sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Um esboço

A cruzada que o COP tem vindo a lançar a alguma comunicação social após Pequim teve recentemente mais um curioso episodio.
Dois jornais noticiaram várias citações de um documento produzido pelo COP sobre a Missão aos Jogos Olímpicos de 2008 e distribuído aos membros da Assembleia Plenária no passado dia 25.
No entanto, com inusitada celeridade, na Travessa da Memória tratou-se de emitir um comunicado a repudiar aquelas noticias, referindo que o documento produzido se trata de um esboço, pelo que as citações “não correspondem ao documento final “.
Um dos jornais visados procurou apurar o sucedido junto das federações desportivas, tendo-lhe sido garantido que "O documento que recebemos é o mesmo que está na comunicação social. Não é um esboço"

Ora, toda esta rábula pode apenas ser vista como mais um fait divers nas relações tensas com os jornais, como uma manobra de diversão em vésperas de período eleitoral, ou como disfuncionalidades de comunicação institucional. Mas não vamos por aí.

Não é por um documento estar elaborado em versão provisória que o mesmo não se deve apresentar ao público ou ser reportado pelos órgãos de informação, salvo motivos onerosos onde deve ser garantida a confidencialidade até à sua publicação final, algo que aqui não sucedeu, pelo que nem se pode considerar como uma fuga de informação.

Pelo contrário, consideramos que em democracia o processo de prestação de contas é simultaneamente - e não sequencialmente -, uma responsabilização entre os pares e uma responsabilização pública – reforçada quando estão em jogo dinheiros públicos -; o que significa, neste caso especifico, que os vários momentos de elaboração do Relatório da Missão aos Jogos Olímpicos de 2008 passam pelo escrutínio das federações (o qual tem tido vários escolhos e “tacticismos”, segundo consta) e pelo escrutínio publico, até ao momento final de entrega aos responsáveis políticos. Para tal desiderato é essencial o acompanhamento dos órgãos de comunicação social.

A audiência pública constitui não só uma garantia de transparência, mas também um incentivo à participação e envolvimento de todos os interessados na boa gestão de recursos públicos. Isto aplica-se, salvo excepções relacionadas com poderes de soberania, a qualquer domínio da sociedade e das relações com o Estado, onde o desporto não se exclui. Aplica-se a qualquer fase do ciclo de políticas públicas, nomeadamente nos seus momentos de avaliação.

São estas as orientações e princípios de boa governança, em processos legislativos, administrativos ou executivos. Mais e melhor informação, mais participação e responsabilização. Caso se pretenda uma maior responsabilidade e melhor regulação.

Mas quem quotidianamente opera no sistema desportivo – do seu topo até à base – sabe bem a distância que vai da teoria à prática. É uma distância que é tão imposta pelos obstáculos de dirigentes políticos e desportivos, como é pelo nosso desinteresse no desenvolvimento de uma estratégia sustentada de políticas desportivas, em particular por parte de uma franja crescente do tecido associativo - em déficit de empreendorismo e mobilização cívica - que se alimenta de auxílios casuísticos, mais ou menos legítimos, mais ou menos pontuais, mais ou menos controlados e em maior ou menor escala consoante a dimensão e posicionamento dos seus actores em relação aos decisores políticos. Uma franja que abarca “carolas” e “gestores”.

E não deixa de ser curioso o papel que a comunicação social desempenhou, e pode vir a desempenhar, nesta trajectória de aridez e discricionariedade na agenda político-desportiva, a qual, ela também, tal como o documento do COP, raramente passou de um esboço.

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