quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Sinais deste nosso tempo



É preciso que lutemos pela lei como pelas muralhas da cidade.

Heráclito, cerca de 544 – 484 a.C.

1. A mitologia grega proclama que os humanos se distinguem dos outros seres por cultivarem a terra, viverem do seu esforçado labor e por terem lei. Porém quando hoje olhamos em redor, esta marca é cada vez mais rara e difícil de encontrar. Em todo o canto e lugar proliferam os enzoneiros, espertalhões e vigaristas, oportunistas e trapaceiros. Movem-se como o peixe na água, driblam com todo o descaramento, tranquilidade e desfaçatez os normativos legais e a obrigação de ganhar o pão com o suor do rosto (um mandamento estipulado por Deus e registado na bíblia!).
Sobejam as mensagens, provas e revelações, trazidas por Hermes (igual e cumulativamente deus dos comerciantes, jornalistas e ladrões!), de que, pouco a pouco, se instala e expande impunemente uma conjuração para o crime de colarinho branco, organizado e praticado, de modo obsceno e insolente, sem quaisquer rebates de consciência ou receio de violar e enfrentar o quadro jurídico constitucionalmente instituído. Este vai ainda subsistindo no papel, mas assemelha-se progressivamente a um castiçal e ornamento ou a uma peça de museu; a sua observância e aplicação prática vão caindo em desuso ou então destinam-se quase exclusivamente às pessoas dotadas de apurada sensibilidade ética e moral, às que não têm notoriedade pública ou não dispõem de meios para contratar instrumentos, expedientes e agentes de ludíbrio e distorções das leis.
De resto o sistema judicial encarrega-se - não poucas vezes e salvo excepções que surpreendem pela crescente raridade - de lançar achas para fogueira da falta de transparência e da acusação de não ser isento e equitativo para todos, mas antes cego, surdo e mudo para os abusos e desmandos dos omnipotentes e mediáticos, ateando assim as já altas labaredas do descrédito e da desconfiança.

2. A máxima de Platão (“a verdade é a beleza no seu máximo esplendor”) vê-se substituída por estoutra: “a verdade oficial, oficiosa e pública é a mentira no seu máximo despudor”.
Com efeito a mentira instalou-se, tornou-se rotina compulsiva e vem constituindo a base, o fuste e o capitel do sistema político e social, apesar de a verdade continuar límpida e cristalina, estar bem à nossa frente e ser nítida à vista desarmada como o sol do meio-dia. No entanto parece inútil denunciar a primeira e afirmar a segunda. Até porque quem a isso se atreve é apontado a dedo como retrógrado (ou coisa pior) e gerador de problemas, é objecto de escárnio, de riso, insulto e maus-olhados; humilhado, desmoralizado e intimidado é coagido a encolher-se e recuar para o canto da comiseração, da depreciação e do desdém.
Como resultado desta evolução, a depressão e a resignação tomam conta de nós: indignar-se com o quê e denunciar para quê? Fazer o quê, a não ser assistir atónito ao estendal de imoralidade, fechar os olhos, sacudir os ombros, endurecer a consciência e cruzar os braços?
Em suma, ser honesto requer hoje uma grande ousadia e exige uma heroicidade acima dos mortais comuns e manifestamente fora de moda. Por este andar, não tarda nada a ser considerado anacronismo e um destrambelhamento próprio de lunáticos e doidos varridos, carecidos de internamento urgente.

3. A democracia desfigura-se e degenera; é cada vez mais uma miragem e já nem sequer virtual é, como se isso fosse o seu destino inexorável e não houvesse possibilidades para a reabilitar e aperfeiçoar. Sentimo-nos frustrados e impotentes e alijamos esta obrigação e responsabilidade, perante o paulatino alargamento do fosso entre os discursos e as intenções propaladas e as obras e constatações registadas. A veracidade dos factos não conta para nada; o que vale são as versões falsificadas da realidade, ardilosamente mistificadas, difundidas e impingidas.
O que foi que nos aconteceu?
Presenciamos e tomamos conhecimento de acontecimentos que nos aviltam, agridem, ofendem e envergonham e não reagimos. As tropelias e pulhices sucedem-se e não têm consequências, nem nós as exigimos. As evidências são mais que muitas, mas não são tidas em consideração, nem geram acções de indignação e protesto. É como se não nos incomodassem e molestassem ou tivéssemos a convicção da inutilidade de assumirmos os nossos deveres cívicos. Calamos e engolimos, como se nada fosse, até porque o olho da censura, mais ou menos velada, está sempre à espreita para nos meter medo e a vinda de represálias não se faz rogada.
Estamos sendo anestesiados de muitas e sofisticadas maneiras; o desinteresse apodera-se de nós e já nada nos choca, por mais escabroso que seja. É isto normal? É uma fatalidade nacional?
Como foi possível chegarmos a este patamar da mais densa escuridão cívica e moral? Como é que as nossas lideranças em tantos e tantos campos se deixaram enlear nesta teia? Que estômago é o nosso para conseguirmos suportar tanta gangrena e iniquidade?
Os intestinos do país e do sistema político que o rege decompõem-se e cheiram a podridão. A vergonha e o decoro ausentam-se para parte incerta. Os valores, os princípios e as noções do dever perderam o pio. A ética está sendo enterrada como um indigente: sem choro nem velas. E a um grande número de pessoas isto tanto se lhe dá como se lhe deu; apenas lhe interessam o bem-estar individual e o lema do salve-se quem puder. Às favas, malvas ou urtigas manda-se o bem colectivo e social e o imperativo de cuidar dele. O apagão da cidadania alastra a passos largos. O Estado omite-se, apaga-se e rende-se às corporações dos poderosos e incensados. As autoridades incumbidas de zelar pelo cumprimento e primado da Lei agem como se a sua função se tivesse invertido, contribuindo assim para a promoção da desmoralização.
Enfim, o país precisa, como de pão para a boca, de uma comprida e forte régua cívica e moral.

4. Todos os dias ficam conhecidas novas tramóias, são reveladas contas suspeitas no estrangeiro, vemos figurões impávidos e serenos a acumular fortuna pela calada da noite, nos labirintos das manhãs e no crepúsculo das tardes. Os nomes e os dados são divulgados, nada acontece; os canais de televisão e as páginas dos jornais abrem-se de par em par para que os nobres barões nos inundem com a negação do óbvio. Todos se dizem vítimas de cabalas, clamam por inocência e, por cima, ainda proferem ameaças. Sempre se acham inocentes ou vítimas do mundo, fazendo juras de inocência e vingança. De remorsos na alma e de vergonha na cara não se descortina o mais leve rasto.
Figuras graúdas da advocacia e reluzentes escritórios de advogados adquirem fortuna gigantesca, especializando-se em novos ramos do florescente negócio dos pareceres e servindo de umbrela aos famosos e endinheirados.
Vale tudo para desacreditar, denegrir, fragilizar, hostilizar, intimidar e transpor o espírito, a letra e o território da legalidade. O manancial de advertências, avisos e recados, intimidações e pressões, ‘influências’, ‘conselhos’ e ‘recomendações’ jorra donde menos seria de esperar, incorrendo - com todo o à-vontade e sem tirar nem pôr - no crime de corrupção sob a forma tentada.
A cada dia que passa decrescem os meios para desnudar a hipocrisia e a falácia de pessoas dotadas da arte e do poder de contar com agentes e máquinas de fabricação e propaganda de uma imagem de reputação acima de qualquer suspeita.

5. Quase tudo o que é delito grave é esquecido, arquivado, empacotado ou sujeito a delongas e remetido para as calendas gregas, acabando por prescrever. A Lei parece regulamentada para proteger a desmoralização. Jornalistas e formadores de opinião, ciosos da deontologia da função, ou são ‘dispensados’, saneados e vilipendiados ou sentem-se inúteis, pois a indignação tornou-se dispensável e supérflua. O que se pensa e diz não se escreve; e o que se escreve não usufrui de contexto favorável para se fincar, sustentar e medrar, enquanto a mentira vive num regabofe, engorda e sofre metamorfose.
Sempre que a verdade eclode e é escrita ou dita em público, os figurões visados reagem como felinos acossados e com um inimaginável arsenal de astúcias, máscaras e ardis.
Quando algum nome sonante cai na rede e é chamado à pedra por um juiz, este é rotulado de ‘exibicionista' e sedento de mediatismo. E corre o risco de ser malquisto e preterido nalguma avaliação e promoção.
Para cúmulo apregoa-se, alto e bom som, que vivemos num Estado de direito. Ah!, se ele fosse mesmo a sério, os diversos tipos de trafulhice e tramóia, de agitação e chantagem, de conluio e manobrismo, de jornalismo encomendado e de modo de ser ‘jornalista’ pombo-correio ou pau-mandado não disporiam do ar viciado que tanto gostam de respirar; não contariam com o descaso e os favores do deus da (in)justiça, nem lhes valeriam os embustes de Hermes para escapar ao banco da assunção de responsabilidades.

6. Mas… não haverá esperança de escapar a este plano inclinado para o abismo cívico e moral? Não é lícito cultivar o optimismo e, em nome dele e da necessidade de o possuir e proclamar, acreditar que a esta onda avassaladora de aldrabice, descaro, falsidade e hipocrisia se seguirá um mar extenso e regenerador da autenticidade e verdade?
A esperança, por si só, sem ser fecundada pela vontade e pelas acções e posições correspondentes, está longe de ser um amparo, um consolo, uma vantagem, um remédio ou bom presente para o desejado futuro. Ao invés, pode ser inclusive uma desgraça e uma tensão negativa, geradoras de demissão e indiferença, em face da gritante ausência de alternativa. Pode ser uma espera em vão e, assim, é continuar carente, é desejar o que não se tem e não se vê como alcançar, é prolongar o estado de insatisfação e infelicidade. Confiar apenas na esperança é, pois, equipará-la à fé ou religião. Ora, diz o velho Platão, a crença é o oposto do conhecimento.
Por outras palavras, a esperança constitui mais um mal do que um bem. Julgo que esta nuvem escura paira sobre a vida do nosso país, a ponto de não ser perceptível se ainda há alguma esperança. Com efeito é pertinente perguntar se é significativo o número dos que não se calam, entregam e rendem perante a avalanche de desvario que ameaça soterrar definitivamente o modo de vida estribado na tradição do trabalho sério e honrado. Ainda têm voz, capacidade e oportunidade de intervir no espaço público as pessoas amantes da ética e da decência e com vergonha na cara? Serão capazes de aguentar as campanhas de calúnia e desmoralização do mais sórdido e vil calibre?
7. Esta evocação, logo à saída das férias, não é de bom-tom; assume até todo o aspecto de uma contradição. Então as férias deixaram um sabor tão amargo e abriram portas a considerações formuladas com a tinta do azedume? Reconheço que a aspereza e o ar carregado e sisudo não são de bom augúrio nem a maneira mais recomendável para iniciar um novo ano de labutas, trabalhos e canseiras. Todavia há razões que arrastam o ânimo para um desvão pouco aconselhável nesta fase do campeonato.
Sucede que, nos últimos tempos, os sinais de mau funcionamento do fígado e da bílis são inequívocos: mau hálito, boca a saber a papel de música, preguiça intestinal, dificuldades em dormir, herpes e outras afecções cutâneas etc. Não dá para perceber de imediato as causas destas manifestações, tanto mais que me tenho preocupado em adoptar e seguir a preceito um estilo de vida sensato e saudável: exercício corporal quanto baste, abundância de saladas e frutas, corte no álcool e nos doces, ingestão frequente de líquidos, cultivo do convívio familiar, prática sexual ajustada à idade, leitura de livros de filosofia atinentes à condução de uma existência em harmonia com o cosmos, à formação de um pensamento ampliado, a uma visão alargada e compreensiva do mundo e dos seres que o povoam etc.
Como quer que seja, o mal-estar da bílis e do fígado não é de geração espontânea. Basta pensar um pouco para concluir que talvez tenha muito a ver com a leitura dos jornais e com o consumo acrescido da televisão e com o que isso avivou em mim.
Por um lado, não cessam as notícias de uma escabrosa actualidade feita de incêndios e incendiários, trafulhices e vigarices, cinzas e vítimas, aldrabões e vilões nos mais distintos sectores. (Para não meter a foice em seara alheia, convido o leitor a examinar o largo campo do ensino superior com todo o incessante cortejo de regimes jurídicos, regulamentos e demonstrações de nepotismo, tentando a todo o custo destruir a matriz da universidade e a paixão pela docência e impor transformações estatutárias e institucionais ao arrepio dos princípios e dimensões humanistas e iluministas da missão universitária. Quem é que ousou denunciar e questionar a insanidade dos centralizadores, burocratas e fanáticos da gestão que sobrepõem esta e os seus ditames à actividade-fim da Universidade e, deste jeito, a colocam em lugar cimeiro e a missão tradicional em lugar último? Quem é que reagiu, na altura própria e visando impedir os irreparáveis danos e estragos, à operação cosmética que envolveu o famigerado e fraudulento Processo de Bolonha, urdida para vender gato por lebre, tratando todo mundo como se fosse um bando de asnos e mentecaptos? Quem é que levantou a caneta e a voz contra os fervorosos paladinos e ilusionistas, contra o abastardamento do pensamento e o atentado a uma sólida formação de base ocasionados por essa medida dolosa da lucidez e sensatez? Como é que a razão foi torpedeada e tanta gente se deixou levar na enxurrada do populismo e da intrujice? Onde estavam as ordens profissionais, algumas finalmente tão despertas, enquanto a demência avançava? Agora é tarde e Inês é morta! Se os académicos e toda a multidão de entidades com obrigação de agir responsavelmente puseram na boca o adesivo da cobardia, se preferiram, por manifesto oportunismo ou demissionismo (do tipo: não me comprometas!), comportar-se como ingénuos, desatentos e distraídos e fazer ouvidos de mercador, se emudeceram, pactuaram e foram activa ou passivamente coniventes e cúmplices com a insidiosa lavagem ao cérebro da opinião pública, o que é que se pode esperar das outras pessoas?!)
Por outro lado, o pior do futebol está de volta e revigorado: à parte a confusão, o caos, a sujeira e chafurdice dos bastidores federativos e dos respectivos mandantes, intoxicadores, agitadores, subalternos, avençados, parceiros, filhos e enteados, os canais televisivos regurgitam de programas e painéis prenhes de regougadores peritos em açular o bando e acordar nele os mais arcaicos e agressivos instintos. O circo reabriu e vai ficar e durar, para que a ‘democracia’ vigente siga avante, impávida e triunfante. Enquanto o povo ignorante, apático, manipulado e alienado tudo engole; e o esclarecido abafa, em silencio e resignação, o seu sacrifício e dor.

8. Sei que este texto é enfadonho, repetitivo, recorrente, desnecessário e vão, porquanto não vai além do óbvio. Por isso as dúvidas e perguntas do leitor são legítimas. Será o escrito motivado por algum sentimento especial? Não morará no meu subconsciente algum despeito ou inveja? No capítulo pessoal não viso ninguém em particular. Desejo sempre que as entidades e pessoas colham frutos abundantes, multiplicados e céleres do que plantam ou semeiam, que nada demore ou falte aos méritos e virtudes da sua acção e comportamento. Mesmo assim não podia deixar de escrever estas linhas. Quanto mais não seja, para desagravar a consciência das minhas obrigações e para abrir as pesadas comportas da inquietude e do desassossego.
Todavia no plano superior e indeclinável do civismo o sentimento é de outro jaez, dado o funcionamento do nosso sistema judicial e dos actores políticos e sociais. A existência da vasta e intocável estirpe de trafulhas, tartufos e mentirosos está corroendo e dissolvendo a nossa estrutura e postura cívica, ética e moral. Está a contaminar-nos e, por via disso, tornar-nos falsos, hipócritas e cínicos nos pensamentos e nas palavras, nas congeminações e nos actos. A linguagem que circula e se impõe no quotidiano vai criando uma realidade condizente. Sem darmos por isso, tropeçamos nela a toda a hora, como quem dá topadas nas pedras do caminho e não presta grande atenção.
As palavras vão sendo esvaziadas de sentido. Está surgindo e ganhando foros de aceitação e validade um estranho e inquietante idioma, prenhe de um léxico assaz predatório e transformador. O vocabulário corrente serve para nos habituar e conformar a um novo modelo de indivíduo e a um novo ideal ‘educativo’: o dos sujeitos libertos de quaisquer desafios, entraves, freios, temores, inquietações e inibições civilizacionais e morais; abertos, flexíveis, disponíveis e competentes para a falcatrua, a farsa, a insinceridade, a incoerência, a ordinarice, o embuste, sem o mínimo indício de escrúpulos, de decoro e vergonha.
O aquém-homem surge na linha do horizonte, imponente e impante de arrogância, empáfia e vaidade, suscitando admiração, adulação, bajulação, aplauso e reconhecimento. A vida está para os arrivistas, espertos, oportunistas e sandeus. Eis a nova elite inspiradora da conduta dos demais. Eis o resultado e o marco altaneiros do avanço e progresso das reformas operadas nos nossos dias. Bem hajam os ídolos, donos e fabricantes deste tempo!
Quão grande é a falta de lideranças coexistíveis e confiáveis em tantos sectores! Como nos vamos reerguer destes escombros?

6 comentários:

Anónimo disse...

Finis Patriae, ó Olimpicus Bentus!!!!!!!!

Luís Leite disse...

Texto notável!
Resposta à última pergunta:
Não vamos.
A decadência ética e moral, historicamente cíclica, acabou sempre com revoluções violentas, que hoje, neste marasmo europeista sem retorno não são possíveis.
No entanto, tudo está, como sempre esteve, nas mãos do povo ou de quem saiba reagir em seu nome.
Esta a última esperança (vã)?

Anónimo disse...

A situação é clara:de acordo o Global Competitiveness Report para 2010-2011 Portugal caiu mais dois lugares no índice de competitividade das economias. Em 2005, quando José Sócrates tomou posse, Portugal estava em 30º lugar; agora está em 48º.
Eis alguns dos países que nos ultrapassaram nestes cinco anos: Malásia, Eslovénia, Kuwait, Chipre, Tailândia, Polónia, China, Tunísia e Indonésia.E por isso as suas palavras,professor,são tão pertinentes

José Correia disse...

As Forças Morais dos Líderes (Um Exemplo do Além-Mar)

Agradeça-se a clarividência destas “palavras bentas” sobre a nossa desdita, ou melhor desta violentíssima decadência do regime e do completo aviltamento dos nobres ideais da democracia e da Nação portuguesa. E ponhamos os nossos “olhos da alma” nas palavras de um líder político que abaixo se seguem e pensemos se seria hoje ou no próximo futuro possível que em Portugal algum dos nossos líderes políticos, desde o Presidente da república ao Primeiro-Ministro de qualquer dos grandes partidos nacionais fazer um tão vibrante apelo às energias e valores da Pátria secular que somos.

Vamos à citação tal qual:

“Mas os valores dos quais depende o nosso sucesso – trabalho esforçado e honestidade, coragem e fair play, tolerância e curiosidade, lealdade e patriotismo –, esses, são bem antigos. Esses são verdadeiros. Têm sido a força silenciosa do progresso ao longo da nossa História. Aquilo que se exige, pois, é um regresso a essas verdades. O que nos é exigido agora é uma nova era de responsabilidade – que todos os americanos reconheçam que temos deveres para connosco próprios, para com a nossa nação e para com o mundo, deveres que não aceitamos com relutância, antes assumimos com satisfação, firmes na convicção de que nada há de mais gratificante, que nada define melhor o nosso carácter, do que a entrega total a uma tarefa difícil.
(…)
América: face aos perigos que nos ameaçam a todos, neste Inverno do nosso descontentamento, recordemos essas palavras intemporais. Com esperança e virtude, afrontemos de novo as correntes geladas e suportemos as tempestades que vierem. Que os filhos dos nossos filhos digam que, quando fomos postos á prova, nos recusámos a deixar que esta viagem terminasse, que não virámos as costas nem vacilámos. E que, com os olhos postos no horizonte e a graça de Deus sobre nós, levámos em frente a grande dádiva da liberdade e a entregámos intacta às gerações futuras.”

(Citações da parte final do Primeiro Discurso proferido por Barak Obama como Presidente dos EUA, intitulado “Triunfo da esperança sobre o medo”, Washington, D. C., 20 de Janeiro de 2009).

Nota Importante: Pode ser muito interessante efectuar o tratamento deste pequeno excerto do discurso retirando dele as palavras fundamentais que o consubstanciam e compará-las com as dos discursos oficiais que vamos tendo nesta nossa desgraçaria regimental.

José Pinto Correia

Fernando Tenreiro disse...

Caro Professor

O sector é pequeno e veja-se como dá de comer a tantas bocas como à justiça, ao turismo, à educação e às obras públicas, por exemplo.

Estes favores não contam com contrapartidas destas bocas para equilíbrio entre e o que a população necessita. O alimento é desviado das necessidades vitais do sector para as necessidades de outrem.

As Universidades deveriam ser incentivadas a aprofundar a sua investigação aplicada como faz a União Europeia.

A tese, que estou a obter na Faculdade de Desporto da Universidade do Porto, permitiu-me sistematizar e questionar o paradigma nacional: porque somos pequenos, não temos a capacidade de nos batermos em pé de igualdade com os outros. Este paradigma aplicado desde os anos oitenta é errado. Portugal com dez milhões de habitantes é um país europeu médio e existem países europeus menores com um produto superior, em termos relativos.

Há agentes ludibriados, eventualmente por auto-envolvimento, clubes e federações, universidades e autarquias. Veja-se uma autarquia: recebe o financiamento comunitário para uma instalação de topo e passa a ter instantaneamente um custo de manutenção de dezenas ou centenas de milhares de euros por mês. Como a instalação é especializada não têm população bastante para equilibrar as contas entre a despesa de manutenção e a receita da utilização e da prática, e passando a receber atletas de Lisboa ou do Porto financia outras autarquias. Não são conhecidos programas de incentivo à prática nas instalações criadas por parte das populações locais o que permitiria a prazo equilibrar o défice da manutenção que actualmente obriga a autarquia. Em síntese as autarquias desviam algum do dinheiro, que deveria ser encaminhado para projectos locais, para investimentos que não beneficiam a sua população como a despesa de manutenção das mesmas que financiam atletas de outras regiões nomeadamente de Lisboa e do Porto. As instalações colocadas em meios rurais não alcançam os utentes de Lisboa e do Porto que seriam os principais consumidores das actividades da infra-estrutura criada com financiamentos comunitários. É possível encontrar factores económicos que prejudicam outros parceiros.

Fica o desalento face à legislatura que arrancou devagar, escondeu a pouca arte que tinha e que, finalmente necessitando de apresentar trabalho, restam os fretes. Foi uma mão cheia de nada. A herança que perdurará será o desvio sustentado do desenvolvimento medido pela média europeia.
A profunda crise orçamental, económica, institucional e de paradigma exigiria um protagonismo iluminado e mobilizador do sector em relação à economia e à sociedade. As condições estão criadas para a divergência sustentada em relação à cultura e aos princípios de cidadania europeia.

Distinguir o paradigma universal do desenvolvimento do que acontece em Portugal é um enorme trabalho de Sísifo que Portugal não consegue assumir.

Esta é a minha interpretação económica do seu tempestivo poste.

Fernando Tenreiro disse...

Caro Professor

O sector é pequeno e veja-se como dá de comer a tantas bocas como à justiça, ao turismo, à educação e às obras públicas, por exemplo.

Estes favores não contam com contrapartidas destas bocas para equilíbrio entre e o que a população necessita. O alimento é desviado das necessidades vitais do sector para as necessidades de outrem.

As Universidades deveriam ser incentivadas a aprofundar a sua investigação aplicada como faz a União Europeia.

A tese, que estou a obter na Faculdade de Desporto da Universidade do Porto, permitiu-me sistematizar e questionar o paradigma nacional: porque somos pequenos, não temos a capacidade de nos batermos em pé de igualdade com os outros. Este paradigma aplicado desde os anos oitenta é errado. Portugal com dez milhões de habitantes é um país europeu médio e existem países europeus menores com um produto superior, em termos relativos.

Há agentes ludibriados, eventualmente por auto-envolvimento, clubes e federações, universidades e autarquias. Veja-se uma autarquia: recebe o financiamento comunitário para uma instalação de topo e passa a ter instantaneamente um custo de manutenção de dezenas ou centenas de milhares de euros por mês. Como a instalação é especializada não têm população bastante para equilibrar as contas entre a despesa de manutenção e a receita da utilização e da prática, e passando a receber atletas de Lisboa ou do Porto financia outras autarquias. Não são conhecidos programas de incentivo à prática nas instalações criadas por parte das populações locais o que permitiria a prazo equilibrar o défice da manutenção que actualmente obriga a autarquia. Em síntese as autarquias desviam algum do dinheiro, que deveria ser encaminhado para projectos locais, para investimentos que não beneficiam a sua população como a despesa de manutenção das mesmas que financiam atletas de outras regiões nomeadamente de Lisboa e do Porto. As instalações colocadas em meios rurais não alcançam os utentes de Lisboa e do Porto que seriam os principais consumidores das actividades da infra-estrutura criada com financiamentos comunitários. É possível encontrar factores económicos que prejudicam outros parceiros.

Fica o desalento face à legislatura que arrancou devagar, escondeu a pouca arte que tinha e que, finalmente necessitando de apresentar trabalho, restam os fretes. Foi uma mão cheia de nada. A herança que perdurará será o desvio sustentado do desenvolvimento medido pela média europeia.
A profunda crise orçamental, económica, institucional e de paradigma exigiria um protagonismo iluminado e mobilizador do sector em relação à economia e à sociedade. As condições estão criadas para a divergência sustentada em relação à cultura e aos princípios de cidadania europeia.

Distinguir o paradigma universal do desenvolvimento do que acontece em Portugal é um enorme trabalho de Sísifo que Portugal não consegue assumir.

Esta é a minha interpretação económica do seu tempestivo poste.