segunda-feira, 24 de junho de 2013

O treinador que não sabe comunicar… não pode treinar!

Os primeiros episódios, no Chelsea, do treinador José Mourinho a entregar a Tiago um papel para este ir dar a outro colega seu dentro de campo fez destaque na comunicação social. O que seria aquilo? Diria que se tratava de uma forma simples de comunicar com quem estava distante e, acima de tudo, diminuir o ruído que seria dizer algo ao jogador português para que este fosse dizer ao seu colega. Naturalmente, o médio iria sempre introduzir uma palavra a mais ou transmiti-la de forma mais emocional ou racional.


A verdade é que o treinador não joga, mas participa diretamente! E a sua comunicação tem um peso preponderante na ação dos seus atletas. Participa ativamente durante os treinos e nas conferências, lidera os atletas, gesticula, fala com os atletas individual ou coletivamente, aponta, dá o exemplo, mas não pode ser ele a executar os movimentos técnicos ou táticos durante a competição. Logo exige-se que consiga transmitir o que quer de forma muito eficiente.

Porque os atletas, de forma consciente ou inconsciente, também podem estar sempre a observar e a tirar as suas conclusões. E isto passa pela gestão do próprio treinador do seu impacto comunicacional e pela importância que o mesmo assume.

A comunicação é o que as pessoas realizam para trocarem informação entre si, utilizando sistemas simbólicos e processos para alcançarem esse objetivo. O treinador que até possa saber muito de tática, se não conseguir transmitir essa informação que recolhe para os seus atletas ou adjuntos, de nada vale, porque essa informação só será útil para uma pessoa, que não joga, o treinador. Necessita de transformar essa informação em ações e, para isso, tem de explicar aos outros o que é necessário que se faça. Não como ele entenderia mas como os atletas entenderão!

Os treinadores começam a procurar potenciar os denominados mind games. Phil Jackson, ex-treinador na NBA dos Chigaco Bulls e LA Lakers, era um perito. Mais recentemente, José Mourinho utiliza muito a sua comunicação como modo de influenciar o que os outros pensam ou interpretam de algumas das suas atitudes e comportamentos. Mesmo existindo sempre uma distância entre o que o treinador português de facto pensa mas que pretende explicitamente comunicar aos outros. Condiciona, motiva, estimula, amedronta, avalia…só com as suas palavras ou gestos.

Também em Portugal assistimos a uma maior exigência ao nível da comunicação. Observa-se que um conjunto de treinadores é mais eloquente a comunicar. Procura ser mais empático, de forma que a sua mensagem chegue mais clara e rápida aos seus atletas. Vítor Pereira e Jorge Jesus mudaram a sua forma de comunicar para o público em geral. Ambos foram alvo de processos de mudança. Um pelo coaching, outro pelo carisma da pessoa que trabalhou consigo.

Por outro lado, também é interessante verificar que alguns treinadores não mudam a sua forma de comunicar e ainda obrigam que sejam todos os outros a adaptar-se a ele.

Acrescenta-se que numa equipa e num jogo é importante ter presente que todo e qualquer comportamento é comunicação. Qualquer comportamento ou ausência de comportamento irá proporcionar um outro comportamento que bem interpretados são ferramentas muito importantes para quem lidera e também para os próprios atletas no seio das equipas.

Por fim, não nos iremos esquecer de algumas acções bem intensas que aconteceram esta época desportiva. Que grande impacto comunicacional teve em nós. Infelizmente para os seus emissores, certamente, não foi aquela a imagem que queriam transmitir…

domingo, 16 de junho de 2013

Vale mais praticar desporto ou descansar sem ruído?

Texto publicado no Público de 16 de Junho de 2013.


1. Numa “pré-epoca” de litígios desportivos, situemo-nos no quadro da informação jurídica, direito fundamental de todos.
2. Recente decisão de tribunal administrativo superior lidou com tema bem interessante.
Duas pessoas, uma seguida por médico em virtude de perturbação do sono – provocada pelos ruídos mencionados - e outro sofrendo de doença bipolar grave, vieram interpor uma providência cautelar visando o encerramento provisório de um pavilhão gimnodesportivo de uma escola.
A escola autoriza a utilização do pavilhão no período pós aulas, de segunda-feira a sexta-feira até às 24H00, ao sábado até às 22H00 e ao domingo até às 12H00, para a prática de actividades desportivas por pessoas alheias à actividade escolar, recebendo uma contraprestação monetária.
Segundo os requerentes encontra-se “ em causa a violação de direitos de personalidade, designadamente o direito ao sono, ao descanso, à tranquilidade e à saúde, os quais estão constitucionalmente consagrados, são directamente aplicáveis e vinculam entidades públicas e privadas».
3. Julga-se útil dar conta da ponderação de valores concretizada pelo tribunal que, a final, veio a confirmar a decisão de primeira instância favorável aos requerentes: encerramento provisório do pavilhão no período assinalado.
O Ministério da Educação e Ciência recorreu desta decisão, alegando, entre outros aspectos, que a concessão da providência é susceptível de causar grave lesão ao interesse público, em particular no que se refere às actividades que decorrem fora do período lectivo e que se prendem com o Programa do Desporto Escolar.
4. O Tribunal, para além de se pronunciar sobre outras questões, veio a operar uma “ponderação de interesses e danos”, públicos e privados.
 O «interesse» privado, que sobressai da tese dos requerentes cautelares é o da salvaguarda do seu direito ao sossego, à tranquilidade, ao descanso, que se vê afectado pelo ruído da dita exploração comercial do pavilhão gimnodesportivo. Mas este interesse «privado» encontra também eco no interesse «público» da protecção da saúde, mediante a implementação de medidas que evitem a sua agressão.
Para o MEC, em resumo, visa-se prosseguir a exploração das potencialidades desse pavilhão gimnodesportivo através da realização de «actividades desportivas por pessoas alheias à actividade escolar, recebendo, por isso, uma contraprestação monetária». Mas também aqui, se anicha o «interesse público» de promover a actividade desportiva, com tudo o que isso significa ao nível da promoção de uma vivência física e mentalmente sadia.
5. Que decisão?
“Não é difícil concluir que a dimensão qualitativa, pessoal, constitucional e legal, dos danos que resultam da recusa da providência, para a esfera jurídica dos requerentes cautelares, superam os que provavelmente resultam, para os interesses da entidade requerida, da sua concessão.
Mas chamamos a atenção para o facto de o encerramento provisório que foi decretado, e que entendemos confirmar, ter duas limitações, uma temporal e outra pessoal. A primeira, porque se aplica, apenas, de segunda a sexta-feira, no período que vai desde o termo das aulas até às 24H00, na totalidade do dia de sábado, e no domingo até às 12H00. E a segunda porque se aplica, apenas, à prática de actividades desportivas por «pessoas alheias à actividade escolar».
Destas limitações resulta o não impedimento da prática de actividades de carácter desportivo que tenham a ver com  «Programa de Desporto Escolar»  desde que levadas a cabo pelos alunos ou outras pessoas ligadas à actividade escolar.”

domingo, 9 de junho de 2013

O poder central em Mirandela

Texto publicado no Público de 9 de Junho de 2013


1. Viajar quase 900 quilómetros para participar em seminário no âmbito da II Semana da Juventude e do Desporto, organizado pela Câmara Municipal de Mirandela, não é fácil.
Abandona-se o conforto da capital, da centralidade, do metro, da comunicação fácil, para olhar uma realidade afastada, interior, de passos e agir diferentes. Lisboa é o centro da vida; Mirandela, o afastamento rodeado de pedras rudes, uma terra mais de azeite e menos de alheiras, ao contrário da ideia que se carrega à partida da viagem.
2. Perante uma plateia de dirigentes associativos locais e alguns estudantes de Bragança, tentei transmitir o que o Direito “dá” ao dirigente desportivo voluntário e o que dele “exige”. Pouco ou nada e quase tudo, respectivamente.
Mas, para além dessas constatações, comuns a este infeliz País, seja o nordeste, inesperadamente, assumiu-se como centralidade e Lisboa como inevitável periferia.
3. A Federação Portuguesa de Pangration Athlima tem sede em Mirandela, foi fundada em Abril de 2000 e congrega cerca de duzentos praticantes.
Portugal participou, na Grécia, no Campeonato do Mundo de Pangration em 2003, obtendo 3 medalhas de bronze por José Varela (C.A.M.P.A. de Alijó), Ivete Alves (C.A.M.P.A. de Alijó) e Pedro Mores (A.M.A.O. de Mirandela). Colectivamente, a equipa portuguesa foi 8ª classificada.
A representação nacional esteve também presente no Campeonato da Europa, em 2004, igualmente na Grécia, conquistando, em agon, uma medalha de ouro por João Varela, de Alijó; medalha de prata por Sandra Dias e uma de bronze por Cristina Novo, ambas do Mirandela. Em paleismata mais uma prata por intermédio da dupla: Sandra Dias e Cristina Novo. Portugal foi 5º.
4. Pangration? Em Mirandela? Alijó?
“O combate de pankration define-se como um combate entre 2 atletas cujo objectivo é a vitória de um deles sobre o seu adversário. Aos atletas é permitido qualquer tipo de ataque com os membros superiores, inferiores e com a cabeça. As técnicas devem ser as permitidas pelas regras e assim evitar traumatismos. As técnicas podem ser utilizadas com os atletas em pé ou no chão. É permitido qualquer tipo de prisão (agarre) de corpo ou roupa com os pés ou mãos cumprindo os regulamentos. É permitido qualquer tipo de projecção ou prisão e pressão muscular sempre que não leve a um traumatismo sério e duradouro”. Trata-se uma antiga arte marcial e antigo desporto de combate sem armas, que segundo a mitologia grega teve início com os heróis Hércules e Teseu. Uma mistura de boxe e luta olímpica, tendo surgido pela primeira vez na 33ª Olimpíada (648 AC).
5. Num tempo em que para o Estado o dinheiro mede as modalidades desportivas, parecendo privilegiar a diminuição de federações desportivas - contrariamente ao que se julgava ser uma finalidade das suas incumbências -, em Mirandela existem exemplos de pluralidade desportiva, quer o Estado queira ou não queira.

Estou certo, que outras centralidades existirão por este País fora que, com base no apoio público local e no voluntariado, continuam a pugnar pela afirmação do desporto como realidade social que contribui para o desenvolvimento da personalidade humana.

domingo, 2 de junho de 2013

Se cometeres crimes entrega o dinheiro ao clube.

Texto publicado no Público em 2 de Junho de 2013.

1. Se levasse em linha de conta o sentir da “opinião pública” sobre o valor das decisões da justiça desportiva, este texto poderia intitular-se “Lá como cá”.
2. Um dirigente desportivo, quando no exercício de funções públicas, foi condenado, em 1ª instância, em 4 anos e sete meses de prisão, com suspensão de execução da pena por igual período, acompanhada de regime de prova, pela prática de um crime de corrupção e outro de abuso de poder. Em causa encontram-se condutas ilícitas em que, resumindo, o arguido beneficiava empresários da construção civil e, com isso, obtinha para o clube importantes vantagens patrimoniais.
Interpostos recursos, incluindo pelo Ministério Público, o Tribunal da Relação veio a aplicar a pena única de 6 anos de prisão.
Seguiram-se os recursos para o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) que recentemente veio a tomar a decisão final sobre o caso.
3. Do extenso acórdão, destaquemos algo que nos marcou, isto é, a pena aplicada: 15 meses de prisão, com a execução suspensa por igual período.
Centremo-nos apenas em informar as razões que determinaram esta concreta pena, bem diversa da alcançada em 2ª instância.
Afirma o STJ que as penas servem finalidades de prevenção geral e especial, isto é, pretende-se não abalar a confiança das expectativas de todo dos cidadãos na validade das norma jurídicas e no “restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada pelo crime”. Do ponto de vista da prevenção especial, o critério decisivo é, em princípio, a medida da necessidade de socialização do agente.
Ora, adita o STJ, exige-se um sinal claro de “intransigência” perante a corrupção e a venalidade, desta forma acompanhando os sentimentos de repúdio da comunidade pelo fenómeno da corrupção.        
4. Passando ao caso concreto, o STJ afirma que nada impede que a pluralidade de actos (concretamente oito) e a intensidade com que foram praticados sejam valoradas como factor de agravação da culpa.
Mas (primeiro mas): “Todavia, não será descabido, para a caracterização da medida da culpa, mais uma vez destacar os fins e motivos da actuação do arguido, não directamente ligados ao seu enriquecimento pessoal, uma vez que todas as vantagens, com excepção de uma única situação […] se destinaram ao clube, num contexto de dificuldades económicas e financeiras do clube”.
Assim sendo, 15 meses de prisão.
5. Mas (segundo mas): “Já antes destacámos a elevada dimensão em que se projectam as exigências de prevenção geral quanto ao crime de corrupção e o mesmo não deixa de se poder afirmar, em substancial medida, quanto ao crime de abuso de poder. Não obstante, há especiais contornos do crime de corrupção (aquele que assume, em função da pena parcelar por ele aplicada indiscutível preponderância no concurso) que o afastam dos casos típicos ou normais em que a ganância do agente dirigida ao seu enriquecimento pessoal é o principal fautor do crime. No caso, salvo uma única excepção, as vantagens destinaram-se a um clube desportivo e mesmo a única vantagem directa recebida pelo arguido não se dissocia da “vida” do clube porque foi destinada à campanha do arguido para a direcção do clube.
Os fins e motivos da actuação do arguido no quadro das «constantes dificuldades económicas e financeiras do clube», não podem deixar de interferir na percepção comunitária do crime atenuando as exigências de defesa do ordenamento jurídico que são, por regra e em abstracto, reclamadas pelo crime de corrupção.
Por isso, no caso, a suspensão da execução da pena, se subordinada ao cumprimento de deveres destinados a reparar o mal do crime, não deixará de ser compreensível para o sentimento jurídico da comunidade e para a manutenção da sua confiança no direito e na administração da justiça.”
6. Tudo bem, mas o meu sentimento jurídico não compreende. Sou um insensível, claro está.