Declaração prévia: o que se está passar com o futebol e respectivos órgãos dirigentes é suficientemente grave para merecer a censura e reprovação públicas. O governo tem a obrigação de avaliar a natureza das ocorrências e adoptar os procedimentos previstos no ordenamento jurídico de modo a salvaguardar os interesses e as competências públicas delegadas na FPF. Dito isto é preciso nadar para fora. Para fora do futebol e para fora do desporto.E contra a corrente. Para não cair no”meiinho”para onde a hierarquização mediático/social nos quer empurrar.
Nestes tempos conturbados do futebol luso ocorre-me com frequência o velho princípio de que o desporto é um reflexo da sociedade. Escrevi intencionalmente desporto porque o que se passa com o futebol só é diferente na escala, na dimensão e na visibilidade. Tudo o resto se pode passar em outras modalidades. Basta que deixem de ter pouco de desporto e façam o “up-grade”: muito de “produto”, ”negócio “,”espectáculo”,”indústria”e vocábulos equivalentes. E que passem a ter um escrutínio e interesse públicos como tem o futebol. Dito isto vale a pena acrescentar algo mais: o que se passa com o futebol em nada é substancialmente diferente, a não ser para os distraídos, do que por aí anda no resto do país. Se fosse possível fazer um ranking da “gravidade dos factos” o futebol perderia. E dou por mim não a defender o futebol, mas a criticar aqueles que não querem olhar para o país para além do futebol. É que os dirigentes do futebol não são nem mais sérios, nem mais incompetentes que os seus homólogos de outros sectores da sociedade. Respiguemos factos recentes. O que dizer do evidente desequilíbrio comunicacional no modo como são tratadas as vicissitudes do Apito Final e da Operação Furacão. As consequências gravosas para o interesse público são precisamente as inversas à atenção mediática concedida. O que se passa com uma e com outra relativamente ao lesar dos interesses do país não tem comparação possível. Outro exemplo: as pressões do Major merecem mais atenção que as escutas ilegais feitas por funcionários da PJ. Outro exemplo: as promiscuidades do futebol são tratadas como assuntos de Estado. Os negócios da banca como matéria reservada. Exceptuando a forma, pergunto: em que são diferentes? Outro exemplo: as comissões dos dirigentes nas transferências dos jogadores são práticas condenáveis; nas empresas, públicas e privadas, não são comissões, são “royalties” e é uma prática comum do negócio. Como no futebol: umas vezes às claras ; outras por baixo da mesa. Ou não é verdade? Assinaturas forjadas no futebol. E verdade! E em muitos dos projectos metidos na repartições públicas? As off-shores para o futebol são um modo de lavar dinheiro sujo. Mas as off-shores para a banca são um meio de rentabilizar capitais. Os dirigentes do futebol, uma peste que importa sanear em nome da indústria do espectáculo. Os dirigentes dos grandes grupos económicos e empresariais gente séria que puxa pelo país. Não têm dívidas fiscais? Não pagam serviços ilegítimos? Não manobram nos bastidores das influências? Não arranjam “fruta”para melhor fechar os negócios? Atente-se no modo como recentes investigações sobre aqueles últimos entraram e saíram rapidamente dos jornais de referência. Os exemplos podem multiplicar-se. Perante este descalabro ético que sector da sociedade portuguesa tem autoridade moral para dar lições ao futebol?
Não se trata de branquear ou aligeirar o que se passa no futebol. O que passa com o futebol e com o organismo de justiça é grave. Mas não é de todo diferente do que se passa com o país. De resto é cada vez mais nítido que o direito serve para muitas coisas mas nem sempre para a administração da justiça. No desporto e fora dele.
O que está doente não é futebol. Se fosse só o futebol o problema seria apesar de tudo bem mais fácil de resolver. O problema é outro. É o jogo da bola, é a política, são os interesses instalados -de que se não excluem os operadores de justiça - são as fortunas construídas em poucos anos, são os casinos, são as polícias, são as obras públicas, são as televisões, são as secretas,são os poderes não-eleitos, são as “golden share”, é a banca, é a bolsa, são as “off-shores”.É o país que está doente. E em vez de diagnosticar o que está a ocorrer limitamo-nos a seguir a onda do que mais se fala. A seleccionar sintomatologias em função do que é mediaticamente relevante. A solução vai invariavelmente para o reforço dos meios legais e similares. E para o desporto tudo agora se parece resumir a um novo edifico de magistratura: o Tribunal Arbitral. Será sério, honesto e imune a influências e poderes. Não será deste mas de outro mundo. Terá uma vocação e bênção divinas? Oxalá assim seja. Mas cá para mim há uma pequena coisa bem mais importante de discutir e mais difícil de debelar: o carácter. O carácter das pessoas. A sua formação e honorabilidade. Aquilo de que são ou não capazes de fazer. Os valores e os princípios que norteiam as suas condutas. Não do que apregoam. Nem do que rezam ou juram. Mas do que fazem. Em casa, no emprego, na sociedade. E deixem de pedir ao desporto o que ele por si só não tem capacidade de fazer: o de regenerar a sociedade!
Nestes tempos conturbados do futebol luso ocorre-me com frequência o velho princípio de que o desporto é um reflexo da sociedade. Escrevi intencionalmente desporto porque o que se passa com o futebol só é diferente na escala, na dimensão e na visibilidade. Tudo o resto se pode passar em outras modalidades. Basta que deixem de ter pouco de desporto e façam o “up-grade”: muito de “produto”, ”negócio “,”espectáculo”,”indústria”e vocábulos equivalentes. E que passem a ter um escrutínio e interesse públicos como tem o futebol. Dito isto vale a pena acrescentar algo mais: o que se passa com o futebol em nada é substancialmente diferente, a não ser para os distraídos, do que por aí anda no resto do país. Se fosse possível fazer um ranking da “gravidade dos factos” o futebol perderia. E dou por mim não a defender o futebol, mas a criticar aqueles que não querem olhar para o país para além do futebol. É que os dirigentes do futebol não são nem mais sérios, nem mais incompetentes que os seus homólogos de outros sectores da sociedade. Respiguemos factos recentes. O que dizer do evidente desequilíbrio comunicacional no modo como são tratadas as vicissitudes do Apito Final e da Operação Furacão. As consequências gravosas para o interesse público são precisamente as inversas à atenção mediática concedida. O que se passa com uma e com outra relativamente ao lesar dos interesses do país não tem comparação possível. Outro exemplo: as pressões do Major merecem mais atenção que as escutas ilegais feitas por funcionários da PJ. Outro exemplo: as promiscuidades do futebol são tratadas como assuntos de Estado. Os negócios da banca como matéria reservada. Exceptuando a forma, pergunto: em que são diferentes? Outro exemplo: as comissões dos dirigentes nas transferências dos jogadores são práticas condenáveis; nas empresas, públicas e privadas, não são comissões, são “royalties” e é uma prática comum do negócio. Como no futebol: umas vezes às claras ; outras por baixo da mesa. Ou não é verdade? Assinaturas forjadas no futebol. E verdade! E em muitos dos projectos metidos na repartições públicas? As off-shores para o futebol são um modo de lavar dinheiro sujo. Mas as off-shores para a banca são um meio de rentabilizar capitais. Os dirigentes do futebol, uma peste que importa sanear em nome da indústria do espectáculo. Os dirigentes dos grandes grupos económicos e empresariais gente séria que puxa pelo país. Não têm dívidas fiscais? Não pagam serviços ilegítimos? Não manobram nos bastidores das influências? Não arranjam “fruta”para melhor fechar os negócios? Atente-se no modo como recentes investigações sobre aqueles últimos entraram e saíram rapidamente dos jornais de referência. Os exemplos podem multiplicar-se. Perante este descalabro ético que sector da sociedade portuguesa tem autoridade moral para dar lições ao futebol?
Não se trata de branquear ou aligeirar o que se passa no futebol. O que passa com o futebol e com o organismo de justiça é grave. Mas não é de todo diferente do que se passa com o país. De resto é cada vez mais nítido que o direito serve para muitas coisas mas nem sempre para a administração da justiça. No desporto e fora dele.
O que está doente não é futebol. Se fosse só o futebol o problema seria apesar de tudo bem mais fácil de resolver. O problema é outro. É o jogo da bola, é a política, são os interesses instalados -de que se não excluem os operadores de justiça - são as fortunas construídas em poucos anos, são os casinos, são as polícias, são as obras públicas, são as televisões, são as secretas,são os poderes não-eleitos, são as “golden share”, é a banca, é a bolsa, são as “off-shores”.É o país que está doente. E em vez de diagnosticar o que está a ocorrer limitamo-nos a seguir a onda do que mais se fala. A seleccionar sintomatologias em função do que é mediaticamente relevante. A solução vai invariavelmente para o reforço dos meios legais e similares. E para o desporto tudo agora se parece resumir a um novo edifico de magistratura: o Tribunal Arbitral. Será sério, honesto e imune a influências e poderes. Não será deste mas de outro mundo. Terá uma vocação e bênção divinas? Oxalá assim seja. Mas cá para mim há uma pequena coisa bem mais importante de discutir e mais difícil de debelar: o carácter. O carácter das pessoas. A sua formação e honorabilidade. Aquilo de que são ou não capazes de fazer. Os valores e os princípios que norteiam as suas condutas. Não do que apregoam. Nem do que rezam ou juram. Mas do que fazem. Em casa, no emprego, na sociedade. E deixem de pedir ao desporto o que ele por si só não tem capacidade de fazer: o de regenerar a sociedade!
5 comentários:
Belíssimo texto.
Marcos Antunes
Subscrevo, por inteiro, as palavras do nosso associado.Aliás, em particular no que respeita às qualidades das pessoas como fonte de tudo o resto, se me é permitido dizê-lo, tenho-o afirmado (e escrito)no passado.
Prof. Constantino,
Comungo por inteiro as suas palavras. O texto é duma fidelidade radiológica ou talvez eco gráfica do estado doentio do nosso país. Cada órgão que lhe faz parte encontra-se em estado urgente de cirurgia!
Sublinho a “dormência” ou hipnótico estado de cada um de nós e logicamente de cada grupo que fazemos parte, preocupados somente com os “problemas” que nos tocam directamente, praticamente ignorando o que se vai passando ao nível de outras estruturas.
Como professora, preocupa-me tudo o que diz respeito à educação, a todos os níveis, começando pelo global até no meu particular, na minha escola e na minha casa. Provavelmente, todos nós o fazemos um pouco… Mas a todos nós, é exigido um pouco mais do que só sabermos do que se passa! Temos de colocar o dedo na ferida e cura-la do seu interior até ao exterior, do meu particular, para o global. Isto é o que tenho tentado fazer, na minha vida pessoal como profissional e académica.
Para terminar, o seu talento para escrever e denunciar está de excelente saúde, assim como provavelmente estará a sua forma de ser e agir! Os meus Parabéns!
Maria
Ao Marcos Antunes
Dizer apenas "belíssimo texto" é a maior ofensa que se pode fazer a um autor.
Ao jmm
Já não é a primeira vez que aparece a confirmar o que outros dizem, com a preocupação de informar que já vem dizendo isso há muito tempo, quando o que o "nosso associado" disse, já muitos, antes de si, o disseram e badalaram.
E depois queixam-se que são sempre os mesmos a dizerem as mesmas coisas, já sabidas, ressabidas e gastas, de tão repetitivas.
Em tais circunstâncias, concluindo-se que não há nada de novo, fazem o seu auto-retrato.
Então renovem e remoam as ideias, e digam coisas novas.
Não aos mesmos slogans.
Existe o índice da corrupção em http://www.transparency.org/policy_research/surveys_indices/cpi/2007
que nos diz que Portugal está em 28.º lugar no mundo.
Este índice sugere-nos que nos países que nos precedem, o caso do desporto e com opiniões públicas como as dos tablóides britânicos existem mecanismos eficazes de resolução dos problemas de corrupção no seu futebol e na restante sociedade.
O José Constantino tem razão porque a opinião pública nacional tem um comportamento diferenciado para acontecimentos equivalentes.
A corrupção é um imposto que obriga os agentes económicos a fazer transacções com custos mais elevados e por isso dificultam o desenvolvimento económico e a democracia.
Outro aspecto do artigo do José Constantino com pertinência é a da possibilidade do Tribunal Arbitral do Desporto procurando resolver os litígios no desporto poder vir a fracassar este objectivo.
Convirá aqui estabelecer com clareza o que fará o TAD e não esperar dele coisas que não estarão ao seu alcance realizar.
O sucesso do TAD dependerá da racionalidade e eficácia do todo legislativo público e dos regulamentos associativos desportivos.
Caso estas estruturas institucionais forem ineficazes não se esperem milagres do trabalho do TAD.
O desafio permanece de conseguirmos fazer melhor do que os países que estão à nossa frente nos índices de corrupção e de transparência mundiais.
Se não subirmos nestes índices muito provavelmente estaremos a cair nos índices de desenvolvimento europeus e mundiais.
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