segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Arranjando uns trocos

É uma lei da vida: a longa permanência no poder cria uma espécie de usura do cargo. E o que de positivo se alcançou corre o risco de ser anulado pelo que um excessivo exercício tem de menos positivo. Por outro lado, essa longa permanência, quando sujeita a uma contínua exposição pública, cria desgaste e com ele o aumento do número dos que se opõem. E os que se opõem, podem ser até antigos aliados nada garantindo que no futuro os opositores de hoje não voltem a ser os aliados de amanhã. No desporto, na política, na vida das empresas sobram os exemplos. Porque muitas vezes não se trata da defesa de valores ou de princípios ou de programas ou até de uma eventual ética da razão, mas tão só de negociar/dividir o poder. E o poder tanto pode servir para o exercício de uma estratégia, como para a defesa de certo tipo de privilégios corporativos ou até de algum contributo financeiro directo ou indirecto que o exercício de certas funções permite. Muita da dificuldade na renovação de quadros dirigentes desportivos não tem só como explicação o carácter desgastante e benévolo do trabalho realizado. Pelo contrário. São os benefícios pessoais ou materiais dela resultantes que explicam o “estar agarrado” ao poder. Que não será sempre assim não é difícil de demonstrar. Difícil será provar que o não é, em elevado número de casos.
Este arrazoado todo para chegar a um tema que de tão maltratado merece alguma reflexão: o do benevolato no dirigismo desportivo. Não sem antes sermos perfeitamente claros que nada temos quanto à profissionalização do dirigismo desportivo e à remuneração dos seus dirigentes. Que o sejam de forma transparente, legal e decorrendo essa profissionalização não dos dinheiros públicos, o que seria uma ”funcionalização encapotada”, mas apenas da gestão de recursos próprios das organizações desportivas. Será, neste caso, um percurso natural de crescimento das organizações e um sentido natural da sua especialização.
Mas uma parte significativa do tecido associativo e do funcionamento das organizações desportivas continua a ser assegurado pelo dirigismo benévolo. Trabalho sem qualquer contributo remuneratório. No passado houve várias tentativas de legislar para este tipo de agentes voluntários. Protegendo a sua acção e estimulando o respectivo exercício. Por uma ou outra razão essas iniciativas não vingaram. Se no passado fazê-lo era importante, no presente continua a sê-lo.Com uma razão acrescida que justifica a sua oportunidade: o de ter aumentado o número dos que invocando o voluntariado desportivo se servem do seu valor socialmente relevante para cobrir acções que de voluntárias nada têm e que se transformaram em verdadeiros empregos. Que o sejam na plenitude dos seus direitos e obrigações. Mas que deixem de integrar o “choradinho” do dirigente carola, que o não são.
Tocar neste assunto é mexer com parte do “coração” do funcionamento das organizações desportivas. Para muitas,sobretudo as organizações de topo, é assunto tabu. E por uma ou outra razão prevalece a gestão do silêncio. Que não serve a profissionalização do dirigismo desportivo que, quando as condições o permitem e justificam, deve ser claramente assumido. E que também não serve o dirigismo benévolo contaminado por aqueles que à sua custa”vão arranjando uns trocos”em nome da sua "paixão"pelo desporto.

5 comentários:

Anónimo disse...

Já devia saber que a entrada do desporto profissionalizado varre toda a memória do amadorismo, ou melhor, toda a memória do passado.

Anónimo disse...

A tese de Saldanha Sanches - entusiasticamente recebida pelos visados - de que o voluntariado, nos bombeiros, sai mais caro ao Estado do que ter bombeiros profissionalizados, dá que pensar, não?

Claro: ele só falou dos bombeiros. Porque para o desporto - todos o sabemos - emigraram todos aqueles cujo ideal de vida era mesmo ser "voluntários", não é verdade?!!!

Os que tinham dúvidas sobre o bem fundado de trabalhar à borla, esses ficaram-se pelos bombeiros, como é bem de ver!!!... Uma espécie de "voluntários tóxicos", para usar uma terminologia agora muito em voga...

Anónimo disse...

No que toca a salários (ou indemnizações, para Comandantes), recompensas, fees, mordomias, etc, etc, o “profissionalismo” já chegou ao Desporto Federado, efectivamente. E há até quem tenha um salário superior ao do Primeiro-ministro, com o dinheiro do Estado…Claro.

Não se vê é sinais de Profissionalismo. Isto é, não existe correspondência entre o dito “profissionalismo” e desenvolvimento desportivo. Nem se podia esperar outra coisa, já que os intervenientes são os mesmos! Há coisas que o dinheiro não compra..

E assim vamos: o “Movimento” Associativo continua alegremente…Parado. Dá é mais dinheiro, aos mesmos de sempre.

Daí concluir que, para o desporto federado, dever-se-ia mudar o ditado que diz “O barato sai caro” para “O PARADO sai caro”

Anónimo disse...

«...E há até quem tenha um salário superior ao do Primeiro-ministro, com o dinheiro do Estado…Claro. »

Bom, na verdade os exemplos de irresponsabilidade e incompetencia de uns e desse outro, também andam próximos; daí que...não seja de admirar!

Anónimo disse...

... bem visto..


Luz Vaga