados de educação não se sabem comportar a ver jogos de crianças... se vem dos impostos ou de outras receitas é indiferente... é dinheiro publico para clubes de futebol... Não me agrada e é discriminatório em relação aos desportos que fomentaram e educaram para comportamentos cívicos do seu publico.
Quem trabalha bem noutros desportos leva com 23% de iva sem recuos, quando se mexe com o populismo do futebol avança-se num dia e recua-se no dia seguinte...
Sempre achei curiosa a designação, saída do 25 de Abril, "encarregados de educação". Coisa mais forçada e anti-natural...
A educação só faz sentido se for dada pelos pais, ou na sua ausência, pelo ambiente familiar. Não é negligenciável para terceiros.
A Escola não é o local para dar educação, mas para dar instrução específica sobre matérias e conhecimentos essenciais.
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