Quando no ano passado o Vaticano, através do seu jornal oficial L'Osservatore Romano,traçou um cenário macabro da prova rainha de Todo-o-Terreno e considerou que o Dakar, como prova, tem pouco de "sã competição" e lembrava o "rasto de sangue" que cresce, ano após ano, na rota da corrida, como preço da tentativa de "exportar modelos ocidentais" para ambientes humanos e ecossistemas que, de ocidental, "têm muito pouco”,a generalidade da comunicação social e os “amantes dos desportos motorizados”assobiaram para o lado. Coisa de padres. Mesmo quando se lembravam as 49 vítimas da prova a que se juntavam ainda oito crianças e duas mulheres “com uma atitude cínica, que ignora por completo a realidade que atravessam, lançando no deserto automóveis, motos e mesmo enormes camiões, a velocidades loucas, cujos destroços ficam abandonados, muitas vezes, como monumentos à irresponsabilidade", apesar de se dizer tudo isto, nada aconteceu. Eu não gosto de corridas de popós. Era incapaz de sair de casa para assistir a uma competição destas. Considero um atentado cívico colocar corridas de automóveis em estruturas viárias projectadas para servir os cidadãos como, por exemplo,Rui Rio promove no Porto. De todo do “circo”aprecio as assistentes. Mas para isso basta-me olhar para a televisão. Mas reconheço o direito aos que apreciam este tipo de modalidade que de resto tem significativa popularidade. Mas num país em crise e com tantas dificuldades financeiras, onde se encerram serviços públicos por obediência a lógicas economicistas, interrogo-me como é possível que entidades públicas gastem o dinheiro do todos a financiar uma organização comercial em valores muito para além do que seria razoável. Num país onde muitos analistas e comentadores se incomodaram com os dinheiros públicos gastos no Euro2004, existe um estranho silêncio à volta do negócio do Lisboa-Dakar não se explicando qual o retorno que o país e os portugueses têm com o dinheiro que se oferece aos organizadores. Que retorno tem uma entidade como a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e ao abrigo de que critérios de gestão se justificam a passagem de quase dois milhões de euros? E de um milhão e meio por parte de uma autarquia algarvia? E os apoios públicos incontabilizáveis? E como se sentem as autoridades do país a estimularem uma iniciativa toda ela cimentada no risco, na aventura e nas altas velocidades quando em simultâneo promovem campanhas cívicas de condução dentro dos limites de segurança? Não há aqui uma evidente contradição?
sábado, 5 de janeiro de 2008
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5 comentários:
Desta vez se permite discordo do conteudo do seu texto.
embora não considere o automobilismo um desporto, uma vez que é a máquina que efectua a grande amioria do esforço, não deixo de ser um adepto dos carros dos ralis etc.
Penso que o futebol consome mais recursos que esse "desporto" e `dà pexemplos, veja-se o que aconteceu este fim de semana no jogos do Benfica, que refletem muitas vezes o comportamento das claques e dos adeptos.
Como é evidente as coisas deve e têm de ser devidamente analizadas nomeadamente a vertente social e económica.
JBarradas
Ao JBarradas
Deixando de lado o que significa para o continente africano este tipo de iniciativas o que contesto não é,nem a popularidade do desporto automóvel ,que é indiscutível,nem a sua realização mas a desproporção dos apoios públicos, sobretudo financeiros, para um negócio privado que como privado que é, deve viver dos apoios privadose não dos dinheiros públicos salvo se quem financia,os portugueses,beneficiarem da concessão desses apoios.Ora o retorno, a existir, é na sua esmagadora maioria de incidência marcadamente privada.Mudarei de opinião quando vir demonstrado que,para além de um conjunto de negócios á volta da rali,Portugal tem retorno do financiamento que faz.
Grandes Eventos Desportivos e Benefícios Económicos: Algumas Notas
Caro J. M Constantino
Quero modestamente contribuir para algum esclarecimento sobre o que em outras paragens é feito relativamente aos apoios concedidos à realização de grandes eventos desportivos e ao modo como são e devem ser avaliados criteriosamente os respectivos benefícios daí resultantes. Trata-se de um pequeno excerto de um texto de apoio da disciplina de “economia do desporto” do Mestrado em Gestão do Desporto que venho leccionando na FMH.
Fica para outra oportunidade o detalhe maior do modo como são financiados por dinheiros públicos e avaliados, seguindo metodologias academicamente definidas, os diferentes tipos de eventos desportivos (porque são considerados diferentes tipos de eventos segundo a respectiva natureza) realizados no Reino Unido.
Que são outras paragens e outras racionalidades e exigências de respeito pelos contribuintes lá isso são inequivocamente.
Porque aqui no Burgo Atlântico da West Coast, no nosso IDP ou na tutela desportiva, é a tristeza que se vê, de avaliação de custos-benefícios nem uma letra, mesmo que seja morta (do EURO 2004 são outras contas de que porventura falaremos mais adiante)!
Portanto, em citação aqui vai o meu pequeno contributo:
Até aos anos 80 do século XX, hospedar grandes eventos desportivos como os Jogos Olímpicos ou um Campeonato do Mundo de futebol eram considerados fardos muito pesados e até insuportáveis para muitas cidades e mesmo países.
Este facto podia, aliás, ser confirmado pela terrível experiência da cidade de Montreal que ficou com uma dívida colossal dos Jogos de 1976 que os respectivos habitantes só acabaram de pagar em 2006, isto é, trinta anos depois dos Jogos.
Mas, a experiência bem sucedida dos Jogos de Los Angeles, em 1984, que apresentaram pela primeira vez na história desse evento um resultado financeiro final significativamente positivo (de 215 milhões de dólares), vieram alterar a percepção pública relativamente a estes grandes eventos desportivos, fazendo com que muitas cidades e governos nacionais passassem a considerar os grandes eventos com promotores eventuais de benefícios económicos e financeiros.
Por isso, o estudo dos grandes eventos desportivos passou a ser objecto de especial atenção nas décadas de 80 e 90 do século XX, passando a existir inúmeras referências na literatura académica a esse respeito.
Um primeiro estudo dos impactos económicos destes eventos foi o realizado relativamente ao Grande Prémio de automobilismo de Adelaide (Burns e al., 1986). Ele foi imediatamente seguido pelo estudo relativo aos Jogos Olímpicos de Inverno de Calgary de 1988 (Ritchie, 1984; Ritchie e Aitken, 1984, 1985; Ritchie e Lyons, 1987, 1990; Ritchie e Smith, 1991).
Em 1996, Mules e Faulkner argumentam que mesmo os grandes eventos como as corridas de Grandes Prémios não são sempre benéficos em termos económicos para as cidades que os hospedam. E destacam que em muitos eventos dessa dimensão acabam por ser as autoridades públicas a despender a maior parte dos recursos necessários, o que acarreta geralmente prejuízos para as próprias comunidades.
Como se pode verificar de vários eventos realizados na Austrália em décadas pretéritas, os diversos eventos criaram, naturalmente, impactos positivos no respectivo produto bruto do estado e das cidades hospedeiras, mas todos eles se traduziram, ao mesmo tempo, em prejuízos financeiros para as respectivas cidades hospedeiras, os quais foram obviamente suportados pelas respectivas verbas públicas – provenientes maioritariamente dos respectivos impostos e desviadas de outras finalidades, designadamente de carácter social ou até de apoio ao denominado “desporto de base”.
Como afirmam esses autores “Esta estrutura financeira é comum a muitos eventos especiais, e resulta em prejuízos como os referidos. Parece improvável que os operadores privados desejem liderar a realização destes eventos devido à sua pequena probabilidade de cobrirem os custos e mesmo de resultarem em lucros. A razão pela qual os governos hospedam estes eventos e perdem o dinheiro dos contribuintes no processo radica nos efeitos multiplicadores e externalidades”.
Por outro lado, também se podem considerar estes grandes eventos desportivos como elementos das estratégias de afirmação nacional e internacional das cidades que os promovem, e desse modo os respectivos resultados financeiros não devem ser considerados isoladamente desses pretensos efeitos adicionais ou mesmo intangíveis. No caso de muitas cidades do Reino Unido os eventos promovidos têm muitas vezes objectivos de regeneração urbana e de desenvolvimento turístico (vide Bianchini, 1991; Bramwell, 1995; Loftman e Spirou, 1996; Roche, 1994). Acontece também que em determinados casos os eventos desportivos referidos são justificados pelos impactos económicos nas cidades, nomeadamente quando medidos em termos das despesas adicionais geradas na economia local ou regional, dos benefícios injectados pelos fluxos turísticos e pela reconfiguração da imagem da cidade na possível atracção de novos investimentos e negócios (Roche, 1992).
Um outro particular e porventura decisivo aspecto da relevância originada com estes eventos desportivos é o de eles poderem consubstanciar uma estratégia de afirmação e visibilidade internacional das cidades hospedeiras, que dessa forma se promovem (“estratégia de marketing e de posicionamento das cidades”) além-fronteiras, numa época cada vez mais intensamente global.
José Pinto Correia
Contra factos não há argumentos e na realidade foca alguns aspectos limitativos e que se traduzem na mais valia que na realidade essas provas trazem para os privados, e aí concordo com o carissimo Dr. JMC.
A questão aqui apenas se coloca na imagem que pode trazer ao País e do Pais, nomeadamente com a elevada capacidade de organização demosntrada.
Infelizmente existem outros desportos que deviam ser um veiculo de promoção e desenvolvimento das diversas camadas da população e acabam por ser identicos aos Ralis, veja o Estoril Open.
A questão está em podermos tirar partido desses eventos tentando atingir o fim proposto, permitir que a grande maioria da população possa tirar prtido dos mesmos, observando e praticando.
xontudo como sabemos existem desportos que de todo são e podem ser massificados, dai que o fenómemo futebol tenha atingido a proporção global.
Numa análise económica será que embora o futebol e outros desportos profissionais tenham por objectivo o praticante o desportista não têm também na sua génese o lucro económico, lucro esse que não é aplicado no desenvolvimento desportivo das camadas jovens mas sim nas elevadas remunerações auferidas pelos praticantes profissionais e respectivas SADs.
JBarradas
O JPinto Correia esclarece e bem o enquadramento que os chamados "grande eventos" devem ter e o modo como se podem constituir como vantagens para os países de acolhimento.Agradeço por isso a sua contribuição e creio ,salvo melhor opinião, que ela acolhe as preocupações que manifestei e de alguma modo também ajudam a reflexão que o JPBarradas trouxe ao a tema.Obrigado a ambos.
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