quinta-feira, 3 de maio de 2012

Dilemas éticos



A governação faz-se de escolhas. Em democracia não há só um caminho. Escolher, este ou aquele, é sempre uma opção. Não uma obrigação. E envolve  um dilema ético. Em momentos de crise e de penúria financeira, mais se acentua esse dilema. Reconhecer este elementar facto não requer qualquer moralismo especial, qualquer cartilha traduzida de um filósofo do dever moral e menos ainda de um programa nacional. Ninguém se lembra de um programa nacional pela honestidade e ou pela honradez e eles são tão necessários como são os do cumprimento dos regulamentos desportivos.
O Secretário de Estado do Desporto e da Juventude proclama, a quem o quer escutar, que o governo respeita a autonomia do movimento associativo. Qualquer problema que surja- dos árbitros de futebol à falência de clubes desportivos- lá vai a mesma resposta. Pois ainda bem. Mas vale o mesmo que o governo, a cada desempregado, declarar que respeita a garantia do direito constitucional ao trabalho. Contudo, no caso da autonomia do movimento associativo, não era tempo perdido gastar cinco minutos para pensar o que é, e para que serve, essa autonomia. Isto depois de o Estado ter nacionalizado muitas das competências originais das federações desportivas, delas se apropriando e as ter devolvido à origem sob a forma pública de delegação como contrapartida ao financiamento. E, de caminho, já agora, explicar como se consegue que um sistema à beira da implosão, saia da situação em que se encontra com um programa que começa e acaba na ladaínha da autonomia do movimento associativo. Ora estas escolhas são do domínio da ética, embora, bem sei, nunca sejam consideradas como tal. Porque, da ética para o desporto, existe uma noção de algo comparável a um catálogo de boas maneiras.
Um dos principais dilemas que se coloca à ação governativa é o de escolher na base de critérios que sejam assentes em valores que se pretendem ver salvaguardados. Se um governo pretende garantir um bom uso dos recursos públicos não pode escolher quem deles reiteradamente deu mau uso. Se um governo eleva o mérito como critério de escolha pública não pode assinar recrutamentos na base do alinhamento partidário. Se o governo pede sacrifícios aos portugueses não pode alimentar uma clientela em cujas cabecinhas se acolhe a ideia de que os sacrifícios são para os outros, porque, para eles, tudo como dantes, quartel-general em Abrantes! A mentira necessária ou a governação às escondidas são inaceitáveis e devem ser democraticamente combatidas.
Estes problemas podem ser entendidos como problemas menores e apenas um sinal da consequência da degenerescência dos sistemas democráticos. Mas não. Pelo contrário, são problemas maiores. Porque a degenerescência dos sistemas democráticos começa precisamente na quebra e posterior perda de valores de confiança entre governantes e governados. E essa perda é mais devastadora que as diferenças de opinião ou de modelos de governação. A crise da instância politica não resulta tanto de divisões entre esquerda/direita mas entre a palavra/ação entre o que os políticos dizem e o que fazem.
Seria talvez mais recomendável não voltar a este tema, até porque há muita suscetibilidade ferida (e ao falar disto é inevitável) mas o governo, com o recato e a reserva impostas pela natureza dos factos, deveria avaliar, se sim ou não, a probidade dos que o servem está acautelada. Se os sacrifícios que estão a ser impostos começam pelo exemplo dos que dirigem a administração pública. Se os problemas que afetam o sistema desportivo nacional podem ser tratados como reflexões teóricas. De tentar perceber para que serve hoje a autonomia do movimento associativo quando tem competências públicas delegadas que o obrigam a um tormento burocrático permanente. De pouco valem os livros brancos, ou de outra cor, os grupos de trabalho ou os embaixadores da ética se o exemplo de quem governa não está em linha com os valores defendidos. Mais cedo ou mais tarde o preço a pagar será elevado e, quanto mais tarde, maior o custo.
O governo tem pela frente uma tarefa muito complexa resultante do momento que o país vive e com ele a escassez de meios financeiros. Muitos dos problemas que tem de enfrentar não se pode dizer que sejam da sua responsabilidade. Mas é sua, a responsabilidade de encontrar a melhor resposta para eles. E tem entre mãos a falência de organizações desportivas perante o exaurir de meios financeiros autárquicos ou regionais. Neste cenário é comovente falar da autonomia do movimento associativo. Mas é inócuo. Até porque tem uma administração pública desportiva com a tentação de abuso da posição dominante. E com a vontade de colocar na ordem quem dela se afasta. E nada existe de mais intolerante que o abuso de poder exercido desta forma.Com ou sem respeito pela autonomia do movimento associativo.




9 comentários:

Anónimo disse...

«Temos mais de 60 federações com utilidade pública desportiva que podem claramente promover estes hábitos», lembrou Alexandre Mestre, no dia em que um estudo da OMS revelou que os jovens portugueses são dos que menos desporto praticam.
Dixit Alexandre Mestre um praticante assiduo, daquela modalidade já aqui referida como "Direito Desportivo".
Pregar menos e praticar mais seria aconselhável, sem dúvida!
A Ética não se vende no Pingo Doce e muito menos com 50% de desconto para o comprador a granel.

Luís Leite disse...

Um dos maiores problemas deste país é a falta de cultura geral e específica.
Passou-se de uma cultura dual burguesa urbana/provinciana rural para uma cultura maioritariamente suburbana.
A cultura pré-25 de abril era feita de desigualdades sociais muito marcadas, mas não existiam vazios culturais como temos agora no suburbano.
Por outro lado, passou-se da cultura do ser para a cultura pós-moderna do ter.
Tanto antes como depois, a cultura do conhecimento, por um lado, e da prática de atividades formativas e enriquecedoras do caráter, por outro, nunca abrangeu mais que uma pequena percentagem da população.
O que sempre se passou com o desporto passou-se com a música, com as artes plásticas, com a literatura, etc.
Falta-nos cultura.
A maioria das famílias e das escolas não conseguem transmitir, nos tempos que correm, conhecimento e hábitos culturais.
O vazio não se preenche com apelos à ética nem com legislação deslocada da realidade.
Para se ser governante, é indispensável ter soluções para estas realidades.
Que os recrutados, notoriamente, não têm.

Armando Inocentes disse...

Caro JM Constantino:

Na minha modesta opinião - e é só uma opinião, vale o que vale - eu elegeria este post como o melhor que escreveu em Colectividade Desportiva.
Não só por aquilo que nele podemos ler, mas por aquilo que podemos interpretar dele e para o alerta que nos lança.
Falar em autonomia do movimento associativo? Com o atual RJFD? Nem sequer comento... mas quase que me atrevo a dizer que em política (e particularmente na nossa) não há "dilemas éticos"! Mesmo em democracia, mesmo num estado de direito, quem manda continua a poder e, pior ainda, quem continua a poder, manda.

Luís Leite diz que o problema deste país é a falta de cultura geral e específica - deste país não, mas talvez mais da maioria dos portugueses! O que se traduz num problema de formação... num problema de percepção clara de valores...

O dilema ético reside em escolhermos que mundo vamos deixar aos nossos filhos ou que filhos vamos deixar a este mundo... Alguém pensa que os nossos políticos estão preocupados com isto? Desiludam-se... eles estão preocupados é com as suas preocupações!

Um abraço!

josé manuel constantino disse...

Caros Luís e Armando
Peter Druker, num dos seus livros, usa a imagem do camponês que todos os anos lança as sementes à terra mesmo sabendo que muitas delas nunca germinarão,mas ele nunca desiste.....ser guerrilheiro da palavra e da ação cívica é a forma que temos de procuara melhorar as coisas ...sabendo que muitas das sementes que lançamos por aí ficarão...

Anónimo disse...

Ética é uma palavra que o Secretario de Estado do Desporto e juventude não devia nunca de pronunciar,quando não teve etica não escolha dos dirigente do ipdj.
Um dia temos uma presidente que mais tarde passa para vogal, porque o actual presidente não teve coragem de "limpar" os colegas de trabalho.Colegas que outrora tiveram cargos de dirigentes e que o respeitaram e não lhe fizeram perseguições como ele agora viu e permitiu que fossem feitas, esse senhor "CARRASCO" já regressou ao serviço de origem,pois já limpou os elementos da antiga direcção, muda-se de instalções e instala-se a nova direcção. Durante uma semana o IPDJ é incontactavel pois não exitem comunicações,para se mandar um email ao presidente tinha que mandar para um emailpessoal de funcionário e este imprimia e entregava ao Sr. Presidente.
Em relação serviços desconcentrados do IPDJ, estão a quaseum ano sem funções atribuidas e neste momento sem qualquer contacto com os serviços centrais e os funcionários sem saberam qual vai ser a sua situação pois não sabem se vão para mobilidade ou se vão ser "repescados",Sim "repescados "odescontentamento dos funcionários em relação a esta equipa é tanta que muitos que não foram colocados nas listas preferiram sair pelo seu pé, a ter que atura-los.
A comissão continua á margem destes problemas um dos elementos vai a chefe de divisão.
Quando não há etica com os funcionários como pode haver com os agentes desportivos.

Anónimo disse...

Pois....o IDP morreu! Tal como morreu de igual modo o IPJ! Os funcionários de ambos os lados morreram na totalidade um um pouco também! Tudo isto porque a política se sobrepõe à eficácia da gestão da coisa pública. Tudo porque uns certos indivíduos querem "talvez governar" Serviços que não teriam capacidade de "governar" não fosse o "encosto político" do momento. Penso que esta fusão veio trazer mais prejuízos que lucros, isto se a classe governativa do novo serviço entendesse que sem ovos (leia-se funcionários competentes e conhecedores dos serviços a prestar) fossem tão ou mais importantes que "vendetas". Uma coisa deu para todos perceberem: venha quem vier a mesma "aberração lógica de governação da coisa pública" mantêm-se e a dança das cadeiras faz-se mais por bizarrias que por competências! Presumo que o novo instituto não esteja vivo daqui, talvez 5/6 anos porque os seus objectivos e competências deixam de fazer sentido na filosofia política e económica que há pouco tempo nasceu!

Anónimo disse...

O Relvas é que não tem qualquer dilema ético: a filha aparece a trabalhar no Open de Ténis do Jamor, organizado pelo João Lagos (e a ser beijada pelo Pai, que ficou "emocionado") e, simultaneamente, o Lagos anuncia que está para muito breve que o Governo lhe ceda, a custo zero, terrenos do Jamor para ele construir e explorar um complexo do ténis (que ficaria ao lado da Praça da Maratona).

E diz o Lagos, com tranquilidade, que não quer dinheiro nenhum para a construção, porque ele virá da Câmara de Oeiras e de privados. Como se a cedência gratuita de terrenos públicos não fosse muito melhor do que dinheiro!!!!!...

Só faltava depois a Sofia Relvas ser a Relações Públicas do novo Complexo de Ténis!!!! Se estes métodos já renderam com os sobreiros, porque é que não hão-de vingar com o Jamor?!

Fernando Tenreiro disse...

dirijo-me aos anónimos

caros amigos

É bom de ver que o IDP começou a ser morto em 2005 quando vocês o tomaram e decidiram destruí-lo a partir de cima com nomeações 'que não lembra ao diabo'.

Hermínio Loureiro tinha nomeado José Constantino, um líder desportivo com provas dadas e que depois demonstrou estar à altura das responsabiidades que lhe foram exigidas e de que saiu com um elevado desempenho.

Como discordei publicamente dele aqui neste mesmo blogue estou à vontade para dizer que quem destruiu o IDP foi quem veio a seguir e nomeou pessoas sem currículo.

Fizeram mais, as coisas correram mal com essas primeiras nomeações pobres e mesmo assim foram mantidas umas e outras, novas, igualmente incapazes foram nomeadas.

Vocês anónimos de 2005 a 2010 fizeram uma guerra suja neste mesmo blogue.

Vocês são as pessoas que não podem falar do que se passa agora.

Há a hipótese de algum dos anónimos que agora fala e critica o SEDJ não ter estado activo na guerra suja, mas nessa altura porque não houve mais vozes que se opusessem ao sucedido em anos e anos de destruição do IDP?

Quanto ao que se passa no IPDJ tenho procurado encontrar respostas no blogue desportoeeconomia.blogspot.com

As respostas não são simples hoje como não eram nas legislaturas de 2005 a 2011.

Os meus melhores cumprimentos

Anónimo disse...

O IPDJ está tão morto, tão morto que ainda se encontra incontactável do "mundo exterior". Que se saiba ainda não aconteceu nenhum "terramoto" no desporto pelo facto. Se calhar era mesmo melhor ficar assim para sempre :-)