quinta-feira, 9 de junho de 2011

Equívocos

O tema da responsabilidade social das empresas encerra um enorme conjunto de equívocos. Muitas vezes associada a uma lógica caritativa esquece o fundamental: a primeira responsabilidade social de uma empresa é criar riqueza, garantir emprego, pagar justos salários e cumprir as suas obrigações fiscais. E se para além destes objectivos estender a sua acção a outras áreas sociais que o faça. Não para obter vantagens. Não para exercício de marketing, de construção de imagem ou outro tipo de benefícios, incluindo os fiscais. Mas porque encontra sinceras razões de índole social para assim proceder.
A lógica da responsabilidade social tem sido progressivamente capturada por uma estratégia de negócio. Não são acções desinteressadas ou altruístas, mas iniciativas que em nome da responsabilidade social escondem lógicas comerciais. O carácter genuíno e desinteressado da acção é falso. E este tipo de actuações chegou também ao desporto. Muita festa, muita gente colunável, políticos e afins, muita imprensa, muito Portugal positivo e solidário. E lá dentro negócio.
Quem não é sensível a uma iniciativa desportiva cujos fundos revertem para uma causa social? Ou para um sociedade que luta contra uma doença? Ou para uma instituição de solidariedade social? Ninguém ousará contestar o mérito de uma medida deste tipo. Porque na grande maioria dos casos não tem condições de avaliar se por trás da acção benemérita se alberga um negócio. E em muitos casos é disto que se trata. Uma parte vai para a entidade beneficiada, mas a outra fica com a entidade organizadora que pelo carácter supostamente altruísta da iniciativa recebe ainda sobre forma gratuita bens e serviços que em outras circunstâncias teria de pagar. Não é uma acção de apoio social. É um aproveitamento indevido com o pretexto de apoio a uma causa social.
O que está errado em tudo isto? A falta de transparência. Que uma entidade que venda bicicletas promova iniciativas de uso da mesma nada há a censurar. Mas que o faça com recurso a meios públicos e embrulhando a promoção em objectivos de recolha de fundos para esta ou aquela acção social é uma mistificação. É uma aldrabice. E o mesmo sinal pode ser replicado pela acção generosa de alguns agentes do desporto que sempre ofereceram um chouriço na esperança de receberem um presunto. Bem sei o melindre que a situação comporta. E quem organiza este tipo de eventos conta com o desconforto que é denunciar este tipo de situações. E por isso multiplicam-se as iniciativas desportivas com supostos fins de solidariedade social.
Não podemos daqui concluir que todas as organizações que organizam eventos desportivos no âmbito de os programas de responsabilidade social o não façam de forma legítima,lícita e sincera. Mas é preciso estar atento.E separar o trigo do joio.Porque há muito negócio que se montou à volta do desporto em nome de causas sociais.E para essse peditório quem quer dar,que dê.Mas que o faça devidamente informado.

7 comentários:

Luís Leite disse...

300% de acordo!
E atenção, muitas das empresas que financiam estes eventos são as maiores empresas públicas, com verbas destinadas ao marketing.
As "Corrida da ...", com quenianos(as) e etíopes contratados para correrem e ganharem, transmitidas pela RTP em directo e com helicóptero, na prática são jornadas de convívio, caminhadas isoladas, sem continuidade, o anti-desporto.
O Tribunal de Contas devia investigar estas iniciativas e ver de onde vem e para onde vai o dinheiro.
Devo esclarecer que nada tenho contra jornadas de convívio e que é certo que uma percentagem dos lucros vai para instituições meritórias. Mas... e o resto?

Anónimo disse...

Escre LL

300% de acordo!

Que inflacção! Já não bastava o "completamente de acordo" e vem agora o "300% de acordo"....

Não se pode ser mais venerador e obrigado!

Kaiser Soze disse...

É um assunto difícil e bastante melindroso.
Em teoria, numa visão romancizada da vida, concordo plenamente. A solidariedade não devia ter um preço nem trazer benefícios diferentes do gosto em ajudar.

Agora, seria preferível que quem pratica a "solidariedade" para, parcialmente, benefício próprio não o fizesse?
Seria melhor não receber nada do que receber menos do que o desejável e, até, justo?

Realisticamente, penso ser melhor parte de alguma coisa e tudo de nada mas, como disse, moralmente é muito discutível.

Luís Leite disse...

Anónimo,

Não há pachorra.
Não sabe o que é inflação (e não "inflacção").
Nunca fui venerador e obrigado de/a ninguém, com excepção do meu falecido pai.
Tenha juízo e dê a cara, ao menos!

Luís Leite disse...

Kaiser Soze:

Mais uma vez não concordo consigo.
Quem faz algo por solidariedade, no fim de todas as despesas estarem pagas, deve entregar todo o dinheiro sobrante à causa benemérita que foi publicitada.
Aqui não pode haver negócio do promotor em proveito próprio.
Sobretudo quando ninguém sabe exactamente de onde vem e para onde vai o dinheiro envolvido.
Se há negócio lucrativo para o promotor é, no mínimo, imoral.
A situação ainda é muito mais grave quando estão em causa verbas com origem nos impostos, entregues por empresas públicas a entidades privadas, numa mixórdia lamacenta de solidariedade e marketing.
E contabilidade mascarada e/ou não auditada por entidade independente.

Anónimo disse...

Escreveu LL

Não sabe o que é inflação (e não "inflacção")

Dizia Baudelaire que não se recordava de nenhuma pessoa iteligente que conhecera, mas que tinha bem presente todos os cretinos com que se cruzara, de quem se lembrava até com uma certa ternura....

E eu confesso que começo a sentir o mesmo pelo LL!...

Luís Leite disse...

Insisto em afirmar que o anónimo sem argumentos não sabe o que é inflação.
Mas eu, como sou boa pessoa, ajudo os menos capacitados e como sou professor, até gosto de ensinar:
"Inflação" significa, basicamente, uma subida geral dos preços no mercado, ou seja, uma desvalorização não intencional da moeda e um consequente menor poder de compra para a população.
Claro que inflação nada tem a ver com eu estar 300% de acordo com JM Constantino sobre um determinado assunto.
É uma asserção idiota.
Quanto à citação de Baudelaire, devolvo-lha com todo o gosto.
Saberá você o que é um cretino?
Tenha juízo e dê a cara!