sexta-feira, 2 de maio de 2008

Os poucos que ganham muito

Não conheço, mas pode ser que exista, alguma penalização aplicada pelas confederações patronais quando as empresas filiadas estão no mercado da concorrência com salários em atraso aos respectivos trabalhadores. No domínio do futebol profissional entende-se que a respectiva liga o deve fazer. Porque não a simples aplicação às entidades empregadoras de futebolistas das regras de penalização previstas para as restantes empresas? Também não sei se há algum estudo comparativo entre os níveis salariais praticados no futebol profissional em Portugal e nos restantes países europeus. Mas estou convencido que mercados como o inglês, espanhol, alemão, espanhol e francês pagam, em média, acima do praticado em Portugal. O que parece normal. Clubes de países com economias mais fortes têm capacidades, que clubes de país economicamente mais frágeis não têm. O que não nos deixa de interrogar, apesar de tudo, como, ainda assim, é possível praticarem-se em Portugal os salários e os contratos elevados que se conhecem. Mesmo sendo poucos os que ganham muito é muito ,penso eu, para as receitas que originam. Mas há uma coisa que importa relativizar: os salários dos futebolistas quando comparados com outros mercados não são nada que se equivalha com os salários praticados com os gestores de topo das empresas incluindo as do sector público do Estado: os gestores portugueses ganham os segundos melhores salários da EU em termos absolutos e logo a seguir aos ingleses. Coisa que não sucede com os futebolistas. Sendo que em algumas das empresas do sector empresarial do Estado há necessidade de subvenção pública o que significa que há contributo dos cidadãos, por via da imputação fiscal. O que não ocorre com os futebolistas. O que também se passa com os futebolistas e não ocorre com os gestores públicos é haver salários em atraso. Pelo que neste momento, como contribuinte, preocupa-me mais o que tenho de pagar aos segundos do que aquilo que ganham os primeiros.

6 comentários:

Anónimo disse...

Meu caro Professor José Manuel Constantino:

A razão de ser das especialíssimas regras das instituições desportivas, no que concerne aos salários em atraso, radica na essencial diferença entre a natureza das "empresas desportivas" (vulgo, clubes) e as demais empresas "comerciais".
Dito isto assim, parece uma heresia.
Mas tenha presente este aspecto: no desporto - ao contrário do que se passa noutros sectores económicos - a "empresa desporiva" não visa a "liquidação" dos concorrentes; pelo contrário, precisa deles para sobreviver, porque, caso contrário, deixaria de haver possibilidade para a competição desportiva. E precisa, aliás, que eles sobrevivam com boa saúde desportiva (o que pressupõe um mínimo de saúde económica...), sob pena de a competição se ressentir do grande desiquilíbrio competitivo entre os clubes.
É por esta razão que as instituições desportivas se preocupam - ou melhor, se devem preocupar... - com estes indícios de pré-falência que constituem os salários em atraso.
Em suma: não se pode remeter o desporto, sem mais, para as regras equivalentes do mundo económico-empresarial - porque, a prazo, deixaria de haver desporto...

Cumprimentos do

a)José Manuel Chabert

josé manuel constantino disse...

Caro J.M. Chabert

O desporto não nasceu com o assalariamento dos praticantes e não é estimável que desapareça com a aplicação pura e simples das regras equivalentes do mundo empresarial,de resto cada vez mais comuns. Por aqui podemos ficar descansados. E os sinais de pré-falência não se restringem à prática de salários em atraso. Nem o regime de “equivalência concorrencial”no plano desportivo é ferido apenas pelo que se passa entre quem paga a horas e quem o não faz. Mas o problema é outro: é o de saber se deve haver no mercado do desporto profissional uma “excepção desportiva”para a prática de salários em atraso, distinto do que ocorre noutros sectores.Você entende que o desporto profissional tem especificidades que o justificam .Eu entendo que não.

Anónimo disse...

Meu caro Professor José Manuel Constantino

Há, no seu discurso, um (para mim) evidente parti pris contra o desporto profissional, bem patente na frase de que o "desporto não nasceu com o assaliaramento dos praticantes". Claro que não nasceu com o profissionalismo, mas este é hoje uma regra, largamente expandida, e ao que parece sem merecer os seus favores.
Percebo o seu desconforto com o desporto profissional. Históricamente, a evolução para o profissionalismo também mereceu os desfavores dos Poderes Públicos.
E embora eu esteja certo de que os seus reparos, a essa realidade, se fundamentam em razões distintas, permita-me que lhe recorde as reservas do Estado Novo em relação ao mesmo profissionalismo: "a beleza do desporto perde-se quanto se converte num modo de vida" - diza o legislador de 1943, no Decreto 32.946; ou só serão permitidos praticantes profissionais no futebol, ciclismo e boxe - dizia o legislador de 1960, na Lei 2104.
A sua posição (do Prof. Constantino), relegando o desporto profissional para um mundo que, a prazo, ditará o seu desaparecimento, não será uma recriação dessas velhas desconfianças quanto ao profissionalismo desportivo?

Cumprimentos

a) José Manuel Chabert

josé manuel constantino disse...

O José Manuel Chabert é uma pessoa bem informada.Conhece,desculpe a presunção, muito do que escrevi sobre esta matéria.Em lugar algum encontrará qualquer reserva mental ou partis-pris em relação ao desporto profissional e até aos apoios em matéria de políticas públicas.O que de resto seria um verdadeiro absurdo.A minha reserva é apenas aos que,aceitando as lógicas das regras do mercado no que concerne à vida empresarial,estimam ser capazes de corrigir os constrangimentos da livre concorrência no desporto profissional através de formas de engenharia social assentes no pressuposto iluminista de que o Estado deve olhar de modo distinto,no que respeita à viabilização e sustentabilidade do desporto profissional, do que olha para a agricultura ,para as pescas ou para o pequeno comércio.De resto entendo melhor uma "excepcionalidade das políticas" em matéria de apoios públicos à criação cultural,pela natureza do próprio mercado em relação a algumas das artes,do que ao desporto e ao respectivo mercado.É apenas isso que não aceito.
Obrigado pela sua opinião

Anónimo disse...

Na Economia do Desporto foi Walter Neale em 1964, "The Peculiar Economics of Professional Sports", Quaterly Journal of Economics, 78 (1), 1-14, quem referiu em primeiro lugar a relevância da igualdade de capacidade desportiva entre competidores do mesmo escalão para alcançar o maior usufruto económico.

Ou seja, a peculiaridade referida pelo JM Charbert que tornam o desporto distinto das outras actividades económicas é determinada pela individualidade desportiva defendida pelo JM Constantino.

Quarenta anos depois de Neale nenhum autor económico contesta esta primazia desportiva para a definição de algumas das características de excepção do funcionamento do mercado do desporto.

O desporto profissional americano funciona com base em pressupostos de excepção económica, de que o monopólio das ligas é um exemplo, e a União Europeia aceita excepções das regras económicas aplicadas ao desporto desde que analisadas caso a caso. Veja-se no recente Livro Branco do Desporto.

A punição dos atrasos do pagamento de salários relaciona-se com um termo muito claro e que se encontra também na "bisca lambida", com as devidas proporções. Chama-se Batota caso se trate de uma atitude propositada e reincidente.

Quando um clube deixa de pagar salários durante uma época desportiva, quer dizer que por algum motivo esse clube está a jogar num nível de competição que não tem capacidade económica para estar e que está a ocupar o lugar de outro clube que deveria estar em seu lugar e que tem os salários em dia. A falta de pagamento afecta a credibilidade desportiva da competição e do princípio de igualdade de capacidades para maximizar o interesse comum.

Não interessa a razão dos erros do clube falsas declarações, má gestão, perseguição aos jogadores, o que quer que seja, os salários em atraso devem ser punidos por representarem alguma forma de vantagem indevida sobre os seus competidores desportivos.

Ao afectar a imagem da competição com atrasos de pagamento o clube prejudica todos os clubes concorrentes, a competição e a modalidade.

Como as regras desportivas são para serem cumpridas esse clube deve ser punido pela Liga ou Federação que são as guardiãs das Regras do Jogo.


A parte interessante é se os clubes se juntam e contestam o cumprimento das Regras do Jogo argumentando que a crise económica é que impede os espectadores de ir aos estádios e das empresas financiarem as transmissões televisivas e em peso os clubes afirmam que não devem ser castigados por deixarem de pagar salários. Esta já é outra história com contornos económicos distintos. Mas seria necessário que houvesse uma demonstração económica pela totalidade dos clubes, o que não acontece.

florbela silva disse...

Dr. José Manuel Chabert,

Atrevo-me a participar nesta discução bloguista como "caloira" no mundo da gestão desportiva, mas bastante conhecedora do mundo empresarial e bastante conhecedora do mundo jurídico.
É de destacar de facto "que a beleza do desporto se perde quando de transforma num meio de sobrevivência", mas temos que concordar que estamos no Millenium - Séc.XXI, estarmos a destacar legislação de 42/43 serve para??????
É muito misterioso essa obsessão por essa época, será que não pode conceber legislação mais actualizada, sem ter influências do Estado Novo.
Para quando poderá adoptar pensamentos mais modernos????

Tenho dito
Flor