Não é um fenómeno recente. Nem é um problema exclusivo do futebol. Há vários anos que se assiste, na generalidade das modalidades desportivas em que compete ao mais elevado nível, a uma perda da capacidade competitiva do Benfica. Dantes era raro perder. Agora é raro ganhar. Essa perda de capacidade competitiva foi, em tempos mais recentes, atribuída à frágil situação financeira e às vicissitudes directivas. Actualmente é atribuída a quê? Muitos avançam com a ideia que tudo tem a ver com a organização do clube. Em defesa desta tese é invocado o exemplo do F.C.Porto e da sua liderança onde inclusive têm sucesso os que no Benfica o não tiveram. Esta tese só em parte é verdadeira. Se tudo se resumisse à organização do clube e ao talento do seu líder não haveria treinadores com insucesso. E o FCP também os colecciona. Talvez seja mais ponderado ligar as duas coisas; a organização do clube e o talento de quem o dirige, seja a nível da gestão desportiva, seja a nível técnico. Liderar é uma coisa, gerir é outra, treinar uma outra coisa ainda. É consensual que as organizações são, em parte, aquilo que valerem os seus recursos humanos. José Mourinho recordava, recentemente, que sem ovos não se fazem omeletes e que no supermercado há ovos de tipo 1,de tipo2 e de tipo3.Mas se a qualidade dos recursos humanos de que uma organização dispõe é uma condição necessária e um factor crítico de sucesso, não é ó único nem é suficiente para que o sucesso seja alcançado. Não basta ter pessoas e ter pessoas com vontade, conhecimentos e competências. A possibilidade de sucesso é determinada pelo modo como o conjunto das competências, capacidades e conhecimentos são colocados ao serviço dos objectivos da organização. Esse modo é definido pela liderança e executado pela gestão. E, por isso, as organizações não podem vencer só com gestão ou apenas com liderança. Um bom técnico será penalizado num clube com deficiências e carências organizativas. Mas um mau técnico não vencerá por melhor que seja a organização. O problema do Benfica é de ambos os domínios. Vive de memórias. O clube chegou tarde ao comboio dos tempos actuais e das exigências que a organização desportiva requer. Não procurou a qualidade, o conhecimento e a organização. Pensou que bastaria ter instalações, história, glórias,museu massa associativa, uma águia amestrada, kits para sócios, construção civil, merchandising e o Eusébio. E começou a sobrar em discurso, o que faltava em êxitos desportivos. Perante as dificuldades optou por um arrogante populismo. E num cenário de crise de resultados pelo anuncio de uma nova contratação. O resto - a ambição, a organização, a capacidade e competência de dirigentes e de treinadores – faria parte do seu código genético. Não era preciso seleccionar, nem investir na escolha dos melhores. O resultado está á vista. E era previsível.
quarta-feira, 12 de março de 2008
Visto de fora
publicado por josé manuel constantino às 09:45 Labels: Gestão desportiva, Organizações desportivas
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8 comentários:
"O resto - a ambição, a organização, a capacidade e competência de dirigentes e de treinadores – faria parte do seu código genético. Não era preciso seleccionar, nem investir na escolha dos melhores."
Isto acontece em vários sítios do desporto actualmente e também mais do que anteriormente.
Como atacar o problema para criar futuro?
A obrigatoriedade de prestação de contas, a auditoria por agentes externos e independentes, a divulgação pública dos relatórios de auditoria, o debate público frontal e democrático sobre os relatórios, a divulgação abundante de informação estatística e dos actos são processos que as sociedades mais desenvolvidos usam.
...
Respeitosos comprimentos ... e larguras
O Fernando Tenreiro anda muito pessimista e descrente.O Hegel dizia,cito de cor, que nenhuma ciência está tão exposta a um profundo grau de desprezo como quando qualquer julga poder dominá-la.Tire ciência e coloque desporto e aí tem a explicação para o que se passa no Benfica e,não sei, mas, provavelmente, nesses "vários sítios do desporto" de que fala.
Com vossa licença,
Parece-me que o problema do Benfica é, e desde há muito, não tanto a forma como o clube é (bem ou mal gerido) mas a razão pela qual o clube consegue sobreviver apesar de isso, tendo em conta que os seus dois adversários mais directos parecem numa situação mais confortável.
O argumento levantado por JMC parece deixar nas pessoas que gerem o clube grande parte da responsabilidade pela situação, e isso parece-me pecar por defeito.
Os clubes sobrevivem muito devido às rede de apoio que possuem. A diferença entre o Benfica e seus opositores parece ser, em larga medida, o facto de as suas redes de apoio destes últimos não se terem contentado apenas com a sobrevivência do seu clube.
Assim sendo, o Benfica lembra-me um indivíduo que apesar de continuar a portar-se mal continua a ser incondicionalmente amado pela sua família.
Já dizia o José Gil… os portugueses são excessivamente ternurentos…
andré
André o seus argumentos têm alguma razoabilidade.De facto não se pode isolar os representados e colocar toda a responsabilidades nos que dirigem as organizações .Mas em todas as organizções há um hierarquia de responsabilidadese e por isso existem dirigentes e dirigidos.O que é mais interessante é o facto de ser elevado o grau de acomodação ao insucesso ou sobre ele se teceram as mais obtusas explicações onde nunca cabe uma coisa tão simples como a incompetência.
A Anabela já veio dizer que o marido, de quem está separada, não lhe paga a educação do filho e é um malandro.
A comunicação social assegura que o plantel precisa de uma volta total.
Até ver, a primeira questão é uma questão do foro pessoal da mulher, como diria o António Costa, de Lisboa, e a segunda começa a explicar a motivação do(s) balneário(s) referida pelo António Camacho, ex-Luz.
Duas questões
1 - Toquei num tabu: auditorias externas e independentes e informação abundante e objectiva no desporto português.
2 - Discordo da sua sugestão acientífica para manter o Porto invencível internamente, derrotado prematuramente externamente, e os clubes de segunda linha acederem às competições europeias.
Nos tais textos científicos que leio, diz-se que o facto do Porto ter ganho a Champions e a UEFA foi uma excepção à vitória dos grandes clubes dos grandes países.
O melhor desafio português era conseguir que os nossos maiores clubes ganhassem de novo a Champions e a UEFA.
Recuso-me a aceitar a malandrice dita pela Anabela e que o balneário dite a performance de um dos maiores clubes portugueses.
O que parece ciência é bom senso e capacidade superior de fazer as coisas bem feitas.
O Benfica do Futuro: de onde para aonde?
A situação desportiva do Benfica nos últimos dez anos, pelo menos, é um bom caso de estudo para quem quiser analisar em profundidade a capacidade organizacional e estratégica de um clube desportivo de grande dimensão.
Depois de uma situação financeira praticamente insustentável e de “falência técnica”, o Benfica já com a actual Direcção concentrou-se como SAD na resolução dos problemas financeiros, valendo-se de vários instrumentos de marketing que o potencial da marca Benfica em termos nacionais permitia explorar.
Esta recentragem no domínio financeiro, que advém da natureza específica da SAD como empresa que é, foi deixando a uma certa míngua a capacidade de orientação estratégica e de organização do próprio futebol, desde o profissional ao das camadas jovens, que se traduziu ano após ano na incapacidade de apresentar sucessos desportivos palpáveis quer a nível nacional, quer por maioria de razão a nível da UEFA.
Sentiram-se ao longo destes vários anos, com diversos Presidentes em funções, e incisivamente com o actual Presidente, as múltiplas deficiências organizativas, com tradução efectiva na indefinição de estruturas intermédias de gestão, nas desorientações sucessivas na composição dos plantéis anuais, na ausência de jogadores das camadas jovens a acederem ao escalão máximo, na desprotecção “política” e organizacional dos diversos treinadores e, acima do mais, numa patente incongruência discursiva dos líderes máximos (Presidentes e Directores Desportivos quando existiram) relativamente aos objectivos fundamentais do clube em prazos relativamente amplos.
Bem ao contrário, a esta flagrante incapacidade de direcção e orientação opunham-se promessas de rápidos resultados e de sucessos desportivos que não estavam escudados e implantados em cima de estruturas organizacionais firmes e estrategicamente enquadradas.
Face aos sucessivos insucessos desportivos que o clube ia amealhando, acenavam-se com novas e luminosas promessas, mudanças de treinadores e de algumas caras, novas aquisições de jogadores pretensamente melhores e salvadores, campanhas de marketing que o potencial da marca permitia renovadamente, emergência de novos recursos financeiros provenientes da gestão de tipo empresarial da SAD, e mais discursos apelando a uma mística benfiquista que pudesse fazer miticamente renascer o potencial desportivo em franca perda.
Só que as grandes fragilidades de pensamento estratégico, de organização e criação de estruturas internas capacitadas para os tempos do futebol moderno de alta competição, da ausência de um discurso de liderança ordenado e motivador, a falta de capacidade de geração interna de novos jogadores provindos das camadas jovens do clube, e uma significativa ausência de “integradores culturais” que fizessem a efectiva ligação psicológica e motivacional dos jogadores externos na “alma clubista”, tudo isto tem vindo a contribuir para uma desagregação contínua do potencial de sucesso desportivo do Benfica.
Este “status quo” que tem um grau de profundidade e permanência visíveis impõe mudanças estratégicas, organizativas e estruturais amplas, resultantes de um exercício de discussão interna amplo – porventura com reunião de contributos científicos e técnicos exteriores ao próprio Benfica.
Tal exercício deveria ter um horizonte temporal mínimo de cinco anos, e procurar quer a reorganização e reorientação referidas, quer o fixar dos correspondentes resultados desportivos almejados com essas profundas linhas de mudança.
José Pinto Correia.
Caro Fernando,
lamento que um pai não pague a mensalidade do filho mas não estou a ver o alcance da questão da Anabela(?) relativamente ao problema do Benfica.Concordo por inteiro com o seu último parágrafo.
Ao J.Pinto Correia
assinaria por baixo o seu comentário.
Obrigado a ambos.
A diferença entre o Porto e o Benfica reside na estrutura da equipa, cuja aparelhagem permite que, quando uma nova peça (jogador) entra, fica automaticamente inscrito, em termos de interacção com as restantes peças.
Isso pressupõe que a integração perfeita resulta da perfeita, passe o pleonasmo, arquitectura de todo o edifício do Porto, desde os alicerces até ao topo
No Benfica, ocorre o contrário de tudo isto. O edifício está por fazer desde a base até o topo. A arquitectura tem falhas e fissuras a começar do topo até alcançar os alicerces (os jogadores) que sentem o desequilíbrio de todo o edifício. Por isso, cada nova peça que entra num conjunto desconjuntado só vem aumentar e manter o descompasso.
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