segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Lisboa sem futebol: Porquê?

Texto publicado no Público de 11 de Novembro de 2012.

1. Esta semana o futebol lisboeta viveu em efervescência.

Na sequência das recentes medidas sobre o policiamento nos espectáculos desportivos – que aqui elogiámos na vertente não futebolística –, aprovadas pelo Decreto-Lei nº 216/2012, de 9 de Outubro, a Associação de Futebol de Lisboa, admitindo não ter as condições mimas de segurança para a realização das suas provas e campeonatos, decidiu suspendê-las, até ao dia 25 de Novembro, em todas as suas categorias e vertentes (futebol e futsal).

Mais deliberou essa associação decretar o “Luto Institucional do Futebol Amador de Lisboa”, suscitar a inconstitucionalidade do diploma e ainda, entre outras acções, promover uma manifestação no dia 17 de Novembro, com a prática simbólica de jogos a disputar pelos seus mais jovens jogadores, seguindo-se uma marcha em direcção à sede da Federação Portuguesa de Futebol. Para 24, uma manifestação, a deslocar-se para o sítio do costume (Assembleia da República).

2.O que está em causa?

Vamos restringir a um aspecto: jogos dos escalões de juvenis e iniciados.

Agora, a requisição do policiamento deixou de ser obrigatória, o que vale por dizer que a responsabilidade pela ordem e segurança no interior do respectivo recinto e pelos resultados da sua alteração é inteiramente dos promotores do espectáculo e ainda que a responsabilidade pelos encargos com o policiamento – que venha a ser requisitado – é suportada pelos respectivos promotores.

Se adicionarmos as situações de violência existentes (e ainda as potenciais) nesses escalões aos valores dos encargos policiais, compreende-se o custo acrescido para os clubes.

3. Façamos, a este respeito, apenas duas considerações, sem formular nenhum juízo sobre a validade do argumentário e a adequação das acções anunciadas pela associação lisboeta.

Em primeiro lugar, assinale-se que parecem ter chegado ao desporto federado as formas de protesto – contra a austeridade – que já são, neste tempo, habituais à nossa vivência social. Também o desporto, também o futebol. E num momento ainda anterior aos significativos cortes no financiamento público do desporto a ocorrerem em 2013. Viver-se-á uma instabilidade desportiva? Que estratégias e respostas já estão trabalhadas pelo Governo e pelas federações desportivas?

4. Em segundo lugar, perguntar-se-á pelas razões que levam a que ocorram situações de violência – a exigir policiamento – nos jogos de futebol de escalões jovens, ao nível das competições distritais.

E quando aqui chegamos é todo um outro mundo de questões, sendo que, acima de tudo, relevam as de natureza formativa e educacional.

Bastará ao leitor vivenciar alguns desses jogos e, por exemplo, observar a postura dos pais.

E não é ainda despiciendo um dos axiomas do futebol – que bem “ajuda” a educar e formar as crianças –, que muitos intelectuais e integrantes de “elites” têm orgulho em frisar: na vida pode mudar-se de cônjuge, de religião, de sexo, de nacionalidade, etc; só não se muda de clube.

Citando declarações de Litos, ex-jogador do Sporting, a propósito da crise do clube: "O meu filho, de 12 anos, perguntou-me se podia mudar de clube. Como pai e sportinguista, claro que tudo farei para que isso não aconteça.”

5. Vamos ver no que isto dá.

9 comentários:

Anónimo disse...

É manifestamente redutor afirmar que a problemática está no fim da obrigatoriedade de policiamento nos jogos de escalões de juvenis e inferiores, como o afirma o artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 216/2012, de 9 de Outubro.

Em minha opinião o problema é bem mais extenso pois o n.º 1 do artigo 5.º deste diploma legal refere que “A comparticipação do Estado nos encargos com o policiamento de espetáculos desportivos reconhecidos pela respetiva federação detentora do estatuto de utilidade pública desportiva tem lugar, na estrita medida das disponibilidades financeiras referidas nos números seguintes, nos seguintes casos:
a) Seleções nacionais;
b) Provas de campeonatos nacionais de escalões etários inferiores ao do escalão sénior e dos campeonatos distritais.”.

Ou seja, o Estado apenas comparticipará nos encargos com policiamento se tiver disponibilidades financeiras. Se ficamos reféns da disponibilidade financeira do Estado, então mais valia escrever: o Estado não comparticipa quaisquer encargos com policiamento!

Por outro lado, a alínea b) refere que o Estado só comparticipa provas de escalões etários inferiores ao do escalão sénior. Assim, e na prática, o Estado apenas comparticipará o escalão de juniores, pois deixa de comparticipar os seniores e passa a não haver policiamento nos escalões de juvenis e inferiores.

Mas o mais grave deste Decreto-Lei é não prever medidas adequadas à salvaguarda da competente punição dos infractores. Senão vejamos, se um árbitro for agredido no desempenho das suas funções, quem vai identificar o agressor, é o responsável da segurança? Com que legitimidade? Alguém acredita que o infractor vai dar a sua identificação a um qualquer cidadão? Que vai ficar ali parado à espera que a polícia chegue?

Acresce que, na minha modesta opinião, paralelamente ao Decreto-Lei n.º 216/2012, de 9 de Outubro deveria ter sido aprovada legislação que puna severamente os dirigentes e restantes agentes desportivos que adoptem comportamentos e profiram declaração que levam manifestamente à adopção de condutas violentas.

Se com policiamento obrigatório a punição dos infractores já era o que todos sabemos, como será de ora em diante? Será este o momento adequado para acabar com o policiamento quando todos conhecemos o estado em que se encontra a sociedade portuguesa? Alguém acredita que as frustrações não se podem transformar em violência? Se o Estado está a reforçar o policiamento em várias áreas porquê acabar com ele no desporto?

É caso para perguntar: o que é mais importante para o Estado, a vida humana e a integridade física do Homem (que claramente é colocada em risco com este Decreto-Lei) ou a saúde financeira dos clubes?


Luís Leite disse...

Um retrato fiel da mentalidade desportiva prevalecente em Portugal.
Uma tristeza...

Anónimo disse...

Este post do Professor José Manuel Meirim suscita questões pertinentes.

Em 6Nov2012 (21:46), ao comentário “Perder por falta de comparência” colocado por J.M.Constantino, já me tinha referido a esta decisão da «Direcção da Associação de Futebol de Lisboa». Perguntando de que tipo de problema se tratava (exclusivamente jurídico, ou também económico e social?); e de que provavelmente a solução dependeria da resposta que se desse à pergunta anterior.

A questão parece mais fácil do que parece.
É uma questão que facilmente incendeia questões morais, éticas, e educacionais. Que, embora legítimas e obrigatórias, tolhem um pouco a razão e uma análise mais sistemática. Concretamente, tende-se a passar com demasiada rapidez da «identificação e caracterização do problema» para o nível da «imputação» (deve ser assim, dever ser assado; este é o mal, esta é a cura; etc.).

Quando em 1987 investiguei este problema da “violência associada ao desporto”, após um trabalho de vários meses no terreno (ver revista Sociologia …pág. ) os resultados alcançados apontaram para uma solução diferente da que viria a ser adoptada oficialmente pelo Estado desde essa data. Silenciaram metade daquilo que os dados da análise mostraram. E com isso, a solução de gestão das claques e a gestão dos espectadores nos recintos desportivos enveredou apenas por um lado; quando deveria ter enveredado pela complementaridade de dois. Razão pela qual em todos os «Programas de Ética no Desporto» falta uma metade. É isso que desde essa altura venho alertando. Para que tomem em consideração o que revelam esses dados da «investigação concreta feita aos comportamentos que ocorrem efetivamente no terreno». Para que olhem com cuidado os «Dados da investigação» em vez de começarem a perorar «moral baseada em ideais utópico-filosóficos».
Para mostrar como isso se faria na prática realizei em ???? um trabalho de formação para professores do ensino básico e secundário na ex-Direção Regional de Educação do Algarve, que até me valeu um louvor e um diploma do Conselho Científico-Pedagógico da Formação Contínua de Professores. E continuei, em vão, até hoje, em cada nova legislatura, a chamar a atenção para essa metade silenciada do problema. Que é esquecida em todos os «novos programas de ética no desporto» que se vão sucedendo.

(Cont.)

Anónimo disse...

Nesse «Relatório Técnico» que produzi para a Direção-Geral dos Desportos em 1989, intitulado “Espectadores de Futebol e as Metamorfoses da Violência” (Talvez, 1989), no âmbito do primeiro projeto de investigação a este problema realizado em Portugal com o Conselho da Europa (por iniciativa do Prof. João Boaventura,) pude mostrar como a dinâmica dos comportamentos agonísticos dos espectadores (efetivamente praticados nos recintos desportivos) apresentavam uma estrutura de variação que oscilava continuamente entre dois graus/pólos. O que obrigaria a ter em consideração não apenas um trabalho de prevenção baseada em atos punitivos (sanções e punições), jurídico-formais (legislação reguladora), ou logísticos (separação, grades, controlos). Mas também seria necessário apostar, em simultâneo, num trabalho de auto-regulação dos comportamentos dentro dos recintos desportivos, através de medidas concretas que indiquei (ver referência in Revista “Sociologia: problemas e práticas”, n.º 12, 1992, ISCTE, pág.152, nt.11).

Isto para dizer que agora percebem que não há dinheiro para manter a solução adoptada. Que o caminho adoptado menosprezou a metade que lhe falta agora para que, entre «público-espectador» e «intervenientes no espectáculo desportivo», haja a auto-regulação que seria desejável.
A solução adoptada foi baseada num excessivo peso do dispositivo policial, e num esforço jurídico-institucional para os quais não se vislumbra sustentabilidade económica. A solução adotada no final dos anos 1980 (após Heysel) passados 30 anos acabou por criar um problema enorme de desproporção e assimetria entre os modos de assistir ao espectáculo desportivo. A segregação dos espectadores dentro dos recintos desportivos criou uma cultura de especialização que provoca uma espiral de violência, e que dificilmente será desmantelada, acarretando ao Estado custos gigantescos. Exatamente aquilo que o trabalho que fiz em 1989 previu.

Mas isto mostra também outra coisa. Que em Portugal muitos dos trabalhos que resultam da investigação árdua no terreno da prática de pouco servem perante os doutos que se acolhem nos holofotes dos palcos da política e do dirigismo dentro dos Departamentos da Administração Pública. Ou dito de outro modo, os Talvez, e há alguns que ainda resistem estoicamente nesta história de ruína e decadência do nosso País para que muitos estão agora a acordar, nada valem.

Não é a Chanceler nem a austeridade que têm culpa. Ou não?

Talvez

Anónimo disse...

Parece-me que isto é essencialmente uma questão financeira e no que toca a mim, como contribuinte, concordo que os meus impostos não sejam usados para pagar policiamento de modalidades que têm MILHÕES de euros a render no banco.
E aproveito para dizer que também concordo que os jogos de futebol não sejam transmitidos em canal aberto. Quem quer ver, que pague e não me retirem mais dinheiro do bolso para ver 2 ou 3 jogadores portugueses. Concordo que seja transmitido os jogos da selecção pois aí sim, podemos ver os jogadores portugueses a jogar.
Não pensem que sou xenofobo. O que não gosto é de ver milhões de euros de empresas públicas ou semi-públicas a serem enviados para outros países na contratação de jogadores.

Luís Leite disse...

Agora já não tenho dúvidas.
Talvez é mesmo extra-terrestre.

Anónimo disse...

Oh Luís Leite você é um homem distraído.O tempo que levou a perceber que o Talvez vive noutro planeta!!

Anónimo disse...

Que engraçado seria um "casamento" de um "extra-terrrestre" Talvez, com um "ultra-terrrestre" Leite.

Luís Leite disse...

Anónimo das 11:52:

Impossível.
Sou hetero.
E não estou para casamentos.
Case você e tenha muitos meninos anónimos, para pagarem a minha reforma.