quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Ganhar mais de 600.000 euros? Nem pensar…


Na vizinha Espanha a famosa e denominada, para muitos, “Lei Beckham”, implementada em 2004, consignava um regime fiscal beneficiador para os trabalhadores estrangeiros com residência fiscal no país, isto é, sobre os seus rendimentos incidiria uma taxa de apenas 24% enquanto para os demais trabalhadores seria de 43% durante um período de 6 anos.
Considerado um regime injusto para com a restante população, o governo espanhol, graças a fortes pressões políticas, decidiu ao fim de cinco anos revogar tal regime, porém, o arrojo foi fraco face à ameaça de greve por parte da Liga de Futebol Profissional Espanhola que alegava a incapacidade financeira dos clubes para cobrir a redução que os seus jogadores iriam ter nos seus salários.

E a intenção de revogação rapidamente passou a uma pequena alteração do regime. Assim, a partir de 1 de Janeiro de 2010, apenas os jogadores que aufiram mais de 600.000 Euros mensais (7,2 milhões Euros anuais) passarão a estar sujeitos à taxa de 43%, mantendo-se para os restantes jogadores estrangeiros a de 24%.

Poder-se-á contar com os dedos de uma mão os jogadores que auferem mais do que aquele montante astronómico (provavelmente C.Ronaldo, Messi, Ibrahimovic, Kaká e Henry) e claro está que a Liga Espanhola continuará a ser uma das ligas europeias com vantagem negocial no mercado de jogadores estrangeiros e a dar-se muito bem com esta política, já que a importação de tantos jogadores estrangeiros nem sequer impediu o progresso da selecção espanhola, campeã europeia em 2008.

Veremos se tal matéria será regulada, e em que moldes, na Lei do Desporto Profissional, cuja preparação há muito se ventila em Espanha. Contudo, os mais de cem milhões de euros evocados pelo Presidente da Liga espanhola como a factura que os clubes teriam de pagar caso vingasse a aplicação da taxa de 43% para todos os jogadores, não representará um apoio, ainda que indirecto, e bem significativo por parte do Estado ao desporto profissional? Por onde pairam as preocupações e interdições da União Europeia a este respeito?

4 comentários:

Luís Leite disse...

Perdoe-me a Maria José Carvalho se o meu comentário sai um bocadinho ao lado da questão central que coloca, mas:

1) O desporto profissional, como se sabe, é uma das várias formas eficazes de lavar dinheiro sujo, pelo que não adianta aos governos exagerar nos impostos, já que os contratos são rapidamente alterados no interesse de contratante e contratado, sendo pago o remanescente através de uma qualquer offshore;

2)Por conveniências jornalísticas e políticas, criou-se em Portugal a ideia de que os Cristianos Ronaldos, Messis e outros futebolistas são os desportistas com maiores salários pagos pela sua entidade patronal.

3) Só na NBA, há actualmente 5 jogadores que ganham por ano mais de 20 milhões de dólares e há 24 que ganham mais de 15 milhões por ano. Quanto aos clubes, os gastos só em ordenados variam entre os 91 milhões dos LA Lakers e os 55 milhões dos Memphis Grizzles, o que paga menos dos 30 clubes da NBA, andando a média pelos 70 milhões.
Situações semelhantes acontecem na NFL (futebol americano) e na NHL (hóquei no gelo) e para não falar no basebol. Então se entrarmos no da Fórmula 1, os valores auferidos
pelos mais famosos são muitíssimo superiores. Quanto a dinheiro ganho em prémios, cachets e contratos publicitários, em modalidades individuais, há vários jogadores de golfe, tenistas e atletas que ganham bem mais que os futebolistas mais famosos e que fogem dos impostos como o diabo da cruz, vivendo no Mónaco e sendo pagos através de paraísos fiscais.

4) A verdade é que o futebol não está certamente entre as modalidades com salários mais elevados e o "soccer" só é realmente a modalidade mais importante em parte da Europa, parte de África e na América do Sul. Nos outros continentes não é.

5) Desfutebolizemos, por favor...

Luís Leite disse...

Já agora os salários do futebol americano em 2008/2009:

24 das equipas da NFL pagam, só em salários, mais de 100 milhões de dólares por ano, sendo lideradas pelos Oakland Riders, com mais de 152 milhões. São inúmeros os jogadores que ganham anualmente mais de 10 milhões de dólares (nem consegui contá-los).

A comparação com o futebol europeu é, no mínimo, divertida...

No basebol (MLB), o New York Yankees "infield" Alex Rodriguez (conhecem?) ganha 33 milhões de dólares anuais só em salário, mas têm outros na equipa, Derek Jeter que aufere 21,600 milhões e Mark Teixeira, que ganha 20,625 milhões.
Esta equipa gasta, só em ordenados mais de 200 milhões de dólares por ano. E são muitas a um nível idêntico.

Maria José Carvalho disse...

Caro Luís Leite muito obrigada pelo seu contributo para a "desfutebolização" trazendo-nos informações dos rendimentos de profissionais do desporto americano. Como bem entendeu a minha intenção não foi escalpelizar os salários dos profissionais do desporto, mas tão só ilustrar uma realidade vizinha que procurou através de um aliciante fiscal atrair "génios" para o seu país de vários domínios sociais. E o sector do futebol aproveitou bem esta estratégia. Dado a nossa existência no espaço europeu, este apoio estatal, ainda que indirecto ao desporto profissional, tem sido contestado e proibido pela União Europeia, daí eu ter levantado a questão.
Fique certo que os seus comentários mesmo que nem sempre "acertem no alvo" serão sempre muito bem recebidos.

Tiago Viana disse...

A realidade Norte-americana é distinta da europeia em vários pontos.
Primeiro, os clubes têm dono, são aceitas as candidaturas para as cidades onde a liga considera que há condições financeiras (nº de população, poder de compra) para sustentar a organização, podendo ser deslocalizados caso a cidade onde estão implantados não seja rentável. Também recebem algum apoio dos "Municipios" em termos de recinto a utilizar.
Os jogadores são muito bem pagos porque a receita publicitária é enorme e de bilheteira e marchandising também. É raro haver compensações financeiras por transferências e são irrisórias, Há sim, trocas porque o jogador mantém a vigência do contracto que tem com o clube e a Liga. As regras são claras.
A contribuição fiscal pelo que sei é igual em todo o país e actividade desportiva.
Relativamente à vantagem competitiva que os clubes espanhóis podem ter por terem um regime fiscal melhor, eu prefiro que o meu país continue a tributar os desportitas no escalão respectivo e que o Estado seja mesmo proibido de financiar o Desporto profissional. Tomar medidas para aumentar o índice de prática desportiva da população e dar condições de prática adequadas. Esse é o dever do Estado.