quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Com todos e para todos ou só para alguns?

"It is not the creation of wealth that is wrong, but the love of money for its own sake."
Margaret Thatcher


Os tempos actuais são propícios a derivas fundamentalistas liberais ao ponto de ser tentador apontar o falhanço do modelo social europeu como uma das principais causas para o momento que a Europa atravessa. Aquele que foi um dos maiores contributos da Europa para o progresso da modernidade nunca esteve tão em causa como hoje.

Não é preciso ler muito Keynes, estudar a biografia dessa figura conservadora, Bismark, que no final do sec. XIX fundou as bases desse Estado Social tantas vezes replicado pelo mundo fora, ou consultar os indicadores estatísticos disponíveis, para se ter a noção que o atestado de sobrevivência de uma economia de mercado se encontra na sua coesão social. Ou seja, na capacidade do Estado garantir, eficientemente, as suas obrigações sociais na saúde, segurança social, emprego, qualidade de vida e, também, no desporto, particularmente junto daqueles que mais carecem, uma vez que ainda está por se descobrir uma economia de mercado desenvolvida sem uma força de trabalho qualificada.

Fazer crer que não se produz o suficiente para o Estado garantir tais obrigações constitucionalmente consagradas e isolar o debate entre a fraca produtividade e as elevadas prestações sociais trata-se, num cenário de austeridade, da demissão da política na sua dimensão mais nobre de conduzir os destinos de uma nação. Tanto mais tentador quanto se cede perante o dinheiro fresco que provem dos regimes de leste (aqui o futebol europeu é um bom exemplo) reduzindo o acto de governar à ditadura dos números. Afinal não se chegou ao Fim da História, mas á derrota de uma geração, servida a frio pelo muro de Berlim.

A Europa produz mais do que o necessário para garantir aquelas obrigações e sustentar um modelo de desenvolvimento e prosperidade que se tornou um desígnio e referência para inúmeras economias mundiais. Contudo, não produz o suficiente para sustentar um serviço nacional de saúde onde o custo per capita de uma consulta num centro de saúde é mais do dobro do que num privado. Não produz o necessário para sustentar uma rede viária com fluxos de trânsito ridículos ou equipamentos sócio-desportivos às moscas, edificados pelo populismo irresponsável de quem não pensou um segundo nas gerações vindouras. Não produz o necessário para alimentar um mastodonte na 5 de Outubro tão distante da realidade escolar e da sua missão de valorização da escola pública. Não produz, também, o necessário para suportar programas olímpicos com os resultados que obteve durante décadas, quando outros países, de menores condições, continuadamente alcançaram melhores resultados com menores apoios, colocando o nosso país, aí sim no topo dos rankings, de rácio de despesa pública por medalha olímpica conquistada.

Não haja ilusões, o risco da ortodoxia neoliberal tomar conta da ocorrência será tanto maior quanto mais se adiar reformular o papel vital do Estado em assegurar - o que não significa prestar - as obrigações sociais junto dos seus cidadãos, com eficiência, justiça, transparência, responsabilização e equidade, sob pena da ortodoxia do mercado se impor à politica e, como a história tantas vezes o comprova, cortar a eito e aniquilar progressivamente os fóruns de mobilização cívica e os corpos intermédios que em tantos domínios sociais, são um suporte essencial para a concretização de politicas públicas.

Neste contexto, não deixa de ser sintomático que estes corpos intermédios, emanação da sociedade civil, e motor essencial para “promover, estimular, orientar e apoiar a prática e a difusão da cultura física e do desporto” deste país, consagrados no texto constitucional citado como associações e colectividades desportivas, não tenham merecido a devida prioridade na reflexão e acção dos poderes públicos, ao nível do poder central, quando sinaliza uma clara preferência em regular o desporto profissional e a modalidade com menor dependência de apoios públicos, mas plasma como principal opção para o quadriénio “… uma política de desporto com todos e para todos, recordando, designadamente, que tudo começa na fase infanto-juvenil e que as mulheres e a população sénior não podem ser descuradas”.

Mas também, ao nível do poder local - e aqui quiçá mais preocupante - quando, num quadro de austeridade, cede ao imediatismo da empresarialização de iniciativas municipais eivadas da vacuidade do folclore salutogénico da actividade física, desistindo de qualificar o labor do seu tecido associativo, de criar interdependências entre este e a comunidade escolar, e de escrutinar com rigor a criação de valor desportivo gerado com os recursos públicos que lhe são afectos (numero de praticantes, qualificação técnica, resultados competitivos, dinâmica organizacional, etc).

Nada melhor do que um exemplo reformista da liberal Grã-Bretanha para elucidar que nesta, como noutras equações, o problema reside na qualidade da acção do Estado para envolver, responsabilizar, capacitar e valorizar a acção daquelas entidades daLink sociedade civil que, lá como cá, fizeram e fazem o desporto acontecer todos os dias alimentando a cadeia de valor cujo topo o Estado Português se apressa em reflectir.

Tudo isto, ironicamente, através de um simples conceito anglo-saxónico difundido pela insuspeita senhora Thatcher e inculcado no desenho de qualquer política pública naquele país.
Value for Money!

12 comentários:

Anónimo disse...

O Estado socialista (na gaveta)/ social-democrata que tem governado a Europa quase toda e também Portugal, nas últimas décadas, cumpriu os mandamentos keynesianos intervencionistas.
Supostamente em favor de um Estado Social.
O problema do Keynesianismo é a tendência para o "politicamente correto", com objectivos claramente eleitoralistas.
Portugal é um exemplo cruel de actuação intervencionista do Estado irracional, cedendo, em simultâneo, a iniciativas neo-liberais apenas nas áreas mais propensas à corrupção.
No nosso país, tal como noutros do sul da Europa, a democracia não passou, até hoje, de uma ilusão partidocrática, em que o Estado prometeu o insustentável e, com o benefício de uma classe política cleptómana, levou o país à bancarrota (ela está aí, embora disfarçada).
O Estado Social, nestas condições, faliu.
Com a globalização, a verdade económico-financeira vem ao de cima, como o azeite na água.
E Keynes será substituído por Friedman.
Na minha opinião, ainda bem.
É a única saída.

Anónimo disse...

Escreveu o anónimo das 9h45:

E Keynes será substituído por Friedman.
Na minha opinião, ainda bem.
É a única saída.


O Friedman não é aquele rapaz dos "Chicago Boys" que foi conselheiro do Governo "patriótico" do Pinochet, no Chile?!!!

Anónimo disse...

Anónimo das 19:23h:

Você leu alguma coisa do Milton Friedman?
Está preocupado com Pinochet?
Eu que eu sei é que o intervencionismo estatal baseado no keynesianismo nos levou a este estado de finanças públicas.
Gasta-se mais do que aquilo que se produz.
Os mercados não funcionam, são manipulados pelos interesses de quem ocupa o poder, que com objectivos eleitoralistas mas muito democraticozinhos dão cabo dos países.
Distribuindo privilégios por uma corja partidocrática, maioritariamente corrupta.
Aumentando impostos para sustentar o insustentável.
Acha bem? É isto que você preconiza?
Em nome de uma Constituição de 1976, completamente utópica e fora da nossa realidade, recheada de direitos, liberdades e garantias e de um Estado Social insustentável?
O MERCADO (oferta/procura), a funcionar corretamente, é a única saída, meu caro.
O resto são tretas...

Anónimo disse...

Este anónimo das 23:23 é um mestre da treta.
Pelo menos uma vez na vida escreva algo de concreto sobre o que deve ser feito no desporto português. Contribua para reduzir a expectativa destes pobres ignorantes da coisa desportiva que frequentam este blog. Você parece um daqueles intelectuais de meia tijela que conhecem muitos nomes - Keynes, Friedman, Rowls e muitos mais - mas não fazem a mais pequena ideia sobre o seu pensamento e muito menos sabem o que é que essa gente pode contribuir par um desporto melhor.
Quando não se tem qualquer ideia concreta sobre o que se deve fazer para tirar o nosso desporto da situação em que se encontra, atiram-se evasivas para o ar, sempre embrulhadas em pessimismo, mal-dizer, derrotismo e sobretudo desdém por aqueles que procuram no dia a dia fazer alguma coisa.
Será que você já leu alguma coisa de um senhor chamado Nikolay Shandowsky? Se não leu então leia. Ajudaria muito na organização dos seus amplos saberes. Passaria a saber melhor onde arrumar os Friedmans os Marxs os Keynes e outros intelectuais que lhe devem fazer a vida num inferno. Até o ajudaria a arrumar a constituição de 76. Tudo ficaria mais ordenado na sua mente. Não hesite, vá a uma livraria perto de si. Não se arrependerá.

Anónimo disse...

Caro anónimo que me chamou "mestre da treta":

1) Você não rebate um único argumento que apresentei;

2) Eu acho que no Desporto português está e sempre esteve tudo mal; senão não estaríamos na cauda da Europa em quase todos os parâmetros;

3) Acredito e defendo o modelo do sistema desportivo americano: High School, College, Ligas Profissionais. O MERCADO a funcionar;

4) Não acredito no "politicamente correto" que impera no desporto português, onde só prevalecem interesses futebolísticos, legislação idiota, demagogia barata, caminhadas, negociatas e dinossáurios que se aguentam no poder décadas, seja em Federações, seja nas estruturas incompetentes de representação do denominado "movimento associativo";

5) Quanto a livrarias e conselhos, não lhos pedi; aqui dão-se opiniões, não se dão conselhos; não seja pedante, se faz favor, não há pachorra...

Anónimo disse...

Escreve o anónimo LL:

(...) onde só prevalecem interesses futebolísticos, legislação idiota, demagogia barata, caminhadas, negociatas e dinossáurios que se aguentam no poder décadas (...)

E diz o Ciberdúvidas da Língua Portuguesa:

(...) pretender a excelência de um termo formado com um elemento grego ("deinos") e o outro latino ("saurios"), como faz um dos participantes no debate do Correio, é querer construir um hibridismo, o que é altamente desaconselhável

Dinossauros, portanto, e não o bacoco "dinossáurios"...

Tome nota e veja se aprende, que eu não duro sempre!

Anónimo disse...

Ao anónimo das 15:11.
Começo pelo fim. você não me pediu conselhos, é verdade, mas eu dou-lhos. É gratuito. Não custa nada e sabe bem contribuir para a sua formação.
Quanto ao pedantismo todos podem testemunhar que você nada partilha desse desvio da natureza humana. No meu caso pessoal você constitui o melhor estimulante para que do meu ser mais profundo emirjam os sentimentos mais condenáveis. Até você os condena. O que você não nota é o que se passa consigo.
O seu ponto 3 diz tudo. Esta é a sua grande proposta e ideia para o desporto português.Há que sugerir aos nossos governantes a adopção do modelo americano (USA). Tudo isso mais o MERCADO e estaria resolvido o nosso desporto.
Você repete até à exaustão as mesmas generalidades. Tudo está mal, os dirigentes não dirigem, as caminhadas, a incompetência, a democracia que nada resolveu, a inutil Constituição etc etc. As suas sugestões são apenas estas expressões de ódio por tudo o que de inútil e medíocre se vai passando na nossa terra.
Mas hoje, está bem, chegou uma proposta muito concreta: adopte-se o sistema USA. Quem esperava uma solução mais complexa e elaborada teve esta surpresa. Afinal a solução é fácil. Estava mesmo aqui à mão de semear.
Quanto à pachorra, eu, pela minha parte, continuarei a tê-la nas doses necessárias para deglutir as suas opiniões. Você, apesar dos maus figados que, por vezes, me provoca, até é divertido. Obrigado pela sua proposta para o desporto português. Pena é que já não vá a tempo de Londres 2012. Por falar em Londres 2012 não imagina como já sinto a expectativa de acompanhar os jogos através das suas opiniões. Agosto nunca mais chega...

Anónimo disse...

Anónimo das 00.05h:

Pode escrever-se das duas maneiras.
Dinossauro ou dinossáurio, embora os cientistas portugueses prefiram usar "dinossáurio".

Aconselho a leitura de:
Silva, C.M. da (2008) - Temas de Paleontologia: Dinossáurio ou dinossauro.

Está lá tudo bem explicadinho, por quem percebe MESMO do assunto.

Carlos Marques da Silva é Professor Auxiliar, investigador e especialista em Paleontologia, do Departamento de Geologia da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

Desejo-lhe longa vida.

Anónimo disse...

Anónimo das 13:47h

Você continua sem apresentar um único argumento ou ideia.

Eu julgo ser coerente naquilo que venho afirmando.

E, das duas uma: ou é verdade ou é mentira que o desporto português é fraquinho.
E que a causa está nos dirigentes. Políticos, olímpicos, confederados e federados.
Que são objectivamente incompetentes.
Uns mais que outros.

Quanto à implantação de um novo modelo, obviamente demoraria décadas.
Defendo o modelo americano.
Em que funciona o MERCADO e o desporto profissional e universitário se auto-regulam, sem interferências do Estado, que se limita a construir e explorar instalações desportivas rentáveis.

Quanto ao seu divertimento comigo, não parece compatível com os maus-fígados que lhe provoco.

Em que é que ficamos?

Anónimo disse...

O divertimento é e será sempre muito superior aos maus fígados que me provoca. É este o único desequilíbrio que devemos admitir nas nossas curtas vidas. Obrigado por essa oportunidade.

Anónimo disse...

Escreveu LL (travestido agora de anónimo):

Pode escrever-se das duas maneiras.Dinossauro ou dinossáurio, embora os cientistas portugueses prefiram usar "dinossáurio"

E acrescentou

Aconselho a leitura de:
Silva, C.M. da (2008) - Temas de Paleontologia: Dinossáurio ou dinossauro.

Está lá tudo bem explicadinho, por quem percebe MESMO do assunto.


LL é capaz de achar isto surpreendente, mas quem percebe MESMO da língua portuguesa são os linguistas e não os paleontólogos.

Pela mesma razão, aliás, que quem percebe MESMO de desporto são os desportistas e não os arquitectos....

Anónimo disse...

Anónimo das 00:40h

Vê-se que você não leu o que escreveu Marques da Silva sobre o assunto.
Também o Prof. Galopim de Carvalho, autoridade máxima sobre a matéria em Portugal, escreve em todas as suas obras "dinossáurios".
Deve ser, para si, um ignorante...

Quanto à sua segunda brilhante asserção, garanto-lhe que há muitos desportistas que percebem pouco ou muito pouco de desporto. E há arquitectos que percebem muito de desporto.

O tal anónimo que você aponta (sabe-se lá porquê...), apresenta no curriculum ambas as qualificações.
Isso não significa nada.

Onde é que você quer chegar?
A lado nenhum?
Aqui discutem-se argumentos sobre desporto...