quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

A tomada de posse do membro do Governo



Na sequência de um gentil convite do presidente cessante da Assembleia Geral da Confederação do Desporto de Portugal, estive ontem presente na cerimónia de tomada de posse dos novos órgãos sociais dessa organização desportiva, congregadora da maioria das federações desportivas.

Devo confessar que, em geral, este tipo de eventos, dentro e fora da esfera desportiva, me deixa algo deprimido, ou dito por outras palavras, não sou pessoa que se sinta bem nestes espaços. Trata-se, apenas, de um traço da minha personalidade. Nada mais do que isso.

De todo o modo, sabido isso, lá fui eu. Só que, desta vez, o que veio a suceder, foi bem mais para além daquilo que possa afectar a minha pessoa.

Depois das palavras do novo presidente da Assembleia Geral – cerca de dez minutos de discurso – e do reeleito presidente – cerca de cinco minutos –, seguiu-se um improviso de mais de 30 minutos do Secretário de Estado da Juventude e do Desporto, antes do encerramento da sessão.

Há algo nesta ordem de intervenções que não joga com o tão reclamado espaço de autonomia do associativismo desportivo. E esse algo localiza-se logo no facto de um membro do Governo tomar a palavra num acto de tomada de posse de uma organização desportiva privada.
Compreende-se que seja convidado e que esteja presente. Já não posso aceitar que tenha direito a intervir neste momento de afirmação de vigor associativo.

O que ontem ocorreu, no entanto, ultrapassou todas as balizas possíveis da compreensão.
O Secretário de Estado da Juventude e do Desporto “tomou posse” da cerimónia, falou para as federações desportivas, auto elogiou-se, propagandeou, explanou “política desportiva”, passou mensagens e recados.
Tudo isto durante mais de 30 minutos e sempre referindo o “meu amigo Carlos Cardoso” ou “ o Carlos Cardoso”.

Em bom rigor, revistas as coisas esta manhã, fica-se com a ideia de que quem tomou posse foi, efectivamente, o membro do Governo.

2 comentários:

Anónimo disse...

Tem razão.
Há uma grande confusão nesse cérebro.

Anónimo disse...

O silêncio que estes divertidos postes geram são ensurdecedores.
São necessárias vias criativas e estimulantes para conseguirmos mais para o desporto que, estou certo, todos queremos que seja maior.

Estas histórias são como o sal e sem a qual a história das coisas, sociedades e organizações não teriam sabor. O tomar um dos lados é um dos ingredientes e a sua contestação, outro possível. Mesmo quando sabemos quem vai fazer o quê.
Em económicas, actual ISEG, contou-se a história que a Universidade do Algarve recebia o Presidente da República Mário Soares numa cerimónia solene e em determinada altura o presidente da universidade Professor Doutor Adriano Pimpão, que liderava a reunião, viu ser-lhe tomada a liderança pelo outro Presidente e que o economista Adriano Pimpão sorriu e deixou a cerimónia prosseguir uma via inovadora. O valor desta história é o diz-que-disse.

A história do desporto é normal e tem coisas que, apimentando, mostram fragilidades e competências. O seu conhecimento e compreensão são importantes.

Neste caso o associativismo desportivo português tem duas cabeças e isso também é normal até certo ponto. Os alemães já o tiveram e actualmente têm apenas uma.
Acho importante continuar a discutir esta característica nacional. O método de abordagem correcto parece-me ser o da quantificação e só depois a discussão ideológica, científica ou de oportunidade.
Os alemães criaram apenas uma cabeça por motivos objectivos. O seu intuito foi alcançar resultados de realce na cena internacional do desporto. Canalizando as energias nacionais, da base ampla da população desportivamente activa, para o topo da excelência. O sucesso da organização do Mundial de 2006 foi uma consequência desta opção de política desportiva.

Entre nós fala-se em mega-eventos e fala-se pouco das causas do seu sucesso.
Discutamos pois a liderança bicéfala do associativismo desportivo português.
A capacidade que demonstrarmos em analisar e debater este desafio do nosso associativismo desportivo terá benefícios positivos para todos.

O meu amigo José C disse-me que “isto não é para levar a sério”.
Se aqui-e-agora “não é para levar a sério” … então quando é que vai ser?

Fernando Tenreiro