quarta-feira, 22 de abril de 2009

Empobrecimento ilícito

Num momento em que a agenda política é motivada pela discussão sobre medidas legislativas que combatam o enriquecimento ilícito não é despiciendo abordar também o empobrecimento ilícito. Das pessoas, das famílias e do próprio Estado.
A administração fiscal deixou prescrever 3,7 milhões de correcções ao IVA feitas à banca do exercício de 2004. Motivo: falta de recursos humanos. O montante dá-nos uma noção sobre o que o Estado deixou de receber e os resultados e a eficiência da administração fiscal. E como os contribuintes cumpridores são penalizados. Os motivos invocados alertam-nos para o alcance das proclamadas medidas de modernização da máquina fiscal. É um exemplo que infelizmente pode ser replicado.
Como aqui já foi referido a Autoridade da Concorrência mandou arquivar o inquérito relacionado com a aplicação da taxa reduzida de IVA aos ginásios e health clubs. Concluiu «não existirem indícios de práticas restritivas da concorrência susceptíveis de serem imputadas às empresas envolvidas no processo». É claro que o problema era outro. O de supostamente certas entidades não terem feito repercutir no preço a pagar pelo consumidor a baixa do IVA.Com a pergunta feita o resultado dificilmente seria outro. Estamos num domínio onde reina a maior das confusões e arbitrariedades. E onde a realidade conta mais que a retórica política.
Empresas municipais que vendem serviços desportivos e não cobram IVA; organismos desportivos sem finalidade lucrativa que não cobrem IVA mas não preenchem os quesitos para tal efeito; serviços municipais de autarquias que seguem o mesmo caminho; institutos públicos que optam pela isenção; entidades privadas que aplicam a taxa de 5% quando deveriam aplicar 20%.A regra é o que cada um entende, distorcendo as regras concorrenciais do mercado, lesando o Estado e não colocando o consumidor perante condições de igualdade na aquisição dos serviços. O que impera é o silêncio e ninguém se parece incomodar.
Neste contexto só se pode compreender o posicionamento governamental, manifestado com a atitude de muitos operadores dos “ginásios” de arrecadarem a diferença entre os IVAs, como uma oportunidade politica de aparecer aos olhos dos consumidores como seu defensor. Contudo é pouco. E pede-se mais acção e menos crispação. O sector continua por fiscalizar. Cada um faz como quer. Reina a bagunça e o incumprimento fiscal.
Qualquer pessoa ou entidade que consulte a administração fiscal sobre estas matérias, para além da dificuldade em obter resposta, corre o risco de obter uma resposta em função da natureza da secção ou sector que a presta. Os técnicos oficias de contas e as sociedades revisoras de contas defendem-se e receiam opinar de modo conclusivo. E o governo hiberna.
Muito se fala de que os portugueses que vivem na fronteira com a Espanha adquirem produtos e serviço mais baratos atendendo, entre outros motivos, a taxas mais baixas de IVA aplicadas naquele país. Mas não é preciso sair de Portugal. Aqui uma aula de natação ou o aluguer de um campo desportivo podem ter ou não IVA. Depende da interpretação que cada entidade faz do cumprimento das suas obrigações fiscais.
Ganha quem à partida não tem nada a perder: os que vendem os serviços. Perde o Estado. E perde quem mais devia ganhar: o cidadão contribuinte e o cidadão utente.

5 comentários:

Anónimo disse...

Hoje a imprensa diz que o COP não paga às federações e aos atletas. A situação é pior do que antes. O COP não tem meios de decidir melhor do que no passado. Tem mais dinheiro do Estado e exige mais ainda. A eleição contra tudo e todos das federações deveria ter limites. O projecto de dar dinheiro ao COP prejudica o desporto. Era melhor atalhar caminho e apresentar um novo projecto de financiamento público ao programa olímpico.

Anónimo disse...

Não interessa o que diz o presidente do COP. O importante é que não tem credibilidade. O que andam o IDP e o Secretário de Estado a fazer? Aceitam pagar com dinheiros públicos as asneiras das federações? Porque é que as federações não são pagas com dinheiros da publicidade como se faz nos Estados Unidos? Os dezasseis milhões de euros são muito dinheiro que poderia ter outras aplicações úteis. As acções imponderadas das federações vão afectar a imagem de Sardinha e Laurentino. As notícias dizem que o fisco divide as empresas pelo grau de risco. O mesmo fazem o bancos conosco quando pedimos um empréstimo. O grau de risco do COP e das federações pode ser visto de duas formas. Na primeira não interessa o que fazem e o Estado dá o dinheiro. Na segunda o Estado exige resultados e dá o dinheiro. Ao Estado fica a palavra sobre a alternativa do que faz com os nossos votos.

ftenreiro disse...

Caro José Constantino,

O desporto português rondará os 1,5 mil milhões de euros. Os grandes países europeus rondam os 30 mil milhões cada, a Suécia 3,5 e a Holanda 8,3.

Começa a haver estatísticas que permitem compreender a equação do desporto português.

Respeito as pessoas que em Portugal se insurgem contra as dimensões económicas e monetárias do desporto.

Porém a dimensão económica é um indicador sintético e dramaticamente objectivo do nosso desporto.

O mercado português é pequeno, como aqueles números indicam.

Enquanto eles forem pequenos, os acidentes que vão acontecendo e que estão descreitos na sua peça, são isso mesmo, pequenos e acidentes.

Creio que a crise mundial demonstrou que automatismos do género: 'o privado é que sabe' e 'o privado é melhor' está enfranquecido por agora.

Num trabalho que estou a fazer pedi a opinião a especialistas e apenas um me deu uma resposta cabal.

Seja por incapacidade minha, seja por outro motivo, as respostas para os problemas que coloquei não encontraram resposta imediata.

O problema dos ginásios tinha uma resposta económica adequada que era aumentar a pressão da oferta para retirar força à procura.

Dar dinheiro ao COP é outra medida económica, entre várias que se podem equacionar e não apenas duas.

Mas têm de ser respostas económicas aos problemas desportivos e sociais encontrados.

Neste momento coloco a questão da quantidade de desporto produzido em Portugal.

Este é um elemento que sendo resolvido irá accionar/alavancar outras capacidades e colocar Portugal a produzir desporto perto dos mais ricos.
até breve

josé manuel constantino disse...

Ao Fernando Tenreiro
A questão que coloca, o da dimensão económica do desporto, não é matéria do meu post”.Abordo o problema da indisciplina fiscal em matéria de serviços desportivos. De quem está obrigado a cumprir e quem tem por missão controlar e garantir esse cumprimento. Que é independente dos indicadores da oferta ou da procura no que tange ao seu cumprimento. Tão só isso e já é muito.

ftenreiro disse...

Então boa-noite

admito que de vez em quando desconverso para poder coversar

quando o programa Mexa-se foi implementado ele pecou por escasso e por passados alguns anos morrer

lembro-me de na dgd dos anos oitenta a professora Margarida Viegas levar ensaboadelas de 'caixão à cova' porque o apoio às federações e à alta competição iria trazer impactos na prática recreativas da população portuguesa

depois a dgd deixou de ter uma divisão de recreação e foi nesse deserto que surgiu o Mexa-se

o desporto para todos, que portugal nunca teve, foi implementado durante duas ou três decadas seguidas na europa

a leitura do que fazer consensualmente é muito dificil para um desporto tão pequeno

a indisciplina fiscal, como conta, são ocasiões que beneficiam, 'os ladrões', salvo seja, por iniciativa do legislador, que o escreve em primeiro lugar, aliás como sugere a administração obama sobre os juristas que apoiaram bush.

será que os juristas legisladores deixaram de ser inimputáveis?

a procura de actos ilícitos é possível porque existe uma oferta de oportunidades legislativas afins ou da ausência de fiscalização e sanção

e este é o sentido da minha proposta, a partir da sua sugestão de ilicitude: os portugueses lucram pouco com a actividade desportiva (menos do que os europeus) e mais prejudicados ficam com a ineficiência e ineficácia das estruturas que sobre elas deveriam actuar

para um sector jurisdicionalizado como o desporto é espantosa a profusão de casos que o seu post apresenta

o meirim tem suportado a ideia de que nem toda a jurisdicionalização é juridicamente aceitável

do ponto de vista económico eu sugiro que o sector tem uma relevância ínfima para o que deveria significar e existem elementos de que está falido

salut