sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Justiça e bom senso

Salomão (1009 a 922 a.C.), terceiro rei de Israel, teve um reinado feliz e longo (mais de 40 anos), marcado pela sabedoria, pela paz e prosperidade. Isto seria já o bastante para se ter dele uma memória moldada pelo apreço e respeito. Porém aquilo que mais o notabilizou e nos faz pronunciar o seu nome com admiração e reconhecimento é o modo de fazer justiça que ele instituiu: a prática do bom senso.
Desde muito cedo, nos bancos da escola primária e da família, aprendemos a associar o nome de Salomão à arte de fazer justiça. Aprendemos que, para tanto, muito mais sólido do que o amparo da letra do texto legal é a interpretação deste segundo as balizas do bom senso. Este não se adquire automaticamente a folhear e decorar os tratados de direito ou a contar um rosário das mais variadas anotações e citações que possam ser chamadas à colação. Mais ainda, não é coisa que Coimbra transmita ou garanta mediante a outorga de um diploma, por mais meritório e doirado que este seja.
O bom senso não cai do céu estrelado, não aparece espontaneamente, não surge da noite para o dia, nem tampouco é emblema que se possa comprar e pôr na lapela do casaco; leva tempo a despontar e amadurecer, num árduo e extenso caminho de reflexão e confrontação com as experiências e vivências feitas. Aprende-se no decurso de uma vida pautada pelo exercício apurado e aturado da rectidão e lhaneza do carácter e pela vigilância das inquietudes da consciência, habitando paredes meias com o cultivo afincado e suado da ética, com a procura persistente da sabedoria e a apropriação paulatina das virtudes humanas.
Para estar apto a praticar a justiça não chega, portanto, conhecer decretos, normas e regulamentos, por grosso e atacado; é preciso dar passos morosos numa paciente e alongada viagem que nos abeire do saber, que depure este da tentação de poder e lhe confira o sabor do apego à palavra, à elevação e erudição estéticas, próprias de quem é sábio. Por isso mesmo não é coisa de novatos ou rapazolas, apressados ou lampeiros, inteligentes ou apenas espertos, oportunos ou só oportunistas, de verbo pronto e fácil, demagogos ou populistas, desejosos de se erguerem em bicos de pés e atingirem a ribalta. É assunto e obra de gente com credibilidade sobejamente comprovada, que não usa a função como trampolim para outros voos mais apetecíveis; antes se compraz com a subida honra e o alto sentido de responsabilidade cívica e moral que o cargo comporta e irradia.
A justiça ‘justa’ é, por definição e essência, jurisprudente; não decorre do alarde ostensivo e da exibição gratuita de uma ampla panóplia de conhecimentos e fundamentações. Nem anda à cata, a todo o custo, de efeitos, elogios e louros mediáticos e da reluzente e sequente notoriedade. Vive do recato, da sobriedade e discrição. Ciente de que não sabe tudo e de que não é possível descartar a dúvida e a incerteza, está casada, em comunhão de bens, com a serenidade, a temperança, a prudência e a claridade no tocante às suas consequências. É sapiencial e não exibicional; é humanista e não justicialista.
Nos últimos dias tenho-me lembrado muito do rei Salomão. Constato que o seu legado não desapareceu na consideração do cidadão comum, amante do bem e da verdade; mas não se vislumbra qualquer resquício dele nas palavras e nos actos de alguns protagonistas do campo da justiça. O desvario anda à solta, como se quisesse retirar do livro das lições da vida aquela que coloca o bom senso num lugar de primazia.
Afinal o ditado popular tem inteira justificação e razão: o que o berço não dá Coimbra não acrescenta. Sim, os pais é que são os grandes professores em termos de orientações, princípios e valores norteadores da vida e da conduta em todos os domínios da actividade. Quem não recebe lições de humildade no berço e aconchego familiares, dificilmente ganhará apego aos correspondentes ensinamentos, parâmetros e bitolas nos bancos da escola e da universidade.
Porventura é por isso que a observância do legado de Salomão está a fazer tanta falta nas instâncias administradoras da justiça: nas centrais e periféricas, incluindo a comissão disciplinar do futebol. O bom senso ausentou-se, faz demasiado tempo, para parte incerta; era já altura de regressar.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

ABC das organizações

Sabemos que existem inúmeros sistemas e ferramentas para se abordarem os métodos relacionados com o funcionamento das organizações. Uns mais simples outros mais complexos. Quando se lida com pessoas e porque são as mesmas que compõem as organizações, porque não utilizar o ABC da gestão de recursos humanos.

Um modelo bastante simples como o ABC (Antecedent, Behavior e Consequence) permite-nos analisar a afirmação de Laurentino Dias que consta hoje na última página do jornal ‘A Bola’:
“ Há três federações que ainda não aprovaram os seus novos estatutos: futebol, vela e jet ski. Vamos esperar por domingo, para actuar em conformidade (referindo a respectiva notícia que o Secretário de Estado da Juventude e Desporto se encontrava preocupado com a situação).”

Até porque a temática já aqui foi abordada através de diversos posts e comentários aos mesmos, continuamos a observar com a atenção devida o comportamento e (expectantes) aguardamos as consequências, quer seja a resposta por parte das respectivas federações cumprirem com o exigido quer seja a resposta do Estado ao potencial incumprimento. Que o sistema desportivo possa ser um exemplo!

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Viver no passado

Há coisas que não se entendem.
Já não é a primeira vez que, ao olhar o jornal oficial, deparamos com anúncios ou projectos de regulamentos municipais que ao mencionarem a legislação desportiva de referência o fazem em termos verdadeiramente incompreensíveis, trazendo ao de cima uma prática administrativa eivada de erros de alguma gravidade.
Gravidade não tanto, porventura, pelos efeitos imediatos – embora, estes não sejam de descurar – mas por revelarem, como um sintoma, um actuar administrativo no mínimo inapto.

Hoje recolhemos outro exemplo.
O município de Ponte de Sor celebrou, com um clube desportivo, um contrato-programa de desenvolvimento desportivo, no dia 25 de Janeiro do corrente ano.
O referido contrato foi celebrado nos termos “da Lei n.º 1/90, de 13 de Janeiro e do regime estabelecido pelo Decreto -Lei n.º 432/91, de 6 de Novembro.”
Ora, nem a Lei nº 1/90 de 13 de Janeiro se encontra em vigor – foi revogada expressamente pela Lei nº 30/2004 de 21 de Julho e, esta última, por seu turno, também já revogada com a entrada em vigor da Lei nº 5/2007, de 16 de Janeiro –, como também o diploma de 1991, relativo aos contratos-programa, morreu no dia 1 de Novembro do ano passado, por força dos artigos 34º e 35º do, Decreto-Lei n.º 273/2009, de 1 de Outubro (Estabelece o novo regime jurídico dos contratos-programa de desenvolvimento desportivo).
Assim é difícil.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Um desporto descrente ou desorientado?

Há coisas que sabemos como começam. Mas só somos capazes de imaginar como terminam. As certezas são como os prognósticos do outro: só no fim do jogo. Mas cheira-me que estamos perante um desporto desorientado, ou, pelo menos, descrente, nos resultados que por aí chegarão até 2012.
O presidente do COP em entrevista ao jornal A Bola (6.2.2010) assumiu o que livremente já havia assumido em outros momentos: sempre acreditou que em Pequim Portugal pudesse arrecadar quatro ou cinco medalhas. Mas é prudente em relação ao futuro: não expressa objectivos desportivos. Opta por falar do museu e das condições de remuneração do cargo.
O secretário de estado do desporto é de outra escola. Não é o governo que compete e portanto não lhe peçam contas dos resultados. E tem aproveitado para enumerar o que tem sido feito durante o seu magistério para melhorar as condições do desporto nacional.Com razão em ambas.
O presidente da CDP ainda se não pronunciou mas, mesmo sem bola de cristal , não é difícil de adivinhar: o desporto português vive o seu melhor momento de sempre.
Entre a prudência dos primeiros e o voluntarismo do último há contudo um traço comum: tudo é explicável, mesmo na ausência de explicação. Ou pelo menos de uma explicação razoável.
Portugal vive uma situação curiosa: nunca, quando comparado com o passado, as condições de preparação e organização desportiva foram tão favoráveis; mas é grande o risco de os resultados alcançados serem inferiores aos desse passado. Como explicar esta aparente contradição?
Os factores de sucesso desportivo dependem das aptidões e capacidades dos praticantes. E do modo como se optimiza esse potencial. O que requisita uma dimensão técnica e uma dimensão social. A primeira da responsabilidade das organizações desportivas. A segunda dos poderes públicos.
Idealmente tudo deveria caminhar num mesmo sentido. Mas a gestão das diferentes variáveis é complexa. Eleger o que é determinante no sucesso desportivo - o atleta ,o treino, a organização desportiva, a política desportiva -é um exercício inútil. Porque a insuficiência de uma variável pode ser facilmente superada pela forte presença de uma outra. O que explica, por exemplo, que países com níveis demográficos equivalentes e potenciais desportivos aparentemente próximos tenham desvios significativos no sucesso desportivo internacional. E países com condições materiais de treino e preparação desportiva inferiores superem quem as tem a nível superior.
Identificar os factores críticos (ou os travões ao sucesso) e priorizar as respectivas intervenções é desejável. Mas para que isso ocorra é necessário uma definição prévia de objectivos (o que se pretende?) e de prioridades (o que é mais importante?). Para o sistema desportivo na sua globalidade e para cada um dos seus segmentos e modalidades.
Um centro de treino pode ser prioritário para uma modalidade e ser dinheiro deitado fora para uma outra. Um quadro competitivo internacional pode ser um factor de aumento da competitividade externa de uma modalidade e um perfeito desperdício de recursos em uma outra. Quando tudo é prioritário e para todas as modalidades é porque nada o é. Tratar como igual o que é diferente é prejudicar quem tem mais condições de competitividade. Ora nem todas as modalidades reúnem as mesmas condições. Pelo que os recursos disponíveis, ainda por cima normalmente escassos, deveriam ser concentrados, prioritariamente, nas que têm valor desportivo e estão aptas a alcançar níveis de eficiência elevados no plano da competitividade externa. Que se avalia pelos resultados alcançados.
Como aspirar a posições de relevo num número significativo de modalidades é imprudente - se tivermos em conta a dimensão, os recursos e a tradição desportiva do país- seria útil que o desporto português, no plano associativo, tivesse interlocutores com suficiente autoridade e capacidade para poder definir um quadro de prioridades, -não é aos governos que o cabe fazer, quando muito cabe-lhes disponibilizar avaliações da realidade nacional e possíveis alternativas - e poder propor aos poderes públicos uma politica de descriminação positiva às modalidades com maior capacidade competitiva. Manter o regime actual é desperdiçar recursos e não potenciar as modalidades com níveis de sucesso mais elevados.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

O importante é estar presente

Recebemos do Luís Leite um texto que agora se publica e agradece.

Para o Presidente do Comité Olímpico de Portugal, no que respeita aos Jogos Olímpicos de Inverno – Vancouver 2010, o importante foi estar presente. Mesmo que o mais que honroso último lugar do brilhante Danny Silva, único atleta português presente nos 15Km de Ski de Fundo, aproxime dos feitos igualmente honrosos dos países equatoriais que não têm de todo nem neve nem gelo, só calor e muita humidade.

Ao ler a notícia publicada no site do COP e que tanto interessou os portugueses, glorifica-se:
1) “O concretizar de um sonho (chegar ao fim) que terá parecido impossível e que afinal se repetiu em duas ocasiões”;
2) “A bandeira portuguesa foi hasteada com solenidade no dia anterior à abertura dos Jogos e Portugal participou no desfile (…)”;

Por mais que se procure no texto, não se encontra nem a classificação (último lugar) do nosso brilhante representante, nem o número de membros que compuseram tão digna e brilhante representação olímpica nacional (5? ,7?, 9?). Ficamos sem saber.

Também ficamos sem saber qual o papel do COP, nas últimas olimpíadas, na procura de soluções para conseguir uma representação ainda mais brilhante, embora se faça eco da brilhante receptividade junto da comunidade portuguesa no Canadá, do brilhante esforço do Presidente do COP de “susceptibilizar portugueses residentes no estrangeiro ou os seus descendentes, que pratiquem desportos de Inverno, de optarem pela nacionalidade portuguesa, o que nos permitiria ter representações mais numerosas no futuro”.

Brilhantíssimo! Nunca fizeram nada! Esqueceram-se! Agora é que vai ser!

Enquanto houver o Danny Silva vai o Danny Silva! Se não se deixarem voluntariamente susceptibilizar os luso-canadianos, luso-americanos, luso-escandinavos, luso-suíços, luso-franceses, luso-austríacos, etc., continua a ir o Danny Silva mais a voluntariosa e brilhante delegação do COP.

Ficámos a saber que o objectivo não é melhorar de último para uma posição um pouquinho menos última. O objectivo é mesmo ter uma representação mais numerosa (de últimos lugares?), que permitiria levar mais brilhantes e fanáticos dirigentes e funcionários do COP aos Jogos Olímpicos de Inverno (7? 11, 13? 25?).

O que importa mesmo é estar presente. Quem não gostava de uma passeatazinha à borla ao Canadá?
Nós somos é invejosos!

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Modelos e virtudes

Uma política pública não se atem apenas sobre os instrumentos regulatórios e normativos que a concretizam, ela expressa também a forma como um determinado sistema social se vê a si mesmo, e quais os valores e processos de decisão/governação em que se fundamenta.

Conhecendo as profundas alterações que o desporto sofreu nas ultimas décadas, em virtude das consequências da sua crescente profissionalização e comercialização, com a emergência de novos actores e lógicas de decisão que horizontalizaram a governação numa complexa rede de parceiros. Tendo presente as diferentes soluções de governação em cada modalidade desportiva e a concepção do sistema desportivo em cada Estado-membro, particularmente após o alargamento a leste, é sem surpresa que a Comissão abandona o modelo descrito em 1998 e no Livro Branco sobre o Desporto assume que:

"O debate político sobre o desporto na Europa atribui frequentemente uma importância considerável ao chamado «Modelo Europeu do Desporto». A Comissão considera que certos valores e tradições do desporto europeu devem ser promovidos. Contudo, considera que, dada a diversidade e as complexidades das estruturas desportivas europeias, é irrealista tentar definir um modelo único de organização do desporto na Europa"

Se os valores solidários onde assentam as bases do desporto europeu o permitem distinguir de outros modelos de organização desportiva, não deixa de ser evidente que muitos desses valores se podem encontrar em várias partes do globo. Na Europa o desporto tende também a importar mecanismos de governação e regulação (sistemas de licenciamento, tectos salariais, competições fechadas ou organizadas em estruturas não piramidais, etc.) de outras latitudes. Tudo isto reconfigura os pilares do Modelo Europeu de Desporto (MED) e a sua fiabilidade enquanto instrumento de análise da complexidade actual do desporto da UE.

No entanto as características do MED têm vindo a ser ao longo dos anos um precioso instrumento político ao dispor das federações para garantirem uma “excepção desportiva” à aplicação do direito comunitário, na senda de um quadro regulador que valorizasse a sua autonomia, autoridade e centralidade nos processos decisórios, evitando que o desporto fosse “governado por juízes”. Neste propósito têm pugnado - quer no Relatório Independente sobre o Desporto Europeu, quer no Relatório sobre o Futuro do Futebol Profissional na Europa do Parlamento Europeu (ainda que de uma forma mais contida neste relatório elaborado por Ivo Belet) - pela necessidade de maior segurança jurídica e de melhor regulação que cubra o vazio legal que leva ao aumento da litigância junto dos tribunais europeus, como único caminho para a boa governação do sector. Tal desiderato só seria possível se a Comissão reconhecesse a singularidade do MED (1) e publicasse orientações precisas sobre a aplicação das normas comunitárias ao desporto (2), no sentido de o proteger, o que limitaria as eventuais consequências das decisões do Tribunal de Justiça da União Europeia.

Em Berlaymont nenhum dos dois objectivos viria a ser acolhido. Os protestos não se fizeram esperar e sentiram-se mais do que uma vez. A Comissão veio, tão simplesmente, frisar que a complexidade e a volatilidade que caracterizam a governação do desporto no espaço europeu não se coadunam com orientações pré-definidas, quer no plano jurídico, quer no plano organizacional. A certeza e a segurança legal só são possíveis trilhando um caminho, passo a passo, que justifique em cada caso específico, mediante a validação de requisitos precisos, a aplicação sensível do direito comunitário às características que distinguem o desporto de outras actividades económicas. O desporto é auto-regulado - com autonomia para escolher o seu modelo organizacional no respeito pela lei e por princípios gerais de boa governança - mas não é susceptível de derrogações apriorísticas do direito comunitário, pelo que as federações desportivas devem justificar perante os supervisores comunitários o valor e o mérito de cada política, conquistando “caso a caso” maior certeza legal, ao invés de procurarem o beneplácito da UE para agirem em livre arbítrio em determinados domínios da sua acção.

Este é um cenário cada vez mais desconfortável, e um caminho com vários escolhos e tensões entre actores políticos e desportivos, à medida que o poder e os centros de decisão se dispersam... O receio sobre o impacto da acção comunitária no domínio do desporto - nomeadamente após alguns ecos durante a presidência francesa de 2008 sobre uma visão intervencionista alargada da UE - aumentou consideravelmente, não só entre o movimento desportivo que criou uma associação para representar os seus interesses junto das instituições europeias, como pôs em alerta estados tradicionalmente eurocépticos, como o Reino Unido, onde a regulação do desporto profissional é uma prioridade estratégica do governo nacional. Relembre-se que foi elaborado sob os auspícios da presidência deste país o Relatório Independente sobre o Desporto Europeu, alinhado com as posições da UEFA.

Começam cedo a tornar-se visíveis os resultados do labor desta aliança de interesses. Na audição da cipriota Androulla Vassiliou, responsável pela política desportiva na nova Comissão Barroso II, no Parlamento Europeu, o inevitável Ivo Belet (01:29 do vídeo de audição) abriu as hostilidades e salientou que os deputados estavam ansiosos por se livrarem da abordagem “caso a caso” e indagou a comissária sobre eventuais planos para esboçar orientações num conjunto de tópicos com vista a “conferir maior certeza legal” ao mundo do desporto.

A recusa da Comissão a um modelo único de organização do desporto europeu - claro sinal dissonante com a sua tendência natural para a homogeneização e convergência de políticas entre os Estados-membros -, o comprometimento num plano de acção supletivo e complementar à auto-regulação das federações desportivas e dos governos nacionais, no sentido, aliás, do disposto no Tratado de Lisboa não são elementos convincentes sobre o papel secundário de Bruxelas.

O problema permanece na forma como o sistema desportivo reflecte sobre si mesmo e sobre os seus processos. Permanece, como sempre, na aplicação de princípios elementares de boa governança à regulação desportiva e na convivência com as normas públicas.

A lei que clama para preservar as virtudes sociais e culturais de um modelo é, todavia, a mesma que refuta para regular uma actividade com uma expressão económica iniludivel.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Português em alta

Muito se deve ao futebol e a José Mourinho no plano da nossa internacionalização e aceitação no exterior.
Ao mudar-se para o Chelsea, de Londres, após triunfar no Futebol Clube do Porto, o emérito e reputado treinador converteu-se num caso especial do panorama mediático internacional, indo muito para além dos limites do futebol. Não apenas vingou nos reinos unidos de Sua Majestade; tornou-se um nome incontornável nas conversas dos amantes do futebol em todo o mundo. De tanto ganhar, falar e ser falado passou a ser conhecido fora do cenário futebolístico, sendo hoje personalidade com ressonância planetária. Goste-se muito ou pouco, Mourinho conquistou o sucesso e é alvo de admiração e sinónimo de competência num terreno deveras difícil e exigente, dando assim um inestimável contributo para a afirmação e promoção mundiais do produto português.
Não desconsideramos que, antes dele, já tínhamos Luís Figo, Rui Costa e Fernando Couto a suscitar apreço e provocar furor além-fronteiras, publicitando positivamente a qualidade do ‘made in Portugal’. Cristiano Ronaldo, de aparecimento mais tardio, veio acrescentar a onda; ao confirmar e multiplicar cabal e constantemente o seu valor, ajudou a desfazer dúvidas e reticências e a fundar a convicção de que afinal o que é português tem mesmo certificado de qualidade: essa é a regra e não a excepção!
Porém é essencial e decididamente com Mourinho que o português se torna alvo de manifesta cobiça e de inusitado e superior interesse. Os nomes anteriores ligavam-se a funções de certo modo subalternas; com Mourinho o português ascende ao estrelato reluzente no desempenho de funções dirigentes. A partir de então regista-se uma explosão: o português é que está a dar e muito! Nunca exportamos tanto. E há de tudo: nomes que correspondem inteiramente às expectativas e até as sobrelevam; e casos que configuram plenamente a habilidade para vender gato por lebre ou para encenar o conto do vigário.
Basta fazer uma ronda por alguns exemplos, que nos acodem sem grande esforço à lembrança, para constatar que não há exagero naquilo que acabamos de afirmar.
Se olharmos para os nossos futebolistas vemos que eles vagueiam pelos campeonatos de quase toda a Europa, no Norte e no Sul, no Centro, no Leste e Oeste, estendendo-se até às Arábias. Para os adeptos o que é português deve ser com certeza bom. Faz-me lembrar quando eu era adolescente; julgava que ser negro era o bastante para jogar magistralmente a bola, até que apareceu no colégio um pretinho que era francamente pior do que a maioria de nós. Foi uma grande desilusão.
Quanto a treinadores, o panorama é idêntico. São desejados em muitos sítios, embora a maioria não se aguente por lá muito tempo. Como quer que seja, o filão está realmente a dar. Essa é a verdade decorrente dos factos, pelo que não sei se terá o mínimo senso invocar o ditado de que em terra de cegos quem tem um olho é rei.
Este fenómeno da manutenção do português em alta pode ser observado, simultânea e concomitantemente, em vários domínios: nas letras, nas artes, na música, na ciência. Realmente não pode ser subestimado o quanto devemos a José Saramago e a António Damásio, entre outros que, por excelentes razões, não podem cair no nosso silêncio e ingratidão. Todavia não quero integrar nesta abordagem esses astros de primeira e cintilante grandeza, para não correr o risco de despertar interpretações equivocadas e descabidas. Cinjo-me a nomes do futebol e da política, porquanto cumprem o seu mister de uma maneira aparentemente semelhante, embora com consequências assaz opostas: os primeiros jogam e realizam performances com a bola da nossa paixão; os segundos pontapeiam desalmadamente a bola do mundo e são fonte de frustração. Além disso uns e outros têm lugar cativo nos órgãos de comunicação social e é através deles que nos entram em casa a toda a hora e instante, como se não houvesse mais nada na vida merecedor de atenção e reconhecimento.
Não fujamos ao tema do escrito e retomemos o fio da meada.
Também na exportação de políticos não estamos nada mal. Ademais, ao contrário das saídas de Mourinho, Figo, Rui Costa, Fernando Couto, Cristiano Ronaldo e mais uns poucos, ficamos a ganhar muito. Estes eram uma mais-valia a nível interno, pelo que nos custou e doeu vê-los partir, enquanto a saída de alguns daqueles nos provoca um suspiro de alívio, por motivos tão óbvios que não vale a pena explicitá-los.
Refiramos a ida do Dr. Durão Barroso para a Presidência da União Europeia. Com a partida dele não perdemos nada; o seu sucessor não foi melhor nem pior do que ele. Também não nos adveio qualquer vantagem do exercício do seu proeminente cargo. Já a Europa parece ter lucrado muito, uma vez que recentemente o reelegeu para a função. Bem vistas as coisas, sejamos decentes e justos, nós acabamos por ganhar muitíssimo no capítulo da auto-estima. Com efeito somos deveras propensos a menosprezarmo-nos na comparação com os europeus. Ora a escolha e reeleição em causa provam que a inteligência, a lucidez e a capacidade de avaliação dos parceiros europeus são bem inferiores às nossas. Alguém conhece no Presidente Barroso uma visão, uma causa, uma ideia ou uma proposta de missão e acção que o recomendem especialmente para tão alto papel? A resposta, decepcionante e negativa, é profusamente eloquente no tocante ao nível da ponderação dos políticos europeus actuais e do teor e sentido que emprestam à putativa democracia. São políticos formados e especializados, com mestria e profundidade, na escola do não dito e do encoberto, por não terem nada de importante e transcendente a dizer e revelar. Impulsionadores do exaltado e exaltante Processo de Bolonha, permitem augurar as venturas e ‘novas oportunidades’ que este nos reserva e, por certo, trará abundantes. Algumas já se estão mesmo a ver!
Agora vai-se embora o Dr. Constâncio; nomearam-no para a Vice-Presidência do Banco Central Europeu e, por via disso, eleva-se no ar uma vozearia de congratulações e declarações de amor e elogio, sem esquecer umas quantas inevitáveis defumações. O homem antes era sofrível, mas o orgulho pátrio da ocasião faz dele doravante um quadro de exímia precisão. Não sei se vai receber tanto quanto auferia no Banco de Portugal; se fosse futebolista iria obviamente ganhar mais e jogar melhor. Resta-nos desejar-lhe que se inspire nas actuações dos talentos do nosso futebol e não leve para fora o padrão de controlo, zelo e rigor e o índice de proficiência que demonstrou cá dentro. Por favor, não nos deixe ficar mal aos olhos da estranja; jogue à Figo ou à Cristiano Ronaldo e fale à Mourinho. Mostre que estamos enganados a seu respeito e que não se cola à sua pele a imagem do Dr. Barroso.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Municípios e desporto profissional

Se existem temas que têm percorrido a Colectividade Desportiva com habitualidade, eles são o do financiamento do desporto, em particular do desporto profissional, e o do posicionamento das entidades públicas a esse respeito, designadamente dos municípios.
Recentemente o Público, no seu caderno Cidades, de 7 de Fevereiro passado, compilou algo que já era conhecido de muitos e pressentido por quase todos: seis municípios gastam 20 milhões de euros por ano nos estádios do EURO 2004.
Esta notícia adicionou-se à leitura de dois artigos publicados no último número da Revue juridique et économique du sport (nº 93, Dezembro de 2009): “Sport professionnel et aides publiques. L’exemple des Conseils Géneraux”, de Pierre Chaix e “Les relations entre les clubs sportifs professionnels et les collectivités territoriales (État des lieux et perspectives)”, de Charles Dudognon.

Devo confessar que as minhas intransigências quanto apoio público municipal ao desporto profissional – não olhando agora a questão jurídica – se vão-se enfraquecendo. Continuo preconceituoso, mas algo parece mudar.
Quando sou confrontado, mais do que uma vez, com o facto de os municípios terem sido as vítimas do EURO 2004 e, com isso, despenderem durante anos verbas bem significativas, a faltar em outros sectores vitais da vida dos seus munícipes, pergunto-me se não teria melhores resultados uma política desportiva local – regulada e transparente – de apoio aos clubes profissionais.

Eis alguns dados franceses que o segundo dos estudos mencionados adianta:
· Em causa estão 5 modalidades desportivas: andebol, basquetebol, futebol, rugby e voleibol;
· O universo é de 130 entidades, com diferentes formas jurídicas (associações e sociedades);
· Na época desportiva 2007/2008, o total das subvenções locais cifrou-se em 111 milhões de euros;
· Este montante representa pouco mais que 1% da despesa desportiva local;
· Em alguns casos, particularmente no andebol, basquetebol e voleibol, a dependência do financiamento público local é bem significativa.

Para além das subvenções públicas há ainda a considerar outros tipos de apoio, como sejam a sponsorização e mesmo a aquisição de entradas para os espectáculos – situação também vivida entre nós – e a disponibilização de infra-estruturas desportivas e recurso humanos.

A finalizar, deixo uma questão: não seria tempo de os municípios, de uma forma conjunta, dotarem-se de regras de conduta – ou de outro tipo –, procurando oferecer uma resposta uniforme a esta questão, contribuindo, dessa forma, para uma concorrência sã, transparente e regulada desses apoios e das próprias competições desportivas?

sábado, 13 de fevereiro de 2010

A velha história do ovo e da galinha

A pergunta é repetida, porquanto não tem resposta pronta, à mão de semear. Pertence ao rol das questões existenciais que inquietam e dão que pensar. E no entanto ela é deveras simples. O que é que surgiu primeiro: o ovo ou a galinha?
Não sei se vale a pena perder tempo a tentar, em vão, encontrar uma ordem de precedência. Devia bastar-nos o conhecimento de que há uma relação de causalidade mútua ou de reciprocidade. O ovo e a galinha são cúmplices um do outro, sem deixar de parte, obviamente, o galo.
O mesmo vale para outras relações e acepções. Veja-se o caso dos dirigentes desportivos e dos árbitros. Diz-se que alguns dos primeiros são corruptores e a alguns dos segundos chamam-lhes corruptos. É bem possível que assim seja. Mas… quem surgiu primeiro: os corruptores ou os corrompidos? Haveria corruptores se não houvesse corruptíveis e vice-versa?
Também aqui nos devíamos concentrar não no estabelecimento de quem gera o quê, mas muito mais no combate impiedoso ao fenómeno da corrupção, dos seus fautores, instrumentos e beneficiários.
Cheguemos ao assunto candente que nos move e trouxe a este ponto: o das ameaças à liberdade de expressão e do controle dos órgãos mediáticos. Nas últimas semanas tem sido um arraial indecoroso, um regabofe sem conta nem medida, impróprio para consumo. O tema dá para tudo: tanto para preocupações e reflexões sérias, como para hilariantes tragicomédias e para as mais refinadas encenações da farsa e da hipocrisia. O rio das lágrimas de crocodilo vai raso pelas margens; políticos e jornalistas têm dado para o peditório tanto quanto podem. A burla continua e fede a trampa. Claro que isto não é para levar a mal: estamos em tempo de Carnaval! Os fantoches e caretos estão em alta e nós andamos necessitados de pândega.
Perguntará o leitor se não estou a passar ao de leve ou até de modo leviano por uma problemática tão grave. Certamente o problema é denso e sério; porém não é de agora. Urge vê-lo para além dos afloramentos folclóricos que ele toma ao sabor dos interesses e conveniências na moda.
Não é verdade que a economia, pior ainda, a finança manda na política, que a noção de serviço e bem públicos se esvanece lentamente e que quase tudo está já a mando da insaciável ganância privada? Será mentira que vivemos num regime (reparem que não digo ‘democracia’!) mediático, em que o conúbio e o festim entre os detentores dos vários poderes e os donos, mandarins e mandaretes da (des)informação são a regra? O que é que isto implica e significa? Estas, sim, são perguntas inquietantes e ponderosas, porque sabemos, de cor e salteado, a aviltante resposta. Sentimos e vemos esta, no dia-a-dia, a entrar-nos pelos olhos dentro e a ferir-nos a consciência, a lucidez, a razão, o coração e a alma.
A tentação de condicionar, controlar, manipular e comandar a opinião pública através dos media alimenta-se da certeza ou convicção de poder contar a bel-prazer com a docilidade, a prontidão, a submissão, o servilismo e o indecoro de não poucos agentes mediáticos. Não adianta querer tapar o sol com a peneira! Nem todos os indivíduos rotulados de ‘jornalistas’ fazem jus à condição; não são amantes e praticantes da dignidade, da decência, da ética e da deontologia profissional.
Autorizará isto e o mais que temos presenciado a afirmar que não há, entre nós, liberdade de expressão? A indagação carece de ser correctamente colocada e respondida. Há muita gente que gostaria de a cercear ou limitar ou, talvez melhor, de a utilizar a seu favor, lá isso é verdade. Essa gente acalenta esse desígnio e move-se nessa direcção, precisamente porque parte deste saber, de experiência feito e sobejamente comprovado: há jornalistas que prescindem da independência, da liberdade e das obrigações inerentes à sua profissão e estatuto, por lhes ser custoso e enfadonho o caminho que aí conduz; ignoram o que é a honra, o carácter, a rectidão, a vergonha, o respeito por si próprios; dão-se bem e são felizes e contentes a fazer fretes e a ser paus-mandados dos grandes e poderosos, pertençam estes ao mundo dos negócios ou ao da política ou ao do desporto. Gostam da mordaça, afeiçoam-se a ela e procuram compensação para a sua indignidade e a indigência mental e moral no acto de ludibriarem os outros. Não se pode olvidar que isto é a mais crua verdade e que os exemplos abundam, com muitas cores e feitios.
Saibamos, pois, sacudir a poeira que anda no ar e nos atrai para posicionamentos parcelares e unilaterais. À compreensível paixão e veemência das nossas reacções juntemos o julgamento procedente de serenas e abrangentes avaliações. Indignemo-nos perante a descabelada intenção de nos alienarem a sensatez e a razão.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

A coisa não vai acabar bem

A linguagem do poder é importante para determinar o nível do discurso político do país. Assim o afirmava o editorial da revista Sábado (nº301).E o que se entende por “linguagem do poder”? A expressão pública dessa linguagem? O que dessa linguagem é privado mas passa do circulo intimo de pessoas que exercem funções públicas?
Que o primeiro-ministro tenha esta ou aquela opinião sobre um jornalista e o seu trabalho e o comente com os que lhe são próximos é natural. Que fale ao telefone e use termos e expressões impróprias para uma conversa pública é possível. Os governantes não são anjos, nem santos. São pessoas normais, iguais a cada um de nós. Mas são pessoas que pelas funções públicas que exercem têm de ter uma conduta privada cautelosa. E, em certa medida, com condicionamentos. Como são pessoas que exercem funções públicas a sua vida é muito escrutinada. E nesse escrutínio cabe tudo: o que é do foro público e do privado. É cruel, mas é assim.
Não é preciso viver no interior de uma redacção, para conhecer os telefonemas entre jornalistas ou escutar as conversas ao almoço para perceber a estima que os jornalistas têm pelos políticos e o modo como a eles se referem. E como preparam as suas campanhas de descredibilzação em nome do direito à informação.
Não existem dois países. E duas linguagens: uma para o poder político. Outra para o poder mediático. Somos o mesmo país e o mesmo povo. E as qualidades, virtudes e defeitos estão igualmente distribuídas. Pelo que temos de cultivar algum distanciamento perante a recente polémica do caso “Mário Crespo”. O problema é outro.
Em nenhuma democracia é fácil a um governo passar de uma maioria absoluta para uma maioria relativa. Pior quando a governação em maioria absoluta o foi com um estilo autoritário, desprezo pela minoria e apoucando quem a criticava.Há muita gente a quem o poder subiu à cabeça E nem precisamos de ir muito longe para buscar exemplos.
Se recuarmos no tempo e consultarmos o histórico deste blogue, que em termos políticos tem pouca relevância, encontramos quem, a coberto do anonimato, tenha usado o insulto e a calúnia como arma do debate político . Num estilo que fez escola em muitos intelectuais orgânicos do “socratismo” -o socialismo democrático é apesar de tudo uma outra coisa - e em muitos assessores em gabinetes do governo. Mais ainda: procurou-se denegrir as opiniões alheias aviltando e descredibilizando o carácter e a idoneidade dos seus autores ou encontrando neles contradições que revelariam a seu baixo compromisso com a verdade.
Este tipo de comportamento inundou o espaço da blogosfera, revelou um padrão de comportamento obsessivo e marcou uma cultura politica da maioria absoluta de onde os responsáveis governamentais não fizeram nada para descolar. O efeito não poderia ser pior do que aquele que está a acontecer. Agravado por, nos tempos actuais, a política se não circunscrever aos seus actores tradicionais mas envolver gente do negócio das “agências de comunicação” e da publicidade politica ”travestida” de jornalismo. De um lado e do outro há muito quem queira acertar contas.
As campanhas de descrédito têm sempre a possibilidade de retornar aos seus autores. E com efeitos mais devastadores. Começam pelas opiniões que se expressam informalmente e acabam nos actos de governação. Começam por conversas de corredor e acabam no computador deste ou daquele jornalista que decide ir investigar o que se ouve dizer. E aí o mundo parece começar a desabar.
Em parte o governo está a ficar refém na cama que ajudou a fazer. Costuma-se dizer que as pessoas inteligentes são aquelas que aprendem com os próprios erros e que os muito inteligentes são aqueles que aprendem com os erros dos outros. Como classificar aqueles que nem aprendem com os erros próprios, nem com os dos outros? Cheira-me que a coisa não vai acabar bem.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Dar o SALTO

Quer no blog quer através de textos que são possíveis ir lendo na imprensa desportiva e não só, sabemos que existe uma necessidade de dar um salto qualitativo (e também muito quantitativo) no nosso desporto. A diversos níveis, como as diversas temáticas que vão sendo aqui abordadas.

Curiosamente o SALTO é uma plataforma mundial de recursos para projectos de âmbito desportivo, social e organizacional, feita por todos nós: profissionais, estudantes, professores, animadores, coordenadores de projectos, voluntários, etc.

É uma plataforma que apresenta um campo deveras interessante: o treino ou 'training', composto por diversas acções de formação espalhadas pelos vários países europeus que possui algo como ferramentas para a realização de projectos, recursos financeiros, dinâmicas de grupo, dinâmicas para acções que sejam desenvolvidas (como na área do treino, aulas, formação, animação, gestão, etc.) ou então os excelentes t-kits (o download de qualquer um deles é gratuito).

Áreas como o networking, o empreedorismo empresarial e social, gestão de emoções, aspectos muito práticos na gestão de projectos, as necessidades e as ferramentas para formação e gestão, questões comportamentais, culturais e de civismo estão ao passo de um clique. Porque o desporto apesar de ser uma área muito específica, vive também ela inserida numa abordagem sistémica quer ao nível da educação quer ao nível de uma sociedade com inúmeras áreas, o desporto nesta plataforma é inserido no seio de algo mais transversal.

Este SALTO dedica-se a uma fase de formação e training para qualquer interessado. É este salto que o nosso desporto poderá e deverá dar, através da educação e formação escolar, universitária e social. É necessário que as licenciaturas, formações, ensino alarguem bastante o leque de conteúdos e temáticas. As que existem são importante, mas é preciso acompanhar os bons exemplos que vamos observando.

Já existem Universidades, Institutos Politécnicos, Escolas Superiores, Escolas Secundárias, Acções de Formação que apresentam nos seus currículos ou conteúdos, áreas como o empreendorismo organizacional e social, gestão e liderança de equipas, o trabalhar em equipa não só no desporto 'jogado' mas também nas equipas de projectos, gestão de emoções, o poder das networkings ou coaching. É preciso que sejam alargadas à oferta de todos os cursos e formações das nossas áreas.

Estas competências técnicas e comportamentais serão (não serão já?!) sem grandes dúvidas indicadores de diferenciação (e sucesso) nos projectos e na forma de estar no nosso dia-a-dia face às dificuldades e oportunidades que vão surgindo no ambiente que nos rodeia. É preciso algo mais para que perante um mundo de crise e oportunidades simultaneamente, existam não só organizações a chorar mas outras que queiram e saibam vender lenços. É este SALTO que poderemos e deveremos querer dar.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Contabilidade criativa

A consolidação orçamental e a redução da divida do Estado através do congelamento das despesas com pessoal é o que está mais à mão. Mas ignora os factores que estão a montante: a dimensão do Estado e organismo conexos. E adia eternamente a diminuição do peso do Estado, da administração pública, das estruturas de governação e da classe politica que nelas encontra emprego e que está sobredimensionada para a escala do país.
Um candidato a líder do PSD, que diz querer mudar Portugal, defende a redução dos salários dos políticos. Sabe que não é por ai que se alcança a redução da despesa pública. Mas vale, supostamente, pelo simbolismo da medida. Pelo sinal que dá ao país. Trata-se de uma refinada demagogia. Que cai bem num pais que tende a abominar os políticos. Mas que não resolve nada de essencial. Porque o problema é outro.
O país não paga de mais aos seus políticos. O país paga é a políticos a mais. A assembleia da república deveria ter menos deputados. Os governos poderiam ser bem mais pequenos. Os gabinetes ministeriais não deviam servir como agência de emprego político. As câmaras municipais só tinham a ganhar com a redução do número de vereadores que tendem a ocupar o tempo com matérias da competência dos dirigentes municipais. Os gabinetes nas autarquias deveriam ter limites à contratação de assessorias políticas. E depois o que tudo isto arrasta: viaturas, refeições pagas com os fundos de maneio, motoristas, secretárias, gabinetes, computadores, portáteis, telemóveis, horas extraordinárias, ajudas de custo, etc.
O governo de José Sócrates, em 2005, apresentou um conjunto de medidas de emagrecimento da despesa pública.Com reformas nas estruturas da administração, com regras para novas admissões e regimes apertados de despesa, com mecanismos de representação e até nas deslocações ao estrangeiro.Com algum pudor inicial na contratação de assessorias políticas. Parecia querer ir num bom caminho. Valia pelo exemplo que queria transmitir. O tempo desfez as esperanças.
O emprego político não diminui. Muitas das reformas ficaram a meio. O Estado não emagreceu. As despesas escondidas de ministérios e gabinetes continuaram. E houve mesmo quem, num clima de retracção financeira, anunciasse, todos os anos, aumentos dos seus orçamentos. O sinal só tinha uma leitura: não era necessário poupar e retrair nas despesas. Havia mais dinheiro para gastar. E quanto às despesas de exercício de funções o tempo fez esquecer as orientações anunciadas.
Governar não é fácil. Governar em tempo de crise pior. Os decisores políticos, por norma, gostam de falar do orçamento. Mas não têm o mesmo gosto para falar das execuções dos orçamentos. Onde se gastou e como se gastou. E evitam dar publicidade aos seus relatórios de execução orçamental. Quem quiser conhecê-los que vá à Conta Geral do Estado. E, se for capaz, que os descubra.
Se olharmos para a governação desportiva verificamos um pouco de tudo isto. Um propósito inicial de reforma com o redimensionamento da rede regional, a concentração de serviços e a redução de custos com a estrutura de funcionamento. A pouco e pouco veio o cansaço.Com o exemplo político a vir de cima e a marcar o ritmo, o ânimo reformista arrefeceu.
Para além de uma incomum correcção sobre correcção do modelo orgânico da administração pública - o propósito inicial sofreu várias alterações e a direcção vai na quarta equipa - a gestão no interior desse modelo veio-lhe acrescentando custos sucessivos, quer através de equipas de projecto, de uma apetência especial pelas viagens, ajudas de custo e turismo desportivo e recentemente pela entrada imediata para os quadros de elementos cuja base de recrutamento inicial foram critérios políticos .E que conseguiram, em pouco tempo, o que outros precisaram de muito tempo para verem reconhecido: a sua estabilidade profissional.
A folga financeira encontrada através de um significativo reforço do “folclore transmontano” e da venda de património deslumbraram. E o aumento do investimento em infra-estruturas púbicas e associativas foi o melhor que se registou no plano da despesa, pese as vicissitudes porque algumas têm passado. Porque, ao lado, sempre se geriu a situação de cada ano económico como se o país estivesse a crescer e não fosse necessário adoptar procedimentos do controle da despesa corrente. Recorreu-se a uma especial disciplina: a contabilidade criativa. Errar, todo erramos. O problema está quando transformamos os erros em virtudes. E a isto aplica-se um nome muito feio.