Quando se anuncia a publicação em Diário da República do primeiro despacho de suspensão do estatuto de utilidade pública desportiva, ao abrigo do novo regime jurídico das federações desportivas, a uma federação desportiva – no caso a Federação Portuguesa de Futebol -, dediquemos algum espaço a essa figura.
Seja-nos permitido, porém, relembrar o «penoso processo» que percorreu todo o ano de 2009.
Em breve, dir-se-á que, fruto da publicação do novo regime jurídico das federações desportivas e do estatuto de utilidade pública desportiva, as federações existentes viram-se vinculadas a um dever de adaptação dos seus estatutos às novas disposições legais relativas à sua organização e funcionamento.
Sobre os valores e desvalores dessas normas legais já muito adiantámos, em momentos, espaços e locais bem diferenciados. E não fomos os únicos. Não iremos, agora, repisar argumentos e opiniões.
Certo é – parece-nos objectivamente indesmentível – que o processo de adaptação estatutária conheceu contornos muito especiais.
Num primeiro momento, em 14 de Agosto de 2009, o Secretário de Estado da Juventude e do Desporto, em acção de propaganda, sublinhou o seu contentamento pelo facto de um número bem significativo de federações desportivas ter procedido à revisão estatutária. Nessa altura (pré – eleitoral) de nada interessava aquilatar se as novas normas estatutárias estavam ou não conformes à lei. Satisfazia-se o poder político com a forma, não com a substância.
Mais tarde, após as eleições legislativas de Setembro, é que se veio a tornar público que os tais elogiados estatutos federativos continham normas contrárias à lei. Daí seguiu-se uma «segunda de mão», levada a efeito por inúmeras assembleias gerais das federações desportivas.
Terão, ainda assim, ficado algumas pinturas borradas? Ver-se-á com o decorrer do tempo.
De todo o modo, criou-se a convicção que a suspensão do estatuto de utilidade pública desportiva era medida sancionatória que só seria tomada pelo Governo no caso das federações desportivas não apresentarem estatutos retocados.
Nada de mais errado.
Na verdade, se é correcto afirmar que é no regime jurídico das federações desportivas que encontramos o núcleo dos fundamentos que levam à suspensão da utilidade pública desportiva, aliás disperso por mais de uma norma, não menos verdade é que tal medida aparece prevsita em outra legislação.
São três, para já, os diplomas legais que destacamos.
O primeiro é o Decreto-Lei n.º 248-A/2008, de 31 de Dezembro, que estabelece o regime de acesso e exercício da actividade de treinador de desporto.
O artigo 12º, nº 2, estabelece deveres de regulação às federações desportivas, a cumprir no prazo de 180 dias (propostas a enviar ao IDP) e adopção de normas de regulamentares, após a validação do IDP, no prazo de 90 dias. Se as propostas iniciais não forem apresentadas pelas federações no prazo estabelecido, incumbe ao presidente do IDP, após audição do Conselho Nacional do Desporto, concretizar a regulação.
Por seu turno, o artigo 26º, nº 1, estipula que às federações desportivas titulares do estatuto de utilidade pública desportiva que não cumpram o disposto no artigo 12.º do decreto-lei aplica -se o disposto nos artigos 21.º, 22.º e 23.º do Decreto -Lei n.º 248-B/2008, de 31 de Dezembro. Logo, o regime de suspensão da utilidade pública desportiva.
Tendo o diploma entrado em vigor 90 dias após a data da sua publicação, quantas federações cumpriram os seus deveres na regulação da actividade de treinador? Haverá alguma que não tenha apresentado, em devido tempo, as propostas que lhe são exigidas? Em caso afirmativo, quantos despachos fundamentados estão a ser preparados?
Segundo diploma: Lei n.º 39/2009, de 30 de Julho, que estabelece o regime jurídico do combate à violência, ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espectáculos desportivos, de forma a possibilitar a realização dos mesmos com segurança.
Aqui, no artigo 5º, estabelecem-se deveres de regulamentação para as federações desportivas e ligas profissionais (regulamento de prevenção da violência). Esses regulamentos estão sujeitos a registo junto do CESD, que é condição de validade.
A não aprovação e a não adopção da regulamentação prevista, bem como a adopção de regulamento cujo registo seja recusado pelo CESD, implicam, enquanto a situação se mantiver, a impossibilidade de o organizador da competição desportiva em causa beneficiar de qualquer tipo de apoio público, e, caso se trate de entidade titular de estatuto de utilidade pública desportiva, a suspensão do mesmo (cá está ela de novo).
Por sua vez, o artigo 50º, nº 1, determina que a adopção de tais regulamentos deve (deveria) ocorrer até ao início da época de 2009-2010.
Qual serão «saldo» neste domínio?
Por fim, um terceiro caso: a Lei n.º 27/2009 de 19 de Junho (Estabelece o regime jurídico da luta contra a dopagem no desporto).
É o artigo 12º que consagra um dever de regulamentação federativa antidopagem, a registar junto da ADoP.
O incumprimento do disposto implica, enquanto o incumprimento se mantiver, a impossibilidade de as federações desportivas serem beneficiárias de qualquer tipo de apoio público, sem prejuízo de outras sanções a aplicar.
O artigo 76º, nº 1, prevê um prazo para a adaptação dos regulamentos federativos ou das ligas profissionais ao disposto na lei: 120 dias a contar da data de entrada em vigor da lei.
A lei entrou em vigor no dia 20 de Junho (artigo 78º).
Que federações cumpriram esse dever?
É que, retornemos ao regime jurídico das federações desportivas, constitui fundamento para a suspensão do estatuto de utilidade pública desportiva, o não cumprimento da legislação contra a dopagem no desporto [artigo 21º, nº 1, aliena b)].
Existe, pois, mais «suspensão de utilidade pública desportiva» do que se pensa. Haverá Estado para tanta?
Seja-nos permitido, porém, relembrar o «penoso processo» que percorreu todo o ano de 2009.
Em breve, dir-se-á que, fruto da publicação do novo regime jurídico das federações desportivas e do estatuto de utilidade pública desportiva, as federações existentes viram-se vinculadas a um dever de adaptação dos seus estatutos às novas disposições legais relativas à sua organização e funcionamento.
Sobre os valores e desvalores dessas normas legais já muito adiantámos, em momentos, espaços e locais bem diferenciados. E não fomos os únicos. Não iremos, agora, repisar argumentos e opiniões.
Certo é – parece-nos objectivamente indesmentível – que o processo de adaptação estatutária conheceu contornos muito especiais.
Num primeiro momento, em 14 de Agosto de 2009, o Secretário de Estado da Juventude e do Desporto, em acção de propaganda, sublinhou o seu contentamento pelo facto de um número bem significativo de federações desportivas ter procedido à revisão estatutária. Nessa altura (pré – eleitoral) de nada interessava aquilatar se as novas normas estatutárias estavam ou não conformes à lei. Satisfazia-se o poder político com a forma, não com a substância.
Mais tarde, após as eleições legislativas de Setembro, é que se veio a tornar público que os tais elogiados estatutos federativos continham normas contrárias à lei. Daí seguiu-se uma «segunda de mão», levada a efeito por inúmeras assembleias gerais das federações desportivas.
Terão, ainda assim, ficado algumas pinturas borradas? Ver-se-á com o decorrer do tempo.
De todo o modo, criou-se a convicção que a suspensão do estatuto de utilidade pública desportiva era medida sancionatória que só seria tomada pelo Governo no caso das federações desportivas não apresentarem estatutos retocados.
Nada de mais errado.
Na verdade, se é correcto afirmar que é no regime jurídico das federações desportivas que encontramos o núcleo dos fundamentos que levam à suspensão da utilidade pública desportiva, aliás disperso por mais de uma norma, não menos verdade é que tal medida aparece prevsita em outra legislação.
São três, para já, os diplomas legais que destacamos.
O primeiro é o Decreto-Lei n.º 248-A/2008, de 31 de Dezembro, que estabelece o regime de acesso e exercício da actividade de treinador de desporto.
O artigo 12º, nº 2, estabelece deveres de regulação às federações desportivas, a cumprir no prazo de 180 dias (propostas a enviar ao IDP) e adopção de normas de regulamentares, após a validação do IDP, no prazo de 90 dias. Se as propostas iniciais não forem apresentadas pelas federações no prazo estabelecido, incumbe ao presidente do IDP, após audição do Conselho Nacional do Desporto, concretizar a regulação.
Por seu turno, o artigo 26º, nº 1, estipula que às federações desportivas titulares do estatuto de utilidade pública desportiva que não cumpram o disposto no artigo 12.º do decreto-lei aplica -se o disposto nos artigos 21.º, 22.º e 23.º do Decreto -Lei n.º 248-B/2008, de 31 de Dezembro. Logo, o regime de suspensão da utilidade pública desportiva.
Tendo o diploma entrado em vigor 90 dias após a data da sua publicação, quantas federações cumpriram os seus deveres na regulação da actividade de treinador? Haverá alguma que não tenha apresentado, em devido tempo, as propostas que lhe são exigidas? Em caso afirmativo, quantos despachos fundamentados estão a ser preparados?
Segundo diploma: Lei n.º 39/2009, de 30 de Julho, que estabelece o regime jurídico do combate à violência, ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espectáculos desportivos, de forma a possibilitar a realização dos mesmos com segurança.
Aqui, no artigo 5º, estabelecem-se deveres de regulamentação para as federações desportivas e ligas profissionais (regulamento de prevenção da violência). Esses regulamentos estão sujeitos a registo junto do CESD, que é condição de validade.
A não aprovação e a não adopção da regulamentação prevista, bem como a adopção de regulamento cujo registo seja recusado pelo CESD, implicam, enquanto a situação se mantiver, a impossibilidade de o organizador da competição desportiva em causa beneficiar de qualquer tipo de apoio público, e, caso se trate de entidade titular de estatuto de utilidade pública desportiva, a suspensão do mesmo (cá está ela de novo).
Por sua vez, o artigo 50º, nº 1, determina que a adopção de tais regulamentos deve (deveria) ocorrer até ao início da época de 2009-2010.
Qual serão «saldo» neste domínio?
Por fim, um terceiro caso: a Lei n.º 27/2009 de 19 de Junho (Estabelece o regime jurídico da luta contra a dopagem no desporto).
É o artigo 12º que consagra um dever de regulamentação federativa antidopagem, a registar junto da ADoP.
O incumprimento do disposto implica, enquanto o incumprimento se mantiver, a impossibilidade de as federações desportivas serem beneficiárias de qualquer tipo de apoio público, sem prejuízo de outras sanções a aplicar.
O artigo 76º, nº 1, prevê um prazo para a adaptação dos regulamentos federativos ou das ligas profissionais ao disposto na lei: 120 dias a contar da data de entrada em vigor da lei.
A lei entrou em vigor no dia 20 de Junho (artigo 78º).
Que federações cumpriram esse dever?
É que, retornemos ao regime jurídico das federações desportivas, constitui fundamento para a suspensão do estatuto de utilidade pública desportiva, o não cumprimento da legislação contra a dopagem no desporto [artigo 21º, nº 1, aliena b)].
Existe, pois, mais «suspensão de utilidade pública desportiva» do que se pensa. Haverá Estado para tanta?
2 comentários:
Aqui se constata que muita da legislação que é feita em Portugal não é para cumprir. Tem apenas um cariz orientador, moralista.
Andam a brincar com coisas sérias.
O Secretário de Estado ficou contente porque muitas Federações cumpriram alguma da legislação, embora muitas fora do prazo?
A República desautoriza-se a si própria, tal a displicência, a ignorância, a incompetência e a inviabilidade evidentes nos disparates travestidos em diplomas.
No caso do Desporto, é mais uma prova de que o Governo e a Assembleia da República pouco ou nada percebem destes assuntos, que consideram, certamente, pouco relevantes, embora politicamente correctos.
Quanto ao Despacho que retirará a utilidade pública desportiva à Federação de Futebol, só acredito quando o vir publicado.
Mesmo que tal venha a acontecer (o que não acredito), o Governo desautoriza-se ao não cumprir os prazos previstos.
Tudo isto é uma vergonha.
O senhor Doutor Meirim deve ser o responsável pelo maior número de cólicas por frase sempre que escreve alguma coisa sobre a rapaziada de Algés.
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