sexta-feira, 25 de junho de 2010

Fica o aviso

Os montantes e a complexidade da circulação dos fluxos financeiros envolvidos nas actividades de intermediação, representação e agenciamento de atletas propiciam o florescimento de práticas ilegais e negócios desportivos pouco transparentes. Neste processo o agente ou empresário desportivo ocupa um lugar central.

De acordo com um estudo recente da Comissão estima-se existirem mais de 6000 agentes desportivos em exercício no território europeu a operarem em 32 modalidades desportivas, sendo que 95% estão ligados às quatro modalidades com maior relevância comercial na Europa - futebol, basquetebol, râguebi e atletismo. O impacto económico desta actividade, só no futebol, cifra-se num valor de 200 milhões de euros anuais em comissões de transferência.

Nestes termos, e tendo em consideração o árduo e longo percurso trilhado pela FIFA junto da Comissão e do Tribunal para implementar um quadro regulador compatível com o direito comunitário, no firme propósito de controlar práticas fraudulentas através de um sistema de licenciamento para os seus agentes; o anúncio da FIFA se afastar do actual regime de licenças e liberalizar, a partir de 2012, a intermediação de jogadores num processo “free for all” - gerido por clube e atleta, no qual escolhem livremente o seu agente, não carecendo este de estar licenciado, e se assumem responsáveis por conduzir a transferência no cumprimento das normas legais - representa um rotundo fracasso das federações nacionais em fiscalizarem a aplicação dos seus regulamentos, uma vez que apenas 25% das transacções eram efectuadas por um agente devidamente licenciado.

É evidente que os alarmes soaram bem alto. Não apenas nas associações representantes de agentes e das ligas europeias de futebol, mas também do poder político. Recorde-se aqui que também a União Europeia tinha considerado “...que a actual realidade económica em torno dos agentes dos jogadores impõe que os órgãos dirigentes do futebol, a todos os níveis, e após consulta à Comissão, melhorem as regras aplicáveis aos referidos empresários; a este respeito, exorta a Comissão a apoiar os esforços da UEFA no sentido de regulamentar a actividade dos agentes dos jogadores, se necessário, mediante a apresentação de uma proposta de Directiva relativa a esta categoria profissional” (§44).

Manifesta a incapacidade das federações em auto-regularem nesta área - em parte devido aos condicionamentos na supervisão e sanção, civil ou penal, para o controlo efectivo de uma actividade económica, que afecta direitos fundamentais, e se encontra na incumbência das autoridades públicas -, mas tendo também em equação a pluralidade de soluções nos ordenamentos jurídicos de cada Estado membro (Portugal é um caso minoritário de legislação específica neste domínio, e com casos levados às instâncias judiciais) sobre uma actividade com uma forte incidência na gestão transfronteiriça de recursos, o Parlamento Europeu ciente de que “afastar o actual sistema de licenças da FIFA para os agentes de desportistas sem estabelecer um sistema alternativo robusto não seria a forma adequada de tratar dos problemas que rodeiam os agentes dos jogadores no futebol” votou favoravelmente no passado dia 17 uma proposta de resolução na qual, preto no branco, sustenta uma “abordagem coerente” e uma via harmonizadora para o conjunto da UE, instando a uma iniciativa da Comissão para introdução de um sistema europeu de licenciamento de agentes.

E não se trata de uma proposta vaga ou difusa. O ponto 18 entra, sem prévia genuflexão, na sacrossanta reserva de autonomia do movimento desportivo e define claramente as regras. O aviso fica lançado: Quando os principais responsáveis pela regulamentação desportiva falharem a UE não se limitará à difusão de boas práticas, a coordenar e estimular a convergência em torno de posições comuns ou a promover o diálogo, mas irá assumir sem hesitação as suas competências de regulação sempre que tal for necessário.

1 comentário:

Luís Leite disse...

Tanto a Comissão como o Parlamento Europeu não têm sequer capacidade de pressionar os Governos dos 27 a tomar qualquer iniciativa legislativa, com excepção dos Tratados, mesmo esses na maioria rejeitados por alguns dos membros ou ineficazes na prática do dia-a-dia.
"Resoluções"? quais os seus efeitos?
O que as instâncias produzem são, no fundo, "recomendações", sob a forma de "directivas" que podem ou não ser cumpridas, no contexto das autonomias nacionais.
Quando nenhum país está interessado em acabar com os "off-shores", que é para onde vai parte significativa do dinheiro envolvido nestas negociatas, estamos conversados...
Há muita gente importante, muitos partidos e organizações interessadas.
Não sou contra os negócios, desde que sejam legais e sobretudo que não fujam aos impostos.
Obviamente nada vai mudar e muito menos por pressão da UE, a menos que O Tribunal Europeu aprecie recurso(s) de cidadão(s) queixoso(s) e lhe(s) dê provimento, fazendo-se assim jurisprudência.
A UE está em vias de extinção.