quarta-feira, 6 de agosto de 2008

A ekcheiria

O olimpismo moderno foi (e é…) a continuação da política por outros meios. Primeiro dos cavalheiros(e cavaleiros) da corte e dos aristocratas. Depois dos militares. E só para homens. Mais tarde para todos. Democrático q.b. na base. Gerontocrático e elitista no topo. O desenvolvimento e internacionalização do capitalismo ajudaram á sua divulgação. A televisão colocou-o na casa de cada um de nós. A partir da Europa e pelo mundo, constituiu-se, neste particular, como um dos primeiros movimentos de globalização. As perspectivas apologéticas de um olimpismo sem política são o equivalente a um desporto onde ela fique à porta. Coisa bem difícil. A trégua (a ekcheiria), quando o foi, significou não o fim dos conflitos, mas um intervalo para continuar depois. E depois, como politica por outros meios, o olimpismo longe de perder alcance, ganhou-o. E ganhou-o porque é política sem parecer que o é. Aqui reside parte da sua força. Se os jogos olímpicos se resumissem a umas competições desportivas o seu interesse seria bem menor. O que lhe dá um acrescido significado social é serem muito mais do que uma competição desportiva e uma manifestação cultural. É o serem ambas as coisas e o maior acontecimento político á escala global. Nem vale a pena recensear muitos factos. Os casos conjunturais: Berlim, Moscovo ou Seoul. Uma tendência que se prolongou no tempo: o sucesso desportivo como forma de legitimação externa da superioridade da organização de países e sistemas políticos. Ou os motivos do presente: organizar os Jogos como forma de alavancar a visibilidade externa dos países ou das cidades. O olimpismo é credor de muita coisa importante.Com ele o desporto afirmou-se como um fenómeno social de expansão mundial. As bases científicas da preparação e do treino desportivo foram lançadas e desenvolveram-se. A alta competição afirmou-se com uma autonomia crescente. As capacidades e limites do rendimento corporal humano foram questionados. Os resultados atingidos permanentemente ultrapassados. A medicalização do rendimento desportivo um factor de tal modo presente que obrigou a regulamentar os seus limites. É certo que o comércio, o poder das marcas e das televisões, a farmacologia, os subornos –de votos e de decisões - sombreiam o maior espectáculo dos tempos modernos. Era inevitável? Afinal o olimpismo viveu (e vive…) o seu tempo. Um tempo de contradições, de tensões e de conflitos. Mas um tempo que teima em não dar razão aos que profetizavam o seu declínio face ao gigantismo e comercialização atingidos. Ou se proferir à sua crescente politização. Pelo contrário. O olimpismo, conceito onde cabe tanta coisa (já lhe chamaram uma religião…) incluindo alguma que lhe foi estranha na sua génese, afirma-se procurando responder o melhor que pode. Também não se pode pedir ao desporto e ao olimpismo que surjam como solução para os problemas do mundo. A sua tradicional cultura conservadora e situacionista não dão grande margem. Mas pode-se ainda pedir ( e esperar…)que através da força congregadora que mobiliza, aproxime pessoas, povos, países e nações facilitando o diálogo e a interlocução mundiais.Nessa tanta coisa que é actualmente o olimpismo os deuses devem sobretudo proteger os que protagonizam o espectáculo: os atletas, os treinadores e as organizações de onde emanam. E os espectadores, sem os quais - como na ópera, no concerto ou no teatro - o espectáculo não é espectáculo.Com poluição ou sem ela.Com liberdade ou assim-assim.Não para que a política meta férias. Mas para que não estrague o espectáculo.



8 comentários:

Anónimo disse...

O artigo do Público, O triunfo da vontade da China, Nina L. Krucheva, página 33, 6 de Agosto de 2008, é uma peça obrigatória para situar os Jogos Olímpicos de Pequim no contexto dos jogos da era moderna e da história do século XX e do aproveitamento dos regimes totalitários como os de Berlim e de Pequim.

Anónimo disse...

Olimpismo à portuguesa
Depois de tantos anos o governo deu a segurança social aos atletas no início dos jogos olímpicos
Obrigado ao governo, afirmam os jornalistas que dizem os atletas na China
Por quem são, diz o governo, a primeira medalha é minha, apesar de haver quem pense que o mérito é dos atletas que fizeram este pedido há muitos anos

Anónimo disse...

Esta notícia segundo a qual o Governo aprovou a integração, na Segurança Social, dos atletas de alta competição, parece, à primeira vista, uma medida positiva.
Mas, vinda de quem vem - o actual Governo - não será, por certo, coisa boa.
É urgente que este blog analise esta questão e encontre razões para contestarmos esta medida. Caso contrário, por falta de argumentos, ficaremos obrigados ou a estar silenciosos (porque não encontrámos nada censurável), ou a alinharmos com a propaganda do Governo.
Quem é bom nesta análises é o Prof. Meirim. Espero que ele queira estudar este assunto.

Anónimo disse...

Alguém conhece o diploma?Jà existe?Se existe e foi aprovado pelo governo que se publique.Como é que é possivel comentar uma medida não a partir do diploma que a concretiza mas do anuncio de um membro do governo em vésperas dos jogos olímpicos?

Luís Serpa

mdsol disse...

Palavras sem preconceitos, lúcidas e pragmáticas (pragmáticas no sentido filosófico). Que muita blogosfera devia ler. Antes de se porem com conversa fiada sobre a perca de "espírito olímpico" dos Jogos! (Como se o espírito olímpico, mesmo o de antanho, fosse uma coisa inventada e praticada por anjos, num paraíso terreal qualquer!) Ah! e porem-se a apelar a boicotes como se a realização dos Jogos fosse a causa ou o efeito linear da afirmação de um regime de per si! E, não pudesse ser a mesma realização uma enorme possibilidade de questionar o que se passa em volta!
É um prazer lê-lo (espero que o anónimo que diz que me encomenda os encómios esteja de férias...ando sem pachorra para a mais leve insinuação de conspirações e arranjinhos...)

:)

Anónimo disse...

Em Constantino
Constantinou-se
Uma Constantinozação
Que foi Constantinozada
Constantinozadamente

Anónimo disse...

A inveja é a homenagem que a inferioridade tributa ao mérito,diz o ditado.Coisa que o poeta bem podia mediitar!

Anónimo disse...

Ao anónimo das 9:37

Esta casa giraldenga
Quem a giraldengaria?
O giraldengor que a giraldengou~Bom giraldengador seria.

E agora? Tenho inveja da casa giraldenga?

Um tigre
Dois tigres
Três tigres
Dois tigres
Um tigre.

E agora? Tenho inveja dos tigres?

Em Constantinopla
Constantinoplizou-se
Uma constantinoplização
Que foi constantinoplizada
Constantinoplizadamente

E agora? Tenho inveja de Constantinopla?

Foi esta que me inspirou a do Constantino, e em homenagem a ele,
elaborei o respectivo desembrulha-línguas.

Se não sabe o que é, tente dizer qualquer deles, o mais depressa possível, sem se enganar.

Mas, por favor, não tire conclusões erróneas, e nas antípodas.

E não só. Serve igualmente para aligeirar o blog, descomprimir, e saltar fora.