A conversão do Pavilhão Carlos Lopes em museu do desporto confesso, quando o assunto começou a ser falado, não foi ideia que aplaudisse. Após a alienação, por razões de mera especulação financeira, do complexo desportivo da Lapa, a “anulação” de um outro espaço desportivo com a carga simbólica do “Pavilhão dos Desportos”, parecia-me uma má decisão. Cheguei de resto a assinar uma petição a favor da sua manutenção como espaço desportivo. Mas depois de ouvir as razões dos responsáveis da Câmara Municipal de Lisboa e conhecer o programam museológico proposto mudei de opinião. E entendo que se pode tratar de um boa solução, quer para o museu, quer para a reabilitação do espaço e revitalização do seu uso.
O estado de degradação e de abandono a que o equipamento foi deixado pelos diferentes governos camarários tornariam um exercício de reabilitação desportiva de custos muito elevados e porventura de complexa solução técnica até pelas condicionantes entretanto ocorridas em matéria de tipologias de espaços desportivos.
Do espaço resta a memória e uma traça exterior que marca uma época da arquitectura desportiva nacional. Uma e outra não são incompatíveis com um uso distinto ainda por cima numa temática que lhe é afim: o desporto. Um desafio que é também um convite aos projectistas para a criação de uma obra que responde ao programa museológico delineado e respeite o que tem naquele edifício de valor histórico e cultural.
O programa museológico proposto (excepção à chamada sustentabilidade económica(?) que só pode ter sido feita por quem não tem a mínima noção da matéria) é arrojado, interessante, diversificado e revela uma dimensão abrangente sobre as diferentes variáveis museológicas conexas com o desporto. Marcado por uma perspectiva que bebeu nos Annalles e na “nova História”, uma noção da história que pouco valoriza o legado, o acervo, o evento e o tempo cronológico, é uma opção ideológica respeitável e que tem tradição internacional. A “nova museologia” alimenta-se muito duma visão sincrónica dos “factos históricos” e mais do que um revelador ou analisador do passado que permita ter uma noção do antes e do depois, investe, até pelas disponibilidades tecnológicas de que dispõe, em cruzamentos com outras áreas disciplinares que são intelectualmente interessantes e muito “marcadas”pelos temas do presente. Não discutindo a sua pertinência no plano epistemológico tal não significa que sejam suficientemente relevantes como material de valor museológico.
O carácter efémero e precário de muitas iniciativas museológicas (o museu virou moda e não há cidade ou vila que não se ache com direito a ter o seu museu) reside na dificuldade de aliar o que deve ser um local de preservação e transmissão cultural com a concorrência das indústrias de entretenimento. A crise de identidade e de gestão de que vivem muitos museus só é possível de ser ultrapassada se se conseguir aliar o acervo museológico e a memória histórica, que são a base normativa e conceptual de uma identidade museológica, com as novas tecnologias e os diferentes públicos. De um lugar de “pedras mortas” a um “prestador de serviços” tipo parque lúdico que até pode fornecer o “bilhete de identidade da condição física” vai a possibilidade de encontrar um adequado equilíbrio entre o acervo museológico e a sua dimensão memorial, histórica, cultural, antropológica e sociológica e a atratabilidade e a animação que um espaço museológico pode ter. O que se conhece do programa museológico apresentado merece o benefício de que existem preocupações em responder ao desafio de um museu que respeitando a história e memória do desporto evite cair na “disneylândia” desportiva.
Ao anúncio deve coincidir a capacidade de o realizar. A “história” do museu do desporto não se resume às suas tentativas de criação desde 1932 em Lisboa num palácio em Calhariz. Nela se inscrevem também as marcas do silêncio, a colocação do seu acervo em instalações indignas, a destruição e desaparecimento de algum do seu legado, a perda de importante material com valor patrimonial.
Num momento que é de afirmação e de esperança é justo que se recordem muitos dos que procuraram com profissionalismo e dignidade lutar por criar em Portugal um museu do desporto. O Luís Casanovas, o Orlando Azinhais, o Jorge Crespo, o Noronha Feio, o João Boaventura, o Pedro de Almeida, o Pedro Cardoso. Porventura esqueço alguns. Que me perdoem se assim for.
O estado de degradação e de abandono a que o equipamento foi deixado pelos diferentes governos camarários tornariam um exercício de reabilitação desportiva de custos muito elevados e porventura de complexa solução técnica até pelas condicionantes entretanto ocorridas em matéria de tipologias de espaços desportivos.
Do espaço resta a memória e uma traça exterior que marca uma época da arquitectura desportiva nacional. Uma e outra não são incompatíveis com um uso distinto ainda por cima numa temática que lhe é afim: o desporto. Um desafio que é também um convite aos projectistas para a criação de uma obra que responde ao programa museológico delineado e respeite o que tem naquele edifício de valor histórico e cultural.
O programa museológico proposto (excepção à chamada sustentabilidade económica(?) que só pode ter sido feita por quem não tem a mínima noção da matéria) é arrojado, interessante, diversificado e revela uma dimensão abrangente sobre as diferentes variáveis museológicas conexas com o desporto. Marcado por uma perspectiva que bebeu nos Annalles e na “nova História”, uma noção da história que pouco valoriza o legado, o acervo, o evento e o tempo cronológico, é uma opção ideológica respeitável e que tem tradição internacional. A “nova museologia” alimenta-se muito duma visão sincrónica dos “factos históricos” e mais do que um revelador ou analisador do passado que permita ter uma noção do antes e do depois, investe, até pelas disponibilidades tecnológicas de que dispõe, em cruzamentos com outras áreas disciplinares que são intelectualmente interessantes e muito “marcadas”pelos temas do presente. Não discutindo a sua pertinência no plano epistemológico tal não significa que sejam suficientemente relevantes como material de valor museológico.
O carácter efémero e precário de muitas iniciativas museológicas (o museu virou moda e não há cidade ou vila que não se ache com direito a ter o seu museu) reside na dificuldade de aliar o que deve ser um local de preservação e transmissão cultural com a concorrência das indústrias de entretenimento. A crise de identidade e de gestão de que vivem muitos museus só é possível de ser ultrapassada se se conseguir aliar o acervo museológico e a memória histórica, que são a base normativa e conceptual de uma identidade museológica, com as novas tecnologias e os diferentes públicos. De um lugar de “pedras mortas” a um “prestador de serviços” tipo parque lúdico que até pode fornecer o “bilhete de identidade da condição física” vai a possibilidade de encontrar um adequado equilíbrio entre o acervo museológico e a sua dimensão memorial, histórica, cultural, antropológica e sociológica e a atratabilidade e a animação que um espaço museológico pode ter. O que se conhece do programa museológico apresentado merece o benefício de que existem preocupações em responder ao desafio de um museu que respeitando a história e memória do desporto evite cair na “disneylândia” desportiva.
Ao anúncio deve coincidir a capacidade de o realizar. A “história” do museu do desporto não se resume às suas tentativas de criação desde 1932 em Lisboa num palácio em Calhariz. Nela se inscrevem também as marcas do silêncio, a colocação do seu acervo em instalações indignas, a destruição e desaparecimento de algum do seu legado, a perda de importante material com valor patrimonial.
Num momento que é de afirmação e de esperança é justo que se recordem muitos dos que procuraram com profissionalismo e dignidade lutar por criar em Portugal um museu do desporto. O Luís Casanovas, o Orlando Azinhais, o Jorge Crespo, o Noronha Feio, o João Boaventura, o Pedro de Almeida, o Pedro Cardoso. Porventura esqueço alguns. Que me perdoem se assim for.
5 comentários:
Por alerta e iniciativa do Professor Monge da Silva o Panathlon Clube de Lisboa trabalhou a ideia da Preservação da Memória do Desporto.
Dessa iniciativa ressaltam alguns aspectos que o anúncio do novo museu, parece não responder:
1 – Existe um espólio desportivo que se perde por esse país fora nas escolas públicas, nos clubes, nas federações e nas instalações e espaços desportivos e que é necessário sensibilizar os agentes locais para a sua importância.
2 – Os agentes locais, clubes, associações, federações e responsáveis pelas instalações, são os garantes da preservação desse vasto e decisivo espólio quer na sua apresentação local através de vitrinas, salas e museus locais, temáticos ou de modalidade, quer na sua salvaguarda em “arcas” a salvo das agruras do tempo caso não seja possível expô-las na situação presente. Deste conceito está a auscultação da vida desportiva das gerações mais velhas, em todo o país, para memória futura e antes que se percam em definitivo.
3 – Face aos recursos escassos que o país tem para aplicar no desporto e no seu museu, existiram no passado imensos projectos de museus e actualmente existem dois: o referido pelo José Manuel Constantino da CML/Governo e o do COP. A sugestão que perpassou na análise no Panathlon era haver apenas um Museu congregando o espólio nacional e o do COP.
4 – A análise económica da viabilidade técnica do museu é um dos aspectos fundamentais da sua criação.
A análise do Panathlon Clube de Lisboa sugere que o que se deverá procurar a nível nacional é a existência de uma Política de Preservação da Memória do Desporto mais do que a preocupação unívoca do Museu do Desporto tão ao gosto dos anúncios vazios de intenções transparentes e concretizadoras capazes de gerar valor acrescentado.
O anúncio feito na comunicação social e o poste do José Manuel Constantino não referem a Preservação da Memória.
Caso o conceito mais amplo, culturalmente sustentado e economicamente viabilizado, esteja no projecto da CML/Governo, então as hipóteses do seu sucesso serão positivas.
Aguarde-se a sua apresentação para o debate público.
Sempre é melhor que o de França colocado por baixo das bancadas do Paris Saint-Germain, e desde que adaptado a Museu já que, obras de raiz, não cabem neste país.
Mas não lhe auguro grande futuro.
Vão aparecer muitos entendidos e o Museu vai viver das guerrinhas entre os que querem o Museu assim e outros o Museu assado.
E entretanto o tempo vai passando.
Incrédulo sou, incrédulo morro.
É necessário saber em que país estamos.
Com o devido respeito o Fernando Tenreiro não leu com atenção o meu texto.Em várias passagens refiro a importância da necessidade do projecto museológico preservar a memória histórica do desporto.A parte que refere relativamente a outros espólios, designadamente do COP,poderem integrar um museu único é assunto que não conheço pelo que sobre ele não tenho opinião.
Obrigado pelo seu comentário.
Da leitura que fiz do seu poste, que é importante pelo seu testemunho, quis mostrar o trabalho feito no PCL que contextualiza a questão da Preservação da Memória do Desporto.
Retirando a avaliação económica os restantes pontos correspondem às perspectivas das personalidades que participaram na análise do PCL: técnicos, responsáveis federados em exercício, antigos dirigentes públicos e privados e professores universitários.
O resultado da análise é o possível em Think Tanks como o Panathlon Clube de Lisboa é.
Gostaria de acrescentar mais alguma coisa sobre a viabilidade económica.
O estudo de viabilidade económica é um instrumento de apoio à decisão de investimento ao adequar o objectivo e a forma do que se pretende fazer com o respectivo custo e proveito.
O Euro2004 é um projecto exemplar onde se fez um estudo cujo resultado deixou a desejar.
Porquê?
Os estudos respondem àquilo que os seus proprietários querem obter.
Na altura da encomenda do estudo já tinha sido decidido o que construir no Euro2004.
O estudo encomendado concluiu que a solução de financiamento, público e privado, era eficiente na perspectiva dos diferentes parceiros Governo, autarquias e clubes.
Foi um estudo sobre o modelo de financiamento e de criação do Euro2004.
O estudo deu razão ao decisor naquilo que já tinha sido decidido e não visava proteger o investimento público nas decisões que já tinham sido tomadas.
O investimento foi maltratado como se observa em Coimbra onde a Académica sugere a inutilidade do construído para o Euro2004. Coimbra é apenas um dos exemplos do fracasso do investimento para o praticante local uma vez realizado o mega-evento.
Temporalmente o estudo deveria ter sido iniciado em 1997/1998. O estudo acabou em 2004 depois do Euro2004 se ter realizado.
Que estudo ficou por fazer?
O estudo em falta deveria ter sido feito antes e ao mesmo tempo que se definia o objecto do investimento, se escolhiam as dimensões dos estádios e as localizações, entre outros factores de decisão.
No início dos projectos, todos contêm boas ideias, como o levar o museu para o Parque Eduardo VII. O facto do monumento necessitar de obras urgentes levanta custos específicos que deverão ser contextualizados. Se mais, se menos, do que outra solução é uma equação que o estudo de viabilidade deverá esclarecer para que isso não seja um ónus do projecto desportivo.
O exemplo do Euro2004 mostra, de novo, que os estádios dos grandes clubes eram inaceitáveis para o negócio do futebol profissional moderno e o construído não evitou as dificuldades que os clubes actualmente possuem. Portanto, a recuperação de monumentos não é um critério de decisão fiável. A última palavra caberá às Finanças e ao Tribunal de Contas.
No quadro global de decisão pública de um desporto moderno devemos ser capazes de cumprir com as obrigações que suportam as decisões que engrandecem o desporto e o país.
Decidir por decidir, principalmente nas coisas que enchem as páginas dos jornais e das televisões por uns dias está o descrédito natural do Anónimo das 17,11.
É importante respeitar os instrumentos que tornam as decisões de investimento público credíveis e úteis: o debate público é um dos instrumentos que permite colocar soluções alternativas e ouvir as posições dos diferentes parceiros e especialistas; os estudos técnicos e económicos servem para aquilatar da verosimilhança das hipóteses avançadas dando-lhes percentagens de benefício social; e as decisões dos grandes governantes fazem a síntese da solução socialmente mais profícua para as actuais e futuras gerações face às condicionantes conhecidas e perspectivadas.
Neste pé, do ponto de vista de alguns princípios como seria adequado que as coisas fossem feitas, em que ponto nos encontramos quanto ao museu?
Bom 2009 a todos e a este blogue em particular!
Contaram-me, hoje, que o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa teria afirmado no programa Quadratura do Círculo que o programa do Museu do Desporto lhe foi apresentado pelo Dr. Pedro Cardoso e que foi o melhor projecto de muitos que lhe foram apresentados para o mesmo local.
O Presidente da CML também teria afirmado que tem o dinheiro livre para o investimento. Esta é daquelas afirmações que deixam qualquer economistas de pé atrás. Para hoje? para amanhã? para a construção? para a gestão? e se só tiver visitantes ocasionais inferiores ao saldo zero das receitas e despesas?
Isto é que se ouve por aí e vale o que vale.
Sem duvidar do projecto, da decisão e da valia das intensões do seu promotor, o debate público surge como um passo consequente para que se evite construir algo apenas do conhecimento dos deuses, dos anjos e da Virgem Maria.
Mais, para fugir ao descrédito do anónimo de 31dez08, seria interessante haver um debate sobre a matéria.
Caberá obviamente à CMLisboa definir os termos do debate e o que está disposta a apresentar para discussão, assim como, o prazo da sua realização.
Os lisboetas agradeceriam.
Enviar um comentário