O interesse óbvio dos governos europeus é incentivar as populações a apostar pelo seu gozo desportivo e simultaneamente obtêm receitas públicas adicionais.
Os espanhóis ligaram a sua lotaria às obras sociais e financiam o desporto a outras fontes públicas de financiamento.
Os portugueses começaram por criar a lotaria, ligando-a à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, depois nos anos sessenta juntaram o Totobola. A partir daí o desporto beneficiou de momentos de desafogo e depois de 1995 o estrangulamento do financiamento dos jogos sociais foi a realidade.
Foi afirmado que o Euromilhões elevou o financiamento do desporto ao estabelecer taxas estabilizadas para todos os beneficiários dos jogos sociais.
Esta afirmação é o desejo destas pessoas que não deviam afirmar o que não conhecem, porque não fizeram as contas. A isto chama-se juridicamente negligência, premeditada ou não.
O quadro seguinte evidencia que o desporto tem uma perda sustentada de longo prazo e que o Euromilhões acentuou essa realidade.
Daí se poder afirmar que não existe um benefício evidente do desporto português pelo evoluir das apostas sociais e que se justifica uma reavaliação de objectivos e fontes de financiamento públicos.
Em síntese observem-se as seguintes questões que o quadro suscita:
Os jogos sociais geridos pelo departamento de jogos da Santa Casa de Misericórdia de Lisboa financiam o IDP, as regiões autónomas, o futebol, o policiamento dos espectáculos entre outros beneficiários desportivos.
A série com os valores provenientes dos jogos sociais para o IDP, barra azul, e o desporto, barra amarela pálida, apresenta uma variação positiva passando de uma média de 25 milhões de euros para 70 milhões de euros.
O IDP é o maior beneficiário embora a sua percentagem no bolo total do desporto tenha diminuído recentemente como se observa na linha mais fina.
Avaliando o total do financiamento público, há que acrescentar os seguintes elementos
A quebra do financiamento da administração pública central ao IDP, barra amarelo forte, caiu a partir de 2000 e 2001 com o financiamento do Euro 2004.
Os valores reais de 2004 correspondem aos valores dos anos anteriores, retirando o financiamento do Euro 2004, o que diminui as barras de 2002 e 2003 para valores próximos de 2004.
O efeito Euromilhões não tem impacto crescente no crescimento do financiamento público.
O efeito Euromilhões visou substituir o financiamento da administração pública central pela receita dos jogos sociais e o montante de benefício calculado foi a manutenção do montante anterior não foi o seu crescimento.
O efeito Euromilhões diminuiu a receita do desporto em 30%, efeito que já vinha de antes do Euro2004 se retirarmos o investimento do megaevento.
As duas linhas grossas mostram respectivamente a subida da importância da receita dos jogos sociais e o esmagamento do financiamento público ao desporto por parte da administração pública central que o desporto suporta desde 1996.
Como conclusão diga-se que face à concorrência na obtenção das receitas dos jogos sociais por parte de sectores como a segurança social, a educação, a saúde, a juventude e outros departamentos públicos, o desporto não tem vantagens objectivas da integração no conjunto das entidades beneficiárias dos jogos sociais.
O desporto necessita de uma nova visão de conjunto para o seu desenvolvimento.
Existem inúmeras fontes de financiamento interessadas em participar do benefício do desenvolvimento do desporto para a sociedade portuguesa e cabe ao desporto dar-lhes nota das oportunidades que souber conceber e oferecer.
Texto enviado por Fernando Tenreiro
Economista, Presidente do Panathlon Clube de Lisboa