Texto publicado no Público de 27 de Janeiro de 2012.
1.
No primeiro texto que dedicámos a este tema, adiantámos que quem justifica a
criação de um TAD – e parece inevitável a sua criação em Portugal em face da
maioria existente nos parlamentares -, vai adicionando, como pontos positivos
para o desporto, a celeridade, especialização e
uniformização. Tudo que, segundo os defensores desta solução, não se encontra
na justiça estatal e, por via desse facto, não se coaduna com as especificidades
do desporto e da competição desportiva. A adoptar o TAD ganha-se, também por
isso, eficácia no sistema de resolução de litígios desportivos, com tudo de
positivo que daí resulta para a vivência do sistema ou dos diversos sistemas, modalidade
a modalidade desportiva.
2. Iniciemos pela especialização de quem julga as “questões
desportivas”.
E, neste domínio, sem entrar em linha de conta com o mito da
especialização daqueles que se encontram, nas diversas modalidades a aplicar as
normas desportivas e com a “suposta” especialização dos futuros árbitros do
TAD, o que se vem afirmando é que os magistrados não se encontram totalmente
habilitados, porque desconhecedores, a decidir adequadamente em matéria
desportiva. Ou, também por outras palavras, “não são sensíveis às
particularidades do Direito Desportivo”.
3. Vários flancos débeis apresentam estas proposições.
Concentremo-nos, neste espaço, somente em alguns.
O primeiro dos quais surge a montante. Mas o que é, a final,
em Portugal o Direito do Desporto? De que se compõe que seja tão difícil,
porventura impenetrável, aos magistrados dos tribunais do Estado?
Resumindo, penso que sem abuso, dir-se-á que o desporto é
regulado por dois tipos de normas: umas de origem pública, outras provenientes
das próprias organizações desportivas.
Sucede que, no caso português e em outros, geográfica e
culturalmente próximos, aquilo que eram normas privadas das entidades desportivas,
são normas públicas. Dê-se, como mero exemplo, os regulamentos disciplinares
das federações desportivas. Ou seja, estamos no domínio do Direito
Administrativo, para o qual o Estado até possui uma ordem própria de tribunais. Quem
melhor, então, para julgar questões de natureza administrativa que os juízes
especializados?
4. A juntar a essa administrativização das regras
fundamentais das federações desportivas, surge a transversalidade do Direito do
Desporto. Questões laborais, fiscais, societárias, civis e tantas outras em ramificações de ramos de Direito,
abordadas, interpretadas e aplicadas pelos Tribunais, preenchem o espaço
litigioso do desporto.
E. para muitas delas, o Estado emanou legislação específica –
contrato de trabalho desportivo e sociedades desportivas, por exemplo – tendo
como parâmetro a respectiva lei geral e subsidiária. Ora, que faltas de
especialização têm, então os magistrados e os Tribunais do Estado?
E, se dúvidas houvesse, bastaria apreender o balanço de mais
de uma centena de decisões dos tribunais superiores portugueses – nos últimos
dez anos -, que tiveram o desporto como raiz, para concluir que as suas
decisões revelam conhecimento da lei a interpretar e a aplicar, alcançando-se,
de uma fora geral, respostas bem positivas e fundamentais para o próprio
desenvolvimento do Direito do Desporto.
5. Dir-se-ia que os verdadeiros especialistas do Direito do Desporto,
a existirem, também se encontram entre os magistrados portugueses, laborando
nos tribunais do Estado.
6. PS: Foi descoberto o
filão das irregularidades na utilização de jogadores da equipa “B” e dos
problemas que se colocam nessa espécie de vaso comunicante com a equipa
principal. Sendo certo que se trata de regulamento em aplicação pela primeira
vez, não deixa de ser estranho o desconhecimento (aparente) dessas normas –
pelos “especialistas do direito desportivo” –, com tudo o que de prejuízo
implica para os clubes infractores. Haverá mais Caixas de Pandora prestes a
abrir?
7 comentários:
Concordo com os argumentos de JM Meirim, embora seja de opinião de que, como referi em anterior comentário, os Tribunais em geral e o Tribunal Administrativo em particular, são um último recurso para litigância.
E os juízes de direito só têm que ser especialistas na interpretação da Lei e na sua aplicação.
Sempre que necessitem, podem chamar especialistas para esclarecer os Tribunais.
É possível ter o link para o lugar da Assembleia da Repúbilca onde está o material que tem sido indicado nestes postes?
Caro anónimo
Sugiro-lhe este percurso na página da AR.
a)Atividade Parlamentar e Processo Legislativo;
b)Iniciativas legislativas;
c)Coloca em branco o campo da Sessão Legislativa
d) no assunto escreve desporto
e) irá encontrar as duas iniciativas legislativas e um conjunto considerável de contributos e pareceres, e ainda a trasncrição vídeo de audiências realizadas.
JMMeirim
Caro anónimo
Pode encontrar o que procura aqui.
obrigado pelo link para as actividades do parlamento
Tal como dizia o Talvez aqui há muito tempo, vem agora um especialista dizer o seguinte: “Os Tribunais Arbitrais servem para legitimar atos de corrupção” (Marinho Pinto, na cerimónia pública de Abertura do Ano Judicial, 30 Jan 2013)
Talvez
Se o Sr. Marinho Pinto tem casos para denúncia de corrupção, não se deve coibir de os denunciar, sob pena de ao calar-se ser conivente com a corrupção do direito e de um dos seus instrumentos, os tribunais arbitrais.
Temos que ser coerentes naquilo que pensamos e dizemos, sob pena de perdermos o pé à realidade e demonstrarmos com exemplos simultaneamente fúteis e assertivos a pouca valia do afirmado publicamente.
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