A Colectividade Desportiva publica e agradece um novo texto de Fernando Tenreiro.
Houve quem se perguntasse no fim da legislatura passada acerca do seu trabalho no desporto. Através de anónimos, atirava os foguetes, corria a apanhar as canas, apontando virtudes porque não havia elementos contestáveis alternativos. Portugal sabe que a ausência de contestação é sinal de certa força, que não de razão.
A evidência que a legislação do desporto dos anos noventa falhara aconselhava um perfil de actuação modesto e baseado em pressupostos de governance e éticos semelhantes aos que produzem os melhores resultados europeus. Infelizmente a certa altivez teve como consequência o falhanço de Pequim que confesso, eu próprio, esperava não acontecesse.
Irei escrever o prometido terceiro e último artigo, este sobre o lançamento do livro ‘Desporto e Estado: Ideologia e Prática’.
O novo livro que Jorge Bento e José Constantino coordenaram foi a reafirmação de um modelo de sucesso do desporto português. Uma vez mais o acto editorial comportou o risco de trazer novos nomes para testar o acumular de capital de conhecimentos do desporto português num mercado pouco motivado para a escrita e o debate dos seus temas candentes.
Manuel Villaverde Cabral o orador convidado fez uma incisiva valoração científica do que apelidou uma nova área, referindo-se ao conhecimento do desporto, notando que existem condições para um desenvolvimento futuro seguro e equivalente ao já sucedido noutras áreas.
Estas palavras esperançosas ilustram que os desafios que se apresentam ao desporto exigem o aprofundamento das medidas e dos incentivos numa perspectiva de longo prazo e sem expectativa de resultados positivos instantâneos e de benefícios sem um custo acessório.
Este imediatismo feito de espuma que apela ao sucesso pelo sucesso, observa-se nos actos oficiais, inaugurações, recepções a atletas, participação em corridas populares, comemorações e festas desportivas. O comportamento contamina e prejudica o desporto nacional porque a acumulação de conhecimento e de capacidade de governance equivalente ao nível europeu exige um investimento público conhecedor, prolongado direccionado para os desafios do mercado privado e menos para os problemas dos agentes conhecidos.
Armando França demonstrou no Congresso do Desporto que existem políticos com um conhecimento apurado sobre as necessidades reais do mercado do desporto, assim como, existem líderes desportivos como Hermínio Loureiro e Joaquim Evangelista que actuam em ambientes adversos, para citar um par de nomes.
Há um oceano de projectos para fazer, todo o tempo do mundo é pouco para o muito que a população portuguesa necessita em termos desportivos, todos somos escassos e ignorantes dos passos exactos que gerarão o maior valor acrescentado e colocarão as futuras gerações de portugueses com um consumo desportivo de nível europeu.
Os parceiros desportivos públicos e privados do desporto devem caminhar neste sentido mesmo que erros sejam cometidos ou lapsos surjam. A definição do ‘core’, do objecto fundamental do sector, é o elemento decisivo da determinação de fazer como a Europa faz.
Pequim primeiro e depois os dados europeus do nível desportivo nacional demonstraram que Portugal está longe do nível Europeu médio e que a criação de condições de produção desportiva é incipiente materialmente.
O futebol, retirando o trabalho incompreendido da Liga de Clubes e a resignação contrariada do Sindicato de Jogadores, mantém uma atitude majestática que a sua dimensão suporta servindo de exemplo às restantes modalidades que o copiam e porque o copiam remetem-se à sua menoridade e invisibilidade social e económica.
Como Jorge Bento referia na apresentação do livro a falta de debate é imensa e trilha-se uma via de silenciamento. O exemplo dado por José Constantino da falta debate, publicações, teses, não se justifica pela existência dos três jornais diários de desporto que mais nenhum país tem no mundo desenvolvido.
O blogue e os livros de Jorge Bento e José Constantino são oásis civis no desporto português actual. Não são o bastante, nem são o essencial para o que um mercado dinâmico, como o do desporto moderno, exige dos parceiros desportivos portugueses.
A definição do ‘core’ para o desporto nacional numa perspectiva europeia permitirá equacionar os projectos relevantes, a sua quantidade e qualidade, e os tempos de realização dos activos que faltam para a média dos países com quem Portugal compete globalmente.
A definição do ‘core’ através do debate científico e democrático traria outra beleza às mãos de fada que no seu castelo à beira Tejo lidam com o mercado desconhecendo o saber fazer europeu de todos os países que desde há décadas e mais recentemente nos ultrapassam habitualmente em todos os indicadores de performance desportiva.
1 comentário:
Por muito que se teorize, o que contam são as práticas. Políticas e não só.
E nesse campo estamos e estaremos na cauda Europa.
Cada vez mais atrasados, sendo ultrapassados por países europeus com menos de metade da nossa população.
Neste blogue, têm sido feitos muitos diagnósticos correctos da realidade do desporto nacional. E propostas de intervenção racionais e adequadas, a implementar a médio e longo prazo.
Nada que interesse ao Poder e ao mercado.
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