O automóvel é, sem dúvida, uma grande criação e instituição do génio humano. Mas não é perfeito, nem completo. Para cumprir a sua função, depende da incorporação e do concurso de algo que não pertence à sua estrutura original, como é o caso dos pneus. Sem eles um carro não andaria, logo seria uma coisa inútil.
Por isso mesmo o automóvel é um artefacto superior e sublime e, ao mesmo tempo, frágil e humilde. Concomitantemente é um símbolo da nossa humanidade, tanto daquilo que a exalta como daquilo que a convida a ter os pés assentes na terra. Exactamente por ser carente da prótese dos pneus. Estes não fazem parte do carro propriamente dito, não trazem a sua marca; são produto de outra proveniência. Quem faz carros não quer saber do chão; deixa essa preocupação para outros. É isso que constitui o objecto dos fabricantes de pneus e perfaz a missão destes.
Um carro simboliza elevação, inovação, ousadia, criatividade, aventura, sonho, estilo, beleza, agilidade, estética, potência, bem-estar, limpeza, conforto. Não quer tocar na poeira, na sujidade, na lama imunda, nos excrementos, no lixo abjecto, na chuva e no óleo do asfalto, no piso escorregadio e traiçoeiro, na irregularidade dos caminhos e estradas. Delega esse serviço baixo e degradante nos pneus; é precisamente para isso que eles são feitos, é para isso que eles são pagos, é nisso que eles concorrem entre si, tentando cada um provar que é melhor do que os outros no cumprimento de tal finalidade e que dá garantias de maior durabilidade e fiabilidade no desempenho do seu papel rasteiro.
O negócio dos pneus é muito bom e rendoso; ninguém se dá ao cuidado de tentar saber dos proventos que gera e dos métodos que segue, por ser um domínio meio obscuro e ignorado, como o dos cangalheiros. Não se regateia e discute muito o preço a pagar pelos actos que nos causam alguma repugnância ou constrangimento. Sem pneus o carro não andava e afogava-se na imundície. Mesmo o avião, que tem asas para voar, sem pneus não levanta e arrisca-se a uma aterragem perigosa.
Por isso mesmo o automóvel é um artefacto superior e sublime e, ao mesmo tempo, frágil e humilde. Concomitantemente é um símbolo da nossa humanidade, tanto daquilo que a exalta como daquilo que a convida a ter os pés assentes na terra. Exactamente por ser carente da prótese dos pneus. Estes não fazem parte do carro propriamente dito, não trazem a sua marca; são produto de outra proveniência. Quem faz carros não quer saber do chão; deixa essa preocupação para outros. É isso que constitui o objecto dos fabricantes de pneus e perfaz a missão destes.
Um carro simboliza elevação, inovação, ousadia, criatividade, aventura, sonho, estilo, beleza, agilidade, estética, potência, bem-estar, limpeza, conforto. Não quer tocar na poeira, na sujidade, na lama imunda, nos excrementos, no lixo abjecto, na chuva e no óleo do asfalto, no piso escorregadio e traiçoeiro, na irregularidade dos caminhos e estradas. Delega esse serviço baixo e degradante nos pneus; é precisamente para isso que eles são feitos, é para isso que eles são pagos, é nisso que eles concorrem entre si, tentando cada um provar que é melhor do que os outros no cumprimento de tal finalidade e que dá garantias de maior durabilidade e fiabilidade no desempenho do seu papel rasteiro.
O negócio dos pneus é muito bom e rendoso; ninguém se dá ao cuidado de tentar saber dos proventos que gera e dos métodos que segue, por ser um domínio meio obscuro e ignorado, como o dos cangalheiros. Não se regateia e discute muito o preço a pagar pelos actos que nos causam alguma repugnância ou constrangimento. Sem pneus o carro não andava e afogava-se na imundície. Mesmo o avião, que tem asas para voar, sem pneus não levanta e arrisca-se a uma aterragem perigosa.
Também nós não prescindimos dos pneus (solas de couro ou borracha) dos sapatos. Sujam-se e gastam-se, porém temos à mão materiais de limpeza e substitutos à altura para todos os gostos, estações do ano, situações do tempo e natureza das tarefas a cumprir. Temos sapatos e pneus de todas as formas e feitios: para andar, para correr, para praticar os diversos desportos, para casa, para a rua, para a praia e a montanha, para o Verão e o Inverno etc. A variedade não tem fim.
Os pneus são, portanto, de uma utilidade inestimável e expressão da fecundidade do nosso engenho e inspiração: aliviam-nos, compensam-nos, acrescentam a nossa liberdade e margem de acção, permitem que voltemos a consciência e atenção para causas, ideais, metas e alvos elevados. Com eles evitamos ferir a nudez e sensibilidade dos pés na aspereza e rudeza do chão. Temos neles um prestimoso intermediário para esse contacto.
Os pneus fazem esse trabalho feio e sórdido, todavia conveniente. Nisso sobrelevamos a aparente esperteza e nobreza das aves. Elas dispensam os pneus dos sapatos; e isso pode parecer prova de uma manifesta superioridade e leveza, tanto mais que assim deitam fora um peso escusado e logram aventurar-se a voar através do espaço imenso dos céus. Só que, quando descem à terra para se alimentar, chafurdam directamente com os pés na carne putrefacta. Triste destino é o seu!
Sejamos, pois, gratos, lúcidos e compreensivos em relação aos pneus. Eles fazem o serviço sujo, indigno e indecente. Sem eles seríamos como os abutres e aves de rapina. Andaríamos com os pés atolados naquilo que nos desqualifica. Devido a eles e aos seus fabricantes, agentes e vendedores podemos andar limpos e aprumados, cheirar bem, ter um porte decente e agradável, sem vergonha e enfado. Afinal dá-nos jeito suportar um rei (com esta ou outra designação) dos pneus, tanto mais que estes são um produto natural: são feitos de tiras da sua língua.
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