domingo, 14 de outubro de 2012

Os polícias e as bicicletas


Texto publicado no Público de 14 de Outubro de 2012.


1. Se o leitor perguntar a um miúdo de 12 anos – quase treze – se existe alguma modalidade desportiva em que a presença da polícia seja determinante para a sua prática, porventura receberá uma resposta semelhante há que me destinaram: o futsal e o futebol.
Porquê? Por causa dos adeptos e da violência que lhes anda associada.
Embora não sendo acertada, esta resposta diz muito da forma como os jovens vêem o desporto que lhes colocam à disposição e como encaram – dir-se-ia como fazendo já parte do ADN de certas modalidades desportivas – o seu policiamento.
Por outras palavras, para os miúdos, já não há futebol sem polícia, o que não deixa de ser um “bom resultado” formativo.

2. Estas palavras vêm a propósito da publicação, no passado dia 9, do Decreto-Lei n.º 216/2012, que veio estabelecer um regime de policiamento de espectáculos desportivos realizados em recinto desportivo e de satisfação dos encargos com o policiamento de espectáculos desportivos em geral.
Em breve, trata-se de uma «actualização» do já longínquo Decreto-Lei nº 238/92, de 29 de Outubro, na sua vida alvo de pontuais alterações em 1998 e 2009. Diga-se, só de passagem, que não se compreende, em termos de técnica legislativa, por que razão se “mantiveram” vivas duas normas e os anexos desse velho diploma.
Mas não é esse o mote de hoje.

3. Independentemente do alcance prático da nova regulação – o que é sobejamente importante para avaliar a bondade das suas normas -, hoje, dir-se-ia quase “uma vez sem exemplo”, elogiamos o Governo.
Com efeito, para usar expressão fina, o recente decreto-lei constitui “uma mudança de paradigma”.
As questões do policiamento, quando relacionadas como desporto, foram sempre encaradas pelo Estado como algo respeitante à segurança pública, à prevenção e combate à violência endógena do desporto, em particular do futebol. E uma fatia dos encargos do policiamento foi – e é – suportada pelo Estado.
Ora, há muitos anos – porventura desde a entrada em vigor do diploma de 1992 – que as entidades promotoras e organizadoras de outras manifestações desportivas, com particular destaque para os agentes do ciclismo, vinham reclamando uma comparticipação pública nos encargos com o policiamento.

4. Bem se compreende esta reivindicação. Com efeito, é essencial à prática do ciclismo em estrada, a presença de autoridades policiais, em nome da segurança estradal e dos próprios praticantes.
Não há ciclismo, pois, usado aqui como exemplo, sem polícia.
Ora o novo diploma vem, pela primeira vez, reconhecer essa realidade.
No discurso redondo da exposição de motivos: “Importa também, por motivos de equidade, integrar no escopo das disposições do presente decreto-lei referentes à comparticipação do Estado, o policiamento de espectáculos desportivos que decorrem na via pública e que, em virtude das suas características, podem merecer um tratamento diverso daquele que lhe vem sendo conferido”.

5. Como atrás referimos, não sabemos onde nos conduzirá esta afirmação. Fica, no entanto, para já, um registo vitorioso para todos aqueles que sempre hastearam a bandeira de que os polícias são vitais para as bicicletas.

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