É um lugar-comum reconhecer-se que o desporto e as
atividades físicas em geral são um meio excecional no contributo ao trabalho
com cidadãos portadores de deficiência. E é verdade. Ajudam à sua integração
enquanto pessoas, mas também são um meio preventivo e terapêutico na redução de
algumas das sequelas resultantes de patologias existentes. E são-no
independentemente da performance
desportiva. É, por isso, limitativa a enfatização dos resultados desportivos
alcançados em certos eventos desportivos. O caso dos jogos paralímpicos e a
enfâse que é habitualmente feita corre o risco, se não houver uma perspetiva
mais abrangente, de adulterar e escamotear as razões fundamentais para a presença
do desporto junto destes cidadãos.
As análises que procuram estabelecer avaliações de tipo
comparativo com outras organizações que, de similares, tem apenas o local e uma
designação afim, são conhecidas. Mesmo que num caso (Jogos Olímpicos) esteja em
causa o rendimento desportivo em termos absolutos e em outros (Jogos
Paralímpicos) o rendimento desportivo absoluto em certo tipo e grau de
patologia. Aplicar aquelas competições, modelos de abordagem equivalentes tem significativo
acolhimento mediático o qual, por seu turno, parece tolhido do distanciamento
crítico necessário e ficar receoso de poder ser acusado de não defender
cidadãos que as circunstâncias da vida limitaram. A situação complica-se quando
se misturam planos sociais de apoio competitivo-que devem ser iguais aos dos restantes
praticantes desportivos-com prémios por resultados desportivos.
O desporto e as atividades físicas que lhe são conexas
são um recurso importante no plano das políticas dirigidas aos cidadãos
portadores de deficiência, o que podemos verificar com maior detalhe
consultando a literatura sobre o tema. A problemática dos cidadãos portadores de
deficiência pede à sociedade, políticas de discriminação positiva, que atendam
à sua situação especial e que procurem reduzir os fatores de desigualdade de
oportunidades quanto à sua vida em sociedade. Estamos perante um problema de
grande complexidade porque a população portadora de deficiência é extremamente
heterogénea, com graus de autonomia diversos e colocando tipos de problemas
distintos.
A adoção de modelos de desenvolvimento desportivo
centrados prioritariamente na dimensão competitiva do desporto, corre o sério
risco de acentuar novas formas de discriminação. Ao se acolher os melhores numa
lógica seletiva, rejeitam-se a grande maioria, porventura, e apesar de tudo, os
mais necessitados de usufruírem de uma prática desportiva sistemática. As políticas
desportivas construídas e centradas predominantemente na obtenção de resultados
em competições, serão sempre poucas em relação aos restantes, que são muitos. Sabemos
que não é fácil às organizações representativas evitarem uma prática do
desporto que procura copiar os modelos dominantes. É este modelo que as
mobiliza porque é um modelo que, apesar de tudo, lhes dá visibilidade. Mas a
prazo serão confrontados com objetivos alcançados, que não corresponderão aos
interesses daqueles que representam. Os vícios e os excessos que passam pelo
desporto contemporâneo transportar-se-ão para o desporto para cidadãos
portadores de deficiência agravando a
sua própria possibilidade de desenvolvimento. O que agora é um ganho (o aumento
da visibilidade) transformar-se-á a prazo num problema maior (o aumento da
exclusão).
O reconhecimento desta situação coloca um quadro de
exigências que pede responsabilidades a todos - poderes públicos, associativos
e privados -,no sentido de se criarem condições que permitam aproveitar as
enormes potencialidades do desporto a favor dos cidadãos portadores de
deficiência. Mas também a reduzir os fatores que impedem uma adequada assunção
do princípio da igualdade de oportunidades perante o direito de todo o cidadão
ao exercício da prática do desporto. O que requer, não apenas a aceitação da
diferença entre indivíduos, mas também a aceitação de diferenças perante as
várias dimensões da prática do desporto. Pedir mais desporto para os cidadãos
portadores de deficiência, não é pedir mais desporto de um qualquer desporto.
Princípio que, afinal, é válido para qualquer cidadão. É no conteúdo deste
direito que não há diferenças.
6 comentários:
Um texto realista, verdadeiro e corajoso, em plena campanha eleitoral para o COP.
Parabéns.
Não é possível no Blogue, saber em mais um texto, do futuro Presidente do COP, Prof. J.M.Constantino, quais as ideias mais profundas, o que defende a curto, médio e longo prazo, para o período de uma Olímpiada ou mais que uma. Quais devem ser as balizas de um ou mais projecto conjugadas com a realidade,hoje, no presente, de Portugal.
Como se perspectivam, conjugando-se com o estádio em que nos encontramos na Educação, onde o Desporto não é avaliado como deveria, sendo sempre posto como um capítulo estanque que só deverá interessar aos homens do Desporto ?
Desporto, escolar, deficientes, universitário, pós alta competição,
pré escolar, manutenção, alto rendimento.
O COP tem decerto teorizado sobre estes propósitos.
Os anteriores Presidentes fizeram-no face ás conjunturas, aos seus propósitos, pensamentos e utopias futuras?
Não seria interessante saber em linhas mestras, mas concisas, o que se propõe J.M.Constantino idealizar ou parcialmente executar?
Não é suficiente saber e conhecer a sua obra editada e as ideias que são possíveis absorver do seu já longo percurso como homem interessado com o ser humano e o seu desenvolvimento físico e mental.
Será possível ?
Agradecemos.
Estatutariamente, o COP não pode nem deve sair da sua área de intervenção:
Preparar, juntamente com as Federações, os Jogos Olímpicos; e promover os ideais e as regras que integram a Carta Olímpica.
Temas laterais não cabem nas competências do COP.
Agora que estalou uma pequena polémica sobre o Doping, gostaríamos de saber o que ao longo dos últimos 30 anos os responsáveis do COP assumiram sobre as contradições entre os fenomenais resultados alcançados e a saúde dos atletas.
Logo, o que J.M.Constantino tem a dizer e quais as suas perspectivas para o futuro, em particular em Portugal.
Assume que face ao que se vive no Desporto Mundial, no Alto Rendimento, Portugal não pode ganhar medalhas?
Ou pode ganhar medalhas fazendo como todos ou a grande maioria?
A entrevista de Luís Horta pode ser politicamente correcta, mas como é entendível, foge à profundidade do tema.
Os portugueses não recorrem ou não recorreram às substâncias proibidas?
É pertinente a entrevista de Luis Horta.
Poderá o COP dizer algo ou influenciar.
Obrigado.
Os anónimos anteriores puseram questões pertinentes.
Não é possível ninguém esclarecer?
Obrigado.
Enviar um comentário